RE - 5810 - Sessão: 29/08/2018 às 13:30

RELATÓRIO

Trata-se de recurso interposto por EDISON ROBERTO DEMARCO (fls. 93-99) contra sentença proferida pelo Juízo da 003ª Zona Eleitoral - Gaurama (fls. 78-88) que, nos autos de representação por doação de recursos acima do limite legal proposta pelo Ministério Público Eleitoral, o condenou ao pagamento de multa no valor de R$ 7.911,30, correspondente a cinco vezes a quantia doada em excesso, com fundamento no art. 23 da Lei n. 9.504/97.

Em suas razões recursais, arguiu preliminar de cerceamento de defesa sob a alegação de que o juízo não lhe oportunizou a produção de prova testemunhal. Ainda, reiterou a preliminar de ilicitude da prova que embasa a representação, sustentando a inconstitucionalidade da Resolução TSE n. 23.463/15, a qual teria instituído a quebra do sigilo fiscal administrativamente, sem decisão judicial.

No mérito, argumentou que a doação de R$ 5.000,00 foi feita pelo casal (considerados ele e seu cônjuge), sendo R$ 2.500,00 para cada um dos cônjuges, tendo o recibo sido emitido, por equívoco, apenas em seu nome. Disse que, no ano de 2015, obteve rendimento bruto de R$ 35.585,86 e sua mulher, com a qual é casado pelo regime de comunhão parcial de bens, R$ 205.184,13, devendo ser considerada no caso vertente a renda do casal.

Asseverou, ainda, que o montante doado não teve o condão de influenciar o pleito nem configura abuso de poder econômico. Sustentou a aplicabilidade das modificações introduzidas pela Lei n. 13.488/17, que limitam a multa em 100% da quantia em excesso, por serem mais benéficas. Ao final, postulou o acolhimento das preliminares e, quanto ao mérito, o provimento do recurso para o fim de ser julgada improcedente a representação. Sucessivamente, requereu seja a penalidade fixada de acordo com a atual regra do art. 23, § 3º, da Lei n. 9.504/97.

Com contrarrazões (fls. 106-110), nesta instância, os autos foram com vista à Procuradoria Regional Eleitoral, que opinou pelo desprovimento do recurso (fls. 119-123v.).

Acompanham os autos documentos sigilosos na forma de Anexo, de acordo com o disposto no art. 7º, §§ 1º e 2º, da Resolução TSE n. 23.326/10.

É o relatório.

 

VOTO

Admissibilidade

A intimação do recorrente ocorreu em 18.4.2018 e o recurso foi protocolizado em cartório no dia 20.4.2018, dentro do tríduo legal (fls. 91-93).

Preenchidos os demais pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso.

Preliminares

a) de cerceamento de defesa

Alega o recorrente ter sido cerceado o seu direito de defesa em decorrência da não permissão, pelo juízo eleitoral, de produção de provas. Diz que “tinha interesse na produção de prova oral para demonstrar que a doação fora conjunta”.

A decisão que, segundo o recorrente, teria impossibilitado a produção de prova está vertida nos seguintes termos: “Considerando que não houve requerimento de dilação probatória pelo representante e representado, intimem-se e voltem conclusos para sentença”.

Sem razão o recorrente.

A uma, porque o rol de testemunhas deveria ter sido indicado por ocasião da apresentação de defesa, conforme despacho inicial que acompanhou a citação.

A duas, porque da decisão que determinou o prosseguimento do feito (fl. 69), o recorrente foi devidamente intimado e quedou silente, conforme certidão da fl. 75, sendo tardia e inoportuna a sua irresignação apenas em via recursal, ante a ocorrência de preclusão consumativa.

A três, porque questões envolvendo a titularidade de doações eleitorais devem ser provadas, em regra, por via documental, a fim de possibilitar que a justiça eleitoral e, porque não dizer, a sociedade, exerçam a fiscalização sobre o financiamento das campanhas eleitorais. Não é por outra razão que o art. 23, inc. I, da Lei das Eleições exige que as doações de recursos financeiros sejam realizadas por meio de “cheques cruzados e nominais ou transferência eletrônica de depósito”, justamente para que se possa identificar e individualizar o doador.

Logo, nesse contexto, resta afastada esta prefacial.

b) de ilicitude da prova

O recorrente suscitou preliminar de ilicitude da prova, porque a Receita Federal teria repassado, ilicitamente, ao Ministério Público Eleitoral, informações sigilosas relativas aos seus rendimentos auferidos no ano de 2015. Requereu, com isso, fosse declarada nula a prova que embasa a ação.

No entanto, a tese não prospera.

As informações quanto aos valores doados para campanhas eleitorais e nomes dos doadores são públicas e não são acobertadas por sigilo, prevendo a Lei das Eleições, até mesmo, a divulgação desses dados na rede mundial de computadores.

O Ministério Público Eleitoral instruiu o pedido judicial de acesso aos dados fiscais com documento obtido a partir de convênio firmado entre a Justiça Eleitoral e a Receita Federal (Portaria Conjunta n. 74/06), o qual prevê, tão somente, a comunicação sobre excessos de doações verificadas quando do cruzamento de dados, sem envio de documentação alguma, de acordo com o art. 25, § 4º, da Resolução TSE n. 23.406/14 (fls. 5-9).

Tal procedimento é meramente apuratório e preparatório de eventual pedido de quebra de sigilo fiscal ao Poder Judiciário, não caracterizando cerceamento de defesa ou acesso ilícito às informações fiscais, na esteira da jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral:

ELEIÇÕES 2010. REPRESENTAÇÃO COM FUNDAMENTO NO ART. 23 DA LEI Nº 9.504/1997. DOAÇÃO PARA CAMPANHA ACIMA DO LIMITE LEGAL. PESSOA FÍSICA. ILICITUDE DA PROVA. NÃO CONFIGURAÇÃO. DESPROVIMENTO.

1. O Ministério Público Eleitoral pode solicitar à Receita Federal a relação de doadores que excederam o limite legal para, posteriormente, requerer a quebra do sigilo fiscal ao juízo competente, como ocorreu no caso concreto. Na linha da jurisprudência do TSE, "o acesso, pelo Órgão Ministerial, tão somente à relação dos doadores que excederam os limites legais, mediante o convênio firmado pelo TSE com a Receita Federal, não consubstancia quebra ilícita de sigilo fiscal" (ED-AgR-AI n. 57-79/PR, rel. Min. Luciana Lóssio, julgados em 24.4.2014).

2. Agravo regimental desprovido.

(TSE – Agravo Regimental em Recurso Especial Eleitoral n. 26375 – Relator Min. GILMAR FERREIRA MENDES – DJE de 18.8.2015) (Grifei.)

 

Assim, demonstrada a licitude da prova, afasto a preliminar.

 

Mérito

Cuida-se de recurso interposto por EDISON ROBERTO DEMARCO contra sentença proferida pelo Juízo da 003ª Zona Eleitoral, o qual julgou procedente a representação por doação acima do limite legal, condenando o recorrente ao pagamento de multa de R$ 7.911,30 – correspondente a cinco vezes o valor que teria excedido o limite permitido para doação.

Veja-se o teor da Lei n. 9.504/97, vigente à época da doação:

Art. 23. Pessoas físicas poderão fazer doações em dinheiro ou estimáveis em dinheiro para campanhas eleitorais, obedecido o disposto nesta Lei.

§ 1º As doações e contribuições de que trata este artigo ficam limitadas a 10% (dez por cento) dos rendimentos brutos auferidos pelo doador no ano anterior à eleição.

[...]

§ 3º A doação de quantia acima dos limites fixados neste artigo sujeita o infrator ao pagamento de multa no valor de cinco a dez vezes a quantia em excesso.

(Grifei.)

No presente caso, resta incontroverso que o recorrente EDISON ROBERTO DEMARCO efetuou doação de campanha em favor do candidato Celso Vilmar Demarco, no pleito de 2016.

Contudo, o cerne da questão reside no montante doado e no total de rendimentos brutos auferidos no exercício anterior ao ano da eleição, o que, conforme o patamar em que ocorra, pode inquinar a doação como irregular, visto que o permissivo legal para doação é fixado em 10% do valor dos rendimentos brutos auferidos pelo doador no exercício anterior ao pleito.

O Ministério Público Eleitoral fundou a denúncia no valor de R$ 5.000,00 e considerou os rendimentos brutos auferidos pelo recorrente no ano-base de 2015 como sendo aquele declarado junto à Receita Federal no IRPF, qual seja, R$ 34.177,40. Assim, o valor de R$ 5.000,00, por exceder em R$ 1.582,26 o limite máximo de R$ 3.417,74, seria irregular.

O recorrente alegou, por sua vez, que, embora tenha realizado a transferência bancária do valor integral, teria arcado com a proporção de 50% do montante, ou seja, teria doado apenas R$ 2.500,00, sendo que a outra metade teria corrido às expensas de sua mulher Adriana Maria Puton Demarco. Assim, sua doação seria regular, posto que o valor alegado não feriria o máximo legal.

Ademais, considerando ser casado com Adriana pelo regime de comunhão parcial de bens, a fim de ser estabelecida a base de cálculo para o percentual legal, pontuou que deveriam ser somados os rendimentos brutos de ambos os cônjuges, o que faria com que valor total doado se inserisse no limite permitido pela legislação.

A hipótese de doação conjunta ventilada pelo recorrente não encontra amparo jurídico.

A certidão de casamento acostada com a defesa à fl. 27 dá conta que EDISON e Adriana são casados pelo regime de comunhão parcial de bens. Nesse regime não se comunicam “os proventos do trabalho pessoal de cada cônjuge”, por disposição expressa do art. 1.659, inc. VI, do Código Civil.

Não desconheço o fato de que esta Corte já definiu, anteriormente, pela possibilidade de considerar os rendimentos de ambos os cônjuges com a finalidade de estabelecer o limite legal para a doação, no regime de comunhão parcial de bens (v.g. Recursos Eleitorais números 49-04 e 21-51, ambos de relatoria da Dra. GISELE ANNE VIEIRA DE AZAMBUJA, julgados em 27.01.2016 e 13.4.2016, respectivamente).

No entanto, analisando-se a movimentação processual dos precedentes acima citados, observa-se que nos referidos feitos o TSE deu provimento aos Recursos Especiais interpostos pela Procuradoria Regional Eleitoral, mantendo entendimento já pacificado de somente admitir a comunicação dos rendimentos do casal quando o regime da união for o de comunhão universal de bens.

Cabe ressaltar que ambas as decisões foram reformadas monocraticamente, com base no art. 36, § 7º, do Regimento Interno do TSE, que autoriza o relator a “dar provimento ao recurso, se a decisão recorrida estiver em manifesto confronto com súmula ou com jurisprudência dominante do Supremo Tribunal Federal ou de Tribunal Superior”.

Da decisão proferida nos autos do REspe n. 49-04 extraio os seguintes excertos, verbis:

O aresto recorrido merece reforma, porquanto divorciado da jurisprudência desta Corte Superior, que somente afere limite máximo de doação de campanha, com base nos rendimentos conjugados do casal, na hipótese de regime de comunhão universal (AgR-REspe 456-63/PR, Rel. Min. Luiz Fux, DJE de 2/10/2015).

Com efeito, na regra basilar que autoriza financiamento privado de campanha (art. 23, § 1º, I, da Lei 9.504/97), adota-se como parâmetro normativo ao limite máximo de transferência a capacidade econômica do doador individualmente considerado. Esse critério de aferição personalíssimo somente se flexibiliza nos casos em que o doador seja casado sob o regime de comunhão universal de bens, oportunidade em que se admite analise conjunta dos rendimentos do casal, declarado por qualquer um dos cônjuges.

Por elucidativo, transcrevo trecho do leading case consubstanciado no voto proferido pelo e. Min. Arnaldo Versiani, no REspe 1835-69/MS, DJE de 4/5/2012: O art. 1.667 do Código Civil estabelece que o "regime de comunhão universal importa a comunicação de todos os bens presentes e futuros dos cônjuges e suas dívidas passivas, com as exceções do artigo seguinte" . O regime de comunhão universal de bens se caracteriza, portanto, pela comunicação de todos os bens do casal, pois, a partir do casamento, os bens são adquiridos pela colaboração de ambos os cônjuges, o que compreende, evidentemente, os respectivos rendimentos. Logo, o rendimento auferido por um dos cônjuges pertence automaticamente ao outro, integrando um único e indivisível patrimônio comum. Assim, tenho que, em razão da predominância de bens comuns nesse regime de comunhão universal, deve ser analisado o rendimento bruto de ambos os cônjuges, para fins de comprovação de observância, ou não, do limite legal de doação de pessoa física para a campanha eleitoral. É certo que o Tribunal a quo, - baseado no arcabouço civilista que dispõe sobre comunicabilidade de bens no regime da comunhão parcial - buscou relativizar jurisprudência desse Tribunal Superior. Todavia, tendo como princípio vetor a especialidade da matéria eleitoral, descabe reinterpretar o art. 23, § 1º, I, da Lei 9.504/97 de maneira mais flexiva. Nesse sentido, cito trecho do voto do e. Ministro Dias Toffoli no AgR-REspe 372-89/CE, DJE de 9/9/2013: Preceitua o art. 1658 do Código Civil que: No regime de comunhão parcial, comunicam-se os bens que sobrevierem ao casal, na constância do casamento, com as exceções dos artigos seguintes. Vê-se que referida norma apenas menciona que, no regime de comunhão parcial e na constância do casamento, comunicam-se os bens que sobrevierem ao casal, nada fala acerca dos rendimentos do casal. Por sua vez, o inciso VI do art. 1659 é claro ao prescrever que: Excluem-se da comunhão: VI - os proventos do trabalho pessoal de cada cônjuge; Com efeito, acerca do tema o Tribunal Superior Eleitoral entende que: Doação. Pessoa física. Rendimento bruto. - É possível considerar o rendimento bruto dos cônjuges, cujo regime de casamento seja o da comunhão universal de bens, para fins de aferição do limite de doação por pessoa física para campanha eleitoral. Recurso especial não provido. (REspe 183569/MS, DJE 4/5/2012, Rel. Min Arnaldo Versiani Leite Soares). Portanto, não tendo o casal adotado o regime de bens da comunhão universal, não é possível considerar, para fins de aferição do limite para doações, o rendimento bruto dos cônjuges. Além disso, a tese de que os bens do casal adquiridos na constância do casamento se comunicam também não procede, porquanto a lei fala em rendimentos brutos auferidos pela pessoa física no ano anterior ao pleito, sendo irrelevante o valor de seu patrimônio. Colaciono, ainda, voto proferido pelo e. Ministro Luiz Fux no julgamento do AgR-REspe 456-63/PR, DJE de 2/10/2015: Com efeito, não obstante as citações doutrinárias de renomados civilistas e a indicação de jurisprudências de outros Tribunais, alheios à matéria eleitoral, esclareço que, no âmbito desta Justiça Especializada, a jurisprudência sólida desta Corte Superior é no sentido de que a conjugação dos rendimentos do casal, para fins de verificação do limite de doação de campanha eleitoral, apenas é admitida na hipótese de regime de comunhão universal, não sendo essa a situação vertente. Consoante registrado no decisum atacado, "a atual jurisprudência desta Corte entende que é possível considerar conjuntamente, para efeito do cálculo do limite legal relativo ás doações eleitorais, os rendimentos brutos anuais do doador e esposa, desde que o regime do casamento seja o da comunhão universal de bens" (AgR-Al 36-23/RS, Rel. Min. Laurita Vaz, DJe de 24/3/2014).

Desse modo, a regra geral já consagrada nessa Corte Superior não comporta nova hipótese de flexibilização, sob pena de desvirtuar o próprio escopo normativo que prima pelo princípio da transparência no financiamento privado de campanha, identificando pessoalmente o doador e lhe impondo limites objetivos.

Confira-se doutrina acerca do tema: No que concerne ao financiamento privado, impera o princípio da transparência. É preciso que os eleitores saibam, ou possam saber, da origem dos recursos usados nas campanhas políticas, sob pena de se formar representação política mendaz, dissociada da verdadeira vontade coletiva. Nesse diapasão, a arrecadação de recursos - quaisquer que sejam eles - de pessoas físicas e jurídicas submete-se a complexo regramento legal, havendo controle estrito quanto a origem, montante que cada pessoa pode doar, gestão e destino que lhes é dado. Além disso, os beneficiários são obrigados a prestar contas minuciosas à Justiça Eleitoral. Tudo com vistas a cercear o abuso de poder econômico nas eleições. (Grifei.)

Busquei amparo, também, nos fundamentos que embasaram a reforma da decisão prolatada nos autos do REspe n. 21-51 e destaco, verbis:

De fato, esta Corte Superior fixou entendimento no sentido de que “é possível considerar conjuntamente, para efeito do cálculo do limite legal relativo às doações eleitorais, os rendimentos brutos anuais do doador e esposa, desde que o regime do casamento seja o da comunhão universal de bens" (AgR-AI n° 36-23/RS, Rel. Min. Laurita Vaz, DJe de 24.3.2014). [...] Percebe-se, porém, que, no caso concreto, o casal adotou o regime de comunhão parcial de bens em seu matrimônio, motivo pelo qual não há como defender a aplicação de tal precedente a fim de considerar a soma de seus rendimentos como parâmetro de cálculo do limite legal da doação. Em sentido contrário, em caso de comunhão parcial de bens, o presente Tribunal Superior firmou o seguinte entendimento: ELEIÇÕES 2012. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL. CARGO. PREFEITO. VICE-PREFEITO. DOAÇÃO DE RECURSOS ACIMA DO LIMITE LEGAL. PESSOA NATURAL. IMPOSSIBILIDADE DE CONJUGAÇÃO DOS RENDIMENTOS DO CASAL. REGIME DE COMUNHÃO PARCIAL DE BENS. LIMITE DE 10% SOBRE O RENDIMENTO BRUTO, ISOLADAMENTE CONSIDERADO, AUFERIDO NO ANO ANTERIOR AO DA ELEIÇÃO. ART. 23, § 1º, I, DA LEI Nº 9.504/97. DECISÃO MANTIDA POR SEUS PRÓPRIOS FUNDAMENTOS. DESPROVIMENTO. 1. A conjugação dos rendimentos do casal, para fins de verificação do limite de doação de campanha eleitoral, apenas é admitida na hipótese de regime de comunhão universal. 2. In casu, o TRE/PR consignou que os cônjuges adotaram regime de comunhão parcial de bens, nestes termos (fls. 377): "Dilamar José Rodrigues da Silva extrapolou o limite legal, pois sua doação de R$ 51.000,00 não se encontra no limite de 10% a que se refere a legislação eleitoral, já que sua esposa teve rendimentos de R$ 17.530,00 (fls. 199), que somados aos seus rendimentos, considerando que é casado em regime de comunhão parcial (fls. 207), no montante de R$ 158.706,49 (fls. 197), totalizam a quantia de R$ 176.236,49". 3. Ademais, a única jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral colacionada pelos Agravantes, a fls. 621, versa sobre a possibilidade de comunicação dos bens do casal, para servir de base de cálculo para as doações de campanha, que esteja submetido ao regime de comunhão universal de bens. 4. Agravo regimental desprovido. (AgR-REspe n° 456-63/RS, rel. Min. Luiz Fux, DJe de 2.10.2015 - grifei) Nesse sentido, incorreto o posicionamento do tribunal que aplicou a possibilidade de admitir a conjugação dos rendimentos do casal para estabelecer o limite de doação de campanha eleitoral. (Grifei.)

As decisões acima citadas transitaram em julgado em 25.11.2016 e 15.02.2017, respectivamente, consoante o Sistema de Acompanhamento de Documentos e Processos desta especializada.

Em abril de 2017 o Tribunal Superior Eleitoral manifestou-se novamente sobre a matéria, dessa vez de forma colegiada, mantendo o mesmo entendimento:

ELEIÇÕES 2014. AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL. REPRESENTAÇÃO. DOAÇÃO ACIMA DO LIMITE LEGAL. PESSOA FÍSICA. SOMA DOS RENDIMENTOS BRUTOS DO CASAL PARA AFERIR LIMITE DE DOAÇÃO. INADMISSIBILIDADE. UNIÃO ESTÁVEL. AUSÊNCIA DE PROVA DE CONTRATO ESCRITO EM SENTIDO DIVERSO. COMUNHÃO PARCIAL DE BENS. REEXAME. SÚMULA Nº 24/TSE. PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE E DA RAZOABILIDADE. INAPLICABILIDADE. DESPROVIMENTO.

1. Este Tribunal Superior já asseverou que não há como ser atendida a pretensão de se considerar a soma de rendimentos de casal convivente em união estável como parâmetro para cálculo do limite legal da doação, tal qual se observa no casamento no regime da comunhão parcial, salvo nas hipóteses de contrato escrito estabelecido entre as partes em sentido diverso.

2. A análise dos rendimentos que deram origem à doação, se derivados de patrimônio comum ou de proventos do trabalho, exigiria necessariamente o reexame do conjunto fático-probatório, providência incabível na via especial, nos termos da Súmula nº 24/TSE.

3. Os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade não podem ser invocados para justificar a improcedência do pedido condenatório ou a fixação da sanção abaixo de seu mínimo legal, nos termos da reiterada jurisprudência desta Corte Superior.

4. Agravo regimental desprovido.

(Recurso Especial Eleitoral n. 4516, Acórdão, Relatora Min. LUCIANA LÓSSIO, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Data 27.4.2017) (Grifei.)

Na mesma linha, o seguinte precedente daquela Corte Superior:

ELEIÇÕES 2012. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL. CARGO. PREFEITO. VICE-PREFEITO. DOAÇÃO DE RECURSOS ACIMA DO LIMITE LEGAL. PESSOA NATURAL. IMPOSSIBILIDADE DE CONJUGAÇÃO DOS RENDIMENTOS DO CASAL. REGIME DE COMUNHÃO PARCIAL DE BENS. LIMITE DE 10% SOBRE O RENDIMENTO BRUTO, ISOLADAMENTE CONSIDERADO, AUFERIDO NO ANO ANTERIOR AO DA ELEIÇÃO. ART. 23, § 1º, I, DA LEI Nº 9.504/97. DECISÃO MANTIDA POR SEUS PRÓPRIOS FUNDAMENTOS. DESPROVIMENTO.

1. A conjugação dos rendimentos do casal, para fins de verificação do limite de doação de campanha eleitoral, apenas é admitida na hipótese de regime de comunhão universal.

2. In casu, o TRE/PR consignou que os cônjuges adotaram regime de comunhão parcial de bens, nestes termos (fls. 377): "Dilamar José Rodrigues da Silva extrapolou o limite legal, pois sua doação de R$ 51.000,00 não se encontra no limite de 10% a que se refere a legislação eleitoral, já que sua esposa teve rendimentos de R$ 17.530,00 (fls. 199), que somados aos seus rendimentos, considerando que é casado em regime de comunhão parcial (fls. 207), no montante de R$ 158.706,49 (fls. 197), totalizam a quantia de R$ 176.236,49".

3. Ademais, a única jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral colacionada pelos Agravantes, a fls. 621, versa sobre a possibilidade de comunicação dos bens do casal, para servir de base de cálculo para as doações de campanha, que esteja submetido ao regime de comunhão universal de bens.

4. Agravo regimental desprovido.

(Agravo Regimental em Recurso Especial Eleitoral n. 45663, Acórdão de 24.3.2015, Relator Min. LUIZ FUX, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Tomo 188, Data 02.10.2015, Páginas 29-30.) (Grifei.)

Aludido precedente, aliás, serviu de parâmetro para o julgamento do RE 390-69, em julho de 2017, da lavra do Des. João Batista Pinto Silveira, com igual conclusão e cuja ementa ora transcrevo:

RECURSO. PRESTAÇÃO DE CONTAS. VEREADOR. ARRECADAÇÃO SEM A IDENTIFICAÇÃO DO CPF DO DOADOR. EMPRÉSTIMOS PESSOAIS DE FAMILIARES. CONTABILIZAÇÃO COMO RECURSOS PRÓPRIOS. DISCREPÂNCIA ENTRE OS PAGAMENTOS EM ESPÉCIE E OS REGISTROS NOS EXTRATOS BANCÁRIOS. RESOLUÇÃO TSE N. 23.463/15. RECOLHIMENTO DE VALORES AO TESOURO NACIONAL. DESAPROVAÇÃO. ELEIÇÃO 2016.

1. Preliminares. 1.1) Incabível a atribuição de efeito suspensivo a recurso que versa sobre prestação de contas. Art. 257, § 2º, do Código Eleitoral; 1.2) Plausível a apresentação de documentos em grau recursal, nos termos do art. 266 do Código Eleitoral.

2. Mérito. Arrecadação de valores sem a identificação pelo CPF do doador, em contrariedade à Resolução TSE n. 23.463/15.

3. O valor de R$ 22.711,58 é expressivo diante do montante arrecadado na campanha, razão pela qual deve ser recolhido ao Tesouro Nacional.

4. Discrepância entre os saques registrados nos extratos bancários e os valores pagos em espécie. Violação ao art. 34 da Resolução TSE n. 23.463/15.

5. Desprovimento. Manutenção do juízo de desaprovação das contas e da determinação de recolhimento do valor ao Tesouro Nacional.

(TRE-RS – RE 390-69 – Relator DES. FEDERAL JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA – J. Sessão de 18.7.2017)

Assim, com o devido respeito às decisões em sentido contrário deste Regional – e por mais sedutora que possa ser a tese de comunicabilidade dos rendimentos do casal –, tenho por bem alinhar-me ao reiterado entendimento do TSE que vem, de modo contumaz, reformando decisões deste e de outros Regionais, valendo o entendimento, portanto, de que só se comunicam as rendas no regime de comunhão universal de bens.

Por outro lado, também não socorre o recorrente a alegação de que teria havido equívoco na emissão do recibo eleitoral (n. 00013118961RS000010E, fl. 07), vez que, se a intenção era de que cada cônjuge doasse 50%, deveriam ter realizado doações distintas, transferidas eletronicamente das respectivas contas-correntes, não da forma como foi feita.

A alegação, a seu turno, de que a doação não teve o condão de interferir na legitimidade do pleito não retira a ilicitude da doação, pois se trata de norma de caráter objetivo a qual pura e simplesmente limita as doações a dez por cento dos rendimentos obtidos no ano anterior ao da eleição, sem espaço para análises subjetivas.

Quanto à aplicação retroativa das alterações legislativas promovidas pela Lei n. 13.488/17, publicada em 06.10.2017, destaco que esta Corte já se manifestou, seguindo a diretriz jurisprudencial firmada pelo TSE, no sentido da sua impossibilidade, conforme se verifica na ementa a seguir transcrita:

RECURSO. REPRESENTAÇÃO. DOAÇÃO DE RECURSOS PARA CAMPANHA ELEITORAL ACIMA DO LIMITE LEGAL. PESSOA FÍSICA. ELEIÇÕES 2014. PRELIMINAR AFASTADA. NÃO CARACTERIZADA A INÉPCIA DA INICIAL. MÉRITO. CONFIGURADO O EXCESSO NO VALOR DOADO. CONTROVÉRSIA SOBRE A SANÇÃO APLICÁVEL. ALTERAÇÃO DA PENALIDADE PELA LEI N. 13.488/17. IRRETROATIVIDADE. PRINCÍPIO "TEMPUS REGIT ACTUM".

ADEQUADA A MULTA APLICADA NA SENTENÇA. DESPROVIMENTO.

1. Preliminar afastada. Inicial em regular condição de ser analisada. Dados supostamente omitidos estão referenciados nos documentos que instruem a peça. A falta da precisa descrição do valor excedido apenas pode ser suprida durante a instrução probatória, não havendo mácula na inicial. Inépcia da petição não caracterizada.

2. Mérito. A doação realizada por pessoa física restringe-se a dez por cento dos rendimentos brutos auferidos no ano anterior ao da eleição, nos termos do art. 23, § 1º, inc. I, da Lei n. 9.504/97. Caracterizada a infringência ao parâmetro legal.

3. Penalidade. Controvérsia sobre a sanção adequada. Inaplicabilidade da Lei n. 13.488/17 aos processos de exercícios anteriores a sua vigência, em prestígio à lei vigente à época dos fatos e ao princípio da segurança jurídica. Irretroatividade. Aplicação do princípio "tempus regit actum". Mantida a condenação imposta na sentença, de acordo com a penalidade prevista na época dos fatos. Provimento negado.

(TRE-RS – RE n 2115 – Relator DR. JAMIL ANDRAUS HANNA BANNURA – DEJERS de 22.01.2018) (Grifei.)

Por essa razão, entendo que o feito merece idêntico tratamento, devendo ser mantida a condenação imposta na sentença, de acordo com a sanção prevista para as doações acima do limite legal realizadas na época dos fatos, sem aplicação retroativa da Lei n. 13.488/17.

Em matéria de doação acima do limite legal, há acórdãos do TSE que são expressos em assentar que a penalidade aplicável no processo é aquela vigente ao tempo da doação, por força do princípio de que o tempo rege o ato. Nessa inteligência, a Corte Superior Eleitoral não acolheu o pedido de afastamento da pena de multa por doação excessiva de pessoas jurídicas, realizada no pleito de 2014, em face do advento da Lei n. 13.165/15.

Referido diploma legal, ao excluir das hipóteses de doação para campanha os recursos repassados por empresas, suprimiu da Lei das Eleições a sanção até então prevista, de multa no patamar de cinco vezes a quantia excedida. Segundo o TSE “a revogação do art. 81 da Lei n. 9.504/97 não alcança as doações realizadas em eleições anteriores à Lei n. 13.165/15, não havendo falar em retroatividade da lei mais benéfica”.

Portanto, dentro desse contexto, no caso concreto, a manutenção da sentença subjacente é medida que se impõe.

Dispositivo

Diante do exposto, afastada a matéria preliminar, VOTO pelo desprovimento do recurso interposto por EDISON ROBERTO DEMARCO, mantendo a condenação ao pagamento de multa no valor de R$ 7.911,30 (sete mil, novecentos e onze reais e trinta centavos), correspondente a cinco vezes a quantia doada em excesso, nos termos do disposto no art. 23 da Lei n. 9.504/97, vigente à época da doação.