RE - 21266 - Sessão: 26/10/2018 às 16:00

RELATÓRIO

Trata-se de recurso interposto por KELE OLIVEIRA CARDOSO KRUGER contra a sentença que desaprovou sua prestação de contas, relativa às eleições de 2016 para o cargo de vereador, devido à ausência de abertura de conta bancária específica para a campanha, à falta de apresentação dos recibos eleitorais e à não comprovação de despesas atinentes aos serviços jurídicos e contábeis (fls. 46-47).

Nas razões recursais, a recorrente pondera que a desaprovação das contas trará como consequência o seu alijamento da vida política. Com base nesse entendimento, postula o conhecimento dos novos documentos juntados ao recurso, invocando os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade. Alega que a abertura de conta bancária era facultativa para os candidatos do Município de Arroio do Padre, aplicando-se a previsão do art. 22, § 2°, da Lei n. 9.504/97, pois na cidade não há agência ou posto de atendimento bancário. Sustenta ter sanado as irregularidades constatadas nas contas quanto aos serviços jurídicos e contábeis. Requer a reforma da sentença (fls. 53-59). Junta novos documentos (fls. 61-69).

A Procuradoria Regional Eleitoral opinou, preliminarmente, pelo não conhecimento da documentação que acompanha o recurso, porque intempestivamente apresentada. No mérito, manifestou-se pelo parcial provimento do apelo, a fim de afastar as irregularidades relativas à não abertura de conta bancária e aos serviços de advocacia e de contabilidade, mas desaprovar as contas em razão da permanência das irregularidades relativas à origem das receitas (fls. 74-79).

É o relatório.

 

VOTO

O recurso é regular, tempestivo e comporta conhecimento.

Inicialmente, cumpre tecer algumas considerações no tocante à prefacial de não conhecimento dos novos documentos acostados ao recurso.

De acordo com o § 1º do art. 64 da Resolução TSE n. 23.463/15, “as diligências devem ser cumpridas pelos candidatos e partidos políticos no prazo de setenta e duas horas contadas da intimação, sob pena de preclusão”.

Contudo, no âmbito dos processos de prestação de contas, expedientes que têm preponderante natureza declaratória e possuem como parte apenas o prestador, este Tribunal tem concluído, em casos excepcionais, com fulcro no art. 266 do Código Eleitoral, pela aceitação de novos documentos acostados à peça recursal e não submetidos a exame do primeiro grau de jurisdição, quando sua simples leitura pode sanar irregularidades, e não há necessidade de nova análise técnica.

Potencializa-se o direito de defesa, especialmente quando a juntada da nova documentação mostra capacidade de influenciar positivamente no exame da contabilidade, de forma a prestigiar a retidão no emprego de recursos e na realização de despesas.

Nesse sentido, o seguinte precedente deste Regional:

PRESTAÇÃO DE CONTAS. ELEIÇÕES 2016. VEREADOR. UTILIZAÇÃO DE RECURSOS PRÓPRIOS SEM A CORRESPONDENTE DECLARAÇÃO DE BENS NO REGISTRO DE CANDIDATURA. COMPROVADA A CAPACIDADE ECONÔMICA. DEPÓSITO EM ESPÉCIE DIRETAMENTE NA CONTA DE CAMPANHA. VALOR ACIMA DO LIMITE REGULAMENTAR. NECESSIDADE DE TRANSFERÊNCIA ELETRÔNICA. DEMONSTRADA A ORIGEM DA DOAÇÃO. INFORMAÇÕES PRESTADAS. PROVIMENTO PARCIAL. APROVAÇÃO COM RESSALVAS.

Apresentação de novos documentos com o recurso. Possibilidade. Providência que contribui para o esclarecimento da movimentação financeira sem prejudicar o procedimento.

Utilização de recursos próprios sem declaração de bens no registro de candidatura. Suspeita de ausência de capacidade. Irregularidade suprida pela apresentação da declaração de imposto de renda.

Doação acima de R$1.064,10 mediante depósito em espécie, sem transferência eletrônica. Documentos comprovando saque de valor idêntico à doação um minuto antes do depósito. Prova que afasta a irregularidade.

A divergência na identificação de doador, limitada à falta de preenchimento de seu nome completo, constitui mera inconsistência formal, incapaz de prejudicar a regularidade das contas.

Aprovação com ressalvas.

(TRE-RS; RE 174-11.2016.6.21.0113; relator Des. Eleitoral Miguel Antônio Silveira Ramos, julgado em 29.06.2018.) (Grifei.)

Assim, rejeito a preliminar e conheço dos novos documentos juntados à peça recursal.

Antes de analisar o mérito, importa consignar que o julgamento de desaprovação das contas não gera reflexos na quitação eleitoral dos candidatos, circunstância que apenas ocorre em caso de omissão do dever de prestar contas.

Passando ao mérito, a contabilidade foi desaprovada em razão da ausência de abertura de conta bancária, da falta de juntada dos recibos eleitorais das doações recebidas durante a campanha e da omissão de despesas relacionadas aos serviços jurídicos e contábeis.

Em relação à não abertura da conta bancária de campanha, o próprio parecer técnico de exame, nas fls. 31 e 32, aponta que a candidata estava ao abrigo da exceção contida no art. 7º, § 4º, da Resolução TSE n. 23.463/15, referente à falta de obrigatoriedade em municípios onde não haja agência ou posto de atendimento bancário.

De fato, conforme a declaração da Prefeitura de Arroio do Padre (fl. 68), a única instituição financeira com alvará de licença e de localização na circunscrição é a cooperativa de crédito Sicredi, a qual, nos termos do Comunicado BACEN n. 29.108, de 16.02.2016, não está contemplada entre os entes financeiros aptos para a abertura de conta eleitoral nas Eleições de 2016.

Em relação às demais irregularidades, conclui-se, igualmente, pelo saneamento das falhas por meio dos documentos acostados com as razões recursais.

Com efeito, os recibos eleitorais às fls. 61 e 66 confirmam que a totalidade das receitas financeiras utilizadas em campanha, ou seja, R$ 550,00, provieram de recursos da própria candidata.

Outrossim, Kele Oliveira Cardoso Kruger apresenta, juntamente ao recurso, o recibo eleitoral relativo à doação de serviços de contabilidade, firmado pela contabilista Adriane Kovalski Ucker (fl. 63), e outro assinado pela advogada Aline Lourenço de Ornel, relativo a serviços advocatícios (fl. 64).

Quanto a esses últimos documentos, é necessário distinguir a consultoria jurídica, que constitui atividade-meio em campanhas eleitorais, da representação processual em feitos judiciais.

Sobre a matéria, o TSE pacificou sua jurisprudência no sentido de que os honorários relativos aos serviços advocatícios e de contabilidade referentes a processos jurisdicionais não são considerados gastos eleitorais de campanha, sendo dispensados de registro e da emissão de recibos nas contas.

Dos contratos juntados às folhas 15-18, verifica-se que os serviços advocatícios e contábeis restringiram-se à própria elaboração e à apresentação das contas eleitorais, processo de natureza jurisdicional, não caracterizando, assim, gastos eleitorais sujeitos à contabilização, nos termos do art. 29, § 1º-A, da Resolução TSE n. 23.463/15.

Nesse sentido, ainda, colaciono ementa de julgado deste Regional:

Recurso. Prestação de contas. Candidato. Contabilização de serviços advocatícios. Art. 29, §§ 1º e 1º-A, da Resolução TSE n. 23.463/15. Eleições 2016.

Parecer conclusivo e manifestação ministerial de piso pela rejeição das contas. Proferida sentença de desaprovação sem que tenha sido oportunizada prévia manifestação à candidata acerca das irregularidades apontadas, conforme previsão do art. 64, § 4º, da Resolução TSE n. 23.463/15. Decisão consubstanciada na ausência de registro de gastos e dos respectivos recibos, referentes à contratação de serviços advocatícios durante a prestação de contas. Ainda que, nesta instância, tenha sido verificado o vício procedimental, deixa-se de reconhecer de ofício a nulidade, em virtude da possibilidade de decisão favorável quanto ao mérito, sem representar qualquer prejuízo à interessada.

Diferenciação conceitual entre o serviço advocatício prestado em processo judicial contencioso e o serviço de consultoria jurídica realizado em favor das campanhas eleitorais. Entendimento do Tribunal Superior Eleitoral no sentido de que os honorários relativos aos serviços advocatícios e de contabilidade referentes a processo jurisdicional contencioso não são considerados gastos eleitorais de campanha. Situação distinta do serviço de consultoria, atividade-meio prestada durante a campanha eleitoral, paga com recursos provenientes da conta de campanha, constituindo gasto eleitoral que deve ser declarado de acordo com os valores efetivamente pagos. Inteligência do disposto no art. 29, §§ 1º e 1º-A, da Resolução TSE n. 23.463/15.

Demonstrada a outorga da procuração no mês de outubro de 2016, excluindo a obrigação contraída do rol de despesas de campanha. Não identificada impropriedade ou irregularidade na prestação, devem ser aprovadas as contas.

Provimento.

(Recurso Eleitoral n. 24846, Acórdão de 07.3.2017, Relator DES. CARLOS CINI MARCHIONATTI, Publicação: DEJERS - Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Tomo 39, Data 09.3.2017, p. 5.) (Grifei.)

Portanto, não remanescem omissões ou indicativos da existência de recursos de origem não identificada ou de fonte vedada.

Logo, não reconhecidas outras irregularidades na prestação de contas, o recurso deve ser provido com o fito de aprovar as contas com ressalvas, dado que os apontamentos foram esclarecidos somente nesta instância, com a documentação acostada ao recurso.

Ante o exposto, VOTO, preliminarmente, pelo conhecimento dos novos documentos apresentados e, no mérito, pelo  parcial provimento do recurso para aprovar as contas com ressalvas.