RE - 5448 - Sessão: 29/08/2018 às 13:30

RELATÓRIO

Trata-se de recurso interposto por PEDRO ANDRÉ ARENHARDT contra decisão do juízo da 172ª Zona Eleitoral que julgou procedente a Representação por doação acima do limite estabelecida no art. 23, § 1º, da Lei n. 9.504/97, ajuizada pelo Ministério Público Eleitoral, e condenou ao pagamento de multa no valor equivalente a 10 vezes à quantia de R$ 1.460,80, doada em excesso, uma vez que o recorrente doou R$ 6.000,00 à campanha eleitoral de 2016 e obteve rendimentos brutos no valor de R$ 45.392,00 em 2015, ano anterior ao do pleito (fls. 60-63).

Em suas razões, afirma que o art. 21, § 4º, inc. III, da Resolução TSE n. 23.463/15 estabelece prazo para que a Secretaria da Receita Federal do Brasil envie comunicação ao Ministério Público Eleitoral relativa a indício de excesso de doação, o que não foi observado nos autos, razão pela qual entende que a Representação é eivada de nulidade. Alega que, ao tempo em que a sentença foi prolatada, estava vigente a redação do art. 23 da Lei n. 9.504/97 dada pela Lei n. 13.488/17, que limitou a sanção pecuniária ao patamar de 100% da quantia doada em excesso, devendo a decisão ser reformada no particular. Sucessivamente, sustenta que a multa aplicada deve ser reduzida ao limite mínimo previsto, ao argumento de que a ausência de apresentação de defesa não é grave o bastante para lhe impingir a imposição de sanção no patamar máximo permitido. Requer a reforma da decisão para que seja reconhecida a nulidade da Representação. Alternativamente, postula a aplicação das disposições contidas na Lei n. 13.488/17, ou a redução da multa ao patamar mínimo previsto na redação anterior do art. 23, § 3º, da Lei n. 9.504/97 (fls. 69-70).

Nesta instância, os autos foram remetidos com vista à Procuradoria Regional Eleitoral, que opinou pelo parcial provimento do recurso, a fim de que, mantendo-se a sentença, o valor da multa aplicada seja reduzida ao patamar mínimo, correspondente à quantia de R$ 7.300,00, equivalente a cinco vezes o valor do excesso da doação (fls. 92-97).

É o relatório.

 

VOTO

O recurso é tempestivo e comporta conhecimento.

Preliminarmente, o recorrente sustenta a nulidade da Representação, ao fundamento de que o prazo previsto no art. 21, § 4º, inc. III, da Resolução TSE n. 23.463/15 não foi observado pela Secretaria da Receita Federal do Brasil.

Razão não assiste ao recorrente.

Como bem concluiu o juízo a quo, o prazo conferido para o envio das informações ao Ministério Público Eleitoral não é preclusivo, uma vez que busca conferir ao Parquet lapso temporal razoável para o ajuizamento da Representação até o final do ano subsequente à realização da doação, providência que foi observada no caso dos autos.

No mérito, consigno que este Tribunal, ao debater a aplicação retroativa do parâmetro fixado para a penalidade por excesso de doação disposto na Lei n. 13.488/17, entendeu, por maioria, pela incidência do princípio tempus regit actum, estabelecendo a irretroatividade das novas disposições em decorrência da proeminência do princípio da segurança jurídica.

Transcrevo a ementa do referido julgamento:

RECURSO. REPRESENTAÇÃO. DOAÇÃO DE RECURSOS PARA CAMPANHA ELEITORAL ACIMA DO LIMITE LEGAL. PESSOA FÍSICA. ELEIÇÕES 2014. PRELIMINAR AFASTADA. NÃO CARACTERIZADA A INÉPCIA DA INICIAL. MÉRITO. CONFIGURADO O EXCESSO NO VALOR DOADO. CONTROVÉRSIA SOBRE A SANÇÃO APLICÁVEL. ALTERAÇÃO DA PENALIDADE PELA LEI N. 13.488/17. IRRETROATIVIDADE. PRINCÍPIO "TEMPUS REGIT ACTUM". ADEQUADA A MULTA APLICADA NA SENTENÇA. DESPROVIMENTO.

1. Preliminar afastada. Inicial em regular condição de ser analisada. Dados supostamente omitidos estão referenciados nos documentos que instruem a peça. A falta da precisa descrição do valor excedido apenas pode ser suprida durante a instrução probatória, não havendo mácula na inicial. Inépcia da petição não caracterizada.

2. Mérito. A doação realizada por pessoa física restringe-se a dez por cento dos rendimentos brutos auferidos no ano anterior ao da eleição, nos termos do art. 23, § 1º, inc. I, da Lei n. 9.504/97. Caracterizada a infringência ao parâmetro legal.

3. Penalidade. Controvérsia sobre a sanção adequada. Inaplicabilidade da Lei n. 13.488/17 aos processos de exercícios anteriores a sua vigência, em prestígio à lei vigente à época dos fatos e ao princípio da segurança jurídica. Irretroatividade. Aplicação do princípio "tempus regit actum". Mantida a condenação imposta na sentença, de acordo com a penalidade prevista na época dos fatos.

Provimento negado.

(TRE-RS - RE: 2115 GRAVATAÍ - RS, Relator: DR. JAMIL ANDRAUS HANNA BANNURA, Data de Julgamento: 18.12.2017, Data de Publicação: DEJERS - Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Tomo 8, Data 22.01.2018, Página 10) (Grifei.)

Ressalto que o posicionamento se coaduna com a jurisprudência do egrégio TSE, que expressamente determina a aplicação da penalidade vigente ao tempo da doação, por força do princípio de que o tempo rege o ato.

Nessa inteligência, cabe rememorar que a Corte Superior Eleitoral não acolheu o pedido de afastamento da pena de multa por doação excessiva de pessoas jurídicas, realizadas no pleito de 2014, em face do advento da Lei n. 13.165/15. Referido diploma legal, ao excluir das hipóteses de doação para campanha os recursos repassados por empresas, suprimiu da Lei das Eleições a sanção até então prevista, de multa no patamar de cinco vezes a quantia excedida. Confira-se:

Eleições 2014. Agravo regimental. Recurso especial eleitoral. Doação acima do limite legal. Pessoa física. Procedência parcial. Multa. 1. Ofensa ao art. 93, IX, da CRFB. Ausência. 2. Revogação do art. 81 da Lei nº 9.504/1997. Irretroatividade. Princípio tempus regit actum. Súmula no 30/TSE. Histórico da demanda

(...)

2. Negado seguimento ao recurso especial, monocraticamente, sob os seguintes fundamentos:

(I) afastada a violação dos arts. 93, IX, da CF/1988 e 489, § 1º, IV, do CPC/2015, devidamente explicitada, a teor do aresto regional, a inaplicabilidade da revogação do art. 81 da Lei nº 9.504/1997 às pessoas físicas, por dizer respeito somente às pessoas jurídicas;

(II) a revogação do art. 81 da Lei nº 9.504/1997 não alcança as doações realizadas em eleições anteriores à Lei nº 13.165/2015, não havendo falar em retroatividade da lei mais benéfica; e

(III) mantida a multa aplicada em face da comprovação da doação acima do limite legal, por afronta ao art. 81, § 1º, da Lei das Eleições - preceito legal vigente e eficaz na data do fato. Da análise do agravo regimental.

3. Não há falar em ofensa aos arts. 93, IX, da CF/1988; e 489, § 1º, IV, do CPC/2015, devidamente demonstrados os motivos pelos quais a revogação do art. 81 da Lei nº 9.504/1997 não isenta de sanções as pessoas físicas que realizaram doações acima do limite legal.

4. A teor da jurisprudência desta Casa, a revogação do art. 81 da Lei nº 9.504/1997 não alcança as doações realizadas em eleições anteriores, ante a incidência do princípio do tempus regit actum. Precedente.

5. Inaplicabilidade do princípio da retroatividade da norma mais benéfica, consoante o entendimento desta Corte Superior. Precedente. Agravo regimental conhecido e não provido.

(Recurso Especial Eleitoral n. 4310, Acórdão, Relatora Min. ROSA WEBER, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Tomo 216, Data 08.11.2017, Página 27) (Grifei.)

 

AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL. ELEIÇÕES 2014. DOAÇÃO ACIMA DO LIMITE. PESSOA JURÍDICA. MULTA. ART. 81 DA LEI 9.504/97. APLICABILIDADE DA NORMA EM 2014. NULIDADE. CERCEAMENTO DE DEFESA. PROVA TESTEMUNHAL. DESNECESSIDADE. DESPROVIMENTO.

(...)

3. No presente agravo, reiteram-se as alegações anteriormente suscitadas, a saber: a) suposto cerceamento de defesa quanto ao pedido de prova testemunhal; b) impossibilidade de incidência de multa em virtude de revogação do art. 81 da Lei 9.504/97 pela Lei 13.165/2015.

(…)

SANÇÕES DO ART. 81 DA LEI 9.504/97

6. A agravante sustentou ser atípica a conduta de doar valores acima do limite legal nas Eleições 2014, pois a Lei 13.165/2015 extinguiu a multa, e, ademais, a citação ocorreu na espécie após revogado o art. 81 da Lei 9.504/97.7. A declaração de inconstitucionalidade do art. 81 da Lei 9.504/97 (ADI 4.650, Rel. Min. Luiz Fux, DJe de 4.3.2016) e a circunstância de esse dispositivo ter sido revogado pela reforma promovida pela Lei 13.165/2015 não autorizam incidência do princípio da retroatividade da lei mais benéfica, conforme inúmeros precedentes desta Corte, dentre eles: AgR-AI 16-43/PR, Rel.Min. Napoleão Nunes Maia Filho, DJe de 10.8.2017; AgR-ED-REspe 4-48/PE, Rel. Min. Rosa Weber, DJe de 2.8.2017; AgR-AI 82- 59/MG, Rel. Min. Luiz Fux, DJe de 9.2.2017; AgR-REspe 43-28/SC, de minha relatoria, DJe de 16.5.2017; AgR-AI 145-63/MG, Rel.Min. Henrique Neves, DJe de 20.2.2017; AgR-AI 36-14/RJ, Rel. Min. Luciana Lóssio, DJe de 1º.7.2016.8. Em outras palavras, ao se abolir hipótese de doação por pessoas jurídicas a campanhas eleitorais, o cenário tornou-se ainda mais rigoroso: se antes era viável doar até certo limite legal, para pleitos futuros essa faculdade não é mais permitida.

CONCLUSÃO

9. Agravo regimental não provido, mantendo-se multa imposta à empresa por doação de recursos acima do limite legal nas Eleições 2014.

(Recurso Especial Eleitoral n. 4136, Acórdão, Relator Min. HERMAN BENJAMIN, Publicação: DJE – Diário de Justiça Eletrônico, Data 27.11.2017, Páginas 60-61) (Grifei.)

Por isso, na situação dos autos, tendo em vista que ao tempo da doação estava vigente a redação originária do art. 23 da Lei n. 9.504/97, que estabelecia a sanção pecuniária de cinco a dez vezes do valor doado em excesso, não merece reforma a decisão.

No tocante à proporcionalidade da multa no caso concreto, cabe salientar que a imposição da penalidade deve ser fixada de acordo com os parâmetros legalmente estabelecidos.

Colho, nesse sentido, o seguinte precedente do egrégio TSE:

ELEIÇÕES 2010. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO. DOAÇÃO DE RECURSOS ACIMA DO LIMITE LEGAL. PESSOA JURÍDICA. NÃO OCORRÊNCIA DA DECADÊNCIA. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. INAPLICABILIDADE. PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE E DA RAZOABILIDADE. AFASTAMENTO DA MULTA OU FIXAÇÃO DO SEU VALOR AQUÉM DO LIMITE MÍNIMO LEGAL. IMPOSSIBILIDADE. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO.

1. O princípio da insignificância não encontra guarida nas representações por doação acima do limite legal, na medida em que o ilícito se perfaz com a mera extrapolação do valor doado, nos termos do art. 81 da Lei das Eleições, sendo despiciendo aquilatar-se o montante do excesso. Precedentes: AgR-REspe n° 713-45/BA, Rel. Min. Dias Toffoli, DJe de 28.5.2014; AgR-AI nº 2239-62/SP, Rel. Min. Luciana Lóssio, DJe de 26.3.2014.

2. Os postulados fundamentais da proporcionalidade e da razoabilidade são inaplicáveis para o fim de afastar a multa cominada ou aplicá-la aquém do limite mínimo definido em lei, sob pena de vulneração da norma que fixa os parâmetros de doações de pessoas física e jurídica às campanhas eleitorais.

3. Este Tribunal Superior assentou ser de 180 dias, a partir da diplomação, o prazo para formalizar a representação contra doadores, presente o extravasamento dos limites legais. Portanto, tendo em vista que a diplomação referente ao pleito de 2010 no Estado do Paraná ocorreu em 17.12.2010, e a representação por excesso de doação foi ajuizada pelo Parquet eleitoral no dia 10.6.2011, não há que se falar em decadência do direito de ação.

4. Agravo regimental desprovido.

(TSE, Agravo Regimental em Agravo de Instrumento n. 2050, Acórdão de 15.12.15, Relator Min. LUIZ FUX, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Tomo 60, Data 31.3.16, Página 12)(Grifei.)

Assim, considerando o valor absoluto do excesso e a sua potencialidade para interferir no pleito, pondero ser razoável que a sua aplicação deva recair no mínimo previsto na disposição normativa, consistente em cinco vezes o valor da quantia extrapolada (R$ 1.460,80), o que alcança o montante de R$ 7.304,00.

Ante o exposto, afasto a matéria preliminar e VOTO pelo provimento parcial do recurso, para reduzir a penalidade de multa para cinco vezes da quantia doada em excesso, totalizando o valor de R$ 7.304,00.