RE - 841 - Sessão: 25/07/2018 às 17:00

RELATÓRIO

Cuida-se de impugnação de indeferimento de transferência de domicílio eleitoral de MARIZETE IZABEL BRANDELERO DA VEIGA recebida como recurso da eleitora.

A recorrente sustenta que deseja a transferência do domicílio eleitoral de Santa Rosa para Santo Cristo em razão do interesse em participar de torneio de futebol que exige que os atletas sejam residentes em determinados municípios. Argumenta que mantém vínculos familiares em Santo Cristo, participa do futebol feminino na localidade e lá reside com o sogro, tendo apresentado documentos comprobatórios nesse sentido (fl. 02).

Nesta instância, os autos foram encaminhados à Procuradoria Regional Eleitoral, que opinou pelo desprovimento do recurso (fls. 36-40v.).

É o relatório.

VOTO

O recurso é tempestivo pois interposto no prazo de 05 dias previsto no § 5º do art. 18 da Resolução TSE n. 21.538/03.

No mérito, os arts. 42, parágrafo único, e 55, inc. III, do Código Eleitoral, assim dispõem sobre o domicílio eleitoral:

Art. 42. O alistamento se faz mediante a qualificação e inscrição do eleitor.

Parágrafo único. Para o efeito da inscrição, é domicílio eleitoral o lugar de residência ou moradia do requerente, e, verificado ter o alistando mais de uma, considerar-se-á domicílio qualquer delas.

(...)

Art. 55. Em caso de mudança de domicílio, cabe ao eleitor requerer ao Juiz do novo domicílio sua transferência, juntando o título anterior.

§ 1º A transferência só será admitida satisfeitas as seguintes exigências:

I - entrada do requerimento no cartório eleitoral do novo domicílio até 100 (cem) dias antes da data da eleição.

II - transcorrência de pelo menos 1 (um) ano da inscrição primitiva;

III - residência mínima de 3 (três) meses no novo domicílio, atestada pela autoridade policial ou provada por outros meios convincentes.

Na hipótese, estão demonstrados os requisitos necessários à transferência do domicílio eleitoral, tendo presente que os conceitos de domicílio eleitoral e civil não se confundem.

Observo que a recorrente demonstrou possuir vínculos com o município de Santo Cristo ao colacionar declaração autenticada em cartório assinada por seu sogro, João Batista dos Santos de Carvalho, dando conta que possui residência na localidade (fl. 18). Juntou também documento que comprova o domicílio do sogro (fl. 24).

Da mesma forma, a eleitora trouxe aos autos o regulamento do “Encontro Esportivo de Integração Internacional Pioneiro Carlos Culmey” (fls. 03-17), que comprova a justificativa de necessidade de prova de domicílio mediante apresentação de título de eleitor para participação como atleta no evento. Tal encontro, conforme informações obtidas em https://bit.ly/2MOKIuO (acesso em 04.7.2018), tem como objetivo desenvolver o intercâmbio esportivo entre comunidades catarinenses, gaúchas e argentinas, fundadas ou idealizadas pelo mencionado colonizador.

Esclareço que o juiz eleitoral indeferiu a transferência solicitada em face de certidão (fl. 26) que dá conta de comparecimento de servidor da Justiça Eleitoral ao endereço mencionado no requerimento. Na visita, foi constatada a presença de João Batista dos Santos Carvalho, que “confirmou que a Eleitora mora no local, porém, encontrava-se no trabalho, em Santa Rosa, sendo funcionária do frigorífico ALIBEM” (sic), e que não seria possível “encontrá-la em casa antes das 20 horas”. Foi certificado, ainda, que “em contato com vizinhos, casas em frente e ao lado, todos alegam desconhecer Marizete, afirmam que apenas o sr. João Carvalho e sua família residem no local” (sic).

Tendo essas informações em conta, penso que a efetiva participação em atividade desportiva local, a constatação da residência do sogro da eleitora no endereço informado e a confirmação de sua relação com Marizete são suficientes para demonstrar a existência de vínculo familiar/afetivo da recorrente com o Município de Santo Cristo e a aptidão para participar da vida política daquela comunidade.

O domicílio eleitoral não exige residência permanente, caracteriza-se por vínculos afetivos, econômicos ou familiares no local, que evidenciem o interesse do cidadão em participar das decisões políticas locais. Nesse sentido, cite-se a doutrina de Carlos Velloso e Walber Agra:

O Código Eleitoral conceituou domicílio eleitoral como o lugar de residência ou de moradia do requerente, facultando-lhe a prerrogativa de escolher uma delas se houver mais de uma (art. 42, parágrafo único). A densidade substancial de seu termo expressa o lugar a que o eleitor tenha vínculos – políticos, sociais, profissionais, afetivos, patrimoniais – na circunscrição em que exerça seu direito de voto.

[…]

O domicílio civil não pode ser confundido com o eleitoral. Ambos apresentam conceituações díspares, não impedindo que uma pessoa tenha um domicílio eleitoral e outro civil.

(Elementos de Direito Eleitoral, Ed. Saraiva, 2ª ed, 2010, p. 149/150.)

A jurisprudência consolidou-se no mesmo sentido, admitindo como domicílio eleitoral o local onde o eleitor possua vínculos familiares, políticos, afetivos, sociais ou econômicos, como se extrai das seguintes ementas:

RECURSO ESPECIAL. TRANSFERÊNCIA DE DOMICÍLIO ELEITORAL. VÍNCULO POLÍTICO. SUFICIÊNCIA. PROVIMENTO.

1. A jurisprudência desta Corte se fixou no sentido de que a demonstração do vínculo político é suficiente, por si só, para atrair o domicílio eleitoral, cujo conceito é mais elástico que o domicílio no Direito Civil (AgR-AI nº 7286/PB, Rel. Min. Nancy Andrighi, DJE de 14.3.2013).

2. Recurso especial provido.

(TSE, REE n. 8551 - Maracanaú/CE. Acórdão de 08.4.2014. Relatora Min. Luciana Christina Guimarães Lóssio.)

Recurso. Transferência de domicílio eleitoral. Deferimento.

Afastada a preliminar de inépcia da inicial. Recebimento de petição nominada erroneamente mas protocolada dentro do prazo recursal.

É pacífico o entendimento de que o conceito de domicílio eleitoral não se confunde com o de domicílio civil. Mais flexível, admite-se como domicílio eleitoral o lugar em que o cidadão possua vínculos familiares, políticos, afetivos, sociais ou econômicos.

Comprovado o vínculo social e político do recorrido com o município. Inscrição eleitoral mantida.

Provimento negado.

(TRE/RS, Relatora Dra. Gisele Anne Vieira de Azambuja, DJE de 18.2.2016.)

Dessa forma, entendendo demonstrado o vínculo da eleitora ao Município de Santo Cristo, deve ser reconhecido o seu domicílio eleitoral na localidade.

Diante do exposto, VOTO pelo provimento do recurso para os fins de deferimento da transferência da inscrição eleitoral de MARIZETE IZABEL BRANDELERO DA VEIGA para o Município de Santo Cristo/RS.