REl - 0600882-18.2024.6.21.0085 - Voto Relator(a) - Sessão: 02/06/2025 00:00 a 03/06/2025 23:59

VOTO

ADMISSIBILIDADE

O recurso é tempestivo, pois interposto em 04.12.2024, sendo a intimação da sentença publicada no Mural Eletrônico da Justiça Eleitoral em 02.12.2024.

Outrossim, encontram-se presentes os demais pressupostos recursais ínsitos à tramitação processual.

Destarte, conheço do recurso.

Passo ao mérito.

 

MÉRITO

Verifica-se, da análise dos autos, que o recorrente extrapolou o limite de autofinanciamento permitido por lei, utilizando recursos próprios no valor de R$ 2.916,00.

Neste sentido, destaca a sentença a quo que “a Portaria TSE n. 593/24 trouxe que o limite de gastos para o município de Arroio do Sal nas Eleições Municipais de 2024 seria de R$ 15.985,08 para o cargo de vereador, sendo que o limite de autofinanciamento é 10% dos limites previstos para gastar na campanha, ou seja, R$ 1.598,51, nos termos do art. 27, § 1°, da Resolução TSE n. 23.607/19”.

O excedente apontado foi de R$ 1.317,49.

No caso em tela, não se verifica no demonstrativo de receitas e despesas do recorrente (ID 45837099) gastos com consultoria, assessoria e pagamento de honorários realizadas em decorrência da prestação de serviços advocatícios e de contabilidade, que são considerados gastos eleitorais, mas excluídos do limite de gastos de campanha, por força da Lei n. 9.504/97, art. 26, § 4º. Portanto, não há como afastar a irregularidade apontada na sentença.

Com relação ao quantum da multa arbitrada, cabe destacar que a regra limitadora ao autofinanciamento tem aplicação de caráter objetivo, e sua infringência provoca a aplicação de multa, nos termos da Resolução TSE n. 23.607/19, cujo art. 27, § 4º, é expresso ao prever a aplicação de multa no valor de até 100% da quantia excedente e, nos casos mais graves, a eventual caracterização de abuso de poder econômico, conforme passo a reproduzir:

Art. 27. As doações realizadas por pessoas físicas são limitadas a 10% (dez por cento) dos rendimentos brutos auferidos pela doadora ou pelo doador no ano-calendário anterior à eleição (Lei nº 9.504/1997, art. 23, § 1º).

§ 1º A candidata ou o candidato poderá usar recursos próprios em sua campanha até o total de 10% (dez por cento) dos limites previstos para gastos de campanha no cargo em que concorrer (Lei nº 9.504/1997, art. 23, § 2º-A).

[...]

§ 4º A doação acima dos limites fixados neste artigo sujeita a infratora ou o infrator ao pagamento de multa no valor de até 100% (cem por cento) da quantia em excesso, sem prejuízo de a candidata ou o candidato responder por abuso do poder econômico, nos termos do art.22 da Lei Complementar nº 64/1990 (Lei nº 9.504/1997, art. 23, § 3º).

Por outro lado, matematicamente, o excesso de R$ 1.317,49 representa um distanciamento de 82% do limite de gastos com recursos próprios para o cargo de vereador (R$ 1.598,51).

Assim, não parece razoável fixar o patamar máximo de sancionamento de multa de 100% da quantia em excesso, considerando que a infração praticada é de 82%. De acordo com precedentes deste Tribunal, entendo que o percentual da multa deve ter proporcionalidade com base na infração real de 82% sobre o montante excedido pelo candidato ao limite permitido.

Nesse sentido, o percentual de 82% relativamente ao excesso de gastos de R$ 1.137,49 sobre o limite de R$ 1.598,51 resulta em multa no valor de R$ 1.080,34; e afigura-se um critério objetivo, adequado e suficiente para reprovação e prevenção da infração ao teto legal do autofinanciamento em disputas eletivas.

Tal posicionamento, como citado, encontra guarida em julgados anteriores deste Tribunal. Destaco aqui o julgado de relatoria da Excelentíssima Desembargador Eleitoral Patrícia da Silveira Oliveira:

PRESTAÇÃO DE CONTAS. ELEIÇÕES 2022. CANDIDATO. DEPUTADO ESTADUAL. CRÉDITO DE RECURSOS PRÓPRIOS DO CANDIDATO NA CONTA DESTINADA À MOVIMENTAÇÃO FINANCEIRA DE VALORES DO FUNDO ESPECIAL DE FINANCIAMENTO DE CAMPANHA – FEFC. EXCESSO DO LIMITE PARA AUTOFINANCIAMENTO. BAIXO PERCENTUAL DAS IRREGULARIDADES. APLICADOS OS PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E DA PROPORCIONALIDADE. MULTA A SER RECOLHIDA AO FUNDO PARTIDÁRIO. APROVAÇÃO COM RESSALVAS. 1. Prestação de contas apresentada por candidato a deputado estadual, referente à arrecadação e ao dispêndio de recursos de campanha nas Eleições Gerais de 2022. 2. Crédito de recursos próprios do candidato na conta destinada à movimentação financeira de valores do FEFC. O apontamento técnico identifica a origem do recurso como sendo do próprio candidato, distinguindo claramente os recursos públicos daqueles eminentemente privados pela conta bancária em questão, demonstrando que o equívoco se trata de mera falha formal. Consoante precedente desta Corte, quando há trânsito de valores privados em contas bancárias destinadas à movimentação de verbas públicas, mas está identificada a origem do recurso com segurança, preserva–se a confiabilidade e a transparência dos registros contábeis, sem necessidade de recolhimento do valor ao Tesouro Nacional. Reconhecida a irregularidade em questão, a ser considerada para o julgamento de aprovação ou rejeição das contas, mas sem determinar o recolhimento ao Tesouro Nacional. 3. Excesso do limite para autofinanciamento. O candidato extrapolou o limite para autofinanciamento em 18,9%. Consequentemente, sujeitou–se ao arbitramento de multa em até 100% do valor excedente, conforme art. 27, §§ 1º e 4º, da Resolução TSE n. 23.607/19. Embora o candidato apresente justificativa para a doação excedente com recursos próprios, a regra limitadora tem caráter objetivo definido em lei, correspondendo a 10% do limite total de gastos para o cargo em disputa, na forma do art. 27, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19. Alinhado com os princípios de razoabilidade e proporcionalidade, aplicada a multa de forma proporcional ao percentual da infração de 18,9% sobre o excesso do limite de autofinanciamento. 4. As irregularidades representam 6,58% das receitas declaradas na campanha e enquadram–se no parâmetro (inferior a 10% da arrecadação financeira) fixado, na jurisprudência desta Justiça Especializada, de aplicação dos princípios de razoabilidade e de proporcionalidade para aprovar com ressalvas as contas, na forma do art. 74, inc. II, da Resolução TSE n. 23.607/19. 5. Aprovação com ressalvas. Aplicada multa, a ser recolhida ao Fundo Partidário. (TRE-RS - PCE: 06032599120226210000 PORTO ALEGRE - RS 060325991, Relator.: Patrícia Da Silveira Oliveira, Data de Julgamento: 06/09/2024, Data de Publicação: DJE-201, data 10/09/2024)

Ainda, em linha com o apurado no parecer da eminente Procuradora Regional Auxiliar, a irregularidade, consubstanciada na nova quantia de R$ 1.080,34, corresponde a 26,58% do total arrecadado pelo candidato (R$ 4.065,21), o que ultrapassa os limites jurisprudenciais de inexpressividade; sendo a multa aplicada de caráter objetivo e o seu recolhimento prévio não afasta a irregularidade na prestação de contas.

Com efeito, a jurisprudência do TRE-RS também considera inexpressivas as irregularidades que não ultrapassam R$ 1.064,10 em valores absolutos ou 10% do total arrecadado, conforme se verifica no aresto que, a título ilustrativo, integro a este Voto:

RECURSO. ELEIÇÕES 2020. PRESTAÇÃO DE CONTAS. PARTIDO POLÍTICO. DESAPROVAÇÃO. IRREGULARIDADE NO USO DE VERBAS DO FUNDO ESPECIAL DE FINANCIAMENTO DE CAMPANHA – FEFC. PRELIMINARES REJEITADAS. NULIDADE DA SENTENÇA POR CERCEAMENTO DE DEFESA E INOBSERVÂNCIA DO DEVIDO PROCESSO LEGAL. MÉRITO. AUSÊNCIA DE ADEQUADA COMPROVAÇÃO DE GASTOS REALIZADOS COM VERBAS DO FEFC. BAIXO PERCENTUAL. APLICADOS OS PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E DA PROPORCIONALIDADE. MANTIDO DEVER DE RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. APROVAÇÃO COM RESSALVAS. PROVIMENTO. 1. Insurgência contra sentença que desaprovou prestação de contas de partido político, referente às eleições municipais de 2020, e determinou o recolhimento de quantia irregular ao Tesouro Nacional. 2. Preliminar. Nulidade da sentença por cerceamento de defesa e inobservância do devido processo legal. Cumpridos os ritos estabelecidos na norma de regência. Rejeitadas as preliminares arguidas. 3. Ausência de adequada comprovação de gastos realizados com recursos públicos, oriundos do FEFC. A recorrente limita–se a pugnar pela aprovação das contas com ressalvas, com base nos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, porquanto o total das irregularidades perfaz 6,68% da receita declarada. 4. A jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral, perfilada por esta Corte, é no sentido de que, no julgamento das contas de órgãos partidários e candidatos, quando o percentual das falhas seja inferior a 10% do total da receita arrecadada ou quando se situe em patamar abaixo de R$ 1.064,10, impõe–se a aplicação dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, para que sejam aprovadas com ressalvas. 5. Mantido o dever de recolhimento da quantia irregular ao Tesouro Nacional. No ponto, a agremiação não formulou qualquer esclarecimento ou impugnação específica, inviabilizando a revisão dos fundamentos não atacados no recurso, tendo em vista o princípio do tantum devolutum quantum apellatum e os termos do art. 932, inc. III, do CPC e da Súmula n. 26 do TSE. 6. Provimento. Aprovação com ressalvas. Recolhimento ao Tesouro Nacional. (TRE-RS - REl: 06009307420206210001 PORTO ALEGRE - RS, Relator.: Des. CAETANO CUERVO LO PUMO, Data de Julgamento: 30/01/2023, Data de Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Tomo 23, Data 09/02/2023)

Portanto, no caso em apreço, o montante irregular ultrapassa os limites de inexpressividade, tanto em termos absolutos quanto em termos relativos, não se podendo trazer para o presente processo as exceções admitidas pela jurisprudência em eventual aprovação das contas com ressalvas.

Por outro lado, ainda que o recorrente tenha recolhido a multa imposta, tal pagamento não tem o condão de afastar a gravidade da irregularidade nem regulariza a prestação de contas.

De acordo com a jurisprudência deste TRE-RS, a quitação de multas não é suficiente para sanar as irregularidades detectadas nas prestações de contas, tal qual se pode vislumbrar no seguinte precedente que abaixo colaciono:

RECURSO. ELEIÇÕES 2020. PRESTAÇÃO DE CONTAS. CANDIDATO. VEREADOR. DESAPROVAÇÃO. RECURSOS DE ORIGEM NÃO IDENTIFICADA. DESCUMPRIDA A NORMA DE REGÊNCIA. MANUTENÇÃO DA SENTENÇA. CUMPRIDA A DETERMINAÇÃO DE RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. DESPROVIMENTO. 1. Insurgência contra sentença que desaprovou prestação de contas relativa às eleições municipais de 2020 para o cargo de vereador, nas quais o candidato alcançou a vaga de suplente, em virtude da utilização de recursos de origem não identificada pelo pagamento de despesa não escriturada na contabilidade, e do não pagamento de despesa com combustível. Determinado o recolhimento ao Tesouro Nacional. 2. Recursos de origem não identificada relativos ao pagamento de despesas não escrituradas nas contas, verificadas a partir das notas fiscais não contabilizadas e emitidas contra o CNPJ do candidato, referentes a gastos com publicidade e com combustível. Contrariedade à determinação do art. 59 da Resolução TSE n. 23.607/19, segundo o qual “o cancelamento de documentos fiscais deve observar o disposto na legislação tributária, sob pena de ser considerado irregular” . Omissão da despesa. Não comprovada a origem dos valores utilizados para o pagamento, que se caracteriza como recurso de origem não identificada e se sujeita a recolhimento ao Tesouro Nacional. Existência de dívida de campanha não assumida pelo partido do candidato, consistente em gasto com combustível. 3 . Razões insuficientes a modificar a decisão a quo. Mantida as irregularidades referentes à despesa não declarada e à dívida de campanha, quantia que representa 50,47% do total das receitas financeiras e ultrapassa o valor de parâmetro de R$ 1.064,10 que a Resolução TSE n. 23 .607/19 considera módico. Quitada a dívida, em face do adimplemento espontâneo do recorrente. 4. Desprovimento. Mantida a desaprovação das contas. Cumprida a determinação de recolhimento ao Tesouro Nacional. (TRE-RS - REl: 0600451-36.2020 .6.21.0016 CAXIAS DO SUL - RS 060045136, Relator.: KALIN COGO RODRIGUES, Data de Julgamento: 23/01/2023, Data de Publicação: DJE-13, data 25/01/2023) (Grifei.)

Com as considerações tecidas, mesmo aplicando-se os princípios de razoabilidade e de proporcionalidade para reduzir a multa aplicada a 82% do montante aferido como irregular, alcançando-se o valor de R$ 1.080,34, tal irregularidade mantém a gravosidade passível para o juízo de desaprovação das contas.

Ante o exposto, VOTO por DAR PARCIAL PROVIMENTO ao recurso, apenas para reduzir o valor da multa aplicada a 82% do montante aferido como irregular, alcançando-se o valor de R$ 1.080,34, mantendo-se os demais termos da sentença prolatada pelo Juízo da 085ª Zona Eleitoral.