RE - 1315 - Sessão: 24/10/2018 às 16:00

RELATÓRIO

Trata-se de recurso interposto pelo PARTIDO DO MOVIMENTO DEMOCRÁTICO BRASILEIRO (PMDB) de ESTEIO em face da sentença que desaprovou suas contas, referentes à movimentação financeira do exercício de 2016, em virtude do recebimento de valores oriundos de fontes vedadas, determinando a suspensão do repasse de quotas do Fundo Partidário pelo prazo de um ano e o recolhimento da quantia de R$ 1.250,00 ao Tesouro Nacional (fls. 137-138).

O recorrente opôs embargos declaratórios, ao argumento de que a sentença incorreu em omissão (fls. 142-148), o que não foi reconhecido pelo juízo a quo, que rejeitou os aclaratórios (fls. 154-156).

Irresignado, o órgão partidário reiterou a necessidade de aclarar a decisão (fls. 160-166), tendo o julgador de piso novamente rejeitado o apelo (fls. 168-171).

Interposto recurso, em suas razões a agremiação sustenta que a decisão não enfrentou os argumentos expostos na petição às fls. 126-129, que infirmavam os apontamentos dos pareceres da unidade técnica e do órgão ministerial. Alega que a sentença é nula, por ofensa ao disposto no art. 489, § 1º, incs. I e IV, do Código de Processo Civil e por violação aos princípios do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa. Invoca a disposição contida no art. 1.022, caput e inc. II, parágrafo único e inc. II, do Código de Processo Civil para justificar a alegação de cerceamento de defesa, por entender que a decisão inviabilizou a oposição de embargos declaratórios, ao aduzir a possibilidade de imposição de multa na reiteração da insurgência. Destaca a existência de omissão quanto à falta de observância dos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade na dosimetria da sanção de suspensão das quotas do Fundo Partidário. No mérito, repisa os argumentos expendidos na manifestação das fls. 126-129 e nos embargos de declaração. Requer a aprovação das contas, ainda que com ressalvas. Sucessivamente, postula o parcial provimento para reduzir a sanção de perda de quotas do Fundo Partidário ao patamar mínimo, diante da ausência de má-fé (fls. 175-181).

Nesta instância, a Procuradoria Regional Eleitoral opinou pelo desprovimento do recurso (fls. 188-198).

É o relatório.

 

VOTO

Senhor Presidente,

Eminentes colegas:

O recurso é tempestivo.

Inicialmente, observo que o recorrente, a pretexto de evitar tautologia, deixou de reprisar os argumentos pelos quais defende a reforma da decisão de mérito, remetendo à análise, por este Tribunal, das razões constantes na petição às fls. 126-129.

Conquanto a ausência de regularidade formal acarrete o não conhecimento do recurso, pela falta de apresentação dos fundamentos de fato e de direito pelos quais impugna a decisão recorrida, na situação dos autos, considerando que o apelo enfrenta pontos específicos da decisão, evidencia-se a presença do interesse recursal, bem assim da regularidade formal, não sendo a hipótese de mera irresignação genérica e sem fundamentação.

Com essas considerações, conheço do apelo.

Como matéria preliminar, o órgão partidário alega a nulidade da sentença, ao fundamento de ofensa ao disposto no art. 489, § 1º, incs. I e IV, do Código de Processo Civil e por violação aos princípios do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa.

Sustenta que a decisão não analisou os argumentos expostos na petição às fls. 126-129, que rebate as irregularidades apontadas no parecer da unidade técnica e do órgão ministerial.

De fato, não houve pronunciamento judicial acerca das questões jurídicas suscitadas pelo prestador por ocasião da prolação da sentença. Ocorre que, como bem ressaltado no parecer da douta Procuradoria Regional Eleitoral, a integração da decisão às fls. 168-171, por meio dos aclaratórios, supriu as omissões alegadas, razão pela qual a preliminar deve ser afastada.

Ademais, observo que a sentença adotou a técnica da decisão per relationem, na qual o julgador adota como razões de decidir a fundamentação explicitada em parecer ou em outro elemento de informação constante nos autos.

No âmbito do processo de contas, considerando a natureza técnica das questões debatidas, é comum a utilização do instituto para a adoção das conclusões firmadas no parecer técnico, o que não acarreta nulidade da decisão, tampouco viola o dever de fundamentação e os demais preceitos constitucionais invocados pelo recorrente.

Logo, não se verifica nulidade na decisão.

 

No mérito, as contas foram desaprovadas em virtude de falha na apresentação de recibos eleitorais e de recebimento de contribuições oriundas de fonte vedada, conforme parecer conclusivo às fls. 114-118.

Relativamente aos recibos eleitorais, o órgão técnico apontou que o diretório partidário passou a emitir comprovantes de doação somente após o relatório de diligências, em afronta à disposição contida no art. 11 da Resolução TSE n. 23.464/15, in verbis:

Art. 11. Os órgãos partidários de qualquer esfera devem emitir, no prazo máximo de três dias contados do crédito na conta bancária, recibo de doação para:

I – as doações recebidas de pessoas físicas;

II – as transferências financeiras ou estimáveis em dinheiro realizadas entre partidos políticos distintos, com a identificação do doador originário;

III – as transferências financeiras ou estimáveis em dinheiro realizadas entre níveis de direção partidária do mesmo partido político, com a identificação do doador originário;

IV – as transferências financeiras de recursos do Fundo Partidário realizadas entre partidos distintos ou entre níveis de direção do mesmo partido, dispensada a identificação do doador originário.

Em defesa, a agremiação reputa a irregularidade como sendo de natureza meramente formal, incapaz de macular o exame contábil.

A respeito da falha identificada, destaco que a jurisprudência tem adotado entendimento no sentido de não admitir a confecção tardia de recibos com o escopo de justificar despesas ou amparar receita omitidas.

Entretanto, a hipótese dos autos é diversa, pois não há sonegação de recursos ou inconsistências na identificação de doadores. Além disso, o próprio diretório municipal buscou sanear a falha com a geração, ainda que extemporânea, dos recibos eleitorais.

Assim, concluo que a falha não compromete o exame da regularidade das contas, especialmente por constarem todos os elementos essenciais à fiscalização das doações.

Desse modo, considerando a ausência de prejuízo ao efetivo controle das contas, a impropriedade merece tão somente a indicação de ressalva.

Nesse sentido:

RECURSO. PRESTAÇÃO DE CONTAS. PARTIDO POLÍTICO. EXERCÍCIO FINANCEIRO 2015. DOAÇÕES RECEBIDAS. DOAÇÃO DO DIRETÓRIO NACIONAL DO PARTIDO. REGULAR. DOAÇÃO ORIGEM NÃO IDENTIFICADA. AUSÊNCIA DE RECIBOS ELEITORAIS. RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. APROVAÇÃO COM RESSALVAS. PROVIMENTO PARCIAL.

1 Doação proveniente do Diretório Nacional da agremiação devidamente identificada com data, origem e CNPJ do doador. Evidenciada regularidade da doação. Afastado recolhimento do numerário ao Tesouro Nacional.

2. Recebimento de doação de origem não identificada, em desacordo com a previsão contida nos arts. 7º, 8º, § 2º, da Resolução TSE n. 23.432/14. Situação que acarreta o recolhimento ao Tesouro Nacional. Quantia de pequena expressão, que representa 6,8% do montante integral. Aprovação com ressalvas. Provimento parcial.

(TRE-RS - RE: 664 GIRUÁ - RS, Relator: DES. FEDERAL JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA, Data de Julgamento: 04.12.2017, Data de Publicação: DEJERS - Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Tomo 219, Data 06.12.2017, Página 11.) (Grifei.)

No que se refere aos recursos considerados como provenientes de fonte vedada, a unidade técnica considerou irregular a receita procedente de Felipe Costella, por ostentar a condição de vereador.

Referente às autoridades públicas, registro que, por aplicação dos princípios do tempus regit actum, da isonomia e da segurança jurídica, deve incidir ao exame das presentes contas a legislação vigente à época dos fatos, ou seja, sem as recentes alterações promovidas pela Lei n. 13.488/17, que modificou o art. 31 da Lei n. 9.096/95.

Nesse sentido, já se pronunciou este Tribunal:

RECURSO. PRESTAÇÃO DE CONTAS ANUAL. PARTIDO POLÍTICO. EXERCÍCIO DE 2015. PRELIMINAR. MANUTENÇÃO DOS DIRIGENTES PARTIDÁRIOS NO POLO PASSIVO. ILEGITIMIDADE NÃO CONFIGURADA. MÉRITO. RECEBIMENTO DE DOAÇÕES DE FONTES VEDADAS. ALTERAÇÃO LEGISLATIVA. PERMITIDA A CONTRIBUIÇÃO DE FILIADOS. INAPLICABILIDADE AO CASO CONCRETO. APLICAÇÃO DA LEGISLAÇÃO VIGENTE À ÉPOCA DOS FATOS. PRINCÍPIO DA SEGURANÇA JURÍDICA. MANUTENÇÃO DO JUÍZO DE IRREGULARIDADE DA DOAÇÃO. REDUÇÃO DO PRAZO DE SUSPENSÃO DO RECEBIMENTO DAS QUOTAS DO FUNDO PARTIDÁRIO. PARCIAL PROVIMENTO.

1. Preliminar rejeitada. O art. 38 da Resolução TSE n. 23.432/14 prevê que deverá ser determinada a citação do órgão partidário e dos responsáveis para que ofereçam defesa sempre que houver impugnação ou constatação de irregularidade no parecer conclusivo. A integração dos dirigentes na lide é consectário da responsabilização prevista na Lei dos Partidos Políticos. Manutenção dos dirigentes partidários para integrarem o polo passivo. Ilegitimidade passiva afastada.

2. Constituem recursos oriundos de fontes vedadas as doações a partidos políticos realizadas por titulares de cargos demissíveis ad nutum da administração direta ou indireta que detenham condição de autoridades, vale dizer, que desempenhem função de direção ou chefia.

3. A Lei n. 13.488/17, publicada em 06.10.17, alterou a redação do art. 31 da Lei n. 9.096/95 - Lei dos Partidos Políticos -, excluindo a vedação de doação de pessoa física que exerça função ou cargo público demissível ad nutum, desde que filiada ao partido beneficiário.

4. Inaplicabilidade ao caso concreto. Incidência da legislação vigente à época dos fatos. Prevalência do princípio da segurança jurídica e da paridade de armas no processo eleitoral, em detrimento da aplicação pontual da retroatividade in bonam partem. Manutenção do juízo de irregularidade das contribuições advindas de cargos demissíveis ad nutum, ainda que os contribuintes sejam filiados à agremiação.

5. Incontroverso o recebimento de recursos de fontes vedadas, em valor correspondente a 65,79% das receitas do partido, impõe-se a desaprovação das contas. Redução, entretanto, do prazo de suspensão do recebimento de quotas do Fundo Partidário para quatro meses.

6. Provimento parcial.

(TRE-RS; Recurso Eleitoral n. 14-97, Relator: Dr. Luciano André Losekann, julgado em 04.12.2017, por unanimidade.) Grifei.)

Destaca-se que o art. 31, inc. II, da Lei n. 9.096/95, em sua redação primitiva, vedava o recebimento de doações procedentes de autoridades públicas, como se verifica por seu expresso teor:

Art. 31. É vedado ao partido receber, direta ou indiretamente, sob qualquer forma ou pretexto, contribuição ou auxílio pecuniário ou estimável em dinheiro, inclusive através de publicidade de qualquer espécie, procedente de:

[…]

II - autoridade ou órgãos públicos, ressalvadas as dotações referidas no art. 38.

No conceito de autoridade pública, previsto no artigo referido, inserem-se os detentores de cargos em comissão que desempenham função de chefia e direção, conforme assentou o egrégio Tribunal Superior Eleitoral, com a Resolução n. 22.585/07, editada em razão da resposta à Consulta n. 1428, cuja ementa segue:

Partido político. Contribuições pecuniárias. Prestação por titulares de cargos demissíveis ad nutum da administração direta ou indireta. Impossibilidade, desde que se trate de autoridade.

Resposta à consulta, nesses termos. Não é permitido aos partidos políticos receber doações ou contribuições de titulares de cargos demissíveis ad nutum da administração direta ou indireta, desde que tenham a condição de autoridades.

(CONSULTA n. 1428, Resolução n. 22585 de 06.9.2007, Relator Min. JOSÉ AUGUSTO DELGADO, Relator designado Min. ANTONIO CESAR PELUSO, Publicação: DJ – Diário de Justiça, Data 16.10.2007, Página 172.) (Grifei.)

Reproduzo trechos extraídos do referido acórdão, que bem explicitam a decisão:

[…] podemos concluir que os detentores de cargos demissíveis ad nutum da administração direta ou indireta da União, e por via reflexa os dos Estados e dos Municípios, são considerados autoridade pública, ante a natureza jurídica dos cargos em comissão, bem como das atividades dele decorrentes.

O recebimento de contribuições de servidores exoneráveis ad nutum pelos partidos políticos poderia resultar na partidarização da administração pública. Importaria no incremento considerável de nomeação de filiados a determinada agremiação partidária para ocuparem esses cargos, tornando-os uma força econômica considerável direcionada aos cofres desse partido.

Esse recebimento poderia quebrar o equilíbrio entre as agremiações partidárias. Contraria o princípio da impessoalidade, ao favorecer o indicado de determinado partido, interferindo no modo de atuar da administração pública. Fere o princípio da eficiência, ao não privilegiar a mão-de-obra vocacionada para as atividades públicas, em detrimento dos indicados políticos, desprestigiando o servidor público. Afronta o princípio da igualdade, pela prevalência do critério político sobre os parâmetros da capacitação profissional.

[…]

(...) Estamos dando interpretação dilatada. Estamos dizendo que autoridade não é somente quem chefia órgão público, quem dirige entidade, o hierarca maior de um órgão ou entidade. Estamos indo além: a autoridade é também o ocupante de cargo em comissão que desempenha função de chefia e direção.

[…]

Está claro. A autoridade não pode contribuir. Que é a autoridade? É evidente que o hierarca maior de um órgão ou entidade já não pode contribuir, autarquia, empresa pública, sociedade de economia mista, e, além disso, os ocupantes de cargo em comissão.

[…]

As autoridades não podem contribuir. E, no conceito de autoridade, incluímos, de logo, nos termos da Constituição, os servidores que desempenham função de chefia e direção. É o artigo 37, inciso V.

[…]

O Tribunal responde à consulta apontando que não pode haver a doação por detentor de cargo de chefia e direção.

 

A vedação, decorrente do entendimento firmado pela Corte Superior na aludida consulta, tem orientado as decisões deste Regional, como se verifica pela seguinte ementa:

RECURSO. PRESTAÇÃO DE CONTAS. PARTIDO POLÍTICO. FONTE VEDADA. AUTORIDADE. ART. 31, INC. II, DA LEI N. 9.096/95. DESAPROVAÇÃO. RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. SUSPENSÃO DAS QUOTAS DO FUNDO PARTIDÁRIO. EXERCÍCIO FINANCEIRO DE 2015.

Desacolhida a matéria preliminar. 1. Realizada citação do partido para os fins do art. 38 da Resolução TSE n. 23.464/15. Defesa regularmente apresentada. Não configurada nulidade do feito por cerceamento de defesa. 2. Despicienda a apresentação de demonstrativo do cálculo do valor a ser recolhido ao Tesouro Nacional. Resultado alcançado por mero cálculo aritmético. Soma constante no relatório conclusivo do exame das contas. Irregularidade não evidenciada.

Configuram recursos de fontes vedadas as doações a partidos políticos advindas de titulares de cargos demissíveis ad nutum da administração direta ou indireta que tenham a condição de autoridades, vale dizer, que desempenhem função de direção ou chefia. A previsão de fonte vedadas tem por finalidade impedir a influência econômica daqueles que tenham alguma vinculação com órgãos públicos, assim como evitar a manipulação da máquina pública em benefício eleitoreiro. Reconhecidas como vedadas as contribuições provenientes de secretário municipal, supervisor de departamento, chefe e coordenador.

Mantida a penalidade de recolhimento da quantia recebida indevidamente ao Tesouro Nacional. Redução do período de suspensão do recebimento de verbas do Fundo Partidário para cinco meses.

Provimento parcial.

(TRE-RS; Recurso Eleitoral n. 10.26, Relator: Des. Federal João Batista Pinto Silveira, julgado em 05.7.2017, por unanimidade.) (Grifei.)

Tal entendimento foi, inclusive, solidificado na Resolução TSE n. 23.464/15, cujas disposições disciplinam as contas partidárias do exercício financeiro de 2016, analisadas nestes autos:

Art. 12. É vedado aos partidos políticos e às suas fundações receber, direta ou indiretamente, sob qualquer forma ou pretexto, doação, contribuição ou auxílio pecuniário ou estimável em dinheiro, inclusive por meio de publicidade de qualquer espécie, procedente de:

(…)

IV – autoridades públicas.

(…)

§1º Consideram-se como autoridades públicas, para os fins do inciso IV do caput deste artigo, aqueles, filiados ou não a partidos políticos, que exerçam cargos de chefia ou direção na administração pública direta ou indireta. (…) (Grifei.)

Na situação sob exame, ao entender pela ilicitude da doação realizada pelo Vereador Felipe Costella, a decisão combatida guarda alinhamento ao posicionamento manifestado por este Tribunal na Consulta n. 109-98, julgada em 23.9.2015, consoante a qual os detentores de mandato eletivo devem ser considerados autoridades para efeito do disposto no art. 12, inc. XII e seu § 2º, da Resolução TSE n. 23.432/14.

Contudo, recentemente, o Plenário deste Regional entendeu por conferir interpretação restritiva ao art. 12 da Resolução TSE n. 23.464/15, posto que consiste em norma constritiva de direitos, especialmente em relação à autonomia da gestão partidária.

Desse modo, não é possível equiparar o ocupante do cargo de vereador, exercente de mandato fixo conferido pelo sufrágio popular, ao detentor de cargo público, demissível ad nutum, de chefia ou direção na administração pública direta ou indireta, para o fim de coibir o aparelhamento partidário por meio da distribuição de funções públicas.

A mudança jurisprudencial ocorreu a partir do julgamento do RE n. 13-93, conforme ementa que transcrevo:

RECURSO. PRESTAÇÃO DE CONTAS. PARTIDO POLÍTICO. EXERCÍCIO FINANCEIRO DE 2016. RECEBIMENTO DE DOAÇÃO REALIZADA POR DETENTOR DE MANDATO ELETIVO. VEREADOR. INTERPRETAÇÃO RESTRITIVA DA NORMA. NÃO CARACTERIZADA FONTE VEDADA. LICITUDE DA DOAÇÃO. REFORMA DA SENTENÇA. APROVAÇÃO DAS CONTAS. PROVIMENTO.

Configuram recursos de fontes vedadas as doações a partidos políticos advindas de autoridades públicas, vale dizer, aqueles que exercem cargos de chefia ou direção na administração pública, direta ou indireta. Definição expressa no texto do art. 12 da Resolução TSE n. 23.464/15.

No caso, a agremiação partidária recebeu recursos de detentor de mandato eletivo de vereador. O texto normativo não contempla os agentes políticos. Impossibilidade de se dar interpretação ampliativa à norma que traz uma restrição de direitos. O detentor de mandato eletivo não é titular de cargo nomeado em razão de vinculações partidárias, ao contrário, exerce "munus" público, eleito pelo povo. As doações realizadas por essa espécie de agente não possuem a potencialidade de afetar o equilíbrio entre as siglas partidárias. Caracterizada, assim, a licitude da doação efetuada pelo vereador. Fonte vedada não caracterizada. Reforma da sentença para aprovar as contas. Provimento.

(RE 13-93, Relator Desembargador Federal João Batista Pinto Silveira. Julgado em 6.12.2017. Unânime.)

Colho do voto do relator, Des. Federal João Batista Pinto Silveira, trecho da percuciente análise tecida sobre o tema, o qual tomo expressamente como razões de decidir:

[...]

Ainda que se tenha firmado jurisprudência no sentido de que todo aquele cargo comissionado de chefia ou direção seja autoridade, o fato é que, em nenhum momento é possível incluir no texto os detentores de mandato eletivo.

Primeiro, porque a norma é restritiva de direito, não podendo ser dada interpretação ampliativa.

Segundo, porque não se amoldam ao detentor de mandato eletivo os argumentos que sustentaram a compreensão de que os demissíveis ad nutum devam ser considerados autoridades.

O detentor de mandato eletivo não é titular de cargo nomeado em razão de vinculações partidárias, ao contrário, exerce munus público, eleito pelo povo, consagrando o princípio democrático e republicano.

Nessa medida, as doações realizadas por exercente de mandato eletivo não possuem a potencialidade de afetar o equilíbrio entre as siglas partidárias.

Dessarte, a vedação imposta pela Resolução TSE n. 23.464/2015, ao proibir doações por servidores que exercem a função pública em caráter precário tem o objetivo de obstar a partidarização da administração pública, principalmente diante dos princípios da moralidade, da dignidade do servidor e da necessidade de preservação contra abuso de autoridade e do poder econômico.

Não é o caso dos exercentes de mandato eletivo, que apenas estão sujeitos à perda do mandato em hipóteses restritas e taxativas, desde que observados o contraditório e ampla defesa.

Portanto, a contribuição realizada pelo titular de mandato na Casa Legislativa municipal é considerada lícita e regular, devendo ser afastada a falha apontada e, consequentemente, a determinação de recolhimento dos valores respectivos ao Tesouro Nacional.

Assim, tendo em vista a única incorreção remanescente, concernente à irregularidade na emissão dos recibos eleitorais, afigura-se excessivamente gravosa a aplicação da severa sanção de desaprovação das contas e de suspensão do recebimento de verbas alusivas ao Fundo Partidário.

Tratando-se de falta que não prejudica o exame contábil, admite-se a aplicação dos postulados da razoabilidade e da proporcionalidade para aprovar-se as contas com ressalvas.

Nos mesmos termos, a iterativa jurisprudência do TSE, que colaciono abaixo:

PRESTAÇÃO DE CONTAS. PARTIDO HUMANISTA DA SOLIDARIEDADE (PHS). EXERCÍCIO FINANCEIRO DE 2010. APROVAÇÃO COM RESSALVAS.

1. As falhas apontadas, a despeito de terem comprometido a regularidade das contas e representarem aplicação irregular do Fundo Partidário, correspondem a apenas 0,53% dos recursos recebidos pelo Partido Humanista da Solidariedade (PHS), no ano de 2010 (R$ 1.258.845,15).

2. A jurisprudência deste Tribunal Superior tem admitido a aprovação das contas, com ressalvas, com fundamento nos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, quando verificadas falhas que correspondem a valor ínfimo.

3. Determinado o recolhimento ao Erário no valor de R$ 6.717,11 (seis mil, setecentos e dezessete reais e onze centavos), devidamente atualizados, que devem ser pagos com recursos próprios do partido.

4. A determinação de devolução aos cofres públicos decorre da natureza pública dos recursos que constituem o Fundo Partidário e independe da sorte do processo de prestação de contas, consoante previsto no art. 64 da Res.-TSE nº 23.432/2014.

5. Prestação de contas do PHS referente ao exercício financeiro de 2010 aprovada, com ressalvas.

(Prestação de Contas n. 79347, Acórdão, Relatora Min. Luciana Christina Guimarães Lóssio, Publicação: DJE - Diário de justiça eletrônico, Tomo 206, Data 29.10.2015, Página 58) (Grifei.)

PRESTAÇÃO DE CONTAS. PSTU. DIRETÓRIO NACIONAL. EXERCÍCIO FINANCEIRO DE 2010. APROVAÇÃO COM RESSALVAS. RESSARCIMENTO AO ERÁRIO. RECOLHIMENTO AO FUNDO PARTIDÁRIO.

1. As faturas emitidas por agências de viagem que contenham o nome do passageiro, número do bilhete aéreo, data e destino da viagem são hábeis à comprovação de gastos com passagens aéreas, sem prejuízo de serem realizadas diligências de circularização se forem levantadas dúvidas sobre sua idoneidade. Precedentes (PC nº 43/DF).

2. A restituição ao erário de valores impugnados em prestações de contas anteriores deve ser feita com recursos próprios, e não com recursos do Fundo Partidário.

3. As irregularidades apuradas no caso dos autos não são hábeis, por si só, a caracterizar a rejeição das contas e correspondem a somente 5,34% dos recursos recebidos do Fundo Partidário. Precedentes.

Contas aprovadas com ressalvas e determinação de restituição ao erário dos valores relativos às irregularidades na aplicação de recursos e de recolhimento ao Fundo Partidário de recurso de origem não identificada depositado na conta vinculada.

(Prestação de Contas n. 92252, Acórdão, Relator Min. Henrique Neves Da Silva, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Data 06.4.2016, Página 88.) (Grifei.)

ANTE O EXPOSTO, VOTO pelo parcial provimento do recurso, para afastar a preliminar de nulidade da sentença e aprovar com ressalvas as contas do PARTIDO DO MOVIMENTO DEMOCRÁTICO BRASILEIRO (PMDB) de ESTEIO, relativas ao exercício financeiro de 2016, afastando a determinação de recolhimento de valores ao Tesouro Nacional.

É como voto, senhor Presidente.