RE - 960 - Sessão: 05/10/2018 às 16:00

RELATÓRIO

Trata-se de recurso interposto pelo PARTIDO DO MOVIMENTO DEMOCRÁTICO BRASILEIRO de Toropi contra sentença que desaprovou suas contas referentes à movimentação financeira do exercício de 2015, em virtude do recebimento de doações de fonte vedada, consoante o disposto no art. 12, XII, da Resolução TSE n. 23.432/14, determinando o recolhimento ao Tesouro Nacional do valor de R$ 5.049,38 e a suspensão, com perda, de novas quotas do Fundo Partidário, pelo prazo de 3 (três) meses, a partir da data de publicação da decisão (fls. 161-165v).

Em sua irresignação (fls. 169-174), o recorrente requer que o processo seja suspenso, até que o Supremo Tribunal Federal julgue a Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 5.494. No mérito, pugna pelo provimento do recurso, para que sejam julgadas as contas regulares, ao argumento de que os doadores ocupantes de cargos comissionados e de chefia não detinham poder de autoridade. Além disso, alega que as doações eram realizadas diretamente ao diretório municipal partidário e que consubstanciavam ato de liberalidade, não se vinculando ao exercício do cargo. Subsidiariamente, requer a redução do valor a ser devolvido ao Tesouro Nacional e do período de suspensão do Fundo Partidário.

O Ministério Público Eleitoral não interpôs recurso contra a sentença.

Nesta instância, os autos foram com vista à Procuradoria Regional Eleitoral, que opinou pelo desprovimento do recurso (fls. 184-190).

É o relatório.

 

VOTO

O recurso é tempestivo. A decisão foi publicada no dia 27 de março de 2018 (fl. 166) e a interposição ocorreu na data de 2 de abril de 2018 (fl. 169), dentro do prazo previsto pelo art. 258 do Código Eleitoral.

Relativamente à preliminar de suspensão do processo até que o Supremo Tribunal Federal julgue a ADI n. 5.494, resta prejudicada sua análise, porquanto publicada no DJe n. 119/2018, em 15.6.2018, a decisão proferida pelo Relator, Ministro Luiz Fux, que extinguiu o processo, sem resolução de mérito, por perda de objeto.

No mérito, as contas da agremiação recorrente foram desaprovadas em razão do recebimento de recursos provenientes de fonte vedada, no valor de R$ 5.049,38, consistente em doações de pessoas ocupantes de cargos de chefia e direção na Prefeitura de Toropi.

Correta a decisão recorrida. O art. 12, inc. XII, da Resolução TSE n. 23.432/14 veda o recebimento de doações procedentes de autoridades públicas, como se verifica por seu expresso teor:

Art. 12. É vedado aos partidos políticos e às suas fundações receber, direta ou indiretamente, sob qualquer forma ou pretexto, doação, contribuição ou auxílio pecuniário ou estimável em dinheiro, inclusive por meio de publicidade de qualquer espécie, procedente de:

[…]

XII – autoridades públicas; 

(...)

§ 2º Consideram-se como autoridades públicas, para os fins do inciso XII do caput deste artigo, aqueles, filiados ou não a partidos políticos, que exerçam cargos de chefia ou direção na administração pública direta ou indireta.

[…]

No conceito de autoridade pública prevista no artigo referido inserem-se os detentores de cargos em comissão que desempenham função de chefia ou direção, conforme assentou o egrégio Tribunal Superior Eleitoral, com a Resolução n. 22.585/07, editada em razão da resposta à Consulta n. 1.428, cuja ementa segue:

Partido político. Contribuições pecuniárias. Prestação por titulares de cargos demissíveis ad nutum da administração direta ou indireta. Impossibilidade, desde que se trate de autoridade.

Resposta à consulta, nesses termos. Não é permitido aos partidos políticos receberem doações ou contribuições de titulares de cargos demissíveis ad nutum da administração direta ou indireta, desde que tenham a condição de autoridades.

(CONSULTA n. 1428, Resolução n. 22.585, de 06.9.2007, Relator(a) Min. JOSÉ AUGUSTO DELGADO, Relator designado Min. ANTONIO CESAR PELUSO, Publicação: DJ – Diário de Justiça, Data 16.10.2007, Página 172.) (Grifei.)

Reproduzo trechos extraídos do referido acórdão, que bem explicitam a decisão:

[…] podemos concluir que os detentores de cargos demissíveis ad nutum da administração direta ou indireta da União, e por via reflexa os dos Estados e dos Municípios, são considerados autoridade pública, ante a natureza jurídica dos cargos em comissão, bem como das atividades dele decorrentes.

O recebimento de contribuições de servidores exoneráveis ad nutum pelos partidos políticos poderia resultar na partidarização da administração pública. Importaria no incremento considerável de nomeação de filiados a determinada agremiação partidária para ocuparem esses cargos, tornando-os uma força econômica considerável direcionada aos cofres desse partido.

Esse recebimento poderia quebrar o equilíbrio entre as agremiações partidárias. Contraria o princípio da impessoalidade, ao favorecer o indicado de determinado partido, interferindo no modo de atuar da administração pública. Fere o princípio da eficiência, ao não privilegiar a mão-de-obra vocacionada para as atividades públicas, em detrimento dos indicados políticos, desprestigiando o servidor público. Afronta o princípio da igualdade, pela prevalência do critério político sobre os parâmetros da capacitação profissional.

[…]

(...) Estamos dando interpretação dilatada. Estamos dizendo que autoridade não é somente quem chefia órgão público, quem dirige entidade, o hierarca maior de um órgão ou entidade. Estamos indo além: a autoridade é também o ocupante de cargo em comissão que desempenha função de chefia e direção.

[…]

Está claro. A autoridade não pode contribuir. Que é a autoridade? É evidente que o hierarca maior de um órgão ou entidade já não pode contribuir, autarquia, empresa pública, sociedade de economia mista, e, além disso, os ocupantes de cargo em comissão.

[…]

As autoridades não podem contribuir. E, no conceito de autoridade, incluímos, de logo, nos termos da Constituição, os servidores que desempenham função de chefia e direção. É o artigo 37, inciso V.

[…]

O Tribunal responde à consulta apontando que não pode haver a doação por detentor de cargo de chefia e direção.

Sustenta o recorrente que as doações consideradas de fontes vedadas pelo juiz eleitoral de primeiro grau foram lícitas, pois os doadores eram desprovidos de poder de autoridade, uma vez que não desempenhavam “funções atinentes a administração, gestão e ordenação de despesas, funções estas que não perfazem a natureza destes cargos na administração pública municipal”.

O magistrado de piso bem analisou a questão em sua sentença:

Inicialmente anoto que este juízo indeferiu a oitiva dos doadores pois as atribuições dos cargos públicos, e seu enquadramento na definição de autoridade, podem ser cotejados com a Lei Municipal n. 002-97/2000 que dispõe sobre os quadros de cargos e funções da Prefeitura de Toropi, constante nas fls. 131/140.

A definição de autoridade aqui tratada é fixada no art. 12, inc. XII, da Resolução TSE n. 23.432/2014, aplicável ao exercício financeiro destas contas:

[…]

O texto é por demais evidente. Diretor e Chefe dirigem e chefiam pessoas e equipes, ou seja, têm pessoas sob sua subordinação, supervisão e controle.

Assim também é a forma como a Lei Municipal n. 002-97/2000 escalona os cargos em comissão (CC) e funções gratificadas (FG) na fl. 135, fixando o cargo de Secretário no topo da classificação e sob sua supervisão os cargos de diretor e chefe, variando conforme a secretaria.

Além disso, na descrição das atribuições (fls. 135v/140/) de todos os cargos listados no parecer do examinador (fls. 88/95) é possível constatar os termos: supervisionar, coordenar, gerenciar, planejar, autorizar, entre outros que definem o nível de autoridade que o cargo encerra e o diferencia de quem somente cumpre as ordens emitidas.

Assim, não merece acolhida o argumento do prestador pois os cargos apontados como fonte vedada enquadram-se perfeitamente na definição da norma.

Assim, razão não assiste ao recorrente. Restou comprovado que as doações foram realizadas por agentes públicos que detinham ascendência hierárquica sobre outros servidores, pois ocupavam cargos em comissão de diretoria, chefia, supervisão, inclusive o de Subprefeito (fls. 88-95; 132-140v.), conforme segue: Diretor de Patrimônio e Licitações, Diretor de Projetos, Diretor de Trânsito, Diretor de Compras, Chefe de Gabinete, Chefe de Obras, Chefe de Inspetoria, Chefe de Arrecadação, Chefe de Oficina, Chefe de Departamento de Pessoal, Chefe de Almoxarifado, Chefe do Posto de Saúde, Supervisor da SMEC e Subprefeito.

De igual modo, não prospera a argumentação tecida pelo recorrente no sentido de que a doação por ocupantes de cargos em comissão, por consistir em liberalidade, não seria vedada.

Ora, se não se tratasse de liberalidade, doação não seria, e a norma é precisa e clara ao proibir “doação” aos “partidos políticos” procedente de “autoridades públicas”, definidas tais como aquelas que “exerçam cargos de chefia ou direção na administração pública direta ou indireta”.

Relativamente à alegação de que não constitui infração eleitoral a doação de autoridade pública a diretório municipal de agremiação partidária, quando realizada diretamente àquele, também não merece prosperar, por ausência de qualquer amparo jurídico ou lógico. O diretório municipal é um órgão partidário, ou seja, jamais perde a condição de partido político, sendo-lhe vedado o recebimento de doação oriunda de autoridade. Ademais, dispõe o § 3º do art. 12 da Resolução TSE n. 23.432/14:

§ 3º As vedações previstas neste artigo atingem todos os órgãos partidários, inclusive suas fundações, observado o disposto no § 2º do art. 20 desta resolução.

(Grifei.)

Indene de dúvida, pois, que não são permitidas doações oriundas de autoridades públicas diretamente a órgãos partidários municipais, como ocorreu no caso em exame.

O recebimento de recursos de fonte vedada constitui, a teor do art. 14, § 3º, da Resolução TSE n. 23.432/14, irregularidade grave. Imperiosa, assim, a desaprovação das contas partidárias.

No tocante ao pedido subsidiário de que seja reduzido o valor a ser devolvido pelo PMDB de Toropi ao Tesouro Nacional, em virtude de nem todos os agentes municipais que figuraram na tabela produzida pela unidade técnica junto ao juízo de primeiro grau (fl. 75) caracterizarem-se como autoridade, a exemplo de assessores ali relacionados, melhor sorte não socorre o recorrente.

Na tabela da fl. 75 dos autos constam, efetivamente, assessores que realizaram doações ao partido político. Contudo, mais adiante, nas fls. 96 e 97, o examinador reconhece o equívoco daquele lançamento e desconta do valor total anterior (R$ 6.719,12) a quantia de R$ 1.707,91, referente às doações oriundas de tais assessores, resultando no montante final de R$ 5.049,38, apontado na sentença como de fonte vedada.

Deve, assim, ser mantido o valor cujo recolhimento ao Tesouro Nacional foi determinado na sentença, pois todo ele consistiu em recurso oriundo de fonte vedada.

Quanto ao outro pedido subsidiário, de redução do número de meses em que o partido deve ficar sem receber quotas do Fundo Partidário, não merece, da mesma forma, ser acolhido.

O PMDB de Toropi arrecadou o total de R$ 21.124,05, dos quais R$ 5.049,38 são oriundos de fonte vedada, o que representa aproximadamente 23,90% dos recursos arrecadados durante todo o exercício de 2015.

Verifica-se, por conseguinte, que a irregularidade das contas alcançou proporção próxima de um quarto da receita total do partido político.

Assim, em um juízo de razoabilidade e proporcionalidade, a suspensão de recebimento de novas quotas do Fundo Partidário pelo prazo de três meses, como imposta na sentença, afigura-se adequada.

Ante todo o exposto, afasto a matéria preliminar e VOTO pelo desprovimento do recurso.