RE - 36011 - Sessão: 19/09/2018 às 14:30

RELATÓRIO

O Ministério Público Eleitoral – MPE - de Taquari interpõe recurso contra a sentença que julgou improcedente a Ação de Impugnação de Mandato Eletivo (fls. 433-439) ajuizada em desfavor de Ana Cristina de Oliveira Goethel, Liliane Pereira da Rocha, Marcos Adriano da Silva, Clóvis Shenk Bavaresco, René D'ávila Marques, Nilton Flores da Silva Neto, Cássio Pereira Von Fruhauf, Aragão Custódio Santos Siqueira, Paulo Roberto da Silva Flores, Marcos José Machado dos Reis, Sandro Jocelito Forgiarini, Adão Carlos Alexandre Lopes, Arizoli Pereira, Paulo Jair da Silva Pereira, Thiago da Conceição Lopes, Danilo Roberto Viana Pereira, Eduardo Tadeu Fiscuk, Miguel Bastos Martins, Alcides Marques Saldanha, Jeferson Luiz Santos da Rosa, João Fernando Zuber, Anselmo Junqueira dos Santos, Homero da Silva Rosa, Roberto Luís de Araújo Vargas, Pedro Danilo da Costa Gravina e José Moisés Costa Carbonell por suposta fraude no preenchimento da quota de gênero, mediante candidaturas fictícias de ANA CRISTINA DE OLIVEIRA GOETHEL e LILIANE PEREIRA.

Os candidatos ora recorridos (titulares e suplentes) concorreram às eleições proporcionais daquele Município, nas eleições de 2016, pelas Coligações “Taquari Pode Muito Mais” (PP, PPS, PSC e DEM) e “Fazer Mais, Fazer Melhor, Fazer Crescer” (PSDB e o então PMDB).

O MPE de 1º grau sustentou, em sua irresignação, que a prova produzida nos autos confirma que Ana Cristina e Liliane jamais foram candidatas de fato. Aduziu que, nas respectivas páginas no Facebook, ainda que tenham apoiado explicitamente outros candidatos, não há qualquer referência às próprias candidaturas (fls. 445-450v.).

Acrescentou que Liliane lançou sua candidatura na mesma data e evento em que seu companheiro lançou candidatura própria ao mesmo cargo e pelo mesmo partido. Ainda, que Liliane não recebeu nenhum voto, enquanto Ana Cristina apenas um e, mais, ambas declararam ausência de movimentação de recursos em suas prestações de contas de campanha.

Asseverou, também, que, nos depoimentos prestados em juízo, verifica-se que as duas candidatas tinham pleno conhecimento acerca do funcionamento do sistema eleitoral, uma vez que ambas eram filiadas e participavam ativamente da vida partidária, não sendo crível a tese de que tenham desistido tacitamente de suas candidaturas.

Ressaltou, o recorrente, que o representante da Executiva Nacional do PSC, ouvido em juízo na qualidade de informante, declarou que as candidaturas das requeridas eram apenas para preencher as cotas de gênero (grifos no original).

Concluiu requerendo a reforma da sentença para o fim de declarar a ocorrência de fraude/abuso de poder nas candidaturas de ANA CRISTINA DE OLIVEIRA GOETHEL e LILIANE PEREIRA DA ROCHA e, em consequência, decretar a cassação dos mandatos de todos os recorridos, assim como declarar nulos os votos obtidos pelos candidatos eleitos MARCOS ADRIANO DA SILVA, CLÓVIS SCHENK BAVARESCO e RENÉ D’ÁVILA MARQUES, determinando sua redistribuição segundo a regra do art. 109 do Código Eleitoral. Postula, ainda, seja admitido o preenchimento das vagas conquistadas pelas candidatas do gênero feminino das coligações envolvidas - “Taquari Pode Muito Mais” e “Fazer Mais, Fazer, Melhor, Fazer Crescer”, excetuadas as requeridas Ana Cristina e Liliana.

As partes recorridas apresentaram contrarrazões (fls. 455-467).

Postulam, em preliminar, o não conhecimento do recurso, por falta de fundamentação. No mérito, requerem o desprovimento do recurso, sustentando que o representante não se desincumbiu do ônus de comprovar a ocorrência de fraude na inscrição das candidatas Ana Cristina e Liliane.

Nesta instância, os autos foram com vista à Procuradoria Regional Eleitoral, que opinou, primeiro, pela extinção do processo com julgamento do mérito, em face do reconhecimento de decadência, com fulcro no art. 487, inc. II, do Código de Processo Civil, e, na questão de fundo, pelo provimento dos recursos (fls. 470-479v.).

É o relatório.

 

VOTO

Admissibilidade

O Ministério Público Eleitoral foi intimado da sentença em 11.5.2018, sexta-feira (fl. 443), e interpôs o recurso em 14.5.2018, segunda-feira (fl. 444), sendo tempestivo, portanto. Presentes os demais pressupostos de admissibilidade, dele conheço.

 

Pedido de não conhecimento do recurso

Os recorridos ANA CRISTINA DE OLIVEIRA GOETHEL e outros, em contrarrazões ao recurso do MPE (fls. 455-459), pugnam, preliminarmente, pelo não conhecimento da irresignação, sustentando que carece de fundamentação, pressuposto de sua admissibilidade, uma vez que, em suas razões, o órgão ministerial de 1º grau não trouxe novos argumentos em sua insurgência, limitando-se a reproduzir os termos já aduzidos em peças anteriores.

A preliminar não comporta acolhimento.

As razões de recurso satisfazem integralmente as exigências do art. 1.010 do Código de Processo Civil. Nelas, o recorrente aponta as passagens do provimento judicial recorrido contra as quais se insurgiu e indica as razões de seu inconformismo, de forma que o recurso encontra-se apto a ser conhecido.

Assim, rejeito a preliminar arguida.

 

Decadência da ação

A Procuradoria Regional Eleitoral, por sua vez, no parecer de fls. 470-479v., suscitou a decadência da ação em virtude da não inclusão no polo passivo da candidata MARA REGINA BARCELLOS RODRIGUES (PASTORA MARA), eleita ao cargo de vereadora pela Coligação “Fazer Mais, Fazer Melhor, Fazer Crescer”, nas eleições de 2016.

Reproduzo as razões contidas no parecer da douta Procuradoria Regional Eleitoral, que assim analisou a questão, verbis (fls. 472v.-473v.):

Compulsando-se os autos, observa-se que não foram incluídas no polo passivo da presente AIME as candidatas mulheres eleitas pelas coligações TAQUARI PODE MUITO MAIS e FAZER MAIS, FAZER MELHOR, FAZER CRESCER.

De acordo com as informações extraídas da página do TRE-RS (www.tre-rs.jus.br/eleicoes/2016/1turno/rs89290.html, fls. 52-53v, foi eleita a candidata à vereadora MARA REGINA BARCELLOS RODRIGUES (PASTORA MARA) pelo PSDB, pertencente à coligação FAZER MAIS, FAZER MELHOR, FAZER CRESCER (fl. 57) no município de Taquari-RS. No entanto, a referida candidata deixou de integrar o polo passivo da presente AIME, eis que o MINISTÉRIO PÚBLICO ELEITORAL autor, entendeu que as sanções por fraude ao art. 10, §3º, da Lei n. 9.504-97 “não poderão ser estendidas às candidatas mulheres, cujas candidaturas foram lícitas, o que viria em contramão à política afirmativa firmada pelo art. 10, §3º, da Lei das Eleições” (fl. 15v).

Entendo, entretanto, que deveria ter sido formado o litisconsórcio passivo necessário, incluindo-se no feito as candidatas mulheres eleitas vereadoras no município de Taquari-RS nas eleições 2016, pelas coligações TAQUARI PODE MUITO MAIS e FAZER MAIS, FAZER MELHOR, FAZER CRESCER dentro do prazo decadencial previsto para o ajuizamento da presente AIME, devendo ser reconhecida a decadência do pedido, ante a impossibilidade de correção do polo passivo após o decurso do prazo decadencial, previsto no art. 14, §10, da Constituição Federal, verbis:

§ 10 - O mandato eletivo poderá ser impugnado ante a Justiça Eleitoral no prazo de quinze dias contados da diplomação, instruída a ação com provas de abuso do poder econômico, corrupção ou fraude.

Isso porque, na Ação de Impugnação de Mandato Eletivo, visa-se à decisão declaratória de nulidade do Demonstrativo de Regularidade dos Atos Partidários - DRAP e desconstitutiva dos mandatos de todos os candidatos eleitos – homens e mulheres –, cujos registros de candidatura são derivados daquele DRAP.

Nessa quadra, a não inclusão no polo passivo da candidata mulher eleita pelas coligações TAQUARI PODE MUITO MAIS (PP/PPS/PSC/DEM) e FAZER MAIS, FAZER MELHOR, FAZER CRESCER (PSDB/PMDB), no caso a PASTORA MARA, trazem efetivo prejuízo à sua defesa, eis que eventual reconhecimento da nulidade do DRAP, conduzirá a cassação dos mandatos de todos os candidatos eleitos nas proporcionais pelas coligações a que integravam ANA CRISTINA e LILIANE.

Note-se, portanto, que é obrigatória a inclusão de MARA REGINA BARCELOS RODRIGUES (PASTORA MARA-PSDB) no polo passivo da presente AIME, cujo objetivo é a cassação dos mandatos eletivos às proporcionais de 2016 no município de TAQUARI pelas coligações TAQUARI PODE MUITO MAIS e FAZER MAIS, FAZER MELHOR, FAZER CRESCER. Observa-se, ainda, que, embora não haja pedido de cassação do mandato da PASTORA MARA, eleita vereadora pela coligação FAZER MAIS, FAZER MELHOR, FAZER CRESCER, deve a mesma integrar o polo passivo da lide, sob pena de efetivo prejuízo à sua defesa, o que não foi feito em tempo hábil, quando do ajuizamento da presente ação.

Ademais, não se mostra possível uma solução que, acolhendo a pretensão recursal deduzida pelo Ministério Público Eleitoral, redundasse por ressalvar a reportada vereadora eleita, na medida em que a nulidade do DRAP gera a invalidade dos registros de candidatura de todos os candidatos dele constantes.

Assim, deve a presente ação ser extinta, com julgamento do mérito, eis que configurada a decadência do direito de ajuizamento da ação, na forma do art. 487, II, do Código de Processo Civil, face ao reconhecimento de litisconsórcio passivo necessário entre os candidatos homens e mulheres eleitos às proporcionais pelas coligações TAQUARI PODE MUITO MAIS e FAZER MAIS, FAZER MELHOR, FAZER CRESCER nas eleições de 2016 no município de Taquari.

 

Com razão o ilustre Procurador Regional Eleitoral.

O exame dos autos demonstra que a ação foi ajuizada somente contra os candidatos do gênero masculino, não sendo dirigida contra as candidatas mulheres registradas pelas coligações envolvidas, à exceção das duas candidaturas alegadamente fictícias.

Asseverou o MPE de 1º grau, na peça vestibular (fl. 15v.), que as sanções não poderão ser estendidas às candidatas mulheres cujas candidaturas foram lícitas, o que viria em contramão à política afirmativa firmada pelo art. 10, § 3º, da Lei das Eleições (grifos no original).

Ocorre que, em caso de eventual comprovação de que a inscrição de uma ou mais candidaturas femininas constituiu um embuste engendrado para burlar as exigências legais e induzir a Justiça Eleitoral a erro quanto à regularidade dos atos partidários, o DRAP como um todo seria atingido.

Sendo assim, em um cenário de procedência da ação, seriam anulados todos os votos obtidos pelas coligações envolvidas, inclusive aqueles recebidos pelos candidatos não diplomados, dada sua condição de suplentes.

Não se desconhece que a jurisprudência majoritária exclui os candidatos não detentores de mandato, assim como os partidos e as coligações, do polo passivo da Ação de Impugnação de Mandato Eletivo, uma vez que a AIME objetiva tutelar o direito difuso de que os mandatos eletivos apenas sejam exercidos por quem os tenha alcançado de forma lícita, sem o emprego de práticas nocivas, como são o abuso de poder, a corrupção e a fraude.

Entretanto, no caso específico da AIME fundada em fraude ao percentual de gênero, todos os indicados no DRAP detêm legitimidade passiva para integrar o feito, independentemente de terem sido diplomados ou não.

É o que se colhe da jurisprudência abaixo colacionada:

RECURSOS. AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL. ELEIÇÕES MUNICIPAIS 2016. PRELIMINAR. AUSÊNCIA DE LITISCONSÓRCIO PASSIVO NECESSÁRIO. NÃO ACOLHIMENTO. MÉRITO. FRAUDE. ABUSO DO PODER POLÍTICO. BURLA AO INSTITUTO DAS COTAS DE GÊNERO. VIOLAÇÃO AO ART. 10, §3º, DA LEI N. 9.504/97 E AO ART. 5º, I, DA CF/88. COMPROVAÇÃO. A CONSTATAÇÃO DE FRAUDE NA COTA DE GÊNERO MACULA TODA A CHAPA, PORQUANTO O VÍCIO ESTÁ NA ORIGEM. CASSAÇÃO DOS DIPLOMAS E DOS REGISTROS DOS CANDIDATOS ELEITOS, SUPLENTES E NÃO ELEITOS, RESPECTIVAMENTE, OS QUAIS CONCORRERAM AO PLEITO PELAS CHAPAS PROPORCIONAIS CONTAMINADAS PELA FRAUDE. NULIDADE DOS VOTOS ATRIBUÍDOS AOS CITADOS CANDIDATOS, RECONTAGEM TOTAL DOS VOTOS E NOVO CÁLCULO DO QUOCIENTE ELEITORAL. INELEGIBILIDADE. SANÇÃO DE CARÁTER PERSONALÍSSIMA. ALCANÇA OS CANDIDATOS QUE DERAM CAUSA AO ILÍCITO. RECURSOS PARCIALMENTE PROVIDOS.

(RE n. 193-92.2016.6.18.0018/PI. Relator Juiz Astrogildo Mendes de Assunção Filho. Publicado no DJE/TRE-PI em 27.9.2017. Unânime.) (Grifei.)

 

AIME. ELEIÇÕES 2016. FRAUDE. CANDIDATURA FEMININA FICTÍCIA. INOBSERVÂNCIA DA RESERVA DE GÊNERO. EXTINÇÃO DO PROCESSO SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO. SENTENÇA AMPARADA NO ART. 485, IV, CPC. NÃO INDICAÇÃO DO PRESSUPOSTO DE CONSTITUIÇÃO E DESENVOLVIMENTO VÁLIDO DO PROCESSO SUPOSTAMENTE AUSENTE. (...) Polo passivo integrado por candidatos eleitos e não eleitos, pelo representante da coligação e pelos partidos que compuseram a coligação. Em função da natureza estritamente desconstitutiva da AIME, ostentam legitimidade passiva, em regra, apenas os titulares de mandatos eletivos. Contudo, ante a especificidade da causa de pedir, que se refere a fraude apta a viciar toda a lista de candidatos proporcionais da coligação, eventual decisão de procedência do pedido de cassação do mandato tem por desdobramento lógico, a inviabilização da assunção do cargo por qualquer candidato da coligação. Situação verificada no citado REspE nº 1-49/PI, no qual figuram, como litisconsortes, eleitos, suplentes e partidos. Ilegitimidade de parte adstrita aos representantes das coligações, cuja esfera jurídica pessoal não é passível de ser atingida pela decisão. RECURSOS A QUE SE DÁ PROVIMENTO, PARA CASSAR AS SENTENÇAS DE EXTINÇÃO DO PROCESSO SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO. EXCLUSÃO DE V.A.M.L. DO POLO PASSIVO DA AIME nº 720-89 E DE A.B.B. DO POLO PASSIVO DA AIME nº 721- 74. DETERMINAÇÃO DE RETORNO DOS AUTOS AO JUÍZO ELEITORAL PARA REGULAR PROCESSAMENTO, A PARTIR DA INTIMAÇÃO PARA CONTESTAÇÃO.

(RECURSO ELEITORAL n 72089, ACÓRDÃO de 08/06/2017, Relator ANTÔNIO AUGUSTO MESQUITA FONTE BOA, Publicação: DJEMG - Diário de Justiça Eletrônico-TRE-MG, Data 19.06.2017.)

 

O tema também já foi enfrentado por este Regional quando do julgamento do Recurso n. 49585, de relatoria do eminente colega, Des. Eduardo Augusto Dias Bainy, o qual restou assim ementado:

RECURSO. AÇÃO DE IMPUGNAÇÃO DE MANDATO ELETIVO. COTAS DE GÊNERO. ELEIÇÃO 2016. PRELIMINARES AFASTADAS. ADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA. ART. 14, § 10 DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. LEGITIMIDADE PASSIVA DA COLIGAÇÃO. EXCEPCIONALIDADE. CONSEQUÊNCIAS REFLEXAS NO DEMONSTRATIVO DE REGULARIDADE DE ATOS PARTIDÁRIOS – DRAP. GRAVAÇÃO AMBIENTAL EM LUGAR PÚBLICO. LICITUDE. MÉRITO. REGISTRO DE CANDIDATURA. ELEIÇÃO PROPORCIONAL. FRAUDE COMPROVADA. INDIVIDUALIZAÇÃO DAS CONDUTAS. DESNECESSIDADE. ART. 10, § 3º, DA LEI 9.504/97. INDEFERIMENTO DO DRAP. NULIDADE DOS VOTOS ATRIBUÍDOS À COLIGAÇÃO IMPUGNADA. NÃO APLICAÇÃO DO ART. 224 DO CÓDIGO ELEITORAL. DISTRIBUIÇÃO DOS MANDATOS NOS TERMOS DO ART. 109 DO CÓDIGO ELEITORAL. PROVIMENTO PARCIAL.

1. Preliminares afastadas. 1.1. O conceito da fraude, para fins de cabimento da ação de impugnação de mandato eletivo (art. 14, § 10, da Constituição Federal), é aberto e pode englobar todas as situações em que a normalidade das eleições e a legitimidade do mandato eletivo são afetadas por ações fraudulentas, inclusive nos casos de fraude à lei. A inadmissão da AIME, na espécie, acarretaria violação ao direito de ação e à inafastabilidade da jurisdição. Não configurada a inadequação da via processual. 1.2. A teor do suprerreferido artigo, na ação de impugnação de mandato eletivo não podem figurar, no polo passivo, a pessoa jurídica e o candidato não eleito no pleito, uma vez que o expediente se destina a desconstituir o mandato obtido nas urnas. Na espécie, contudo, condiderando que a AIME pode gerar efeitos jurídicos também à coligação, se constatada a fraude na composição da proporção das candidaturas, o DRAP sofrerá as consequências originárias, devendo-se privilegiar a ampla defesa no seu aspecto material, redundando, excepcionalmente, no reconhecimento da sua legitimidade para figurar no polo passivo da ação. 1.3. O art. 5º, inc. X, da Constituição Federal tutela a intimidade e a privacidade, sendo ilegal a gravação que vá de encontro a este preceito. No caso, a gravação se deu em lugar público e na presença de outras pessoas, não havendo ofensa a tal regra, reconhecendo-se a sua licitude.

2. Mérito. A reserva de gênero prevista no art. 10, § 3º, da Lei n. 9.504/97 busca promover a igualdade material entre homens e mulheres, impondo aos partidos o dever de preenchimento de o mínimo de 30% e o máximo de 70% para candidaturas de cada sexo.

3. Na espécie, a prova coligida demonstra que a coligação impugnada indicou o nome de uma das candidaturas com o único objetivo de atender o percentual de mulheres exigidos pela legislação, 30% de candidatas do sexo feminino, para tornar possível a indicação do número máximo de candidatos homens para concorrerem ao pleito pela coligação no município. Fraude comprovada que afeta, na origem, o Demonstrativo de Regularidade dos Atos Partidários – DRAP. Revogação do deferimento do registro de candidaturas da chapa proporcional.

4. Recaindo os efeitos sobre o DRAP de toda a chapa proporcional da coligação, não há necessidade de individualização das condutas dos candidatos para aferição de suas responsabilidades.

5. Não se aplica o art. 224 do Código Eleitoral, na medida em que as sanções aplicadas não devem ultrapassar a coligação que deu causa à fraude, devendo ser declarados nulos os votos atribuídos a ela, com a consequente cassação dos diplomas obtidos. Declarados nulos todos os votos atribuídos à coligação impugnada na eleição proporcional do ano de 2016, com a distribuição dos mandatos de vereador por ela conquistados, nos termos do art. 109 do Código Eleitoral, aos demais partidos ou coligações que alcançaram o quociente partidário (cálculo das sobras eleitorais).

Parcial procedência.

(TRE-RS - RE n. 49585, Relator Des. Eduardo Augusto Dias Bainy – J. Sessão de 13.12.2017).

 

É preciso ter em mente que a legitimidade do processo e, consequentemente, da decisão judicial, pressupõe a observância do contraditório e da ampla defesa.

O art. 115, I, do CPC estabelece que, verbis:

Art. 115. A sentença de mérito, quando proferida sem a integração do contraditório, será:

I - nula, se a decisão deveria ser uniforme em relação a todos que deveriam ter integrado o processo;

(…)

Parágrafo único. Nos casos de litisconsórcio passivo necessário, o juiz determinará ao autor que requeira a citação de todos que devam ser litisconsortes, dentro do prazo que assinar, sob pena de extinção do processo.

Dessa forma, no caso dos autos, impunha-se a formação de litisconsórcio passivo necessário, incluindo-se na ação não só a candidata eleita vereadora no município de Taquari-RS, nas eleições 2016, PASTORA MARA, mas todos os candidatos que receberam votos válidos, inclusive as demais candidatas mulheres.

Ajuizada a ação sem a inclusão de todas as partes necessárias, a petição inicial é inepta e, na hipótese dos autos, só poderia ser emendada até a data da diplomação – 19.12.2016 -, prazo decadencial fixado no art. 22, § 1º, da Resolução TSE n. 23.462/15 para a propositura da ação.

Logo, acolhendo a matéria prefacial suscitada pela Procuradoria Regional Eleitoral, é possível, desde logo, reconhecer a decadência do direito de ação, nos termos do art. 487, inc. II, do CPC, e, em consequência, declarar extinto o processo, com resolução de mérito, uma vez que não houve a inclusão na demanda das litisconsortes passivas necessárias, na figura da candidata eleita MARA REGINA BARCELLOS RODRIGUES (PASTORA MARA), bem como dos suplentes ETIENE REIS DA SILVA, MAGDA MARTINS MARIANTE, NAIRA MARIA PORN DA SILVA, ANA TERESINHA TERRES ALEXANDRE, APARECIDA CHAGAS, AMANDA MARTINS MAFASSIOLI, CRISTINA RIBEIRO DE OLIVEIRA, IEDA MARIA DA SILVA MARTINS KERN e LEONI MARIA DA SILVA DOS SANTOS, restando ultrapassado o prazo para o seu chamamento.

Nesse sentido, a jurisprudência:

Recurso. Ação de investigação judicial eleitoral. Abuso de poder. Conduta vedada. Litisconsórcio passivo necessário. Eleições 2016.

Preliminar de ofício. Ação ajuizada somente contra o candidato a prefeito, sem estar dirigida ao candidato a vice-prefeito. A Súmula n. 38 do Tribunal Superior Eleitoral consolidou entendimento de formação de litisconsórcio passivo necessário entre os integrantes da chapa majoritária nas ações visando à cassação do registro, do diploma ou do mandato. A ausência de sua formação é causa de nulidade, conforme art. 115, inc. I, do Código de Processo Civil. Todavia, a considerar que a ação deve ser ajuizada até a data da diplomação, sob pena de implemento da decadência do direito, e a cerimônia de diplomação dos candidatos deve ocorrer até 19.12.2016, reconhecida, desde logo, a decadência do direito, visto não mais ser possível à autora emendar a inicial.

Extinção do feito com resolução do mérito.

(Grifei.)

(RE n. 444-49, Relator Dr. Silvio Ronaldo dos Santos de Moraes, julgado em 19.12.2016.)

 

Recurso. Ação de investigação judicial eleitoral. Captação ilícita de sufrágio. Improcedência. Litisconsórcio passivo necessário. Art. 41-A da Lei n. 9.504/97. Eleições 2016.

Ação para reconhecimento da captação ilícita de sufrágio deve ser ajuizada ao candidato. Impetrada ao partido ou à coligação sem a inclusão obrigatória do candidato, a petição inicial é inepta ou nula, pois a emenda ou suprimento da inicial só podem ocorrer até a diplomação dos candidatos, ato que tipifica o encerramento do prazo decadencial, o qual não é suscetível de interrupção. Apresentada a petição sem a inclusão do candidato, e uma vez transcorrida a diplomação, é de se reconhecer a decadência do direito de representação.

Extinção do feito com resolução do mérito.

(Grifei.)

(TRE-RS - RE n. 120-39, Relator Des. Eleitoral Carlos Cini Marchionatti, julgado em 24.01.2017.)
 

Diante do exposto, afastada a matéria preliminar, VOTO pelo reconhecimento da decadência do direito de ação, extinguindo-se o processo, com resolução de mérito, com fundamento no art. 22, § 1º, da Resolução TSE n. 23.462/15, c/c o art. 487, inc. II, do Código de Processo Civil.