RE - 15742 - Sessão: 17/08/2018 às 17:00

RELATÓRIO

Trata-se de recurso interposto por JOSÉ JUCELINO FRANCO e JÉSSICA NORONHA MANARA, concorrentes aos cargos de Prefeito e Vice-Prefeito de Nova Esperança do Sul, em face da sentença do Juízo da 26ª Zona Eleitoral que desaprovou as contas dos recorrentes relativas às eleições municipais de 2016 e determinou o recolhimento da quantia de R$ 1.500,00 ao Tesouro Nacional, em razão da identificação das seguintes irregularidades: a) abertura intempestiva da conta bancária de campanha; b) recebimento de recurso, no montante de R$ 1.500,00, proveniente de origem não identificada; e c) inconsistências nas sobras de campanha (fls. 68-69).

Em suas razões, os recorrentes afirmam ter justificado o atraso na abertura da conta de campanha e alegam que a falha não enseja a desaprovação das contas, por não acarretar prejuízo à transparência da movimentação financeira. Sustentam o equívoco do entendimento acerca das sobras de campanha, devendo ser considerado como recurso dessa natureza apenas o valor de R$ 26,60, que foi devidamente transferido à conta da direção partidária. Informam que a quantia de R$ 1.500,00 foi restituída ao doador, conforme o art. 18, § 3º, da Resolução TSE n. 23.463/15, porquanto não foi utilizada na campanha. Asseveram que a origem do recurso pode ser verificada por meio dos comprovantes apresentados com o apelo. Argumentam que a punição é desproporcional e malfere o princípio da razoabilidade. Ao final, requerem a reforma da sentença, para o fim de aprovar as contas, ainda que com ressalvas (fls. 71-76).

O Ministério Público Eleitoral apresentou contrarrazões no sentido de manter a sentença que desaprovou as contas (fls. 79-81v.).

Com vista dos autos, a Procuradoria Regional Eleitoral manifestou-se pelo desprovimento do recurso (fls. 85-88v.).

É o relatório.

VOTO

Senhor Presidente,

Eminentes colegas:

O recurso é tempestivo e preenche os demais requisitos de admissibilidade, razão pela qual dele conheço.

No mérito, as contas foram desaprovadas em decorrência da identificação das seguintes irregularidades: a) abertura intempestiva da conta bancária de campanha; b) recebimento de recurso, no montante de R$ 1.500,00, proveniente de origem não identificada; e c) inconsistências nas sobras de campanha.

A respeito do prazo para a abertura da conta bancária, o art. 7º, § 1º, da Resolução TSE n. 23.463/15, dispõe:

Art. 7º É obrigatória para os partidos políticos e os candidatos a abertura de conta bancária específica, na Caixa Econômica Federal, no Banco do Brasil ou em outra instituição financeira com carteira comercial reconhecida pelo Banco Central do Brasil.

§ 1º A conta bancária deve ser aberta em agências bancárias ou postos de atendimento bancário:

a) pelo candidato, no prazo de dez dias contados da concessão do CNPJ pela Secretaria da Receita Federal do Brasil;

b) pelos partidos políticos, até 15 de agosto de 2016, caso ainda não tenha sido aberta a conta de que trata o inciso III do art. 3º desta resolução. (Grifei.)

A determinação de abertura da conta de campanha no prazo regulamentar visa garantir que toda a movimentação de recursos financeiros na campanha seja realizada por meio da conta bancária, a fim de permitir a atuação fiscalizatória da Justiça Eleitoral no que se refere à origem dos recursos arrecadados e à adequação das despesas realizadas.

Assim, a formalidade se reveste de natureza instrumental, tratando-se de providência imprescindível para assegurar a transparência da contabilidade.

Por isso, o entendimento jurisprudencial é no sentido de reputar grave o não cumprimento da determinação normativa, especialmente quando o atraso na abertura exceder em muito o prazo conferido pela norma eleitoral.

E nesse sentido é o precedente colacionado pelo ilustre Procurador Regional Eleitoral em seu parecer:

Eleições 2012. Recurso Eleitoral. Prestação de Contas de candidato. Vereador.

A abertura de conta bancária após o prazo de dez dias, de acordo com o art. 12, § 1º, da Res. TSE n. 23.376/12, e a realização de despesas após a data da eleição, em afronta ao art. 29 da citada resolução, comprometem a transparência e a confiabilidade das contas, ensejando sua desaprovação.

Negaram provimento ao recurso.

(Recurso Eleitoral n. 36217, Acórdão de 12.08.2014, Relator  DES. LUIZ FELIPE BRASIL SANTOS, Publicação: DEJERS – Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Tomo 142, Data 14.08.2014, Página 2.) (Grifei.)

Ocorre que, na situação dos autos, não se verifica qualquer prejuízo em decorrência da falha constatada.

O apontamento realizado pela unidade técnica refere-se à conta destinada à movimentação de recursos provenientes do Fundo Partidário, e não à relativa às receitas procedentes de outros recursos, objeto de incidência da norma em destaque.

Logo, considerando as peculiaridades atinentes ao recebimento de valores do Fundo Partidário, é razoável que a abertura da conta específica seja realizada apenas no caso do repasse de verbas da referida natureza, sem que se configure qualquer transgressão ao prazo de dez dias referido no dispositivo.

Dessarte, deve ser afastada a irregularidade.

Na sequência, a respeito do recebimento de recursos por meio de doações por pessoas físicas, o art. 18 da Resolução TSE n. 23.463/2015 dispõe:

Art. 18. As pessoas físicas somente poderão fazer doações, inclusive pela Internet, por meio de:

I - transação bancária na qual o CPF do doador seja obrigatoriamente identificado;

II - doação ou cessão temporária de bens e/ou serviços estimáveis em dinheiro, com a demonstração de que o doador é proprietário do bem ou é o responsável direto pela prestação de serviços.

§ 1º As doações financeiras de valor igual ou superior a R$ 1.064,10 (mil e sessenta e quatro reais e dez centavos) só poderão ser realizadas mediante transferência eletrônica entre as contas bancárias do doador e do beneficiário da doação.

§ 2º O disposto no § 1º aplica-se na hipótese de doações sucessivas realizadas por um mesmo doador em um mesmo dia.

§ 3º As doações financeiras recebidas em desacordo com este artigo não podem ser utilizadas e devem, na hipótese de identificação do doador, ser a ele restituídas ou, na impossibilidade, recolhidas ao Tesouro Nacional, na forma prevista no caput do art. 26. (Grifei.)

Infere-se que a referida norma estabelece que as “doações financeiras de valor igual ou superior a R$ 1.064,10 só poderão ser realizadas mediante transferência eletrônica entre as contas bancárias do doador e do beneficiário da doação” (art. 18, § 1º).

No caso sob exame, verifica-se que o valor de R$ 1.500,00 não obedeceu à legislação vigente, uma vez que o repasse da quantia não ocorreu por meio de transferência eletrônica, mas sim por depósito em espécie.

Todavia, analisando o extrato bancário na fl. 9 e a cópia da cártula na fl. 16, observo que os prestadores cumpriram a determinação contida no § 3º do dispositivo transcrito, porquanto o valor irregularmente arrecadado foi restituído ao respectivo doador antes da utilização na campanha.

Ademais, ressalta-se que os recorrentes, a fim de demonstrar a verossimilhança de suas alegações, juntaram o comprovante de depósito da quantia por ocasião da interposição do recurso (fl. 77), o que evidencia a origem do recurso e a ausência de consequências nocivas à lisura das contas em decorrência da falha cometida.

Por isso, a decisão deve ser reformada em relação ao enquadramento do recurso como procedente de origem não identificada, afastando-se, por conseguinte, a determinação de recolhimento ao Tesouro Nacional.

Por fim, a respeito da derradeira falha identificada, a sentença considerou irregular a transferência de valores realizada a título de sobras de campanha.

O art. 46 da Resolução TSE n. 23.463/2015, ao dispor acerca das sobras de campanha, estabelece:

Art. 46. Constituem sobras de campanha:

I - a diferença positiva entre os recursos arrecadados e os gastos realizados em campanha;

II - os bens e materiais permanentes adquiridos ou recebidos durante a campanha até a data da entrega das prestações de contas de campanha.

§ 1º As sobras de campanhas eleitorais devem ser transferidas ao órgão partidário, na circunscrição do pleito, conforme a origem dos recursos, até a data prevista para a apresentação das contas à Justiça Eleitoral.

§ 2º O comprovante de transferência das sobras de campanha deve ser juntado à prestação de contas do responsável pelo recolhimento, sem prejuízo dos respectivos lançamentos na contabilidade do partido.

§ 3º As sobras financeiras de recursos oriundos do Fundo Partidário devem ser transferidas para a conta bancária do partido político destinada à movimentação de recursos dessa natureza.

§ 4º As sobras financeiras de origem diversa da prevista no § 2° devem ser depositadas na conta bancária do partido destinada à movimentação de “Outros Recursos”, prevista na resolução que trata das prestações de contas anuais dos partidos políticos. (Grifei.)

Conforme se extrai do regramento normativo, na eventual ocorrência de sobras de campanha, deve a respectiva quantia ser transferida para a conta bancária do órgão partidário, na circunscrição do pleito, de acordo com a natureza do recurso remanescente.

Na situação em análise, considerando que foi afastado o enquadramento do montante de R$ 1.500,00 como sendo recurso de origem não identificada, não há como reputar tal quantia como sobras de campanha.

Assim, remanescendo a título de sobras apenas o valor de R$ 26,60, devidamente transferido para a conta bancária da agremiação municipal (fl. 08), não se verifica irregularidade no repasse e na contabilização dos recursos desta natureza.

Afasto o apontamento.

Portanto, concluo no sentido de que as contas são regulares, sendo que a única falha remanescente, relativa à não observância da disposição contida no art. 18, §1º, da Resolução TSE n. 23.463/2015, relevou-se incapaz de malferir a lisura e a transparência que devem revestir o exame da contabilidade, ensejando apenas a anotação de uma ressalva na escrituração.

Ante o exposto, VOTO provimento parcial do recurso, para aprovar com ressalvas as contas e afastar a determinação de recolhimento da quantia de R$ 1.500,00 ao Tesouro Nacional.

É como voto, senhor Presidente.