RE - 82429 - Sessão: 21/08/2018 às 16:00

RELATÓRIO

Trata-se de recurso interposto pelo MINISTÉRIO PÚBLICO ELEITORAL (fls. 599-613) contra sentença do Juízo da 58ª Zona Eleitoral de Vacaria (fls. 591-594v.), que julgou improcedente a Ação de Investigação Judicial Eleitoral ajuizada em face de JANE PINTO ANDREOLA OLIBONI e CARLOS ALBERTO DA SILVA OLIVEIRA – candidatos não eleitos aos cargos de Prefeito e Vice-Prefeito naquele município nas eleições de 2016 –, em virtude da prática de abuso de poder econômico (art. 22, caput, da Lei Complementar n. 64/90) e captação ilícita de sufrágio (art. 41-A da Lei n. 9.504/97), assim como julgou improcedente a demanda com relação a ADELAR BERNARDI GONÇALVES, representado exclusivamente pelo cometimento de abuso de poder econômico.

Nas razões recursais, o MINISTÉRIO PÚBLICO ELEITORAL reiterou os pedidos formulados em sede de alegações finais (fls. 581-590v.), postulando a reforma parcial da sentença para que JANE OLIBONI e CARLOS OLIVEIRA sejam condenados por abuso de poder econômico, declarando-os inelegíveis para as eleições que se realizarem nos oito anos subsequentes ao pleito de 2016 (art. 22, inc. XIV, da Lei Complementar n. 64/90), e, ainda, pela captação ilícita de sufrágio, impondo-lhes a penalidade prevista no art. 41-A da Lei n. 9.504/97.

JANE OLIBONI e CARLOS OLIVEIRA ofereceram contrarrazões, defendendo a manutenção da sentença (fls. 619-637).

ADELAR GONÇALVES deixou de se manifestar quanto ao recurso interposto (fl. 638).

Nesta instância, os autos foram com vista à Procuradoria Regional Eleitoral, que opinou pelo provimento parcial do recurso para que sejam impostas à recorrida JANE OLIBONI as sanções pelo cometimento do abuso de poder econômico e da captação ilícita de sufrágio, mantendo-se o juízo de improcedência da ação relativamente a CARLOS OLIVEIRA, devido à ausência de prova da sua participação ou anuência, nas condutas ilícitas (fls. 640-649).

É o relatório.

VOTO

Admissibilidade Recursal

A sentença foi publicada no DEJERS no dia 22.11.2017 (fl. 597), e a petição recursal apresentada em 24.11.2017 (fl. 599), dentro, portanto, do tríduo previsto no art. 41-A, § 4º, da Lei n. 9.504/97 e art. 258 do Código Eleitoral. Como o recurso também satisfaz aos demais pressupostos de admissibilidade, dele conheço.

Mérito

O MINISTÉRIO PÚBLICO ELEITORAL interpôs recurso (fls. 599-613) contra sentença do Juízo da 58ª Zona Eleitoral de Vacaria (fls. 591-594v.), que julgou improcedente a ação de investigação judicial eleitoral ajuizada contra JANE OLIBONI e CARLOS OLIVEIRA – candidatos não eleitos aos cargos de Prefeito e Vice-Prefeito naquele município nas eleições de 2016 –, em razão da prática de captação ilícita de sufrágio (art. 41-A da Lei n. 9.504/97) e de abuso de poder econômico (art. 22, caput, da Lei Complementar n. 64/90), bem como julgou improcedente a demanda com relação a ADELAR GONÇALVES, representado exclusivamente pelo cometimento de abuso de poder econômico.

O objeto do recurso interposto pelo órgão ministerial, na linha do entendimento exarado em sede de alegações finais (fls. 581-590v.), restringiu-se ao pedido de condenação de JANE OLIBONI e CARLOS OLIVEIRA pelos ilícitos eleitorais acima referidos, não alcançando o resultado do julgamento de primeiro grau quanto a ADELAR GONÇALVES, que restou absolvido da imputação da prática de abuso de poder econômico.

Assim, delineada a extensão subjetiva do recurso, passo à análise do mérito.

Inicialmente, no que se refere ao ilícito do art. 41-A da Lei n. 9.504/97, a sua configuração exige comprovação inconteste da doação, oferecimento, promessa ou entrega, por candidato ou por terceiro em seu nome, de vantagem pessoal de qualquer natureza, inclusive emprego ou função pública, a eleitor determinado ou determinável, com o fim específico de obter-lhe o voto, no período compreendido entre a data do registro de candidatura e a da eleição.

O abuso de poder econômico, por sua vez, requer comprovação de “(…) ações que denotem mau uso de situações jurídicas ou direitos e, pois, de recursos patrimoniais detidos, controlados ou disponibilizados ao agente. Essas ações não são razoáveis nem normais à vista do contexto em que ocorrem, revelando a existência de exorbitância, desbordamento ou excesso no exercício dos respectivos direitos e no emprego de recursos” (José Jairo Gomes, Direito Eleitoral, 12ª edição, São Paulo: Editora Atlas, 2016, p. 312).

Além disso, segundo dispõe o art. 22, inc. XVI, da Lei Complementar n. 64/90, as circunstâncias do ato abusivo devem se revestir de gravidade que macule de forma substancial a legitimidade do jogo democrático, provocando desequilíbrio entre os candidatos e desvirtuando o espaço de liberdade de expressão do eleitor na escolha de seus representantes.

O Tribunal Superior Eleitoral considera indispensável que a comprovação da captação ilícita de sufrágio e do abuso de poder econômico seja feita por meio de elementos de prova congruentes e robustos para que possam incidir as severas penalidades previstas no art. 41-A da Lei das Eleições – cassação do registro ou do diploma e multa de mil a cinquenta mil UFIR – no art. 22 da Lei Complementar n. 64/90 – cassação do registro ou do diploma e decretação de inelegibilidade para os pleitos que se realizarem nos 8 anos subsequentes –, como se colhe das ementas abaixo transcritas:

ELEIÇÕES 2012. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL ELEITORAL. CANDIDATO A VEREADOR. AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL. CAPTAÇÃO ILÍCITA DE SUFRÁGIO E ABUSO DE PODER ECONÔMICO. ART. 41-A DA LEI DAS ELEIÇÕES. MÉRITO. CARACTERIZAÇÃO DO ILÍCITO ELEITORAL. INSUFICIÊNCIA DO ACERVO FÁTICO-PROBATÓRIO. EXIGÊNCIA DE PROVAS ROBUSTAS E INCONTESTES. NECESSIDADE. REEXAME DE FATOS E PROVAS. IMPOSSIBILIDADE. INCIDÊNCIA DA SÚMULA Nº 24 DO TSE. MANUTENÇÃO DO DECISUM. DESPROVIMENTO.

1. A captação ilícita de sufrágio, nos termos do art. 41-A da Lei nº 9.504/97, aperfeiçoa-se com a conjugação dos seguintes elementos: (i) a realização de quaisquer das condutas típicas do art. 41-A (i.e., doar, oferecer, prometer ou entregar bem ou vantagem pessoal de qualquer natureza a eleitor, bem como praticar violência ou grave ameaça ao eleitor), (ii) o fito específico de agir, consubstanciado na obtenção de voto do eleitor e, por fim, (iii) a ocorrência do fato durante o período eleitoral (GOMES, José Jairo. Direito Eleitoral. 12ª ed. São Paulo: Atlas, p. 725).

2. A demonstração de prova robusta e inconteste da ocorrência do ilícito eleitoral é pressuposto indispensável à configuração da captação ilícita de sufrágio. Precedentes desta Corte.

3. In casu, o Tribunal Regional Eleitoral de Pernambuco, ao reformar a sentença e afastar a condenação, assentou ser frágil o conjunto probatório acostado aos autos, não sendo possível reconhecer a configuração da captação ilícita de sufrágio por meras ilações e presunções, tampouco o abuso do poder econômico.

4. O reexame do arcabouço fático-probatório, que não se confunde com o reenquadramento jurídico dos fatos, revela-se inadmissível na estreita via do recurso especial eleitoral.

5. No caso sub examine, a) o Tribunal de origem consignou ser insuficiente o conjunto probatório para caracterizar o ilícito do art. 41-A da Lei nº 9.504/97 e o abuso do poder econômico; b) a simples apreensão de camisetas de determinada cor no veículo, onde se encontrava a então candidata a vereadora Joelma Aparecida Gomes de Oliveira, não demonstra, de modo imperativo, que as aludidas camisetas seriam distribuídas aos eleitores. Sequer há nos autos prova do valor do material apreendido. Aliás, o conjunto probatório dos autos resume-se aos seguintes documentos: (i) Registro de Ocorrência de fls. 17/18, no qual consta a informação quanto à apreensão de 'camisas azuis (em média duas mil)'; (ii) o auto de apreensão do veículo e de '1.656 camisas de malha de cor azul, sem qualquer ilustração'; (iii) fotocópia da Carteira Nacional de Habilitação da Recorrente. Consta, ainda, uma cópia de uma nota fiscal emitida pela Empresa Scarlett Modas à Empresa Maria da Conceição de Lima Paula - ME, cuja veracidade foi questionada e da qual foi feita extração de cópias à Secretaria do Estado de Pernambuco - SEFAZ/PE, para as providências que julgar cabíveis. Assim, não há elementos suficientes a demonstrar a prática do ilícito eleitoral, até porque as camisetas não possuem qualquer identificação de candidatos ou símbolos, nem há qualquer indício de que seriam distribuídas a eleitores ou cabos eleitorais; c) superar tal conclusão demandaria a reapreciação das provas acostadas aos autos. Incidência do Enunciado da Súmula nº 24 do TSE. 6. Agravo regimental desprovido.

(TSE, RESPE n. 13187/DF, DJE de 16.12.2016, p. 23, Relator Ministro Luiz Fux) (Grifei.)

 

AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ORDINÁRIO. CAPTAÇÃO ILÍCITA DE SUFRÁGIO. PROVA ROBUSTA. AUSÊNCIA. ABUSO DE PODER ECONÔMICO. NÃO CONFIGURAÇÃO. DESPROVIMENTO.

1. Consoante jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral, a condenação por captação ilícita de sufrágio exige prova robusta e não pode ser baseada em mera presunção. Precedentes.

2. Na espécie, a distribuição pontual de 50 camisetas a cabos eleitorais e à equipe de campanha não configura vantagem oferecida a eleitor. Isso porque se trata de "mecanismo de organização de campanha" (RO 1507, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, DJe de 1º.10.2010).

3. Desse modo, também não se configura o suposto abuso de poder econômico, que exige comprovação da "utilização excessiva, antes ou durante a campanha eleitoral, de recursos materiais ou humanos que representem valor econômico, buscando beneficiar candidato, partido ou coligação, afetando a normalidade e a legitimidade das eleições" (AgRg no RCED 580, Rel. Min. Arnaldo Versiani, DJe de 1º.11.2011).

4. Agravo regimental não provido.

(TSE, RO n. 167589/RO, DJE de 27.10.2015, pp. 55-56, Relator Ministro João Otávio de Noronha) (Grifei.)

 

Essa linha interpretativa tem sido adotada no âmbito da jurisprudência desta Corte Regional, conforme ilustram as ementas dos seguintes arestos:

RECURSO. REPRESENTAÇÃO. CAPTAÇÃO ILÍCITA DE SUFRÁGIO. ABUSO DE PODER ECONÔMICO. PREFEITO E VICE. IMPROCEDÊNCIA. ELEIÇÕES 2016.

1. Preliminares. 1.1) Não se mostra inepta a petição inicial na qual se apontam elementos fáticos probatórios que, em tese, configurariam abuso de poder e captação ilícita de sufrágio; 1.2) Não há se falar em ausência de profligação da sentença quando deduzidas razões recursais suficientes para impugnar juízo de improcedência.

2. Doações de campanha sob a forma de aquisição de combustível em favor de candidatos à vereança e para o partido. Vales combustíveis confeccionados e registrados nos recibos eleitorais. Distribuição que se deu em razão de carreata, não estando atrelada a pedido de voto. Construção jurisprudencial que admite a doação de combustível a eleitores correligionários e cabos eleitorais para participação em carreatas.

3. Oferecimento de dinheiro à eleitora para obtenção do voto. Inexistente liame documental, fotográfico ou indício a corroborar o depoimento da testemunha. A condenação por captação ilícita de sufrágio exige prova robusta, não podendo se fundar em meras presunções. Provimento negado.

(TRE-RS, RE n. 253-45, julgado na sessão de 07.6.2017, Relator Des. Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ) (Grifei).

 

RECURSO. AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL. CAPTAÇÃO ILÍCITA DE SUFRÁGIO. USO INDEVIDO DOS MEIOS DE COMUNICAÇÃO SOCIAL. CONDUTAS VEDADAS. PRELIMINARES AFASTADAS. EFEITO SUSPENSIVO. IMPOSSIBILIDADE. CERCEAMENTO DE DEFESA. INOCORRÊNCIA. MÉRITO. CAPTAÇÃO ILÍCITA DE SUFRÁGIO. ART. 41-A DA LEI N. 9.504/97. BOCA DE URNA. NECESSIDADE DE PROVA INCONTESTE. ABUSO DO PODER POLÍTICO E ECONÔMICO. INEXISTÊNCIA. CONDUTAS VEDADAS. ART. 73, V, DA LEI DAS ELEIÇÕES. CONTEXTO PROBATÓRIO. NÃO DEMONSTRADO. LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ. ART. 80 DO CPC. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. RESOLUÇÃO TSE N. 23.478/16 E LEI N. 9.265/96, ART. 1º. AFASTAMENTO. PROVIMENTO PARCIAL. ELEIÇÕES 2016.

1. Preliminares afastadas. 1.1. Admissível a concessão de efeito suspensivo quando a decisão atacada resultar na cassação de registro, no afastamento do titular ou na perda de mandato eletivo, consoante art. 257, §2º, do Código Eleitoral, efeitos não vislumbrados no presente feito. 1.2. Não ocorre cerceamento de defesa quando o julgador determina o desentranhamento de documentos juntados com as alegações finais, após encerrada a instrução processual.

2. Mérito. 2.1. Para a comprovação da captação ilícita de sufrágio e do abuso do poder econômico, necessária prova robusta e inconteste do ilícito, o que não se vislumbra no presente feito. 2.2. O conjunto probatório não permite a certeza necessária para comprovar as ilegalidades consubstanciadas em “boca de urna” e “corrupção eleitoral”, na medida em que os depoimentos dos informantes não têm respaldo nas provas materiais acostadas aos autos. 2.3. A quebra da normalidade e legitimidade do pleito, pelo abuso do poder político, está ligada à gravidade da conduta, capaz de alterar a vontade do eleitor, o que não foi provado neste processo. 2.4. Mesmo incontroversos nos autos, os empréstimos realizados em instituições bancárias ou com particulares, sem a respectiva comprovação de destinação irregular dos valores, não servem para um juízo de procedência da demanda. 2.5. Não há a prática da conduta vedada prevista no art. 73, V, da Lei n. 9.504/97 quando os servidores deixarem de exercer a atividade que atraía o pagamento do plus salarial. 2.6. Não há litigância de má-fé quando não houver o enquadramento no art. 80 e incisos do Código de Processo Civil, bem como não houver o dolo na conduta do litigante. 2.7. A teor do art. 4º da Resolução TSE n. 23.478/16 c/c a Lei n. 9.265/96, não são devidos honorários advocatícios no âmbito da Justiça Eleitoral.

Provimento parcial. Afastadas as condenações por litigância de má-fé e ao pagamento de honorários advocatícios.

(RE n. 20937, julgado na sessão de 06.12.2017, Relator Dr. Luciano André Losekann) (Grifei.)

Entretanto, na hipótese sob exame, a prova produzida durante a fase do inquérito policial e de instrução processual carece de consistência para que se conclua pela presença das elementares constitutivas da captação ilícita de sufrágio (art. 41-A da Lei das Eleições) e do abuso de poder econômico (art. 22 da Lei Complementar n. 64/90), como passo a expor.

Os fatos supostamente ilícitos consistem na distribuição de “cheques-convênio” aos eleitores do Município de Vacaria, notadamente no dia 1º.10.2016 (véspera do pleito), para que fossem trocados por cestas básicas junto ao Supermercado Kellermann, de propriedade de ADELAR GONÇALVES, com o objetivo de cooptação de votos em favor da candidatura de JANE OLIBONI e CARLOS OLIVEIRA, candidatos do Partido Progressista (PP), integrante da Coligação “A VACARIA QUE A GENTE QUER” (PP – DEM).

No âmbito do Inquérito n. 620-82.2016.6.21.0058, instaurado junto à Delegacia de Polícia Civil do Município de Vacaria, foi investigada a distribuição irregular dos “cheques-convênio” e de brita junto ao eleitorado local com o propósito de beneficiar a campanha de JANE OLIBONI e CARLOS OLIVEIRA, coletando-se provas que foram compartilhadas para a instrução da presente ação de investigação judicial eleitoral.

Por consequência, alguns elementos probatórios colhidos durante o inquérito policial não são pertinentes ao objeto desta ação, a exemplo dos depoimentos de Josmar Padilha Camargo, Angelita da Silva Borges e Nicole de Almeida Siqueira (fls. 132, 136 e 138), das fotografias de fls. 45-70 e dos vídeos constantes no CD de fl. 72, que se relacionam especificamente à doação de brita ao eleitorado do município.

Feito esse esclarecimento inicial, de acordo com a certidão de cumprimento do mandado de busca e apreensão e o auto de apreensão de fls. 21 e 28-29, foram apreendidos cerca de 264 (duzentos e sessenta e quatro) “cheques-convênio” preenchidos com diferentes valores e 2 (dois) talões de “cheques-convênio” em branco nas dependências do Supermercado Kellermann, no sábado anterior ao pleito.

Cópias de alguns dos exemplares apreendidos, no valor unitário de R$ 30,00 (trinta reais), R$ 32,00 (trinta e dois reais) e R$ 62,00 (sessenta e dois reais), encontram-se juntadas nas fls. 225-230. Outrossim, podem ser verificadas as fotografias dos “Cheques-Convênio” ns. 12365, 12367 e 12298 (este último em duplicidade) nos arquivos “20161001_183058.jpg”, “20161001_1964134.jpg”, “20161001_194153.jpg”, “20161001_194202.jpg”, gravados nos CDs de fls. 75 e 481 (ambos com idêntico conteúdo).

As cópias e imagens acima mencionadas demonstram que os “cheques-convênio” eram confeccionados com numeração sequencial e campos destinados ao preenchimento do valor, data, nome do funcionário recebedor, número do caixa e do ticket, e sobre os quais eram carimbados o nome, o endereço e o telefone do estabelecimento, e impressa a seguinte frase: “Para uso exclusivo do cliente ao lado mediante identificação”.

Além de constituírem documentos de uso habitual pelo supermercado independentemente do período eleitoral, nos exemplares apreendidos, não foram identificados nomes, termos ou expressões que permitissem vinculá-los à candidatura de JANE OLIBONI e CARLOS OLIVEIRA, ao Partido Progressista (PP) ou ao Democratas (DEM), partidos que integraram a Coligação “A VACARIA QUE A GENTE QUER”.

Nessa linha, como detalhadamente explicado pelo Juiz Eleitoral de primeira instância, o qual teve acesso aos originais dos “cheques-convênio” apreendidos e demais elementos que instruíram o inquérito policial:

(…) ao exame de tais documentos pode ser visualizado que a expressiva maioria são anteriores do período da campanha eleitoral (16/8/2016), com 92 sem data e apenas 11 tendo data do período de propaganda eleitoral, com a prova clarificando que era usual o mercado trabalhar com o uso de vales ranchos, vendidos indiscriminadamente a qualquer pessoa, inclusive com a apreensão de dois blocos em branco, com 40 vales cada um (fl. 592v.) (Grifei.)

Ressalto que, no momento da abordagem policial, JANE OLIBONI não foi flagrada com “cheques-convênio” em seu poder, ou efetuando a sua entrega aos eleitores que estavam presentes no supermercado, tendo a candidata negado a responsabilidade pelos ilícitos no depoimento prestado na Delegacia de Polícia (fls. 147-148).

Aliás, nas imagens captadas no dia da abordagem policial pelas câmeras de videomonitoramento instaladas no Supermercado Kellermann, aparece tão somente uma camionete de cor branca (com adesivo da campanha de JANE OLIBONI e CARLOS OLIVEIRA) estacionada em frente ao local e cenas da candidata no interior do estabelecimento, entre as 10h e 12h, e cenas de atendimento a consumidores, nas quais podem ser observadas cestas básicas prontas para compra, gravadas durante os períodos da manhã e tarde do dia 1º.10.2016 (fls. 82 e 141-146 e arquivos “IMG-20161001-WA0111”, “IMG-20161001-WA0112” e “IMG-20161001-WA0113”, gravados nos CDs de fls. 75 e 481).

Em momento algum, percebe-se comportamento que levasse a suspeitar que a candidata estivesse portando ou entregando os “cheques-convênio” a eleitores, na tentativa de conquistar-lhes a preferência do voto.

Contrariamente, a candidata apenas pode ser vista cumprimentando e tirando fotos com alguns clientes no local, ato de propaganda que, embora pudesse ser questionado quanto à sua regularidade, dado se passar em estabelecimento de acesso ao público, não caracteriza a captação ilícita de sufrágio ou a conduta economicamente abusiva por parte da candidata, sendo oportuno notar que CARLOS OLIVEIRA não estava presente na ocasião.

Da mesma forma, a prova testemunhal produzida durante o inquérito policial mostra-se inconsistente quanto à ilicitude da conduta dos recorridos.

Os depoimentos de Cristiane da Mota Moreira, Adriane Freitas de Lima e Marciele Alves Ferreira, todas funcionárias do Supermercado Kellermann, colhidos em sede policial, confirmaram que os “cheques-convênio” eram documentos usualmente adquiridos por pessoas físicas, ou empresas locais, mediante convênio, que os repassavam a seus funcionários para serem trocados por cestas básicas e produtos individualizados (fls. 31, 32 e 121-123).

Joseli Neris de Souza disse que seu marido, Adão Rodrigues da Silva, ganhou 3 (três) “cheques-convênio”, cada um no valor de R$ 62,00 (sessenta e dois reais), de Luciano Ramos, candidato a Vereador pelo Partido Progressista (PP), para serem trocados junto ao Supermercado Kellermann, não se extraindo de seu depoimento qualquer ligação entre o recebimento dos vales e eventual conduta de JANE OLIBONI e CARLOS OLIVEIRA durante a campanha (fl. 33).

Nádia Alves do Nascimento afirmou que Eva de Oliveira, tia de sua cunhada, havia recebido um “cheque-convênio”, no valor de R$ 62,00 (sessenta e dois reais), para ser trocado junto ao Supermercado Kellermann, mas nada esclareceu a respeito da identidade da pessoa que teria efetuado a doação (fl. 34).

Maria da Silva Lindholz referiu ter recebido 3 (três) “cheques-convênio” para que sua família votasse no número 12 (Partido Democrático Trabalhista – PDT), agremiação estranha à Coligação “A VACARIA QUE A GENTE QUER” (PP – DEM), pela qual foi lançada a chapa composta por JANE OLIBONI e CARLOS OLIVEIRA (fl. 35).

Mateus Alves Boeira mencionou o recebimento de um “cheque-convênio”, no valor de R$ 62,00 (sessenta e dois reais), de seu sogro, para que apoiasse Flávio Rokoski, candidato a Vereador pelo Partido Trabalhista Brasileiro (PTB), sem que tal pedido tivesse sido atrelado a qualquer candidato a Prefeito ou Vice, cargos disputados pelos recorridos (fl. 36).

O delegado de polícia Carlos Moisés Girardi e os policiais civis Alan Diones da Silva Paim e Ederson de Lima Gerlach descreveram a operação de busca e apreensão realizada no Supermercado Kellermann na véspera do pleito, referindo, apenas, terem recebido denúncias sobre a distribuição de vales com a finalidade de obtenção de voto em favor de JANE OLIBONI ou CARLOS OLIVEIRA. Porém, não flagraram a entrega de “cheques-convênio” a eleitores, tendo somente presenciado algumas pessoas efetuando o pagamento de compras com os vales no dia em que realizaram a diligência de busca e apreensão (fls. 38-39, 73 e 85).

Saulo Silva de Vargas disse ter observado situações de troca de vales por frequentadores do Supermercado Kellermann no dia 1º.10.2016, mas não presenciou JANE OLIBONI efetuar o pagamento de compras ou entregar vales a eleitores (fls. 42-44).

Alaídes Aparecida Paim – candidata filiada ao Partido da Mobilização Nacional (PMN), integrante da Coligação “Frente Vacaria Popular” (PDT/PRB/PSC/PMN/PC do B/PROS), ou seja, coligação adversária ao Partido Progressista (PP) nas eleições proporcionais – disse que acompanhou Saulo, seu esposo, até o supermercado naquele mesmo dia, quando presenciou a troca de “cheques-convênio” pelo representado ADELAR, com o auxílio do funcionário Miguel (coordenador de repositores), atividade da qual não se denota caráter ilícito imputável aos recorridos. A depoente também referiu que seu filho, Sandro Miguel Franco Junior (funcionário do mercado), comentou ter visto JANE OLIBONI distribuindo vales a eleitores enquanto esteve no mercado no dia 1º.10.2016 (fls. 86-87).

Todavia, ao prestar depoimento, Sandro Miguel Franco Junior não confirmou a versão apresentada por sua mãe, dizendo, tão somente, ter ouvido comentários a respeito dos fatos, ressaltando que “não chegou a presenciar a candidata JANE entregar os vales e pagar ranchos (...)” (fls. 124-125).

Ueslei Nata Dias Boeira, que trabalhou na campanha de Dagmar Dengo, candidato opositor de JANE pela Coligação “VIA POPULAR” (PDT/PT/PC do B/PRB/PROS/PSC/PMN/PTB/PR), disse ter ouvido comentários a respeito dos fatos e conversado com pessoas que lhe confirmaram a distribuição de vales, pelo Partido Progressista (PP) em favor da candidata, para serem trocados junto ao Supermercado Tapejara, acrescentando ter visto um cliente de posse de um “vale-cesta” no Supermercado Kellermann (fls. 118-119).

Antônio Paganella Filho afirmou ter recebido, dias antes das eleições, 3 (três) vales de pessoas desconhecidas – que estavam no interior de uma camionete de cor preta, identificada com propaganda do Partido Progressista (PP) e estacionada em frente ao Mercado Tapejara – para serem trocados junto ao Supermercado Kellermann. Entretanto, as pessoas que lhe entregaram os vales não lhe pediram voto (fls. 126-127).

Silvio Antônio Moreira Filipini e Andréia Belusso narraram ter visto JANE OLIBONI no Supermercado Kellermann no sábado, sem perceber situação de entrega de vales a eleitores (fls. 128-129).

Adão Rodrigues da Silva declarou ter recebido “santinho” e 3 (três) vales de Luciano Ramos, candidato a Vereador pelo Partido Progressista (PP), sem vincular tal recebimento à candidatura de JANE OLIBONI e CARLOS OLIVEIRA (fl. 134).

Suelen de Souza Maciel expôs que viu pessoas identificadas com coletes de JANE OLIBONI e bandeiras do Partido Progressista (PP) ao lado da porta de entrada do Supermercado Kellermann, sem fazer referência à entrega de vales aos clientes (fl. 137).

Os depoimentos de Marciele Alves Ferreira, Eva de Oliveira e Gricelda Lemos dos Santos, prestados em sede policial e nos quais o Ministério Público Eleitoral precipuamente amparou a sua pretensão recursal, não subsistem como elementos de prova contundentes quando confrontados com as versões apresentadas em juízo, sob o crivo do contraditório.

Em sede policial, Marciele Alves Ferreira (funcionária do Supermercado Kellermann) prestou um depoimento detalhado acerca da sistemática que era utilizada para a troca dos vales, descrevendo as reuniões que foram feitas com os funcionários para evitar conversas a respeito de campanhas eleitorais durante o expediente de trabalho e a operação de apreensão dos vales pela autoridade policial. No tocante a JANE OLIBONI, disse que, no sábado anterior ao pleito, a candidata permaneceu no mercado, distribuindo vales em meio a “santinhos” entregues aos clientes (fls. 121-123).

Contudo, em juízo, Marciele alterou a versão apresentada durante o inquérito, referindo expressamente que não tinha presenciado a entrega dos “cheques-convênio” por JANE OLIBONI a eleitores, mas, tão somente, ouvido comentários de que, no sábado anterior às eleições, pessoas estavam do lado de fora do mercado aguardando o recebimento dos cheques-convênio, desconhecendo quais candidatos fariam a suposta entrega.

Ademais, Marciele foi ouvida na condição de informante, porque declarou ter feito campanha para Amadeu de Almeida Boeira, candidato adversário de JANE OLIBONI e eleito Prefeito no pleito de 2016 pela Coligação “Vacaria Melhor” (PSDB/PPS/PMDB) (CD de fl. 426).

Eva de Oliveira narrou à autoridade policial que, na sexta-feira anterior ao pleito, uma “moça loira” lhe chamou no portão de sua residência e lhe entregou um santinho do Partido Progressista (PP) com um “vale cesta básica”, pedindo-lhe que votasse em JANE OLIBONI (fl. 120).

Conquanto essa versão tenha sido mantida em juízo (CD de fl. 382), em ambos os seus depoimentos Eva não soube informar o nome da “mulher de estatura média e meio loira” que lhe entregou os panfletos e o vale para ser trocado no Supermercado Kellermann, tampouco elucidou a ligação dessa pessoa com a campanha de JANE OLIBONI e CARLOS OLIVEIRA.

Destaco que Eva afirmou não ter observado se outros partidos ou candidatos estavam fazendo campanha nas proximidades da sua casa no dia em que foi abordada. Por outro lado, Nádia Alves do Nascimento havia dito, perante a autoridade policial, que, naquela ocasião, havia, sim, outros candidatos a Vereador pelo Partido Progressista (PP), que não foram identificados, distribuindo propaganda na rua em que ambas moravam (fl. 78), elementos que introduzem dúvida relevante a respeito da vinculação direta da citada moça loira à candidatura dos recorridos.

Ao ser ouvida na Delegacia de Polícia, Gricelda Lemos dos Santos, por sua vez, afirmou ter recebido a visita de JANE OLIBONI em sua casa, oportunidade em que a candidata manifestou seu desejo de poder contar com o voto da eleitora. Narrou que, ao deixar sua residência, JANE lhe disse que mandaria um “valezinho” e, logo em seguida, uma moça loira, acompanhada de um rapaz moreno, efetuou a entrega de um vale, no valor de R$ 62,00 (sessenta e dois reais), para ser trocado no Supermercado Kellermann (fl. 37).

Embora Gricelda tenha ratificado suas declarações em juízo (CD de fl. 531), a exemplo de Eva de Oliveira, não identificou a moça loira que lhe teria entregue o vale em troca de voto para JANE OLIBONI, inexistindo, nos depoimentos de ambas as testemunhas, elementos minimamente seguros que indiquem se tratar da mesma pessoa e que esta estivesse efetivamente ligada à campanha de JANE OLIBONI e CARLOS OLIVEIRA.

Saliento que Gricelda, ao final de seu testemunho durante a audiência de instrução (CD de fl. 531), assim como Marciele Alves Ferreira, disse que havia trabalhado na campanha de Amadeu de Almeida Boeira – candidato, como anteriormente dito, adversário de JANE –, o qual lhe havia prometido emprego para o seu marido caso ganhasse as eleições, e materiais para arrumar a peça na qual residia e construir um banheiro, ou seja, deixou clara a sua ligação e interesse em que Amadeu se saísse vitorioso nas urnas.

A vinculação político-partidária de Gricelda Lemos dos Santos e Marciele Alves Ferreira ao candidato eleito Amadeu de Almeida Boeira, associada à fragilidade intrínseca às suas declarações, constitui circunstância que mitiga ainda mais a força probante dos seus depoimentos para fins de condenação nos moldes pretendidos pelo MINISTÉRIO PÚBLICO ELEITORAL.

Por certo, não se olvida a relevância da prova testemunhal para a comprovação da captação ilícita de sufrágio e do abuso de poder econômico. Por outro lado, não obstante a prova testemunhal possa adquirir contornos decisivos ao juízo condenatório proferido em ações eleitorais em que se apura a prática de captação ilícita de sufrágio e abuso de poder econômico, exige-se que ela seja isenta e livre de comprometimentos políticos ou pessoais, condição sem a qual se torna inservível para fundamentar o decreto condenatório, conforme jurisprudência desta Corte:

Recurso. Captação ilícita de sufrágio. Art. 41-A da Lei n. 9.504/97. Alegada distribuição de cestas básicas e dinheiro em troca do voto. Prefeito e vice. Eleições 2012.

Representação julgada procedente no juízo originário, com imposição das penalidades de multa e cassação dos diplomas.

Preliminar de nulidade da sentença por cerceamento de defesa afastada. O juiz pode, de ofício, determinar a produção de provas, conforme se extrai do art. 22, inc. VII, da Lei Complementar n. 64/90. Ausência de qualquer prejuízo às partes.

Denúncias realizadas por vários eleitores perante o Ministério Público Eleitoral nos dois dias subsequentes à eleição e divulgação do seu resultado. Circunstância que reduz a confiabilidade e atrai suspeita aos depoimentos.

Conjunto probatório formado por testemunhos duvidosos e comprometidos com a orientação política do partido adversário, inconsistentes para aferir a segurança e certeza necessárias para alterar o resultado do pleito conquistado através da soberania popular.

Provimento.

(RE n. 658-80, julgado na sessão de 09.7.2013, Relator Dr. Leonardo Tricot Saldanda) (Grifei.)

Do mesmo modo, os demais testemunhos colhidos durante a instrução processual mostraram-se pouco esclarecedores acerca das alegadas práticas ilícitas.

Nádia Alves do Nascimento confirmou o conteúdo do vídeo gravado no dia da apreensão realizada junto ao Supermercado Kellermann (CD de fl. 75). Acrescentou que nenhum candidato lhe ofereceu vale durante as eleições de 2016 e que, no dia da apreensão, havia se disponibilizado a fazer a troca do vale recebido por Eva de Oliveira, a qual não lhe revelou a identidade do doador da vantagem. Referiu, também, que não viu JANE OLIBONI ou outros candidatos distribuindo vales ou propaganda eleitoral no interior do mercado (CD de fl. 382).

O delegado de polícia Anderson Silveira de Lima e os policiais Carlos Moisés Girardi (policial civil) e Alan Diones da Silva Paim descreveram a diligência de busca e apreensão realizada no Supermercado Kellermann, narrando que os “cheques-convênio” apreendidos não possuíam identificação do seu portador ou de candidatos, somente do próprio mercado (CDs de fls. 382 e 426).

Referiram os 4 (quatro) vídeos de “WhatsApp” gravados com os eleitores Gricelda Lemos dos Santos, Nádia Alves do Nascimento, Joseli Neris de Souza e Mateus Alves Bueno (este último arquivo inaudível), cujos conteúdos, no entanto, não trouxeram informações relevantes à comprovação das práticas ilícitas (CDs de fls. 75 e 481 e degravações acostadas nas fls. 77-80).

Mencionaram, ainda, o relato de funcionários do supermercado no sentido de que o número de troca de “vales-rancho” teria aumentado nos dias que antecederam as eleições, fato que, além de não ter sido demonstrado nos autos, é insuficiente à responsabilização de JANE OLIBONI e CARLOS OLIVEIRA pela suposta distribuição ilícita da vantagem junto à comunidade local. Segundo os depoimentos desses policiais, alguns eleitores declararam ter recebido os vales para que votassem em JANE OLIBONI e outros candidatos que disputavam o pleito proporcional pelo Partido Progressista (PP), o que também não restou confirmado ao longo da instrução do processo.

Adão Rodrigues da Silva repisou seu depoimento prestado na fase pré-processual. Disse ter recebido, de um rapaz desconhecido, material com propaganda de Luciano Ramos, candidato a Vereador pelo Partido Progressista (PP), e 3 (três) “vales-rancho”, no valor individual de R$ 62,00, que foram trocados no Supermercado Kellermann por sua esposa Joseli Neris de Souza (CD de fl. 382).

Adriana Freitas de Lima (funcionária do Supermercado Kellermann) narrou que os “cheques-convênio” sempre foram utilizados, inclusive durante o período eleitoral, como se fossem dinheiro em espécie, não sendo identificados os compradores no momento da troca. Disse que nenhum cliente comentou acerca do recebimento de vales para fins eleitorais e que, diariamente, eram montadas mais de 100 (cem) cestas básicas, as quais sempre ficavam armazenadas no mesmo local, identificando-o nas fotos de fl. 273 (CD de fl. 382).

Sandro Miguel Franco Junior (funcionário do Supermercado Kellermann) também confirmou que os “cheques-rancho” sempre foram utilizados no mercado, mas, como trabalhava como empacotador, desconhecia a sua sistemática de troca. Referiu ter ouvido apenas comentários de clientes a respeito da doação de “vales-cesta”, mas nunca viu a candidata JANE OLIBONI entregá-los a eleitores. Por fim, identificou o local onde eram colocadas as cestas básicas nas fotos de fl. 273 (CD de fl. 382).

Os depoimentos das testemunhas arroladas pela defesa de ADELAR GONÇALVES e JANE OLIBONI não são relevantes à elucidação dos fatos (CD de fl. 546).

Dagmar Dengo, que disputou o pleito majoritário pela Coligação “VIA POPULAR” (PDT/PT/PC do B/PRB/PROS/PSC/PMN/PTB/PR) em 2016, mencionou ter ouvido boatos sobre as imputações feitas aos recorridos, e que, assim como outros candidatos, fez campanha no Supermercado Kellermann, desconhecendo o sistema de “cheques-convênio”.

Nadir Luiz Fracasso afirmou que estava no Supermercado Kellermann no sábado anterior às eleições, quando viu JANE OLIBONI distribuindo apenas propaganda a consumidores, e que sempre via cestas básicas montadas no interior do mercado para venda.

Adonir Guerreiro Toffoli (representante comercial) disse desconhecer os fatos. Confirmou a utilização dos “vales-rancho” por empresas locais que os repassavam a seus funcionários, não havendo necessidade de identificação do portador ou observância de prazo de validade para a troca, bem como a presença de JANE OLIBONI no estabelecimento no sábado pela manhã para distribuir material de campanha aos consumidores. Acrescentou que, no período eleitoral, não houve o aumento de vendas de cestas básicas e que todos os candidatos fizeram campanha no mercado.

Alexandre Gonçalves (representante comercial e candidato a Vereador pelo Partido Progressista – PP) disse que esteve no mercado no sábado e, inclusive, agendou, com ADELAR GONÇALVES, a visita de JANE ao supermercado para que pudesse distribuir propaganda de sua campanha aos funcionários e clientes, referindo, também, que sempre houve a utilização de “vales-rancho” por pessoas físicas ou empresas do município.

Joseli Neris de Souza, Maria da Silva Lindholz, Mateus Alves Boeira, Saulo Silva de Vargas, Alaídes Aparecida Paim, Ueslei Nata Dias Boeira, Antônio Paganella Filho, Silvio Antônio Moreira Filipini e Andréia Belusso e Suelen de Souza Maciel, que haviam prestado depoimentos pouco relevantes à elucidação dos fatos durante a investigação policial, não foram ouvidos em juízo.

Para finalizar a análise probatória, é importante pontuar a inexistência de qualquer indício de que JANE OLIBONI ou CARLOS OLIVEIRA tenham efetivamente adquirido os “cheques-convênio” junto ao Supermercado Kellermann com o objetivo de destiná-los aos eleitores do município em troca de votos para sua chapa, situação em que a sua responsabilização pelas práticas ilícitas resta substancialmente prejudicada.

Acrescento que a prova documental e testemunhal produzida nos autos sequer indiretamente aponta que essa aquisição tenha sido feita por outros candidatos ou cabos eleitorais que apoiavam a candidatura de JANE OLIBONI e CARLOS OLIVEIRA, ou que tenha havido conluio com ADELAR GONÇALVES, proprietário do Supermercado Kellermann, no que concerne à venda dos “cheques-convênio” para uso indevido na campanha eleitoral.

Aliás, em sede de alegações finais (fls. 581-590v.), o próprio órgão ministerial da origem reconheceu a ausência de prova do envolvimento de ADELAR GONÇALVES no suposto esquema ilícito, mediante a venda de “cheques-convênio”, motivada por interesse pessoal ou político-partidário no resultado do pleito, requerendo fosse a ação julgada improcedente quanto ao representado, em posição posteriormente mantida nas razões recursais, que não impugnaram esse capítulo da sentença.

Portanto, o conjunto probatório mostra-se pouco sólido e convincente no tocante à participação direta ou indireta, à anuência, ou, ao menos, ao conhecimento de JANE OLIBONI e CARLOS OLIVEIRA acerca das infrações eleitorais que lhes foram imputadas, requisitos indispensáveis à condenação pela captação ilícita de sufrágio e abuso de poder econômico, na esteira do entendimento do Tribunal Superior Eleitoral e deste Regional, ilustrado nos seguintes arestos:

DIREITO ELEITORAL. RECURSO ORDINÁRIO. ELEIÇÕES DE 2014. IMPUTAÇÃO DE CAPTAÇÃO ILÍCITA DE SUFRÁGIO (ART. 41-A DA LEI 9.504/1997) AO GOVERNADOR E VICE-GOVERNADOR DE ESTADO DO AMAZONAS. CONFIGURAÇÃO. IMPUTAÇÃO DE PRÁTICA DE CONDUTA VEDADA AOS AGENTES PÚBLICOS (ART. 73, I, DA LEI 9.504/1997). AUSÊNCIA DE PROVA DE APLICAÇÃO DE RECURSOS PARA FINS ELEITORAIS. PROVIMENTO PARCIAL DOS RECURSOS PARA AFASTAR IMPUTAÇÃO DA CONDUTA VEDADA. CASSAÇÃO DOS DIPLOMAS.

1. Em relação à imputação da prática de captação de sufrágio, há, no caso concreto, conjunto probatório suficientemente denso a evidenciar tanto a compra de votos por parte de terceiro não candidato, quanto a ciência do candidato em relação ao ilícito. Possibilidade de utilização de indícios para a comprovação da participação, direta ou indireta, do candidato ou do seu consentimento ou, ao menos, conhecimento da infração eleitoral, vedada apenas a condenação baseada em presunções sem nenhum liame com os fatos narrados nos autos (art. 23 da LC 64/1990). Precedentes: ED-RO 2.098; AgR-REspe 399.403.104. No caso, são elementos capazes de comprovar, além de qualquer dúvida razoável, a ciência do candidato quanto à operação de captação ilícita de sufrágio: (i) o local em que ocorreu a oferta e promessa de vantagens em troca de votos, (ii) o envolvimento, direto ou indireto, de pessoas ligadas ao candidato por vínculos político e familiar, e (iii) a relação contratual da autora da conduta com o governo estadual. Precedentes: RCED 755, AgR-REspe 8156-59, REspe 42232-85. Desprovimento dos recursos ordinários de José Melo de Oliveira e José Henrique de Oliveira quanto à configuração da captação ilícita de sufrágio, prevista no art. 41-A da Lei 9.504/1997, mantendo-se a decisão do TRE-AM no sentido de cassar os diplomas dos representados e aplicar-lhes pena de multa no valor de 50 mil Ufirs. (…)

3. Determinação de realização de novas eleições diretas para governador do Amazonas, na forma do art. 224, §§ 3º e 4º, do Código Eleitoral e dos precedentes desta Corte (ED-REspe 139-25).

(TSE, RO n. 224661, DJE de 01.6.2017, Relator Ministro Napoleão Nunes Maia Filho) (Grifei.)

 

Preliminares afastadas. 1. Não há ilicitude na prova obtida mediante filmagem realizada em espaço público na tentativa de identificar autor de possíveis ilícitos eleitorais. Inocorrência de violação aos direitos de imagem e de intimidade. Desnecessidade de autorização judicial. 2. Adoção do parecer do Parquet como causa de decidir. Não há que se confundir argumentos com fundamentos. Considera-se atendida a garantia do contraditório com a análise séria e detida dos fundamentos de defesa. 3. Inocorrência de cerceamento de defesa na vista comum do processo fora do cartório. Falta de demonstração do prejuízo.

Indícios da prática de abuso de poder sem amparo em prova robusta da ciência ou anuência do candidato não servem para caracterizar o ilícito. Ausência de elementos seguros para comprovar que o pretendente ao cargo eletivo auferiu recursos e realizou gastos ilícitos de campanha.

Conjunto probatório insuficiente para lastrear decreto de natureza condenatória.

Provimento.

(TRE/RS, RE n. 713-65, julgado na sessão de 20.5.2014, Relatora Desa. Federal Maria de Fátima Freitas Labarrère) (Grifei.)

Nessa perspectiva e por considerar que, em seu conjunto, a prova constante dos autos é frágil para comprovar a captação ilícita de sufrágio e a movimentação abusiva de recursos financeiros durante o período eleitoral de 2016, mediante a distribuição de “cheques-convênio” com o intuito de beneficiar a candidatura de JANE OLIBONI e CARLOS OLIVEIRA, comprometendo, com isso, a normalidade e legitimidade das eleições, estou conduzindo o meu voto pela manutenção do juízo de improcedência da demanda.

Dispositivo

Diante do exposto, VOTO pelo desprovimento do recurso interposto pelo MINISTÉRIO PÚBLICO ELEITORAL, mantendo a sentença do Juízo da 58ª Zona Eleitoral de Vacaria, que julgou improcedente a Ação de Investigação Judicial Eleitoral ajuizada em face de JANE PINTO ANDREOLA OLIBONI e CARLOS ALBERTO DA SILVA OLIVEIRA.