RE - 20361 - Sessão: 27/06/2018 às 10:00

RELATÓRIO

Trata-se de recurso interposto por PAULO MARQUES DOS REIS (fls. 71-77), candidato ao cargo de vereador no Município de Porto Alegre, contra sentença do Juízo da 113ª Zona Eleitoral (fl. 65 e v.), que desaprovou suas contas relativas ao pleito de 2016, com fundamento no art. 68, inc. III, da Resolução TSE n. 23.463/15.

Em suas razões, o recorrente arguiu, preliminarmente, cerceamento de defesa, em razão de não lhe ter sido oportunizada manifestação após o exame técnico conclusivo, em descumprimento ao art. 66 da Resolução TSE n. 23.463/15. No mérito, afirmou que a diferença detectada, no valor de R$ 7.588,00 (sete mil quinhentos e oitenta e oito reais), refere-se à compra de material gráfico cuja nota fiscal apresentou com o recurso (fl. 78).

Requereu, por fim, em preliminar, a desconstituição da sentença e a abertura de novo prazo para manifestar-se acerca dos apontamentos constantes do relatório conclusivo e, no mérito, o provimento do recurso para serem aprovadas as contas.

Nesta instância, com vista dos autos, a Procuradoria Regional Eleitoral manifestou-se pela rejeição da prefacial de cerceamento de defesa e, no mérito, pelo desprovimento do recurso (fls. 82-85).

É o relatório.

 

VOTO

Admissibilidade Recursal

A sentença foi publicada no DEJERS no dia 24.01.2018, quarta-feira (fl. 69), tendo sido protocolizada a petição recursal em 29.01.2018, segunda-feira (fl. 71).

Portanto, o recurso é tempestivo, pois interposto dentro do tríduo legal, e preenche os demais pressupostos de admissibilidade, razões pelas quais dele conheço.

 

Preliminar de Cerceamento de Defesa

O recorrente arguiu, preliminarmente, cerceamento de defesa em razão da ausência de abertura de prazo para sua manifestação após a emissão do parecer conclusivo, conforme prevê o art. 66 da Resolução TSE n. 23.463/15, a seguir transcrito:

Art. 66. Emitido parecer técnico conclusivo pela existência de irregularidades e/ou impropriedades sobre as quais não se tenha dado oportunidade específica de manifestação ao prestador de contas, a Justiça Eleitoral o notificará para, querendo, manifestar-se no prazo de setenta e duas horas contadas da notificação, vedada a juntada de documentos que não se refiram especificamente à irregularidade e/ou impropriedade apontada. (Grifei.)

Inicialmente, cabe ressaltar que a presente prestação de contas seguiu o rito simplificado, regulamentado nos arts. 57 a 62 da Resolução TSE n. 23.463/15, uma vez que a movimentação financeira apurada foi inferior a R$ 20.000,00 (art. 57, caput).

Desse modo, inaplicável o art. 66 da Resolução TSE n. 23.463/15 ora invocado, o qual se refere à prestação de contas pelo rito ordinário.

In casu, o relatório de exame técnico das contas (fls. 13-17) identificou, entre outras irregularidades, o registro de despesas oriundas da compra de material gráfico de campanha, cujo pagamento não foi verificado no extrato bancário.

Ato contínuo, foi oportunizado ao candidato (despacho de fl. 19) manifestar-se acerca do referido relatório, no prazo de 03 (três) dias, podendo juntar documentos ou retificar a prestação, nos termos do art. 59, § 3º, da Resolução TSE n. 23.463/15 (rito simplificado), in verbis:

Art. 59. […]

§ 3º Concluída a análise técnica, caso tenha sido oferecida impugnação ou detectada qualquer irregularidade pelo órgão técnico, o prestador de contas será intimado para se manifestar no prazo de três dias, podendo juntar documentos.

O prestador requereu a dilação do prazo por 15 (quinze) dias para se manifestar (fls. 23-24), o que foi deferido (fl. 26), tendo apresentado resposta aos apontamentos (fls. 30-33) e peças impressas a título de nova prestação de contas (fls. 34-45), a qual não foi, contudo, transmitida via Sistema de Prestação de Contas Eleitorais desta Justiça Especializada.

Sobreveio parecer técnico conclusivo (fls. 58-60) informando que, a despeito dos esclarecimentos prestados e da correção dos lançamentos relativos aos valores declarados procedida pelo candidato nos documentos físicos apresentados a título de prestação retificadora (fls. 34-45), parte das falhas indicadas no exame das fls. 13-17 permaneciam. Dentre as faltas remanescentes, a que conduziu à desaprovação das contas pelo juízo de primeiro grau, sobre a qual, frisa-se, o candidato já havia prestado esclarecimentos.

Dessa forma, não se vislumbra o alegado cerceamento de defesa.

Por essas razões, afasto a preliminar suscitada.

Juntada de documentos em grau recursal

Ainda em sede preliminar, cumpre registrar a viabilidade dos documentos apresentados com o recurso.

A Procuradoria Regional Eleitoral, em seu parecer (fls. 82-85), informou que deixaria de analisar o documento apresentado pelo recorrente com a peça recursal, ao argumento de que o Tribunal Superior Eleitoral pacificou entendimento reconhecendo a "incidência dos efeitos da preclusão em tais casos".

Com efeito, o egrégio Tribunal Superior Eleitoral posicionou-se no sentido de que "julgadas as contas, com oportunidade prévia para saneamento das irregularidades, não se admite, em regra, a juntada de novos documentos" (TSE, AgReg no RESPE n. 239956, Relatora Min. Rosa Weber. DJE: 31.10.2016).

Todavia, sempre em juízo de exceção, este Regional tem se pautado pela potencialização do direito de defesa no âmbito dos processos de prestação de contas, especialmente quando se trata de documento simples, que dispense a necessidade de nova análise técnica ou de diligências complementares, não apresentando prejuízo à tramitação processual.

O posicionamento encontra supedâneo no art. 266 do Código Eleitoral e está amparado pela reiterada jurisprudência deste Regional, conforme ilustra a ementa da seguinte decisão:

Recurso Eleitoral. Prestação de contas. Candidato. Arrecadação e dispêndio de recursos de campanha. Resolução TSE n. 23.463/15. Eleições 2016.

Preliminar afastada. É faculdade do juiz eleitoral a conversão das contas simplificadas para o rito ordinário, a fim de que sejam apresentadas contas retificadoras. Art. 62 da Resolução TSE n. 23.463/15. A falta de conversão, frente à possibilidade de prolação da sentença com os elementos constantes nos autos, não acarreta cerceamento de defesa. Oportunizada a manifestação do candidato acerca do parecer do órgão técnico, ocasião em que juntados documentos.

Conhecimento dos documentos apresentados em grau recursal, nos termos do art. 266 do Código Eleitoral.

A ausência de registro de doação ou cessão de veículo automotor é irregularidade sanável. Apresentação de retificação das contas, de modo a suprir a omissão e possibilitar a aprovação da contabilidade.

Provimento.

(TRE-RS - RE n. 522-39/RS, Relator: Des. Federal Paulo Afonso Brum Vaz, Data de Julgamento: 14.3.2017.)

Prossigo, passando ao exame da questão de fundo.

 

Do mérito

As contas do recorrente foram desaprovadas em razão da ausência de comprovação do pagamento de dívida de campanha, no valor de R$ 7.588,00 (sete mil quinhentos e oitenta e oito reais). A irregularidade foi assim descrita no parecer técnico conclusivo e reproduzida na sentença atacada, verbis:

Ocorre que, realizada a análise do extrato bancário, ficou constatado o total de R$ 7.760,00 em pagamentos, estando ausente, dos documentos presentes dos autos, o registro de R$ 7.588,00. O candidato informou duas despesas contratadas perante o fornecedor ANS IMPRESSÕES GRÁFICAS LTDA., CNPJ n. 05.677.050/0001-21, na data de 13/09/2016, nos valores de R$ 1.875,00 e R$ 5.713,00, (fls. 39-40) ambas pagas por meio de transferência eletrônica em 16/11/2016, que não constam do extrato bancário eletrônico. Além disso, não foram juntadas as notas fiscais respectivas das despesas informadas, ns. 20159661-1 e 20165996-1. Em suma, não é possível aferir a regularidade dos gatos retificados pelo candidato.

O exame dos autos demonstra que o referido valor é parte do montante de R$ 11.668,00 (onze mil seiscentos e sessenta e oito reais) apontado no exame técnico (fl. 17) como dívidas decorrentes do não pagamento de despesas contraídas na campanha.

Intimado acerca do relatório de exame, o candidato apresentou manifestação (fls. 30-33) acompanhada de peças impressas de nova prestação de contas, nas quais promoveu alteração de valores com o intuito de corrigir as falhas verificadas pela unidade técnica responsável pela análise das contas.

De destacar, primeiramente, que a nova prestação não foi encaminhada pelo sistema informatizado desta Justiça Especializada (SPCE), circunstância que lhe retira eficácia, uma vez que impossibilita o cruzamento de dados com os sistemas da Receita Federal.

Por essa razão, a legislação de regência impõe que a entrega da prestação de contas seja efetuada pelo acima referido sistema informatizado SPCE.

Vejamos o que dispõe, a respeito da matéria, a Resolução TSE n. 23.463/15:

Art. 49. A elaboração da prestação de contas deve ser feita e transmitida por meio do SPCE, disponibilizado na página da Justiça Eleitoral na Internet.

 

Art. 59. A prestação de contas simplificada será composta exclusivamente pelas informações prestadas diretamente no SPCE e pelos documentos descritos nas alíneas a, b, d e f do inciso II do caput do art. 48.

§ 1º A adoção da prestação de contas simplificada não dispensa sua apresentação por meio do SPCE, disponibilizado na página do Tribunal Superior Eleitoral na Internet.

De igual forma, o art. 65, § 1º, inc. I, da citada Resolução obriga que a retificação da prestação de contas se dê via SPCE.

Art. 65. A retificação da prestação de contas somente é permitida, sob pena de ser considerada inválida:

I - na hipótese de cumprimento de diligências que implicar a alteração das peças inicialmente apresentadas;

II - voluntariamente, na ocorrência de erro material detectado antes do pronunciamento técnico; ou

III - no caso da conversão prevista no art. 62.

§ 1º Em quaisquer das hipóteses descritas nos incisos I a III, a retificação das contas obriga o prestador de contas a:

I - enviar o arquivo da prestação de contas retificadora pela Internet, mediante o uso do SPCE;

(…) (Grifei.)

Entretanto, mesmo que válida fosse a prestação retificadora apresentada, não se mostra apta a sanar a falha apontada pelo examinador da contabilidade.

Isso porque, de acordo com lançamentos inseridos na documentação acostada pelo candidato às fls. 33-45, o valor em menção se refere a duas despesas contraídas junto à empresa ANS Impressões Gráficas Ltda., CNPJ n. 05.677.050/0001-21, na data de 13.9.2016, nos valores de R$ 1.875,00 (mil oitocentos e setenta e cinco reais) e R$ 5.713,00 (cinco mil setecentos e treze reais), os quais teriam sido pagos por transferência eletrônica em 16.11.2016.

Já em sua manifestação às fls. 30-33, o recorrente informou, textualmente, ter efetuado O pagamento ANS Impressões gráficas Ltda. CNPJ 05.677.050/0001-21 no montante de R$7.588,00 através de saque eletrônico.

No entanto, o exame do extrato bancário eletrônico acostado à fl. 12 e v. não confirma essa informação. Com efeito, o referido demonstrativo não contempla saques ou transferências nos valores indicados e, além disso, a única transação realizada no dia 16.11.2016 na conta de campanha do candidato é uma transferência de R$2,00 (dois reais) para o Órgão de Direção Municipal do então Partido do Movimento Democrático Brasileiro (PMDB).

Assim, é autorizado concluir que o pagamento das referidas despesas foi efetivado à margem da conta bancária de campanha, em clara infração à regra insculpida no art. 32 da Resolução TSE. n. 23.463/15, o qual estabelece, in verbis:

Art. 32.

Os gastos eleitorais de natureza financeira só podem ser efetuados por meio de cheque nominal ou transferência bancária que identifique o CPF ou CNPJ do beneficiário, ressalvadas as despesas de pequeno valor previstas no art. 33 e o disposto no § 4º do art. 7º.

Ora, a finalidade da exigência normativa é coibir a possibilidade de transações que ocultem ou dissimulem eventuais ilicitudes.

O documento apresentado pela parte em sede recursal, a seu turno, não se presta a elucidar a questão, uma vez que se trata da nota fiscal eletrônica referente à despesa efetuada, nenhuma informação trazendo acerca do pagamento do valor contratado. Sobre esse aspecto, aliás, a Procuradoria Regional Eleitoral assentou que a referida nota fiscal não permite verificar que o valor pago ocorreu por transferência da conta bancária específica destinada a registrar a movimentação financeira de campanha (fl. 84v.).

Desse modo, consideradas todas essas circunstâncias, concluo que o recorrente não obteve êxito em esclarecer a contento a divergência verificada entre os débitos constantes na movimentação bancária e as informações inseridas na prestação de contas.

A falha constatada, em percentual superior a 49% do total das despesas efetuadas – R$15.348,00 – importa em falta grave que compromete o controle e a fiscalização dos recursos utilizados em campanha, de forma que a manutenção da sentença de desaprovação é medida que se impõe.

Nesse sentido, colho o seguinte aresto deste Tribunal em caso análogo:

RECURSO. PRESTAÇÃO DE CONTAS. CANDIDATO. VEREADOR. DESAPROVAÇÃO. ELEIÇÕES 2016. DIVERGÊNCIA ENTRE VALORES MOVIMENTADOS E OS INFORMADOS NA CONTABILIDADE. DEVOLUÇÃO DE CHEQUE. AUSENTE JUSTIFICATIVA SOBRE A DESPESA. OMISSÃO CARACTERIZADA. DESPROVIMENTO.

Divergências entre os débitos constantes na movimentação bancária e os informados na contabilidade, bem como pagamento de despesas por via diversa da conta bancária. Demonstrada, no extrato bancário, a emissão de cheque devolvido. Cártula não apresentada nos autos e ausentes justificativas do prestador quanto à realização dessa despesa. Omissão caracterizada. Incorreções nos registros contábeis que inviabilizam o exame do trânsito financeiro das contas de campanha do candidato. Manutenção da sentença de desaprovação.

Desprovimento.

(TRE/RS – RE n. 504-60 – Relator Dr. Rafael da Cás Maffini – Julgado em Sessão dia 6.12.2017.) (Grifei.)

Diante do exposto, afastada a matéria preliminar, VOTO pelo desprovimento do recurso, para manter a sentença que desaprovou as contas de PAULO MARQUES DOS REIS, relativas ao pleito de 2016 em Porto Alegre, com fulcro no art. 68, inc. III, da Resolução TSE n. 23.463/15.