RE - 3036 - Sessão: 13/11/2018 às 17:00

RELATÓRIO

Trata-se de recurso interposto pelo PARTIDO DOS TRABALHADORES (PT) de SANTO CRISTO, CLEITON JUVER e OTAVIO DE WALLAU contra a sentença que desaprovou a sua prestação de contas referente ao exercício financeiro de 2016, em razão do recebimento de recursos de fontes vedadas provenientes de autoridades, determinando a suspensão de repasse de quotas do Fundo Partidário por um ano e o recolhimento, ao Tesouro Nacional, da quantia de R$ 4.506,66, acrescida de multa de 5%.

Em suas razões, afirmam que as contribuições consideradas provenientes de fontes vedadas foram repassadas ao partido em virtude de suas disposições estatutárias, e invoca os arts. 5°, 7°, 14 e 15, todos da Lei dos Partidos Políticos. Sustentam que os doadores impugnados não se enquadram no conceito de autoridade objeto da vedação constante no art. 12, inc. IV, da Resolução TSE n. 23.464/15, pois realizam apenas assessoramento. Alegam ser lícitas as doações efetuadas por detentores de mandato eletivo, não sendo possível alargar a vedação legal. Requerem a aplicação das disposições previstas na Lei n. 13.488/17 quanto à possibilidade de doações de filiados e defendem ser proibidas apenas as contribuições de entes públicos e pessoas jurídicas. Postulam a reforma da sentença e a aprovação das contas (fls. 320-328).

A Procuradoria Regional Eleitoral manifestou-se pelo desprovimento do recurso (fls. 398-403).

É o relatório.

VOTO

O recurso é regular, tempestivo e comporta conhecimento.

No mérito, os recorrentes insurgem-se contra a conclusão sentencial de que caracterizam recebimento de recursos de fontes vedadas as contribuições realizadas por: Ari Bartolomeu Klatt (Diretor de Obras e Urbanismo), R$ 52,08; Arlei Carlos Moellmann (Vereador), R$ 1.919,52; Arno José Pies (Diretor Est. Rod. Trânsito), R$ 52,08; Cleiton Juver (Vereador), R$ 1.919,52; Gilberto Luis Junges (Diretor de Assistência Agrícola), R$ 52,08; Ivo Antônio Bohn Gass (Secretário Adj. Sec. Agricultura), R$60,76; João Marcelo Klein (Diretor de Compras e Licitação), R$ 26,04; Lino Lermen (Diretor de Oficina), R$ 60,76; Líria Bernadete Wagner Kist (Secretária Adj. da Saúde), R$ 43,40 e Cláudio Feiden (Vereador), R$ 320,42, no total de R$ 4.506,66.

As razões apresentadas merecem ser providas em parte, devendo ser consideradas legítimas as doações efetuadas por detentores de mandato eletivo.

Este Tribunal, na sessão de 06.12.2017, a partir dos julgamentos dos recursos RE n. 14-78 e RE n. 13-93, da relatoria do ilustre Desembargador Federal João Batista Pinto Silveira, decidiu rever a resposta à Consulta n. 109-98.

Nos julgamentos, foi assentada a possibilidade de ocupantes de mandato eletivo efetuarem contribuição a partido político, por não se enquadrarem no conceito de autoridade previsto no inc. II do art. 31 da Lei n. 9.096/95, sem as alterações introduzidas pela Lei n. 13.488/17, pois os termos do referido diploma legal somente podem ser considerados para os exercícios financeiros posteriores à sua vigência.

Em verdade não há, na legislação brasileira, a expressa previsão de que exercentes de mandato eletivo não possam doar para partidos políticos.

A toda evidência, o entendimento pela impossibilidade de recebimento de recursos de ocupantes de cargo eletivo parte de uma interpretação analógica de que tais doadores estariam na mesma posição dos servidores designados para ocupar cargo em comissão demissível ad nutum com poder de autoridade, ou seja, chefia, direção e coordenação, na Administração Pública direta ou indireta dos três Poderes, nas esferas federal, estadual ou municipal.

Essa interpretação extensiva do conceito de autoridade estabelecido na redação originária do inc. II do art. 31 da Lei dos Partidos Políticos viola os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade.

Ora, é da essência das pessoas que se filiam a partidos políticos, concorrem como candidatas e são alçadas a desempenhar mandato eletivo devido à vitória nas eleições (e não por nomeação no âmbito dos três Poderes), o direito de contribuir financeiramente para a legenda pela qual foram eleitas e cuja ideologia defendem e compartilham.

Com esses fundamentos, do valor considerado como oriundo de fonte vedada, no total de R$ 4.506,66, devem ser subtraídas as contribuições realizadas por vereadores, no montante de R$ 4.159,46.

Dessa forma, a quantia recebida de fontes vedadas durante o exercício é de R$ 347,20, a qual representa apenas 5,07% do total de receitas recebidas pela agremiação.

Essas contribuições são irregulares porque os doadores se enquadram no conceito de autoridade, por tratar-se de cargos de chefia e liderança, conforme previsão do art. 12, inc. XII e § 1º, da Resolução TSE n. 23.464/15.

No exercício financeiro de 2016, o recebimento de recursos provenientes de contribuições de servidores ocupantes de cargos demissíveis ad nutum com função de autoridade constitui violação à Resolução TSE n. 22.585/07 e ao art. 31, inc. II, da Lei n. 9.096/95, na redação vigente ao tempo do exercício.

Em 2007, no julgamento da Consulta n. 1428 (Resolução TSE n. 22.585/07), o Tribunal Superior Eleitoral assentou não ser permitido aos partidos políticos receberem doações ou contribuições de titulares de cargos demissíveis ad nutum da Administração direta ou indireta, quando ostentarem a condição de autoridades.

A questão, que até então estava abrangida pela ressalva prevista no § 1º do art. 5º da Resolução TSE n. 21.841/04, passou a ser regulada não apenas pela Resolução TSE n. 22.585/07, mas também pela Resolução TSE n. 23.077, de 04.6.2009.

O fato de haver previsão estatutária não afasta a vedação, merecendo ser consignado que a Resolução TSE n. 23.077/09 determinou que, durante as arrecadações dos exercícios financeiros seguintes, os partidos políticos observassem o entendimento firmado pelo TSE na Consulta n. 1428 (Resolução TSE n. 22.585/07) no que concerne à contribuição de filiados, tendo em conta a interpretação dada ao inc. II do art. 31 da Lei n. 9.096/95, que concluiu pela impossibilidade de doação de titulares de cargos de direção e chefia.

Por fim, o pedido de aplicação retroativa das alterações legislativas introduzidas na Lei dos Partidos Políticos pela Lei n. 13.488/17 não comporta provimento.

Este Tribunal, por ocasião do julgamento do RE 14-97.2016.6.21.0076, debateu a respeito da incidência imediata da alteração introduzida no art. 31 da Lei n. 9.096/95 pela Lei n. 13.488/17, que considera lícitas as doações advindas de ocupantes de cargos demissíveis ad nutum, desde que filiados a partido político, e entendeu pela aplicação da legislação vigente à época do exercício da prestação de contas.

Colaciono a ementa do referido julgado:

RECURSO. PRESTAÇÃO DE CONTAS ANUAL. PARTIDO POLÍTICO. EXERCÍCIO DE 2015. PRELIMINAR. MANUTENÇÃO DOS DIRIGENTES PARTIDÁRIOS NO POLO PASSIVO. ILEGITIMIDADE NÃO CONFIGURADA. MÉRITO. RECEBIMENTO DE DOAÇÕES DE FONTES VEDADAS. ALTERAÇÃO LEGISLATIVA. PERMITIDA A CONTRIBUIÇÃO DE FILIADOS. INAPLICABILIDADE AO CASO CONCRETO. APLICAÇÃO DA LEGISLAÇÃO VIGENTE À ÉPOCA DOS FATOS. PRINCÍPIO DA SEGURANÇA JURÍDICA. MANUTENÇÃO DO JUÍZO DE IRREGULARIDADE DA DOAÇÃO. REDUÇÃO DO PRAZO DE SUSPENSÃO DO RECEBIMENTO DAS QUOTAS DO FUNDO PARTIDÁRIO. PARCIAL PROVIMENTO.

1. Preliminar rejeitada. O art. 38 da Resolução TSE n. 23.432/14 prevê que deverá ser determinada a citação do órgão partidário e dos responsáveis para que ofereçam defesa sempre que houver impugnação ou constatação de irregularidade no parecer conclusivo. A integração dos dirigentes na lide é consectário da responsabilização prevista na Lei dos Partidos Políticos. Manutenção dos dirigentes partidários para integrarem o polo passivo. Ilegitimidade passiva afastada.

2. Constituem recursos oriundos de fontes vedadas as doações a partidos políticos realizadas por titulares de cargos demissíveis ad nutum da administração direta ou indireta que detenham condição de autoridades, vale dizer, que desempenhem função de direção ou chefia.

3. A Lei n. 13.488/17, publicada em 06.10.17, alterou a redação do art. 31 da Lei n. 9.096/95 - Lei dos Partidos Políticos -, excluindo a vedação de doação de pessoa física que exerça função ou cargo público demissível ad nutum, desde que filiada ao partido beneficiário.

4. Inaplicabilidade ao caso concreto. Incidência da legislação vigente à época dos fatos. Prevalência do princípio da segurança jurídica e da paridade de armas no processo eleitoral, em detrimento da aplicação pontual da retroatividade in bonam partem. Manutenção do juízo de irregularidade das contribuições advindas de cargos demissíveis ad nutum, ainda que os contribuintes sejam filiados à agremiação.

5. Incontroverso o recebimento de recursos de fontes vedadas, em valor correspondente a 65,79% das receitas do partido, impõe-se a desaprovação das contas. Redução, entretanto, do prazo de suspensão do recebimento de quotas do Fundo Partidário para quatro meses.

6. Provimento parcial.

(TRE-RS – RE: 1497 NOVO HAMBURGO - RS, Relator: DES. ELEITORAL LUCIANO ANDRÉ LOSEKANN, Data de Julgamento: 04.12.2017, Data de Publicação: DEJERS – Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Tomo 225, Data 15.12.2017, p. 6.) (Grifei.)

Esse posicionamento coaduna-se com a jurisprudência do egrégio TSE, que expressamente determina a aplicação da penalidade vigente ao tempo da doação, por força do princípio de que o tempo rege o ato.

Assim, muito embora os prestadores aleguem que as contribuições foram voluntárias e não partiram de desconto em folha de pagamento, permanece a menção à irregularidade relativa ao recebimento desses recursos, ensejando o recolhimento da quantia ao Tesouro Nacional, nos termos do art. 14 da Resolução TSE n. 23.464/15.

No entanto, o baixo valor nominal da falha (R$ 347,20) e seu diminuto impacto percentual sobre a contabilidade (5,07%) evidenciam que se mostra razoável e proporcional o juízo de aprovação das contas com ressalvas e o consequente afastamento da sanção de suspensão de recebimento de quotas do Fundo Partidário fixada na sentença.

ANTE O EXPOSTO, voto pelo parcial provimento do recurso para aprovar as contas com ressalvas, reduzir para R$ 347,00 o total de recursos a serem recolhidos ao Tesouro Nacional e afastar a sanção de suspensão de recebimento de quotas do Fundo Partidário, nos termos da fundamentação.