RE - 3008 - Sessão: 31/08/2018 às 16:00

RELATÓRIO

Trata-se de recurso interposto por SANDRA IVANA FRONER SCHROER contra a decisão que julgou procedente a representação por doação acima do limite estabelecido no art. 23, § 1º, da Lei n. 9.504/97, ajuizada pelo MINISTÉRIO PÚBLICO ELEITORAL, condenando-a à multa de cinco vezes o valor do excesso doado, correspondendo à pena de R$ 27.272,00.

Em suas razões recursais (fls. 58-61), a recorrente sustenta ser casada em regime de comunhão universal, aduzindo que a renda do casal deve ser somada para fins de fixação do limite de doações. Argumenta que no ano de 2015 era isenta de declaração de Imposto de Renda, pleiteando que sua renda seja equiparada ao valor máximo de isenção para aquele ano. Sustenta ser aplicável a nova sanção de 100% sobre o excesso, estabelecida pela Lei n. 13.488/17. Requer seja reduzido o valor da doação em excesso e a incidência da nova sanção sobre a irregularidade.

Com as contrarrazões, nesta instância, os autos foram encaminhados com vista ao Ministério Público Eleitoral, que se manifestou pelo desprovimento do recurso (fls. 78-81).

É o breve relatório.

VOTO

No mérito, a recorrente efetuou doação de R$ 6.400,00, no pleito de 2016, (fl. 6v.) e declarou ter auferido renda de R$ 9.456,00 no ano de 2015 (fl. 20 – anexo).

Com isso, o juízo de primeiro grau considerou que a recorrente excedeu o limite de 10% da renda bruta do ano anterior ao da eleição em R$ 5.454,40, aplicando-lhe multa de R$ 27.272,00, equivalente a cinco vezes o valor do excesso, tal como estabelecia o art. 23 da Lei n. 9.504/97, com a redação vigente ao tempo da doação:

Art. 23. Pessoas físicas poderão fazer doações em dinheiro ou estimáveis em dinheiro para campanhas eleitorais, obedecido o disposto nesta Lei.

§ 1o  As doações e contribuições de que trata este artigo ficam limitadas a 10% (dez por cento) dos rendimentos brutos auferidos pelo doador no ano anterior à eleição.

§ 3º A doação de quantia acima dos limites fixados neste artigo sujeita o infrator ao pagamento de multa no valor de cinco a dez vezes a quantia em excesso.

A recorrente busca a reforma da sentença, alegando (a) ser casada em regime de comunhão universal, pleiteando a soma de sua renda com a de seu marido; (b) seja considerada como renda pessoal o valor fixado para isenção da declaração de imposto de renda, equivalente a R$ 28.123,91, pois auferiu renda abaixo desse montante; (c) seja aplicada a sanção de 100% sobre o valor doado, posteriormente estabelecido pela Lei n. 13.488/17.

Passo à analise das pretensões recursais.

No tocante à soma da sua renda com a de seu marido, a jurisprudência admite que, para fins de fixação do limite da doação eleitoral, seja somada a renda do casal, desde que tenham adotado o regime de comunhão universal de bens:

RECURSO ESPECIAL ELEITORAL. REPRESENTAÇÃO. DOAÇÃO DE RECURSOS ACIMA DO LIMITE LEGAL. PESSOA FÍSICA. ALIENAÇÃO DE IMÓVEL. COMUNICAÇÃO DO VALOR ENTRE OS CÔNJUGES. NÃO COMPROVADO O CUMPRIMENTO DOS REQUISITOS LEGAIS PARA TANTO. INVERSÃO DO JULGADO. INCIDÊNCIA DAS SÚMULAS 279 DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL E 7 DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. BASE DE CÁLCULO DA DOAÇÃO. CONSIDERAÇÃO DO RENDIMENTO BRUTO DO CASAL. POSSIBILIDADE NO CASO DE COMUNHÃO UNIVERSAL DE BENS. PRECEDENTE. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO.

1. A Corte de origem, soberana na análise das circunstâncias fáticas da causa, concluiu que não ficou comprovado o cumprimento dos requisitos legais capazes de, em tese, permitir que o valor relativo à alienação de bem imóvel por um dos cônjuges se comunicasse ao outro. Portanto, a inversão do julgado encontra óbice nas Súmulas 279 do Supremo Tribunal Federal e 7 do Superior Tribunal de Justiça.

2. É possível considerar conjuntamente, para efeito do cálculo do limite legal relativo às doações eleitorais, os rendimentos brutos anuais do doador e esposa, desde que o regime do casamento seja o da comunhão universal de bens. Precedente.

3. Na hipótese, o matrimônio foi realizado apenas na seara religiosa, não havendo, por conseguinte, estipulação, perante o registro civil, quanto à adoção do regime de comunhão universal de bens pelo casal.

4. Agravo regimental desprovido.

(TSE, Agravo de Instrumento n. 3623, Acórdão, Relatora Min. Laurita Hilário Vaz, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Tomo 56, Data 24.3.2014, Páginas 76/77)

Recurso. Representação. Doação acima do limite legal. Pessoa Física. Art. 23, § 1º, I, da Lei n. 9.504/97. Eleições 2014.

Afastada preliminar. Caráter público das informações referentes às doações realizadas para campanha eleitoral, não acobertadas por sigilo. Licitude da prova extraída do relatório de cruzamento de dados entre a Justiça Eleitoral e a Secretaria da Receita Federal para instrução de procedimentos judiciais. Irrelevante o valor representado pelos bens e direitos para dimensionar o montante da doação. O valor decorrente de liquidação de empresa, cujo montante já integre o patrimônio do doador em exercícios anteriores, sem qualquer diferença positiva de ganho de capital, não pode ser considerado como rendimento, devendo ser excluído do cálculo para apuração do limite legal. As doações realizadas por pessoas físicas, em regime de comunhão universal de bens, ficam limitadas a dez por cento do somatório dos rendimentos auferidos pelo casal no exercício fiscal anterior ao do pleito. O comando disposto na norma do art. 23, § 1°, inc.I, da Lei n. 9.504/97 é de aplicação objetiva. Ultrapassado o limite estabelecido, há incidência da sanção correspondente. Multa cominada no patamar mínimo previsto pela legislação de regência. Provimento parcial.

(TRE/RS, Recurso Eleitoral n. 3507, ACÓRDÃO de 08.3.2016, Relator Dr. Leonardo Tricot Saldanha, Publicação: DEJERS - Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Tomo 42, Data 10.3.2016, Página 4.)

Todavia, a recorrente não junta provas da sua alegação. Não demonstra ser casada, nem o regime de bens do matrimônio.

Pelas declarações prestadas à Receita Federal verifica-se que a recorrente, Sandra Ivana Schroer, é sócia de Eloir Eloi Schroer (anexo). A sociedade com pessoa de mesmo sobrenome até pode indicar que ambos são casados, mas não se presta a comprovar o matrimônio, tampouco demonstra o imprescindível regime de bens da comunhão universal, que permitiria somar a renda do casal.

Assim, não comprovado o casamento, nem o respectivo regime de bens, resta inviável reconhecer a pretendida renda familiar para ampliar o limite da doação.

Relativamente à renda pessoal a ser considerada, a recorrente realizou declaração de renda anual, informando a percepção de R$ 9.456,00. Entretanto, estaria isenta de tal declaração, pois percebeu menos de R$ 28.123,91, renda mínima que gera a obrigação de declarar a renda. Por isso, sustenta ser adequado considerar este último valor como equivalente ao seu rendimento bruto.

A alegação não prospera. De fato, a jurisprudência admite que, na ausência de declaração de imposto de renda, presuma-se em benefício do doador a percepção de valores, no mínimo equivalentes ao teto fixado para isenção de imposto de renda.

Não se justifica adotar essa presunção quando há efetiva declaração do próprio doador, reconhecendo ter auferido renda em montante inferior.

A jurisprudência firmou-se no sentido de ser inadmissível a incidência do valor de isenção da declaração de imposto de renda quando o doador declara ter auferido renda em menor montante, como se verifica pelas seguintes ementas:

ELEIÇÕES 2014. AGRAVO REGIMENTAL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECURSO ESPECIAL ELEITORAL. REPRESENTAÇÃO. DOAÇÃO DE RECURSOS ACIMA DO LIMITE LEGAL. PESSOA FÍSICA. MULTA ARBITRADA. ART. 23, § 3º, DA LEI Nº 9.504/1997. ANOTAÇÃO DA INELEGIBILIDADE NO CADASTRO NACIONAL DE ELEITORES. POSSIBILIDADE. CARÁTER INFORMATIVO. NEGATIVA DE PROVIMENTO. [...] 4. Nos termos da jurisprudência desta Corte Superior, a utilização do teto fixado pela Secretaria da Receita Federal (SRF) para a isenção do imposto de renda como parâmetro do cálculo para doação de campanha abrange, unicamente, a hipótese do doador isento que não apresenta a declaração anual de rendimentos. 5. Apresentada a declaração de ajuste fiscal pelo ora agravante, inaplicável a tese do limite da isenção do imposto de renda como parâmetro para doação de campanha eleitoral. 6. Firme a orientação deste Tribunal Superior de que a anotação da ocorrência no Cadastro Nacional de Eleitores possui caráter meramente informativo, a subsidiar eventual futuro pedido de registro de candidatura, não implicando declaração de inelegibilidade, tampouco ausência de quitação eleitoral. Precedente. Conclusão Agravo regimental não provido.

(TSE, Agravo de Instrumento n. 933, Acórdão, Relatora Min. Rosa Weber, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Tomo 115, Data 13.6.2018, Páginas 30-31.)

ELEIÇÕES 2014. AGRAVO REGIMENTAL. AGRAVO. REPRESENTAÇÃO. DOAÇÃO ACIMA DO LIMITE LEGAL. PESSOA FÍSICA. ISENÇÃO DE DECLARAÇÃO DE IMPOSTO DE RENDA. EXISTÊNCIA DE DECLARAÇÃO RELATIVA AO ANO ANTERIOR À ELEIÇÃO. ART. 23, § 3º, DA LEI Nº 9.504/97. INCIDÊNCIA. INAPLICABILIDADE DO TETO DE ISENÇÃO PARA LIMITE DA DOAÇÃO. SÚMULA Nº 30/TSE. INCIDÊNCIA. IMPOSSIBILIDADE DE REEXAME DE FATOS E PROVAS. SÚMULA Nº 24/TSE. DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL. INEXISTÊNCIA DE SIMILITUDE FÁTICA. AUSÊNCIA DE IMPUGNAÇÃO DOS FUNDAMENTOS DA DECISÃO AGRAVADA. SÚMULA N° 26/TSE. DESPROVIMENTO.1. Conforme se depreende dos autos, o agravante se limitou a reproduzir os argumentos constantes nos recursos anteriores, sem impugnar especificamente os fundamentos constantes na decisão agravada. Assim, incide na espécie a Súmula nº 26/TSE.2. Inexistindo dúvida quanto à capacidade de doação para as eleições, deve incidir a multa calculada conforme o disposto no art. 23, §§ 1º e 3º, da Lei das Eleições.3. Não se aplica o teto de isenção do imposto de renda para fixação do limite de doação para campanha, quando o doador, ainda que isento, efetivamente declara os rendimentos auferidos.4. Agravo regimental ao qual se nega provimento.

(TSE, Agravo de Instrumento n. 3203, Acórdão, Relator Min. Tarcisio Vieira De Carvalho Neto, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Tomo 31, Data 09.02.2018, Página 122.)

Assim, correto o juízo de primeiro grau ao considerar como rendimento bruto da doadora, no ano de 2015, o valor de R$ 9.456,00.

Por fim, no tocante à penalidade aplicável, a sanção prevista ao tempo da doação era de cinco a dez vezes o valor do excesso, nos termos do art. 23, § 3º, da Lei n. 9.504/97.

A Lei n. 13.488/17 reduziu a penalidade aplicável para até 100% do valor do excesso, modificando a redação do referido § 3º:

§ 3º A doação de quantia acima dos limites fixados neste artigo sujeita o infrator ao pagamento de multa no valor de até 100% (cem por cento) da quantia em excesso.

Em recente julgado, este Tribunal enfrentou a matéria, fixando, por maioria de votos, entendimento de que a norma sancionatória mais benéfica não retroage, privilegiando-se o critério do tempus regit actum em matéria de sanção administrativa.

Transcrevo a ementa extraída do precedente citado:

RECURSO. REPRESENTAÇÃO. DOAÇÃO DE RECURSOS PARA CAMPANHA ELEITORAL ACIMA DO LIMITE LEGAL. PESSOA FÍSICA. ELEIÇÕES 2014. PRELIMINAR AFASTADA. NÃO CARACTERIZADA A INÉPCIA DA INICIAL. MÉRITO. CONFIGURADO O EXCESSO NO VALOR DOADO. CONTROVÉRSIA SOBRE A SANÇÃO APLICÁVEL. ALTERAÇÃO DA PENALIDADE PELA LEI N. 13.488/17. IRRETROATIVIDADE. PRINCÍPIO "TEMPUS REGIT ACTUM". ADEQUADA A MULTA APLICADA NA SENTENÇA. DESPROVIMENTO.

1. Preliminar afastada. Inicial em regular condição de ser analisada. Dados supostamente omitidos estão referenciados nos documentos que instruem a peça. A falta da precisa descrição do valor excedido apenas pode ser suprida durante a instrução probatória, não havendo mácula na inicial. Inépcia da petição não caracterizada.

2. Mérito. A doação realizada por pessoa física restringe-se a dez por cento dos rendimentos brutos auferidos no ano anterior ao da eleição, nos termos do art. 23, § 1º, inc. I, da Lei n. 9.504/97. Caracterizada a infringência ao parâmetro legal.

3. Penalidade. Controvérsia sobre a sanção adequada. Inaplicabilidade da Lei n. 13.488/17 aos processos de exercícios anteriores a sua vigência, em prestígio à lei vigente à época dos fatos e ao princípio da segurança jurídica. Irretroatividade. Aplicação do princípio "tempus regit actum". Mantida a condenação imposta na sentença, de acordo com a penalidade prevista na época dos fatos.

Provimento negado.

(TRE/RS, RE n. 21-15, Relator Des. Eleitoral Jamil Andraus Hanna Bannura, julgado em 18.12.2017.) (Grifei.)

Dessa forma, não prosperam os argumentos recursais, devendo-se manter a sentença recorrida.

 

DIANTE DO EXPOSTO, voto pelo desprovimento do recurso.