RE - 39679 - Sessão: 24/07/2018 às 17:00

RELATÓRIO

Trata-se de recurso interposto pelo PARTIDO DEMOCRÁTICO TRABALHISTA (PDT) de SANTO ANTÔNIO DO PLANALTO contra a sentença que desaprovou suas contas relativas à campanha eleitoral de 2016, em razão do recebimento de recursos de origem não identificada, e determinou o recolhimento do valor de R$ 14.300,00 ao Tesouro Nacional, assim como a perda do direito à percepção de quotas do Fundo Partidário por 12 meses (fls.71-72).

Em suas razões recursais (fls. 75-82), a agremiação suscita, preliminarmente, nulidade da sentença por carência de fundamentação. No mérito, sustenta que a modalidade simplificada de prestação de contas aplica-se também aos partidos políticos, fato este que lhes faculta a apresentação de documentos comprobatórios da sua contabilidade. Argumenta ainda que os recursos financeiros são oriundos das contribuições de filiados ao partido, o que pode ser verificado nas prestações de contas relativas aos exercícios de 2013, 2014 e 2015, caso em que, havendo qualquer problema, eventual arguição deve se dar no respectivo processo. Aduz que o valor gasto na campanha eleitoral foi insignificante. Requer, ao final, a aprovação das contas e a desconstituição da ordem de recolhimento de valores ao Tesouro Nacional. Subsidiariamente, pede que seja anulada a sanção pecuniária.

Nesta instância, a Procuradoria Regional Eleitoral opinou pelo desprovimento do recurso (fls. 94-97).

É o relatório.

VOTO

O recurso é tempestivo.

Inicialmente, afasto a preliminar de anulação da sentença por suposta ausência de fundamentação quanto às questões de fato e de direito que conduziram o magistrado ao julgamento pela desaprovação.

Verifico que a decisão atendeu aos requisitos elencados no art. 489, inc. II, do CPC, uma vez que, ainda que de forma sucinta, concluiu pela existência de irregularidades no lançamento contábil, com base nas conclusões lançadas nos pareceres técnicos às fls. 13-17 e 67, devidamente referenciados na sentença.

Desse modo, a utilização da técnica da motivação per relationem, na espécie, não conduz à nulidade da decisão, uma vez que possível a compreensão da fundamentação e o exercício do direito de defesa, inclusive na instância recursal, tal como procedido pelo recorrente.

Assim, afasto a preliminar de nulidade da sentença.

Passando ao mérito, a unidade técnica identificou a ausência de juntada pela grei partidária da documentação referida no art. 48, inc. II, da Resolução TSE n. 23.463/15, essencial ao exame das contas.

Conquanto a agremiação recorrente tenha sido intimada a prestar esclarecimentos acerca da arrecadação e dos gastos de recursos financeiros na campanha eleitoral, o órgão partidário quedou-se inerte, insistindo em sustentar que não tem obrigação de apresentar a documentação requerida pela Justiça Eleitoral, pois sujeita-se ao sistema simplificado de prestação de contas, a teor do art. 57 da Resolução TSE n. 23.463/15.

Para melhor análise da questão, transcrevo, a seguir, referido dispositivo regulamentar:

Art. 57. A Justiça Eleitoral adotará sistema simplificado de prestação de contas para candidatos que apresentem movimentação financeira correspondente a, no máximo, R$ 20.000,00 (vinte mil reais) (Lei n. 9.504/1997, art. 28, § 9º).

§ 1º Nas eleições para prefeito e vereador em municípios com menos de cinquenta mil eleitores, a prestação de contas será feita sempre pelo sistema simplificado (Lei n. 9.504/1997, art. 28, § 11).

§ 2º Para os fins deste artigo, considera-se movimentação financeira o total das despesas contratadas e registradas na prestação de contas. (Grifei.)

Percebe-se da atenta leitura do caput, contudo, que a adoção do sistema simplificado de prestação de contas pela Justiça Eleitoral é endereçado aos candidatos, e não aos partidos políticos. O seu parágrafo 1º está logicamente vinculado ao disposto na cabeça do artigo, ou seja, também aplicável aos candidatos, exclusivamente.

Entretanto, mesmo que assim não fosse, a Justiça Eleitoral pode determinar que o prestador de contas manifeste-se para apresentação de documentos e complementação de informações que sejam necessários ao julgamento, consoante estabelece o art. 64, caput, da Resolução TSE n. 23.463/15.

A análise técnica simplificada das contas, realizada por meio do sistema informatizado, tem por objetivo verificar inconsistências, dentre as quais o recebimento de recursos de origem não identificada.

No caso, foram encontradas falhas nas contas de campanha do partido, e este, mesmo intimado, não apresentou documentos hábeis a demonstrar a regularidade e a origem dos valores arrecadados, tais como recibos eleitorais, notas fiscais e demais comprovantes aplicáveis às receitas e despesas realizadas.

Patente, portanto, que, para julgamento das contas, pode a Justiça Eleitoral solicitar esclarecimentos quanto a possíveis falhas que, se não atendidos, podem conduzir à sua derradeira desaprovação.

No tocante à alegação de que os recursos financeiros do partido foram oriundos das contribuições de seus filiados, tal é o que se tentou verificar a partir da análise das contas, mas que, por ausência de documentação hábil fornecida pelo prestador, não se logrou apurar.

O art. 14, inc. V, al. “c”, da Resolução TSE n. 23.463/15 permite que recursos próprios dos partidos políticos, provenientes de contribuição dos seus filiados, sejam destinados às campanhas eleitorais, desde que identificada sua origem. Assim, incumbe ao partido comprovar o caminho percorrido pelo montante arrecadado, desde o depósito na conta bancária do partido até o repasse para a conta de campanha, em oposição ao asseverado pelo recorrente, de que eventual arguição deveria se dar exclusivamente no processo de contas partidárias anuais.

Nesse ponto, calha transcrever excerto do elucidativo parecer emitido pela Procuradoria Regional Eleitoral (fls. 95v.-96):

Alega o partido que não há obrigação de apresentar todos os documentos solicitados, pois a situação permite o enquadramento em prestação de contas simplificada.

 

Não obstante, tratando-se de doações recebidas do próprio partido, a não apresentação dos documentos apontados no parecer técnico, ainda que fosse o caso de prestação de contas simplificada, impede a identificação do CPF dos doadores originários dos recursos arrecadados pela agremiação, o que acarreta violação expressa ao §3º do art. 23 da Resolução 23.463/2015, bem como ao inc. I do §10 do art. 28 da Lei 9.504/1997. Senão, vejamos o teor dos dispositivos (grifo nosso):

 

Art. 23. As doações de recursos captados para campanha eleitoral realizadas entre partidos políticos, entre partido político e candidato e entre candidatos estão sujeitas à emissão de recibo eleitoral na forma do art. 6º.

(…)

§ 3º As doações referidas no caput devem ser identificadas pelo CPF ou CNPJ do doador originário das doações financeiras, devendo ser emitido o respectivo recibo eleitoral para cada doação (STF, ADI n. 5.394).

 

Art. 28. A prestação de contas será feita:

(...)

§ 9º

A Justiça Eleitoral adotará sistema simplificado de prestação de contas para candidatos que apresentarem movimentação financeira correspondente a, no máximo, R$ 20.000,00 (vinte mil reais), atualizados monetariamente, a cada eleição, pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor - INPC da Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE ou por índice que o substituir. (Incluído pela Lei n. 13.165, de 2015)

§ 10. O sistema simplificado referido no § 9º deverá conter, pelo menos:

I - identificação das doações recebidas, com os nomes, o CPF ou CNPJ dos doadores e os respectivos valores recebidos;

 

Saliente-se que a não identificação do CPF do doador originário nas doações entre partidos ou entre partido e candidato caracteriza recurso de origem não identificada nos termos do inc. II do §1º do art. 26 da Resolução TSE n. 23.463/2015:

 

Art. 26. O recurso de origem não identificada não pode ser utilizado por partidos políticos e candidatos e deve ser transferidos ao Tesouro Nacional, por meio de Guia de Recolhimento da União (GRU).

§ 1º Caracterizam o recurso como de origem não identificada:

(...)

II - a falta de identificação do doador originário nas doações financeiras;

 

Sendo assim, consoante a literalidade dos artigos acima transcritos, mesmo em se tratando de prestação de contas simplificada, há a exigência de identificação dos doadores originários mediante CPF ou CNPJ nas doações entre partidos e entre partido e candidato, o que não ocorreu na prestação de contas ora em análise. Sendo assim, o montante de R$ 14.300,00 importa em recursos de origem não identificada.

Ao final, o recorrente afirma que o montante gasto na campanha eleitoral, R$14.300,00, foi insignificante.

Nesse ponto, valores não excedentes a R$ 1.064,10 poderiam, de fato, ser tomados por irrisórios, conforme reiterada jurisprudência deste Tribunal, visto que é o montante que o próprio legislador elegeu como baliza para dispensar a contabilização de gasto realizado pelo eleitor em favor de candidato, previsto no art. 27 da Lei n. 9.504/97.

Entretanto, a cifra envolvida nos presentes autos supera aquele valor, em elevado grau, não sendo possível aceitar a tese da bagatela.

Assim, em face de a necessária documentação não ter sido acostada aos autos, impedindo a efetiva análise das contas de campanha pela Justiça Eleitoral, caracterizam-se os recursos recebidos e utilizados pelo partido político como de origem não identificada.

Portanto, merecem as contas partidárias de campanha ser desaprovadas, em face das falhas graves que comprometem sua regularidade, forte no art. 68, inc. III, da Resolução TSE n. 23.463/15.

Em virtude de o total acumulado de receitas e de gastos do partido corresponder a 100% dos recursos de origem não identificada, restam inaplicáveis os preceitos de razoabilidade e de proporcionalidade, devendo ser mantida a sanção de perda do direito ao recebimento de quotas do Fundo Partidário por doze meses, consoante o art. 68, §§ 3º e 5º, da resolução multicitada.

Quanto ao pedido subsidiário do recorrente, de que seja anulada a determinação de recolhimento ao Tesouro Nacional do valor glosado, R$ 14.300,00, melhor sorte não o assiste.

Os recursos movimentados pela agremiação, em sua integralidade, caracterizam-se como de origem não identificada, devendo os mesmos ser recolhidos ao Tesouro Nacional, nos termos do disposto no art. 26 da Resolução TSE n. 23.463/15. Este é o consectário inexorável da utilização de recursos de origem não identificada.

Ante o exposto, VOTO pelo desprovimento do recurso, mantendo a sentença de piso na sua integralidade.