RE - 1313 - Sessão: 23/04/2019 às 17:00

RELATÓRIO

Cuida-se de recurso oposto pelo PARTIDO DOS TRABALHADORES (PT) de PASSO FUNDO em face da decisão da 128ª Zona Eleitoral (fls. 147-150v.), que desaprovou as contas da agremiação relativas ao exercício de 2016, determinando a suspensão do repasse de quotas do Fundo Partidário pelo prazo de um ano, em razão do recebimento de importâncias oriundas de fontes vedadas, e até o esclarecimento da origem de recursos, bem como o recolhimento de R$ 34.025,22 (trinta e quatro mil, vinte e cinco reais e vinte e dois centavos), com o acréscimo de multa de 10%, pelo período de 10 (dez) meses.

Em suas razões (fls. 154-160), a agremiação afirmou que as contas não trazem nenhuma irregularidade, apenas impropriedades de natureza formal. Defendeu que as falhas apontadas são advindas de diferenças de entendimento acerca de procedimento contábil, alegando não ter recebido recursos de fonte vedada ou origem não identificada. Argumentou que as doações são contribuições espontâneas de filiados ao partido e que estes não são autoridades públicas, sequer de forma equiparada, e que o valor repassado é ínfimo. Em relação aos recursos de origem não identificada, aduziu que o valor de R$ 6.090,00 é oriundo de campanha de arrecadação de fundos para sustentabilidade do partido, que as doações foram feitas em dinheiro pelos filiados indicados em listagem efetivada no parecer técnico. Narrou que a direção partidária realizou dois depósitos por entender inviável a realização de inúmeras operações em valor ínfimo. Acrescentou que, se, à vista dos documentos juntados, ainda persistisse dúvida, seria possível diligenciar a veracidade das informações prestadas junto aos doadores. Quanto aos recursos advindos do diretório nacional, defendeu tratar-se de percentual de doações recebidas por filiados, de forma que a identificação do doador teria sido devidamente realizada pelo recebedor originário dos valores, e protestou pela juntada dos demonstrativos contendo os dados dos doadores, caso necessário. Apontou que todas as despesas foram devidamente identificadas e comprovadas por nota fiscal, tendo utilizado um único cheque para quitar vários pagamentos de valor menor em alguns casos. Referiu que tal procedimento é usual e que o total das despesas equivale ao valor nominal das ordens de pagamento emitidas. Justificou que a ausência de indicação de CPF decorre da efetivação de depósitos por meio de caixa eletrônico e que todos os valores foram devidamente discriminados na contabilidade partidária. Pleiteou a aplicação dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade. Requereu o provimento do recurso para que seja aprovada a prestação de contas do partido e protestou pela produção de provas. Juntou documentos nas fls. 161-166.

O Ministério Público Eleitoral foi intimado da sentença e não se manifestou (fl. 171).

Nesta instância, a Procuradoria Regional Eleitoral opinou pelo desprovimento do recurso (fls. 174-178v.).

Com o substabelecimento, com reservas, dos poderes conferidos pelo partido (fl. 181), e sob o argumento de que a suspensão dos repasses do Fundo Partidário fora fixada até o esclarecimento quanto à origem dos recursos recebidos, o recorrente juntou petição e documentos (fls. 190-511).

Determinada a remessa dos autos ao setor técnico (fl. 513), foi emitido laudo que ratificou as falhas apontadas no exame realizado em primeira instância, à exceção da apuração dos recursos de origem não identificada. Em síntese, a análise técnica especificou o total de R$ 37.494,91 em irregularidades - sendo R$ 120,00 como recursos de fonte vedada, R$ 11.960,00 oriundos de depósitos identificados com o CNPJ da própria agremiação e R$ 25.414,91 identificados com o CNPJ de outras agremiações – e opinou pela manutenção da desaprovação das contas (fls. 520-526).

É o relatório.

VOTO

Senhor Presidente,

Eminentes colegas:

O apelo é tempestivo e atende aos demais pressupostos recursais, motivo pelo qual dele conheço.

A desaprovação das contas foi fundamentada no recebimento de recursos provenientes de fontes vedadas e de origem não identificada, bem como na ausência de comprovação dos gastos realizados pela agremiação.

Inicio por verificar a questão do recebimento de recursos oriundos de fonte vedada.

No ponto, ficou consignado na sentença (fls. 147-150v.) que

foram apontadas doações oriundas de fontes vedadas, pois feitas por Rosicler Terezinha Dalchiavon, ocupante de cargo de chefia, junto à Câmara Municipal de Vereadores de Passo Fundo, no valor de R$ 120,00 (fls. 61/65), cuja vedação vem expressa no artigo 12, inciso IV e parágrafo 1º da Resolução TSE 23.464/2015.

Consta no documento da fl. 91 que a mencionada doadora exerceu o cargo de diretor-geral da Câmara Municipal de Passo Fundo de 01.01.2016 a 11.12.2016.

Cumpre ressaltar que deve ser aplicado à solução do caso concreto o art. 31, inc. II, da Lei n. 9.096/95, em sua redação primitiva, vigente ao tempo dos fatos em análise, a qual vedava o recebimento de doações procedentes de autoridades, sem ressalvas quanto à eventual filiação do doador, dispositivo regulamentado na Resolução TSE n. 23.464/15.

Nesse sentido, a seguinte ementa:

RECURSO. PRESTAÇÃO DE CONTAS ANUAL. PARTIDO POLÍTICO. EXERCÍCIO DE 2015. PRELIMINAR. MANUTENÇÃO DOS DIRIGENTES PARTIDÁRIOS NO POLO PASSIVO. ILEGITIMIDADE NÃO CONFIGURADA. MÉRITO. RECEBIMENTO DE DOAÇÕES DE FONTES VEDADAS. ALTERAÇÃO LEGISLATIVA. PERMITIDA A CONTRIBUIÇÃO DE FILIADOS. INAPLICABILIDADE AO CASO CONCRETO. APLICAÇÃO DA LEGISLAÇÃO VIGENTE À ÉPOCA DOS FATOS. PRINCÍPIO DA SEGURANÇA JURÍDICA. MANUTENÇÃO DO JUÍZO DE IRREGULARIDADE DA DOAÇÃO. REDUÇÃO DO PRAZO DE SUSPENSÃO DO RECEBIMENTO DAS QUOTAS DO FUNDO PARTIDÁRIO. PARCIAL PROVIMENTO.

(...)

3. A Lei n. 13.488/17, publicada em 06.10.17, alterou a redação do art. 31 da Lei n. 9.096/95 - Lei dos Partidos Políticos -, excluindo a vedação de doação de pessoa física que exerça função ou cargo público demissível ad nutum, desde que filiada ao partido beneficiário.

4. Inaplicabilidade ao caso concreto. Incidência da legislação vigente à época dos fatos. Prevalência do princípio da segurança jurídica e da paridade de armas no processo eleitoral, em detrimento da aplicação pontual da retroatividade in bonam partem. Manutenção do juízo de irregularidade das contribuições advindas de cargos demissíveis ad nutum, ainda que os contribuintes sejam filiados à agremiação.

(...)

6. Provimento parcial.

(TRE-RS; Recurso Eleitoral n. 14-97, Relator: Luciano André Losekann, julgado em 04.12.2017, por unanimidade.) (Grifei.)

Fixado que não é possível a aplicação retroativa das disposições da Lei n. 13.488/17, é de ressaltar que, para os fins de análise de regularidade das finanças de partido político, autoridade pública é o agente demissível ad nutum da administração pública direta ou indireta que exerça cargo de chefia ou direção.

Nesse sentido é a jurisprudência consolidada desta Corte:

PRESTAÇÃO DE CONTAS. PARTIDO POLÍTICO. DIRETÓRIO ESTADUAL. EXERCÍCIO FINANCEIRO DE 2014. DIRIGENTES PARTIDÁRIOS. ORIENTAÇÃO JURISPRUDENCIAL. TRIBUNAL SUPERIOR ELEITORAL. FONTE VEDADA. AUTORIDADE. ART. 31, INC. II, DA LEI N. 9.096/95. DESAPROVAÇÃO. RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. SUSPENSÃO DE QUOTAS DO FUNDO PARTIDÁRIO.

Configuram recursos de fontes vedadas as doações a partidos políticos advindas de titulares de cargos demissíveis ad nutum da administração direta ou indireta que tenham a condição de autoridades, vale dizer, que desempenhem função de direção ou chefia. A previsão de fonte vedadas tem por finalidade impedir a influência econômica daqueles que tenham alguma vinculação com órgãos públicos, assim como evitar a manipulação da máquina pública em benefício eleitoreiro. Reconhecidas como fontes vedadas as contribuições provenientes de chefe de gabinete, supervisor, diretor de departamento e coordenador de bancada.

Recolhimento da quantia recebida indevidamente ao Tesouro Nacional. Suficiente a suspensão do recebimento de verbas do Fundo Partidário pelo período de um mês, conforme parâmetros da razoabilidade.

Desaprovação.

(TRE-RS, Recurso Eleitoral n. 82-18, Acórdão de 16.8.2017, Relator Des. Eleitoral Eduardo Augusto Dias Bainy, Publicação: DEJERS – Diário Eletrônico da Justiça Eleitoral do RS, n. 147, Data 18.8.2017, p. 6.) (Grifei.)

Na hipótese, o cargo de diretor-geral da Câmara Municipal enquadra-se no conceito de autoridade para fins de configuração de fonte vedada de arrecadação de recursos.

O prestador de contas argumenta que as doações recebidas são contribuições espontâneas de filiados ao partido e que o valor repassado é ínfimo.

Ocorre que a espontaneidade da doação não tem aptidão para afastar sua irregularidade. A norma é objetiva e determina de maneira clara que é vedado ao partido receber, direta ou indiretamente, sob qualquer forma ou pretexto, contribuição ou auxílio pecuniário ou estimável em dinheiro, inclusive através de publicidade de qualquer espécie, procedente de autoridades.

Qualificado o doador como autoridade, a doação é vedada, pouco importando se o repasse de valores foi espontâneo, decorrente do estatuto partidário ou efetuado por razões de qualquer natureza.

Quanto à tese de modicidade da doação, a verificação acerca da possibilidade da aplicação dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade é realizada considerando o total das irregularidades apuradas, de forma que cumpre examinar o restante da contabilidade antes de elaborar qualquer juízo a esse respeito.

Dessa forma, passo a analisar o trânsito de recursos de origem não identificada na contabilidade da agremiação.

O juízo a quo apontou a existência de depósitos identificados com o CNPJ do próprio prestador, valores que não transitaram pela conta do partido e repasses da direção nacional da sigla sem identificar os doadores originários, verbis:

Com relação as doações de valores de origem não identificada, foram apontados os créditos dos dias 06 e 07 de junho de 2016, nas quantias de R$ 5.420,00, R$ 670,00 e R$ 5.870,00, onde consta o CNPJ do diretório municipal do Partido como doador.

Ainda, verificou-se que as doações que constaram no demonstrativo das fls. 21/23, apesar de identificados os CPFs dos doadores, no valor de R$ 6.090,00 não transitaram pela conta corrente do Partido, o que também configura recursos com origem não identificada, diante do disposto nos artigos 7º, 8º, § 2º e 13, I, "a", da Resolução TSE 23.464/2015 . Outrossim, não foram apresentados os respectivos recibos de tais doações, em desobediência ao artigo 11 da referida Resolução.

Porém, pode-se compreender que a soma das quantias de R$ 5.420,00 e 670,00 que resultam em R$ 6.090,00 são oriundas da doações acima referidas, mesmo assim estão em desacordo com a legislação aplicável à espécie.

Salienta-se que apesar de apresentado o demonstrativo de doações com nomes e CPFs, tal documento parte da contabilidade do partido e se trata de informação unilateral sem qualquer respaldo probatório. Salienta-se que a exigência eleitoral para que o trânsito das doações, devidamente identificadas, bem como receitas e despesas sejam por meio de conta bancária é justamente para que se possa avaliar a veracidade e a oficialidade das informações, sendo praticamente o único modo de averiguação de recursos provenientes de fontes vedadas, haja vista que o preenchimento posterior de documento informativo ao contador, de forma unilateral pelo partido, não atende a exigência legal que é a lisura dos recursos que foram colocados a disposição da agremiação.

Observa-se que é a única forma de controle efetivo de recursos recebidos e expressamente disposta na resolução TSE 23464/15. De início, já no artigo 5º, inciso IV diz que constituem fontes de receitas, além de outros, as “doações de pessoas físicas e de outras agremiações partidárias, destinadas ao financiamento de campanhas eleitorais e das despesas ordinárias do partido, com identificação do doador originário" (grifou-se). Logo adiante, no artigo 7º, determina que “as contas bancárias somente podem receber doações ou contribuições com identificação do respectivo número de inscrição do Cadastro de Pessoas Físicas (CPF) do doador ou contribuinte, ou no Cadastro Nacional de Pessoa Jurídica (CNPJ) no caso de recurso proveniente de outro partido ou de candidatos.”

Os parágrafos 1º e 2º do mesmo artigo também trazem a mesma exigência para doações via internet ou cartão de crédito.

Prosseguindo, nas seções III, IV e V, que tratam das doações e dos recibos de doação e são claras no sentido da imprescindibilidade da identificação do doador, bem como da necessidade do partido emitir recibo da doação recebida.

Portanto, a partir do não cumprimento de tais disposições, surgem os recursos de origem não identificada que podem ser de fontes vedadas ou não, já que o doador pode nunca aparecer ou aparecer identificado em nome de outra pessoa no documento contábil, por isso que a legislação é tão minuciosa quanto a tal conduta.

A transparência e a confiabilidade das contas partidárias se mostra pela movimentação bancária

Nesse sentido: […]

Igualmente ocorreu com relação ao valor da doação feita pela Direção Nacional do Partido, no total de R$ 27.815,22 (vinte e sete mil, oitocentos e quinze reais e vinte e dois centavos), pois ausente a comprovação dos doadores originários nos termos estabelecidos no artigo 5º, inciso IV, da Resolução TSE 23.464/2015.

O recorrente efetuou depósitos na conta do partido identificando-os com seu número de inscrição do CNJP (do próprio prestador), o que impossibilita que se conheça a real origem dos recursos.

Segundo se alega, parte desses recursos é oriunda de campanha de arrecadação de fundos realizada pelo recorrente, que argumenta que as doações foram feitas em dinheiro pelos filiados indicados em listagem efetivada no parecer técnico. A agremiação ainda acrescenta que a direção partidária efetuou dois depósitos por entender inviável a realização de inúmeras operações em valor ínfimo e defende também que, se ainda persistisse dúvida acerca da origem dos valores, seria possível diligenciar a veracidade das informações prestadas junto aos doadores.

Ocorre que a legislação eleitoral determina explicitamente que as “contas bancárias somente podem receber doações ou contribuições com identificação do respectivo número de inscrição no Cadastro de Pessoas Físicas (CPF) do doador ou contribuinte, ou no Cadastro Nacional de Pessoa Jurídica (CNPJ) no caso de recursos provenientes de outro partido político ou de candidatos” (art. 7º da Resolução TSE n. 23.464/15, que regulamenta o art. 39, § 3º, inc. II, da Lei dos Partidos Políticos).

Dessa forma, não se pode acolher a justificativa de que seria inviável a realização de inúmeras operações em valor ínfimo, visto que a norma é expressa acerca da necessidade de identificação de doações de recursos financeiros, bem como de que tal identificação ocorre pela indicação do número de inscrição no Cadastro de Pessoas Físicas (CPF) do doador ou contribuinte, ou no Cadastro Nacional de Pessoa Jurídica (CNPJ) no caso de recursos provenientes de outro partido político ou de candidatos, tudo isso por ocasião do depósito na conta-corrente da agremiação.

Acerca da realização de diligências para identificação dos doadores, cumpre ressaltar que o partido foi devidamente intimado das irregularidades apontadas na análise técnica, sendo essa a oportunidade concedida para produzir toda sorte de provas que entendesse relevante.

Deve ser mantida, dessa forma, a decisão no ponto em que reconheceu como de origem não identificada os depósitos efetuados na conta do partido com seu próprio CNPJ.

A decisão recorrida também glosou o valor de R$ 27.815,22 (vinte e sete mil, oitocentos e quinze reais e vinte e dois centavos), repassado pela direção nacional do partido, por também entender ausente, nessa modalidade, a comprovação dos doadores originários.

O recorrente defende tratar-se de percentual de doações recebidas por filiados, de forma que a identificação do doador teria sido devidamente realizada pelo recebedor originário dos valores (o diretório nacional da agremiação).

Ocorre que, conforme pontuado na análise técnica (fls. 520-526),

não há como evidenciar a decida correspondência dos créditos, no valor total de R$ 11.642,97, com as informações constantes na documentação acostada, uma vez que, no Diretório Nacional, os aludidos contribuintes/filiados (doadores originários) não estão identificados nos extratos eletrônicos disponibilizados pelo TSE de forma individualizada, com o cpf do doador, ou seja, não há como validar a identidade do doador originário indicado pela Direção Nacional. (sic)

Analisando toda a documentação juntada, a Secretaria de Controle Interno e Auditoria (SCI), no entanto, considerou identificados créditos transferidos pela direção nacional do partido no valor de R$ 2.400,31.

Anoto que a sistemática de repasse de valores adotada pelo partido também vem sendo considerada irregular por outros regionais, por não permitir a identificação dos doadores originários, como demonstra a decisão do Tribunal Regional Eleitoral do Rio Grande do Norte, cuja ementa abaixo se transcreve:

RECURSO ELEITORAL - PRESTAÇÃO DE CONTAS - PARTIDO POLÍTICO - EXERCÍCIO FINANCEIRO - 2014 - DOAÇÕES E CONTRIBUIÇÕES AO PARTIDO - ART. 4º, § 2º, DA RESOLUÇÃO/TSE Nº 21.841 - NECESSIDADE DE IDENTIFICAÇÃO DOS DOADORES - FALTA DE IDENTIFICAÇÃO PRECISA - IRREGULARIDADE GRAVE - DÚVIDA QUANTO À ORIGEM DOS RECURSOS ARRECADADOS - UTILIZAÇÃO DE RECURSOS DE FONTE NÃO IDENTIFICADA - IRREGULARIDADE GRAVE - DESAPROVAÇÃO DAS CONTAS - DETERMINAÇÃO DE RECOLHIMENTO DA QUANTIA TIDA POR IRREGULAR AO ERÁRIO - MANUTENÇÃO DA SENTENÇA - DESPROVIMENTO DO RECURSO

Segundo o art. 4º, § 2º, da Resolução/TSE nº 21.841, doações e contribuições de recursos devem ser efetuadas por cheque nominativo cruzado ou por crédito bancário identificado, diretamente na conta do partido político (art. 39, § 3º, Lei nº 9.096/95, vigente à época dos fatos). Tal regra tem por finalidade identificar os doadores, a fim de que não haja ofensas à norma eleitoral no tocante à vedações de fontes, controle de limites de doações, formação de caixa dois de recursos, dentre outras particularidades.

Nesse particular, a falta de identificação precisa dos doadores de campanha constitui irregularidade grave na prestação de contas, em virtude das dúvidas geradas quanto à verdadeira origem dos recursos em espécie arrecadados, comprometendo, dessa forma, a verificação da legitimidade desses recursos e a credibilidade das contas prestadas.

Na espécie, o processo de débitos (de recursos doados) e créditos (de contribuições de filiados) utilizado pelo partido, na forma ocorreu em Mossoró (de modo genérico, sem que haja efetiva identificação dos doadores pelo banco conveniado), fere o art. 4º, § 2º, da Resolução/TSE nº 21.841, ao não identificar os doadores, não imprimindo segurança acerca da licitude da origem dos créditos.

Planilha elaborada pela contadoria do partido, onde relaciona os filiados doadores e suas respectivas contribuições, acompanhadas de documentos denominados "Apoio à contabilidade - pagamentos efetuados pelo DN" e recibos de doação, são documentos produzidos de modo unilateral pela agremiação, inexistindo qualquer liame seguro que demonstre que os reais doadores são aqueles titulares das contas bancárias onde ocorreu o débito automático da contribuição.

A utilização de recursos de fonte não identificada, concernentes a créditos bancários sem comprovação de sua origem lícita, consubstancia irregularidade grave, capaz de ensejar a desaprovação das contas, com a determinação de seu recolhimento ao erário, nos termos do Art. 6º da Resolução 21.841 do TSE. Precedentes.

Sendo a falha relativa a recursos de origem não identificada, deve ser recolhido ao erário, pelo órgão municipal, a quantia de R$ 13.981,31, como determina o art. 6º da Resolução/TSE nº 21.841.

Recurso conhecido e desprovido.

(TRE-RN, RECURSO ELEITORAL n. 3481, ACÓRDÃO n. 283/2018 de 09.8.2018, Relator LUIS GUSTAVO ALVES SMITH, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Data: 22.8.2018, pp. 4-5.)

Dessa forma, deve ser mantida a sentença em relação à existência de valores sem origem identificada na contabilidade, cujos valores serão especificados na parte final dessa decisão.

Por fim, cabe sindicar acerca da comprovação dos gastos realizados pelo partido.

O recorrente afirma que todas as despesas foram devidamente identificadas e comprovadas por nota fiscal, tendo utilizado um único cheque para quitar vários pagamentos de valor menor, em alguns casos. Refere que tal procedimento é usual e que o total das despesas equivale ao valor nominal das ordens de pagamento emitidas.

Ocorre que o art. 18, § 4º, da Resolução TSE n. 23.464/15 disciplina que os gastos partidários devem ser pagos mediante a emissão de cheque nominativo cruzado ou por transação bancária que identifique o CPF ou CNPJ do beneficiário, ressalvada a constituição de fundo de caixa.

No caso, ausente comprovação de que o partido atendeu aos requisitos constantes no art. 19 do regulamento para realização dos pagamentos por tal modalidade, é de ser mantida a irregularidade apontada na sentença.

Por fim, cabe tecer algumas considerações sobre a apuração do montante das irregularidades identificadas na contabilidade do partido político.

Ficou consignado, na parte final da sentença (fls. 147-150v.), que foram consideradas “como irregulares para fins de devolução as quantias de R$ 27.815,22, R$ 6.090,00 e R$120,00”, o que perfaz o total de R$ 34.025,22.

Observe-se que o valor de R$ 5.870,00, relativo a estorno descrito no trecho da decisão que indico abaixo, não foi incluído no cômputo das irregularidades:

Outrossim, o extrato das fls. 62/79 demonstra que os créditos totalizaram R$ 42.830,69 enquanto que o demonstrativo de receitas e gastos atesta como total de receitas o valor de R$ 37.108,39, revelando a diferença de R$ 5.722,30, o que foi justificado por um depósito em duplicidade no valor de R$ 5.870,00, que foi estornado e rendimentos de aplicação financeira de R$147,70. No entanto, o referido estorno não está demonstrado nos autos.

Ocorre que, quando da remessa dos autos à Secretaria de Controle Interno e Auditoria, o órgão técnico, apesar de entender como identificado o montante de R$ 2.400,31, como já apontado na análise dos recursos recebidos da direção nacional, indicou como sujeitas a recolhimento a quantia de R$ 37.494,91, resultante da soma de R$ 120,00 (recursos provenientes de fonte vedada), R$ 11.960,00 (recursos de origem não identificada) e R$ 25.441,91 (recursos oriundos do Diretório Nacional).

Embora, aparentemente, o órgão técnico tenha majorado a condenação imposta em primeira instância, o que ocorreu, na verdade, é que a última análise técnica incluiu o valor do estorno apontado e não contabilizado na sentença (R$ 5.870,00) e debitou a quantia proveniente dos doadores que considerou identificados (R$ 2.400,31), o que fez com que a monta das irregularidades ficasse acrescida de R$ 3.469,69 em relação ao valor indicado na decisão a quo.

Dessa forma, não houve apontamento de nova irregularidade na análise técnica realizada após a interposição do recurso, o que ocorreu foi a consideração de um ponto descrito na sentença mas não computado na soma dos valores especificada no dispositivo da decisão recorrida.

O caso em análise é muito peculiar, visto que o julgador monocrático consignou expressamente que foram “consideradas como irregulares para fins de devolução as quantias de R$ 27.815,22, R$ 6.090,00 e R$120,00” (sic), o que autorizaria a conclusão de que, na ótica do sentenciante, as questões dos gastos partidários e do estorno não comprovados, embora apontados como máculas na contabilidade, não seriam irregularidades “para fins de devolução”. Tais situações pesariam em desfavor da regularidade da contabilidade, mas não ensejariam o recolhimento de valores.

Tal interpretação, mesmo consagrando entendimento que não reflete o pensamento da Corte, é a que confere maior efetividade à decisão de primeiro grau e prestigia o princípio tantum devolutum quantum apepllatum, bem como a vedação à reformatio in pejus, considerando que não houve qualquer insurgência quanto ao somatório das irregularidades, seja por meio de embargos de declaração, seja por meio de recurso eleitoral.

Dessa forma, considerando que a unidade técnica apurou que houve a identificação dos doadores em relação a R$ 2.400,31, subsistiriam as irregularidades referentes a R$ 120,00 (recursos provenientes de fonte vedada), R$ 6.090,00 (recursos de origem não identificada) e R$ 25.414,91 (recursos oriundos do diretório nacional), o que perfaz o total de R$ 31.624,91 a ser recolhido ao Tesouro Nacional.

Tal montante representa 85,22% da receita da agremiação no exercício em análise, de forma que, tanto a expressividade do percentual, em relação ao movimento contábil anual, quanto o significativo valor nominal das irregularidades impedem sejam invocados os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade para fins de relativização das máculas, devendo ser mantida a desaprovação das contas.

Assim, a sentença merece ser mantida e o valor cujos doadores o parecer técnico logrou êxito em identificar deve ser abatido do montante a ser recolhido pelo recorrente.

Contudo, observo que a decisão aplicou a suspensão do repasse das quotas do Fundo Partidário pelo prazo de um ano em razão do recebimento de recursos procedentes de fontes vedadas, nos termos do art. 47, inc. I, da Resolução TSE n. 23.464/15.

Não obstante a previsão do mencionado dispositivo, este Regional vem entendendo pela aplicação proporcional da sanção e, com base nos critérios de razoabilidade e proporcionalidade, penso que a suspensão do recebimento de quotas do Fundo Partidário pelo prazo de um mês é mais adequada ao caso, sobretudo tendo em vista que o montante dessa irregularidade é de R$ 120,00.

Ainda, ressalto que não é o caso de aplicação da previsão contida no art. 47, inc. II, da Resolução TSE n. 23.464/15, que estabelece a suspensão no caso de recebimento de recursos de origem não identificada até que a Justiça Eleitoral aceite os esclarecimentos prestados pelo órgão partidário, tendo em vista que o preceito apenas incide até o julgamento das contas, sob pena de imposição de sanção por tempo infinito. Prolatada a sentença, a jurisprudência deste Tribunal não tem admitido o revolvimento da matéria:

RECURSO. PRESTAÇÃO DE CONTAS. PARTIDO POLÍTICO. EXERCÍCIO FINANCEIRO DE 2016. DESAPROVAÇÃO. AFASTADA A PRELIMINAR DE NULIDADE DA SENTENÇA. MÉRITO. RECEBIMENTO DE RECURSOS DE ORIGEM NÃO IDENTIFICADA. ART. 7º DA RESOLUÇÃO TSE N. 23.464/15. REFORMA DO VALOR DA MULTA APLICADA. PARCIAL PROVIMENTO.

1. Afastada a preliminar de nulidade. Omissão da sentença em determinar a penalidade de suspensão das quotas do Fundo Partidário decorrente do reconhecimento da existência de arrecadação de recurso de origem não identificada. A interpretação teleológica do texto do art. 36, inc. I, da Lei dos Partidos Políticos evidencia que o repasse de novas quotas do Fundo Partidário somente ficará suspenso até que a justificativa seja aceita pela Justiça Eleitoral ou haja o julgamento do feito, sob pena de imposição de sanção por tempo infinito, penalidade não admitida no ordenamento jurídico interno.

2. Arrecadação de recursos em contrariedade com o disposto no art. 7º da Resolução TSE n. 23.464/15. Documentação apresentada incapaz de expor claramente a origem dos recursos. Falha representando 93,59% da arrecadação no período, impondo o juízo de desaprovação das contas. Considerada a conduta colaborativa do órgão partidário para a fixação da multa. Redução para o percentual de 5% sobre o valor impugnado.

3. Parcial provimento.

(TRE-RS - RE: 2481 NÃO-ME-TOQUE - RS, Relator: EDUARDO AUGUSTO DIAS BAINY, Data de Julgamento: 22.11.2018, Data de Publicação: DEJERS - Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Tomo 214, Data: 26.11.2018, p. 6.) (Grifei.)

Portanto, a manutenção da desaprovação das contas deve ensejar a devolução de valores com o acréscimo de multa, cujo patamar fixado na sentença deve permanecer. A base de incidência, portanto, corresponde à importância de R$ 31.624,91, que resulta da dedução dos valores relativos às irregularidades superadas.

Diante do exposto, VOTO por dar parcial provimento ao recurso para, mantida a desaprovação das contas do PARTIDO DOS TRABALHADORES (PT) de PASSO FUNDO relativas ao exercício de 2016, determinar a suspensão do repasse do Fundo Partidário pelo prazo de um mês, em razão do recebimento de recursos oriundos de fontes vedadas, e o recolhimento de R$ 31.624,91 (trinta e um mil, seiscentos e vinte e quatro reais e noventa e um centavos), com o acréscimo de multa de 10%, ao Tesouro Nacional.

É como voto, senhor Presidente.