RE - 1656 - Sessão: 26/09/2018 às 16:00

RELATÓRIO

Trata-se de recurso interposto pelo PARTIDO REPUBLICANO BRASILEIRO (PRB) de Porto Alegre contra sentença que desaprovou as contas da agremiação, referentes à movimentação financeira do exercício de 2015, em virtude do recebimento de valores oriundos de fontes vedadas, determinando o recolhimento de R$ 56.939,70 ao Tesouro Nacional e a suspensão do repasse de quotas do Fundo Partidário por 08 meses.

Em sua irresignação (fls. 253-260), sustenta que a lista de servidores comissionados obtida da prefeitura inclui não apenas cargos de chefia e direção, mas também de assessoramento, sendo lícita a doação proveniente deste último. Elenca doadores que ocupam cargos desprovidos de atribuições diretivas. Requer a reforma da sentença.

Nesta instância, os autos foram com vista à Procuradoria Regional Eleitoral, que opinou pelo desprovimento do recurso (fls. 269-274).

É o relatório.

VOTO

No mérito, trata-se de prestação de contas relativa ao exercício de 2015 e, antes de adentrar no fato ensejador da desaprovação, cumpre registrar que as questões de direito material são reguladas pela Resolução TSE n. 23.432/14 e as de direito processual são disciplinadas pela Resolução TSE n. 23.464/15, tal como estabelece o art. 65 deste último diploma normativo.

Feito esse registro, as contas foram desaprovadas devido à arrecadação de recursos no total de R$ 56.939,70 de fonte vedada, pois provenientes de detentores de cargos demissíveis ad nutum com atribuição de chefia e direção, os quais são considerados autoridades públicas para fins do disposto no art. 31, inc. II, da Lei n. 9.096/95:

Art. 31. É vedado ao partido receber, direta ou indiretamente, sob qualquer forma ou pretexto, contribuição ou auxílio pecuniário ou estimável em dinheiro, inclusive através de publicidade de qualquer espécie, procedente de:

II - autoridade ou órgãos públicos, ressalvadas as dotações referidas no art. 38

O alcance da vedação é esclarecido pelo art. 12, § 2º, da Resolução TSE n. 23.432/14, o qual refere expressamente os detentores de cargos de chefia ou direção na administração pública direta ou indireta:

Art. 12.

§ 2º. Consideram-se como autoridades públicas, para os fins do inciso XII do caput deste artigo, aqueles, filiados ou não a partidos políticos, que exerçam cargos de chefia ou direção na administração pública direta ou indireta.

O conceito de autoridade pública constante no dispositivo acima foi definido pelo egrégio Tribunal Superior Eleitoral mediante a Resolução n. 22.585/07, editada em razão da resposta à Consulta n. 1428, cuja ementa segue:

Partido político. Contribuições pecuniárias. Prestação por titulares de cargos demissíveis ad nutum da administração direta ou indireta. Impossibilidade, desde que se trate de autoridade.

Resposta à consulta, nesses termos. Não é permitido aos partidos políticos receberem doações ou contribuições de titulares de cargos demissíveis ad nutum da administração direta ou indireta, desde que tenham a condição de autoridades.

(CONSULTA n. 1428, Resolução n. 22585 de 06.09.2007, Relator Min. JOSÉ AUGUSTO DELGADO, Relator designado Min. ANTONIO CESAR PELUSO, Publicação: DJ – Diário de Justiça, Data 16.10.2007, Página 172.) (Grifei.)

Reproduzo trechos extraídos do referido acórdão, que bem explicitam a decisão:

[…] podemos concluir que os detentores de cargos demissíveis ad nutum da administração direta ou indireta da União, e por via reflexa os dos Estados e dos Municípios, são considerados autoridade pública, ante a natureza jurídica dos cargos em comissão, bem como das atividades dele decorrentes.

O recebimento de contribuições de servidores exoneráveis ad nutum pelos partidos políticos poderia resultar na partidarização da administração pública. Importaria no incremento considerável de nomeação de filiados a determinada agremiação partidária para ocuparem esses cargos, tornando-os uma força econômica considerável direcionada aos cofres desse partido.

Esse recebimento poderia quebrar o equilíbrio entre as agremiações partidárias. Contraria o princípio da impessoalidade, ao favorecer o indicado de determinado partido, interferindo no modo de atuar da administração pública. Fere o princípio da eficiência, ao não privilegiar a mão-de-obra vocacionada para as atividades públicas, em detrimento dos indicados políticos, desprestigiando o servidor público. Afronta o princípio da igualdade, pela prevalência do critério político sobre os parâmetros da capacitação profissional.

[…]

(...) Estamos dando interpretação dilatada. Estamos dizendo que autoridade não é somente quem chefia órgão público, quem dirige entidade, o hierarca maior de um órgão ou entidade. Estamos indo além: a autoridade é também o ocupante de cargo em comissão que desempenha função de chefia e direção.

[…]

Está claro. A autoridade não pode contribuir. Que é a autoridade? É evidente que o hierarca maior de um órgão ou entidade já não pode contribuir, autarquia, empresa pública, sociedade de economia mista, e, além disso, os ocupantes de cargo em comissão.

[…]

As autoridades não podem contribuir. E, no conceito de autoridade, incluímos, de logo, nos termos da Constituição, os servidores que desempenham função de chefia e direção. É o artigo 37, inciso V.

[…]

O Tribunal responde à consulta apontando que não pode haver a doação por detentor de cargo de chefia e direção.

O recorrente sustenta que nem todos os doadores exercem cargos de efetiva chefia ou direção, atribuindo aos doadores por ele nominados o exercício de funções de mero assessoramento, esses sim autorizados a realizar doações. Argumenta que a lista na qual se baseou o parecer técnico está equivocada, pois inclui, também, cargos de assessoria.

A lista de cargos de direção e chefia foi extraída do sistema PRESTCON e alimentada a partir de resposta obtida diretamente da Prefeitura e da Câmara de Vereadores de Porto Alegre a ofícios encaminhados pelo juízo de primeiro grau com a solicitação de lista de pessoas “que exerçam cargos de chefia ou direção” durante o ano de 2015 (fls. 175-176).

Assim, não há evidência de equívocos na formação da lista de doadores irregulares. As fontes são os próprios órgãos públicos em que atuaram, que responderam solicitação limitada expressamente aos detentores de cargos de chefia e direção. Assim, presume-se a veracidade das informações que subsidiaram a análise técnica, competindo ao recorrente demonstrar o engano na formação da lista.

Ocorre que o recorrente não logrou comprovar a alegada inconsistência das informações colhidas perante os órgãos públicos.

O partido limita-se a discorrer sobre as atribuições dos cargos ocupados pelos doadores, sem juntar descrição oficial das responsabilidades de seus ocupantes. Com a mera informação, sem documentos aptos a demonstrar a veracidade das alegações, não há como afastar a correção dos apontamentos técnicos.

O fato de a agremiação recorrente não integrar mais a administração municipal não a impede de obter informações sobre as atribuições legais dos cargos, pois trata-se de informação pública, acessível a qualquer interessado. Ademais, dentre os doadores irregulares, há ocupantes de cargos no legislativo municipal, o qual possui representantes do partido recorrente, mas também em relação a esses cargos não foi apresentada descrição legal de suas atribuições.

Soma-se à presunção de veracidade das informações – não afastada por provas em sentido contrário – a simples denominação dos cargos, que denota o exercício natural de poder hierárquico e de gerência, próprios dos cargos de chefia e direção. Dentre essas denominações, pode-se citar os cargos de “Gerente de Projetos” (fl. 107), “Supervisor de Gabinete” (fl. 109), “Coordenador” (fl. 113), “Chefe de Serviço” (fl. 117) e “Secretário Adjunto” (fl. 121).

Dessa forma, o recorrente não apresentou argumentos e provas capazes de afastar a veracidade das informações utilizadas pelo parecer técnico, mostrando-se correta a sentença que reconheceu como fonte vedada o montante de R$ 56.939,70.

Correto, também, o período de suspensão de novos repasses do Fundo Partidário, fixado pelo juízo de primeiro grau em 08 meses, pois mostra-se proporcional ao percentual que a irregularidade representa frente ao total de receitas obtidas em 2015: 67,5%.

Ante todo o exposto, VOTO pelo desprovimento do recurso, mantendo íntegra a sentença recorrida.