RE - 26272 - Sessão: 26/06/2018 às 17:00

RELATÓRIO

Trata-se de recurso interposto por ODEGAR MENDES RAYMUNDO (fls. 51-59), candidato ao cargo de vereador em Nova Santa Rita, contra sentença do Juízo da 66ª Zona Eleitoral (fl. 41 e v.) que julgou desaprovadas as contas relativas ao pleito de 2016 em razão da inexistência de extratos bancários comprobatórios da movimentação financeira.

O recorrente aduziu a nulidade da sentença, por ausência de intimação acerca da irregularidade detectada, requerendo a desconstituição do decisum. No mérito, sustentou a inexistência de falhas que justifiquem a reprovação das contas, pedindo sua aprovação.

Neste Tribunal, os autos foram com vista à Procuradoria Regional Eleitoral, que opinou pela anulação da sentença e pelo retorno dos autos à origem (fls. 73-75).

É o relatório.

VOTO

O recurso é tempestivo (fls. 47-51) e preenche os demais requisitos de admissibilidade, razão por que dele conheço.

Primeiro, de maneira prefacial, afasto a tese da Procuradoria Regional Eleitoral de nulidade da decisão recorrida, a qual seria “carente de fundamentação por não analisar todas as irregularidades que ensejam a desaprovação das contas prestadas”. Transcrevo as razões expendidas pelo agente ministerial nesse tocante (fls. 74-75):

[...]

No entender deste signatário, a sentença de fls. 41 e verso não analisou todos os pontos controvertidos da presente prestação de contas, limitando-se a fazer afirmações genéricas, sem adentrar no exame das irregularidades pertinentes na prestação.

Nessa linha intelectiva, é de ser decretada a nulidade da sentença por falta de fundamentação, com fundamento no §3º inciso IV do art. 1.013 do CPC.

Da mesma forma, o parecer técnico conclusivo da fl. 37 não procedeu à análise técnica que lhe competia quanto à comprovação, ou não, das doações e gastos de valores estimados declarados pelo candidato, limitando-se a apontar apenas a ausência de extrato bancário.

Destaque-se, ademais, que no parecer técnico conclusivo de fl. 37, em que analisada a prestação de contas dos gastos eleitorais do candidato, consta a informação de que não houve a apresentação dos extratos bancários que pudessem comprovar a movimentação financeira.

Ainda nesse desiderato, foi apresentado pelo candidato “Demonstrativo de Receitas/Despesas” dando conta de valores recebidos de pessoa física – R$ 380,00, bem como de partido político – R$ 90,00, além do valor de R$ 90,00 sob a rubrica de “Outros Recursos”, todos a título de bens estimáveis em dinheiro (fl. 15).

Além disso, consoante se observa do extrato de prestação de contas final (fl. 14), o candidato teria realizado gastos com serviços realizados por terceiros no valor de R$ 380,00 (trezentos e oitenta reais), bem como gastos com publicidade por materiais impressos no valor de R$ 90,00 (noventa reais), não tendo o laudo técnico feito qualquer menção a tais apontamentos.

A ausência de documentos hábeis e idôneos que comprovem as receitas e os gastos que o candidato efetuou durante sua campanha eleitoral configura irregularidade grave na prestação de contas do candidato, a qual o parecer técnico conclusivo da fl. 37 e a sentença de fls. 41 e verso não abordam em nenhum momento de seus fundamentos.

Portanto, a alegação do candidato sem a demonstração destes gastos com a juntada dos documentos conforme determina o art. 48, II, da Resolução nº 23.463/2015 do TSE, enseja a desaprovação das contas apresentadas.

Com efeito, a decisão recorrida analisou a questão de fundo sob o viés da ausência de documentos imprescindíveis ao exame, assentando que, embora aberta a conta bancária específica de campanha, não foram apresentados os extratos comprobatórios da movimentação financeira (fl. 41 e v.).

Nesse cenário, tenho que não se trata de omissão na análise da prestação de contas e, sim, do entendimento do juízo a quo do que efetivamente afigurou como falha – com esteio, aliás, naquilo que fora reconhecido como irregularidade pelo examinador técnico à origem (a única falha, diga-se de passagem).

Assim, verifica-se verdadeira divergência do órgão ministerial com a interpretação dada aos documentos integrantes dos autos. Bem ou mal, o juiz singular pautou seu convencimento na ausência dos extratos, sem considerar os demais itens elencados pelo eminente Procurador Regional Eleitoral como causa à reprovação.

A situação, pois, em tese, poderia ser alterada mediante recurso do fiscal da ordem jurídica (o qual foi devidamente intimado da sentença na fl. 45), hipótese não concretizada, e não em sede de recurso exclusivo do prestador, sob pena de operar-se a vedada reformatio in pejus, conforme pacífica jurisprudência.

RECURSO. PRESTAÇÃO DE CONTAS. CANDIDATO. VEREADOR. DESAPROVAÇÃO. ELEIÇÕES 2016. PREFACIAL DE NULIDADE DA SENTENÇA AFASTADA. DESPESAS COM COMBUSTÍVEL SEM REGISTRO DE CESSÃO DE VEÍCULO. DEPÓSITO EM ESPÉCIE ACIMA DO LIMITE REGULAMENTAR. RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. PROVIMENTO PARCIAL.

1. Afastada a preliminar de nulidade da sentença por negativa de vigência ao art. 26 da Resolução TSE n. 23.463/15. Divergência do órgão ministerial relativa à interpretação feita pelo magistrado na origem. Inexistência da ordem de recolhimento de valor porque o mesmo não foi considerado como de origem não identificada na sentença. Circunstância que poderia ser alterada apenas mediante recurso do fiscal da ordem jurídica, e não em sede de recurso exclusivo do prestador.

2. Despesas com combustível sem a correspondente locação ou cessão de veículo. Falha superada com a apresentação de documentos demonstrando a cessão regular de automóvel pelo próprio candidato.

3. Depósito em dinheiro, na conta específica, em valor acima do limite estipulado no § 1º do art. 18 da Resolução TSE n. 23.463/15. Não identificada a origem mediata da doação, cuja quantia foi efetivamente utilizada na campanha eleitoral. Falha significativa, representando 58,06% da totalidade das receitas recebidas pelo candidato, impondo a desaprovação das contas. Recolhimento ao Tesouro Nacional.

Provimento parcial.

(TRE/RS – RE n. 385-75 – Relator Des. Eleitoral Jorge Luís Dall'Agnol – J. Sessão de 5.12.2017.) (Grifei.)

Ademais, gizo que não houve a oposição de embargos de declaração em face do decisum, a realçar a inviabilidade de pronunciamento pela nulidade da decisão.

Segundo, estou acolhendo a preliminar recursal de nulidade da sentença, por cerceamento de defesa, dada a ausência de intimação do prestador para regularização da irregularidade deflagrada pela unidade técnica, a qual, repise-se, balizou a conclusão disposta na sentença.

Efetivamente, dos autos se constata que a intimação levada a efeito e considerada como regular pelo juízo de primeira instância (fl. 36), via carta "AR", foi recebida por terceiro e não pelo ora recorrente.

Nada obstante, é de rigor sublinhar o erro da serventia cartorária em não cumprir o ato por meio de nota de expediente dirigida ao advogado da parte, haja vista o caráter jurisdicional do feito e a impositiva observância da forma de intimação na pessoa do procurador constituído (procuração à fl. 6) – tal como assinalado na resolução de regência no art. 84, conjugado com os arts. 41, § 6º, e 48, inc. II, al. “f”.

Anoto que, após o retorno do aludido comprovante “AR”, adveio o parecer técnico conclusivo e a manifestação do MPE local, este igualmente pela desaprovação, sobrevindo a prolação da sentença em tela.

Tal cenário denota o risco de se reconhecer motivo para reprovação sobre o qual o candidato não foi ouvido, em afronta aos primados constitucionais do contraditório e da ampla defesa.

Esse é o sentido da jurisprudência, conforme se infere, de modo exemplificativo, do seguinte aresto deste Regional:

Recurso. Prestação de contas de candidato. Desaprovação no juízo originário. Eleições 2012. Acolhida a preliminar de nulidade da sentença por cerceamento de defesa.

Documentação nova apresentada pelo "parquet", sobre a qual o recorrente não teve acesso, vez que não intimado, e que, ademais, embasou a sentença pela desaprovação das contas, revela afronta aos princípios do contraditório e da ampla defesa, gerando prejuízo ao recorrente.

Reconhecida a nulidade da sentença prolatada. Retorno dos autos ao juízo de origem.

(TRE/RS – RE n. 309-69 – Relator Dr. Ingo Wolfgang Sarlet – DEJERS de 13.5.2013.) (Grifei.)

O caso vertente ganha contornos mais graves diante da possibilidade de, ao final, com o desprovimento do recurso, advir decisão desfavorável ao recorrente. Na eventualidade de recurso ao TSE, este poderá anular o acórdão, fazendo retornar os autos para refazimento dos atos perpetrados.

Portanto, dentro desse contexto, impõe-se a desconstituição da sentença e o retorno dos autos à origem, a fim de ser devidamente intimado o prestador acerca do apontamento técnico, com posterior observância pelo Juízo da 66ª Zona Eleitoral do procedimento aplicável à espécie.

Diante do exposto, VOTO no sentido de anular a sentença e determinar o retorno dos autos ao Juízo da 66ª Zona Eleitoral, a fim de intimar ODEGAR MENDES RAYMUNDO para se manifestar sobre o apontamento do examinador técnico, nos termos da fundamentação, preservando-se os demais atos praticados no processo.