RE - 21053 - Sessão: 17/07/2018 às 17:00

RELATÓRIO

Trata-se de recurso interposto por JOÃO ANTÔNIO PANCINHA DA COSTA, concorrente ao cargo de Vereador em Porto Alegre, contra sentença do Juízo da 113ª Zona Eleitoral (fls. 39-40) que desaprovou suas contas referentes às eleições municipais de 2016, tendo em vista o recebimento de doação por meio de depósito em espécie em valor superior ao limite de R$ 1.064,10, contrariando o disposto no art. 18, § 1º, da Resolução TSE n. 23.463/15.

Em suas razões, o recorrente invoca preliminar de cerceamento de defesa por inobservância do disposto no art. 66 da Resolução TSE n. 23.463/15, o qual determina a notificação do prestador acerca do parecer técnico conclusivo que entender pela existência de irregularidades nas contas. No mérito, afirma que o equívoco no procedimento foi causado pela própria instituição financeira, cujo operador de caixa efetuou um saque seguido de um depósito, em vez de uma transferência como solicitado pelo recorrente. Sustenta que a origem dos valores não é objeto de controvérsia e que o montante excedente do limite legal é ínfimo, ensejando a aplicação do “princípio dos fatos mínimos”. Ao final, requer a reforma da decisão, julgando aprovadas as contas (fls. 47-53).

Com vista dos autos, a Procuradoria Regional Eleitoral opinou pelo desprovimento do recurso (fls. 58-63).

É o relatório.

 

VOTO

Senhor Presidente,

Eminentes colegas:

O recurso é tempestivo e preenche os demais requisitos de admissibilidade, razão pela qual dele conheço.

Preliminarmente, o recorrente suscita a nulidade da sentença em razão do suposto descumprimento do estabelecido no art. 66 da Resolução TSE n. 23.463/15, que determina a notificação do prestador a respeito do parecer técnico conclusivo que entender pela existência de irregularidades ou de impropriedades sobre as quais não se tenha dado oportunidade para manifestação.

Compulsando os autos, observo que as falhas assinaladas no parecer conclusivo constaram do procedimento técnico de exame das contas (fls. 14-16), tendo o candidato se manifestado acerca das aludidas anotações nas fls. 27-30.

Os pareceres posteriores do órgão técnico (fls. 33-34) e do Ministério Público Eleitoral (fl. 37 e v.) restringiram-se a ratificar os apontamentos do relatório técnico preliminar, nada indicando de novo nos autos.

Logo, não se vislumbra prejuízo ao contraditório, uma vez que o dispositivo prevê a oportunidade de manifestação da parte apenas quando a irregularidade ou a impropriedade tenha sido identificada pela primeira vez no parecer conclusivo, o que não ocorreu no particular.

Desse modo, a alegada infringência ao disposto no art. 66 da Resolução TSE n. 23.463/15 deve ser afastada e, consequentemente, rejeitada a prefacial.

No mérito, o prestador de contas recebeu dois depósitos em espécie, de R$ 600,00 e de R$ 500,00, diretamente na conta de campanha, ambos realizados em 31.8.2016, somando o valor de R$ 1.100,00.

Dessa forma, houve o descumprimento do art. 18, § 1º, da Resolução TSE n. 23.463/15, segundo o qual as doações financeiras superiores a R$ 1.064,10 devem ser realizadas por transferência eletrônica entre contas, não sendo admitido o recebimento por meio de depósito em espécie. Assim estabelece a norma:

Art. 18. As pessoas físicas somente poderão fazer doações, inclusive pela Internet, por meio de:

I - transação bancária na qual o CPF do doador seja obrigatoriamente identificado;

II - doação ou cessão temporária de bens e/ou serviços estimáveis em dinheiro, com a demonstração de que o doador é proprietário do bem ou é o responsável direto pela prestação de serviços.

§ 1º As doações financeiras de valor igual ou superior a R$ 1.064,10 (mil e sessenta e quatro reais e dez centavos) só poderão ser realizadas mediante transferência eletrônica entre as contas bancárias do doador e do beneficiário da doação.

§ 2º O disposto no § 1º aplica-se na hipótese de doações sucessivas realizadas por um mesmo doador em um mesmo dia.

§ 3º As doações financeiras recebidas em desacordo com este artigo não podem ser utilizadas e devem, na hipótese de identificação do doador, ser a ele restituídas ou, na impossibilidade, recolhidas ao Tesouro Nacional, na forma prevista no caput do art. 26.

(Grifei.)

É incontestável, ainda, que o valor recebido de forma irregular foi utilizado na campanha do recorrente.

Na situação em análise, o prestador não logrou demonstrar a origem do recurso. Ressalta-se que a identificação do CPF nas operações de depósito, por tratar-se de ato essencialmente declaratório, não se presta, isoladamente, para essa finalidade.

Quanto ao argumento de que a irregularidade deveu-se a equívoco operacional da agência bancária, cumpriria ao candidato apresentar comprovação documental mínima de suas alegações sobre a origem própria das receitas. Para tanto, poderiam ser oferecidas declaração da agência bancária ou cópias dos extratos bancários de sua conta comum, a demonstrar os correspondentes saques, com equivalência de valor e data em relação aos depósitos, dentre outros documentos. No entanto, os autos carecem de quaisquer elementos probatórios nesse sentido.

Outrossim, diversamente do aduzido no recurso, a irregularidade não é meramente formal ou insignificante.

Com efeito, a exigência normativa de que as doações pelo próprio candidato, acima de R$ 1.064,10, sejam feitas por meio de transferência eletrônica visa, justamente, coibir a possibilidade de manipulações e transações transversas que ocultem ou dissimulem eventuais ilicitudes, como a utilização de fontes vedadas de recursos e a desobediência aos limites de doação.

Ademais, consoante pacificado na jurisprudência do TSE, a aplicação dos postulados da proporcionalidade e da razoabilidade é condicionada ao atendimento dos seguintes requisitos: “(i) falhas que não comprometam a lisura do balanço contábil; (ii) irrelevância do percentual dos valores envolvidos em relação ao total arrecadado; e (iii) ausência de comprovada má-fé do prestador de contas. (REspe n. 183369, Relator Min. Luiz Fux, DJE, Tomo 239, Data 19.12.2016, Página 32-33; REspe n. 263242, Relatora Min. Rosa Maria Weber Candiota da Rosa, DJE, Tomo 202, Data 20.10.2016, Página 15.)".

No caso concreto, o defeito em tela deve ser considerado em sua integralidade, ou seja, no montante de R$ 1.100,00, e não apenas no que ultrapassa o limite legal, equivalendo a 20% do somatório de recursos arrecadados (R$ 5.290,71), não se qualificando como irrisório.

Destarte, sobressai que a mácula nas contas é grave, apta a prejudicar a confiabilidade das informações e a impedir a fiscalização pela Justiça Eleitoral da adequação contábil aos ditames legais insculpidos na Resolução TSE n. 23.463/15, cabendo a sua desaprovação.

Nesse trilhar, reconhecida a doação de origem não identificada e em valor superior ao limite estabelecido pela legislação eleitoral, deve a respectiva importância ser integralmente recolhida ao Tesouro Nacional, a teor do § 3º do art. 18 da Resolução TSE n. 23.463/15.

Por consequência, a sentença não merece reparos.

Ante o exposto, VOTO pela rejeição da preliminar e pelo desprovimento do recurso, mantendo integralmente a sentença recorrida.

É como voto, senhor Presidente.