RE - 1649 - Sessão: 27/09/2018 às 16:00

RELATÓRIO

Trata-se de recurso interposto pelo DIRETÓRIO MUNICIPAL DO PARTIDO DO MOVIMENTO DEMOCRÁTICO BRASILEIRO (PMDB) de  TUPANCI DO SUL em face da sentença (fls. 83-86) que desaprovou suas contas relativas ao exercício financeiro de 2016 e determinou o recolhimento do valor de R$ 7.902,00 ao Tesouro Nacional, além da suspensão do repasse de novas quotas do Fundo Partidário, nos termos do art. 47, inc. II, da Resolução TSE n. 23.464/15.

Em suas razões (fls. 90-91), a agremiação sustenta que o julgamento se deu em bases que não guardam conformidade com o conteúdo dos autos. Assevera que, embora não tenha ocorrido a manutenção de conta bancária durante todo o período, é possível a análise da contabilidade, considerando que todos os recursos arrecadados transitaram pela conta do Partido. Aduz que, por um erro administrativo, a conta anterior restou fechada, porém foi aberta nova conta, havendo correspondência entre o saldo existente naquela e nesta. Alega que os recursos lançados têm origem na conta anterior, afastando o apontamento de que seriam de origem não identificada. Postula, ao final, a reforma da sentença com a aprovação das contas, ou alternativamente, pela aprovação com ressalvas  sem imposição de devolução dos valores ao Tesouro Nacional.

Com vista dos autos, a Procuradoria Regional Eleitoral opinou, preliminarmente, pela anulação da sentença em virtude da não aplicação da multa de 20% prevista no art. 37 da Lei n. 9.096/95, além da suspensão prevista no inc. I do art. 47 da Resolução TSE n. 23.464/15; e pela desconstituição da sentença, a fim de que seja cumprido o disposto nos arts. 38 e 65, § 1º, da Resolução TSE n. 23.464/15. No mérito, manifestou-se pelo desprovimento do recurso (fls. 99-111).

É o breve relatório.

 

VOTO

Senhor Presidente,

Eminentes colegas:

1. Tempestividade

A sentença foi publicada no DEJERS em 23.4.2018 (fl. 87v.), tendo sido interposto o recurso no dia 25.4.2018 (fl. 89), dentro do tríduo legal.

Por conseguinte, interposto o recurso no prazo legal, dele conheço.

2. Preliminares

2.1. Da nulidade da sentença por ausência de citação dos responsáveis pelo partido

A questão inicial é a preliminar de nulidade do feito, arguida pelo d. Procurador Regional Eleitoral, por falta de inclusão dos responsáveis partidários no feito.

Após alguns debates, esta Corte tem se posicionado pelo acolhimento da referida prefacial, alinhando-se aos julgados do e. Tribunal Superior Eleitoral.

Isso porque o TSE tem decidido pelo provimento do apelo, determinando o retorno dos autos à Zona Eleitoral de origem para a inclusão e citação dos responsáveis partidários nos processos de contas de diretórios municipais:

A partir da minirreforma eleitoral, a prestação de contas dos partidos passou a ter caráter jurisdicional, não havendo, à época, grandes alterações quanto ao procedimento adotado por esta Corte nas respectivas ações.

A inovação ocorreu em 2014 quando esta Corte editou a Res.-TSE nº 23.432, de 16 de dezembro de 2014, culminando, em 2015, com a edição da Res.-TSE nº 23.464, de 17 de dezembro de 2015, na qual ora se discute a obrigatoriedade da citação do responsável partidário para integrar os feitos de prestação de contas.

Tal análise deve-se, principalmente, em face do idêntico dispositivo transitório contido nos atos regulamentares que preconiza que "as disposições processuais previstas nesta resolução [Res.-TSE nº 23.432 e Res.-TSE nº 23.464] devem ser aplicadas aos processos de prestação de contas relativos aos exercícios de 2009 e seguintes que ainda não tenham sido julgados"(2) - grifei.

Desse modo, vê-se que a citação dos responsáveis partidários é regra eminentemente processual cuja função é de convocar o sujeito a juízo(3), bem como cientificar o teor da demanda, razão pela qual sua aplicação é imediata.

Denota-se que, a partir das aludidas resoluções e da alteração legislativa advinda com a Lei nº 13.165/2015, a regra processual estabelecida para os processos de prestação de contas é a da obrigatoriedade da citação dos dirigentes da grei partidária, inclusive para fins de eventual responsabilização, na esteira do art. 34, I(4), c. c. o art. 37, § 13(5), ambos da Lei nº 9.096/95.

Nesse sentido estão as decisões monocráticas prolatadas no AI nº 115-08/RS, no REspe nº 89-10/RS e, conforme ementa a seguir, no REspe n° 112-53/RS, de relatoria do Min. Herman Benjamin:

RECURSO ESPECIAL. PARTIDO POLÍTICO. CONTAS DE EXERCÍCIO FINANCEIRO DE 2014. INCLUSÃO DE DIRIGENTE PARTIDÁRIO. ART. 31 DA RES.-TSE 23.464/2015. MATÉRIA PROCESSUAL. APLICABILIDADE IMEDIATA. PROVIMENTO.

1. O pronunciamento jurisdicional que exclui da lide os responsáveis pela administração financeira do partido põe fim ao vínculo processual no que toca a esses sujeitos, de modo que seu conteúdo possui caráter de sentença, recorrível, portanto, desde logo.

2. A regra prevista no art. 31 da Res.-TSE 23.464/2015 - exigência de citação de dirigentes partidários - possui natureza formal e aplica-se a processos de contas relativos aos exercícios de 2009 e seguintes que ainda não tenham sido julgados, a teor do art. 65, § 1º.

3. Recurso especial provido para determinar inclusão dos dirigentes partidários no feito".

(REspe nº 112-53/RS. Rel. Min. Herman Benjamin. DJe de 15.9.2016 - grifei).

Nesse contexto, diante da previsão expressa da responsabilidade do dirigente da agremiação, deve-se observar o direito ao exercício da ampla defesa e do contraditório, o que se alcança com a sua integração ao polo passivo da demanda, nos termos da previsão expressa do art. 38 das citadas resoluções.

Advirto, oportunamente, que o ingresso dos responsáveis do partido nas respectivas ações de prestações de contas não desnatura a sua natureza contábil, sendo relevante para fins de preservação das garantias constitucionais de eventuais responsáveis, desde o início da atividade cognitiva desta Justiça Eleitoral.

Diante do exposto, dou provimento ao recurso especial, com base no art. 36, § 7º, do Regimento Interno do Tribunal Superior Eleitoral, a fim de determinar o retorno dos autos ao Tribunal de origem para a inclusão dos responsáveis pelo PMDB- Municipal nos presentes autos.

(RESPE - Recurso Especial Eleitoral n. 346, Decisão monocrática de 27.3.2017, Relatora: Min. Luciana Christina Guimarães Lóssio, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico - 07.4.2017 - Página 63-66)

A partir disso, esta Corte Regional tem se adequado ao entendimento jurisprudencial firmado, com o consequente acolhimento da prefacial e a anulação da sentença, para o fim de serem citados os responsáveis partidários - Presidente e Tesoureiro que integravam a direção da agremiação ao tempo do exercício -, conforme os termos do art. 38 da Resolução TSE n. 23.464/15, preservando-se os demais atos praticados no curso do processo:

Recurso. Prestação de contas anual. Partido político. Preliminar. Citação. Dirigentes partidários. Art. 38 da Resolução TSE n. 23.464/15. Exercício financeiro de 2014.

Preliminar de citação dos dirigentes partidários. Acolhimento. Jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral no sentido de que as novas disposições contidas na Resolução TSE n. 23.464/15, referentes à inclusão dos dirigentes das agremiações nas prestações de contas de exercícios financeiros são normas instrumentais, aplicáveis aos processos ainda não julgados. Adequação ao entendimento jurisprudencial firmado pela Corte Superior.

Anulação do feito desde a citação do partido. Retorno dos autos ao juízo de origem.

(RE n. 21-42. Relator Dr. Sílvio Ronaldo Santos de Moraes. Julgado em 25.5.2017. Por maioria)

Dessa forma, acolho a matéria preliminar para anular a sentença e determinar a citação dos responsáveis partidários, Presidente e Tesoureiro que integravam a direção da grei ao tempo do exercício, nos termos do art. 38 da Resolução TSE n. 23.464/15, preservando-se os demais atos praticados no curso do processo e restando prejudicada a análise da questão de mérito da demanda.

 

2.2. Da nulidade da sentença por omissão de aplicação da pena de multa de até 20%

Em relação a esta outra preliminar, a sentença também deve ser anulada, por omissão em aplicar e fundamentar a pena de multa de até 20% sobre a importância irregular, nos termos do disposto no art. 37, caput, da Lei n. 9.096/95.

De fato, até o advento da Lei n. 13.165/15, o art. 37, § 3º, da Lei n. 9.096/95, estabelecia a penalidade de suspensão do repasse de novas quotas do Fundo Partidário pelo período de 1 a 12 meses:

Art. 37. A falta de prestação de contas ou sua desaprovação total ou parcial implica a suspensão de novas cotas do Fundo Partidário e sujeita os responsáveis às penas da lei.

§ 3o A sanção de suspensão do repasse de novas quotas do Fundo Partidário, por desaprovação total ou parcial da prestação de contas de partido, deverá ser aplicada de forma proporcional e razoável, pelo período de 1 (um) mês a 12 (doze) meses, ou por meio do desconto, do valor a ser repassado, da importância apontada como irregular, não podendo ser aplicada a sanção de suspensão, caso a prestação de contas não seja julgada, pelo juízo ou tribunal competente, após 5 (cinco) anos de sua apresentação.

A Lei n. 13.165/15 modificou a sanção legal incidente na desaprovação das contas, passando a cominar a pena de devolução da importância considerada irregular acrescida de até 20%:

Art. 37. A desaprovação das contas do partido implicará exclusivamente a sanção de devolução da importância apontada como irregular, acrescida de multa de até 20% (vinte por cento).

A jurisprudência definiu que essa nova sanção deverá ser aplicada nas prestações de contas relativas ao exercício financeiro de 2016, conforme definiu o egrégio Tribunal Superior Eleitoral:

SEGUNDOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. PRESTAÇÃO DE CONTAS DE DIRETÓRIO NACIONAL. EXERCÍCIO FINANCEIRO DE 2009. DESAPROVADA PARCIALMENTE. AUSÊNCIA DE VÍCIOS. REJEIÇÃO DOS EMBARGOS.

1. QUESTÃO DE ORDEM. As alterações promovidas no caput do art. 37 da Lei nº 9096/1995, reproduzidas no art. 49 da Res.-TSE nº 23.464/2015, são regras de direito material e, portanto, aplicam-se às prestações de contas relativas aos exercícios de 2016 e seguintes. Entendimento contrário permitiria que contas das agremiações partidárias relativas a um mesmo exercício financeiro fossem analisadas com base em regras materiais diversas, o que não se pode admitir. É preciso conferir tratamento isonômico a todos os partidos políticos, sem alterar as regras aplicáveis a exercícios financeiros já encerrados, em razão do princípio da segurança jurídica. O Plenário do TSE, analisando a questão relativa à alteração legislativa promovida pela mesma lei ora em análise na Lei das Eleições quanto ao registro do doador originário nas doações, assentou que "a regra constante da parte final do § 12 do art. 28 da Lei nº 9.504/97, com a redação conferida pela Lei nº 13.165/2015, não pode ser aplicada, [...] seja porque a lei, em regra, tem eficácia prospectiva, não alcançando fatos já consumados e praticados sob a égide da lei pretérita" (ED-REspe nº 2481-87/GO, rel. Min. Henrique Neves da Silva, julgado em 1º.12.2015). A modalidade de sanção em decorrência da desaprovação de contas prevista na nova redação do caput do art. 37 da Lei nº 9.096/1995, conferida pela Lei nº 13.165/2015, somente deve ser aplicada às prestações de contas relativas ao exercício de 2016 e seguintes.

[...]

5. Embargos de declaração rejeitados.

(TSE, Prestação de Contas n. 96183, Acórdão, Relator Min. Gilmar Ferreira Mendes, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Volume , Tomo 54, Data 18.3.2016, Página 60/61.) (Grifei.)

Assim, considerando que a aplicação da multa de até 20% é decorrência lógica da desaprovação das contas, deve ser anulada a sentença recorrida, por ausência da observância dos seus consectários legais.

E nesse sentido é o entendimento deste Tribunal, consolidado no recente acórdão de relatoria do Des. Eleitoral Miguel Antônio Silveira Ramos, no RE n. 105-34.2017.6.21.0148, julgado na Sessão de 16.7.2018, cuja ementa a seguir transcrevo com grifos meus:

RECURSO. PRESTAÇÃO DE CONTAS. PARTIDO POLÍTICO. EXERCÍCIO FINANCEIRO DE 2016. SUSPENSÃO DO FUNDO PARTIDÁRIO. PRELIMINAR SUSCITADA PELA PROCURADORIA REGIONAL ELEITORAL. SENTENÇA OMISSA. AUSENTE A DETERMINAÇÃO DA APLICAÇÃO DE MULTA DE ATÉ 20% SOBRE O VALOR IRREGULAR. ART. 37 DA LEI N. 13.165/15. RETORNO DOS AUTOS À ORIGEM. NULIDADE.

Preliminar de nulidade da sentença. A decisão de primeiro grau desaprovou as contas do partido referentes à movimentação financeira do exercício de 2016, determinando o recolhimento ao Tesouro Nacional e a suspensão das quotas do Fundo Partidário após a vigência da Lei n. 13.165/15, que passou a cominar a sanção de devolução dos valores considerados irregulares acrescidos de multa de até 20%. Regramento a ser aplicado nas prestações de contas relativas ao exercício financeiro de 2016.

Nulidade da sentença por omissão em aplicar os consectários legais decorrentes da sua conclusão. Restituição ao juízo de origem.

Registro, por fim, não ser possível aplicar o entendimento de que a questão está madura para julgamento, determinando a aplicação da multa, de ofício, pelo Tribunal, com fundamento na disposição contida no art. 1.013, § 3º, inc. III, do Código de Processo Civil, em razão da supressão de instância no tocante à dosimetria da penalidade, em violação ao princípio do duplo grau de jurisdição.

Dessa forma, acolho a matéria preliminar por omissão de aplicação da pena de multa de até 20%, impondo o reconhecimento da nulidade da sentença, devendo os autos retornarem ao juízo de origem para que nova decisão seja proferida em seu lugar, com a observância das disposições legais vigentes após a edição da Lei n. 13.165/15 e aplicáveis ao exercício financeiro de 2016, em conformidade com a Resolução TSE n. 23.464/15.

ANTE O EXPOSTO, acolhidas as preliminares, VOTO por anular a sentença, determinando o retorno dos autos à origem, nos termos da fundamentação.

É como voto, senhor Presidente.