INQ - 244 - Sessão: 15/08/2018 às 17:00

RELATÓRIO

Cuidam os autos de pedido de arquivamento de inquérito instaurado para apurar a suposta prática do delito tipificado no art. 299 do Código Eleitoral, por CORINHA BEATRIS ORNES MOLLING, Prefeita de Sapiranga, GILBERTO GOETERT, Vice-Prefeito de Sapiranga, e DORLY DAMBROS, candidato a Vereador, mediante a oferta de benefícios pessoais a eleitores em troca de seus votos nos candidatos acima referidos.

Os autos foram remetidos a esta instância com fundamento no art. 29, inc. X, da Constituição Federal, em razão do exercício da chefia do executivo desempenhado por Corinha Molling.

A Procuradoria Regional Eleitoral requereu o arquivamento do expediente em relação à Prefeita, com a remessa dos autos ao primeiro grau, a fim de prosseguir o inquérito em relação aos demais investigados (fls. 74-77).

É o breve relatório.

 

VOTO

O inquérito foi instaurado para apurar notícia de possível distribuição de benefícios pessoais a eleitores, tais como pagamento de contas de luz e água, em troca de seus votos, conduta tipificada no art. 299 do Código Eleitoral:

Art. 299. Dar, oferecer, prometer, solicitar ou receber, para si ou para outrem, dinheiro, dádiva, ou qualquer outra vantagem, para obter ou dar voto e para conseguir ou prometer abstenção, ainda que a oferta não seja aceita:

Pena - reclusão até quatro anos e pagamento de cinco a quinze dias-multa.

A investigação teve início a partir da notícia de duas infrações.

A primeira, uma denúncia anônima de que um caminhão da prefeitura havia despejado uma carga de saibro em frente a uma empresa privada – MQV Artes Gráficas, suscitando dúvidas a respeito da finalidade eleitoral da benesse (fl. 14).

Ao ser ouvido pela autoridade policial, o proprietário da empresa, Oseias Joaquim de Moura, disse que o material depositado em frente da mesma constitui-se de raspas de asfalto decorrentes de serviço de recapeamento realizado pela concessionária da RS 293. Disse ter solicitado a um funcionário que a carga fosse utilizada no local para tapar buracos existentes no asfalto em frente à empresa. Afirmou ainda que o material foi deixado ali por um caminhão da prefeitura, mas negou que o acontecimento tivesse relação com as eleições municipais.

A segunda, uma denúncia de Érico do Nascimento, informando que era orientado a oferecer e dar benesses a eleitores com materiais de campanha quando trabalhou para a candidatura de Corinha Molling (fl. 07).

Ao prestar depoimento, Érico confirmou a notícia do delito, dando detalhes sobre o pagamento de despesas de eleitores e entregando recibo de algumas dessas operações (fl. 44).

As pessoas identificadas nos recibos também foram ouvidas e confirmaram o recebimento dos valores ali registrados, mas negaram qualquer pedido de voto em troca.

O douto Procurador Regional Eleitoral bem descreveu os fatos apurados no inquérito:

Ouvido em sede policial, em 16-05-2017, Erico disse ser filiado ao PP há seis anos e confirmou o relato encaminhado ao MPE. Acrescentou o seguinte (fls. 38-39): (…) o declarante era uma das pessoas que comunicava os responsáveis do Comitê do Partido – PP, sobre as dificuldades de eleitores da sua cidade; QUE o coordenador da campanha eleitoral de Corinha Molling, era seu marido e Deputado Federal Renato Molling; QUE a candidata à prefeita Corinha Molling e seu vice Bentinho, eram quem determinavam os valores em dinheiro, liberados para pagamentos das 'contas' de eleitores; QUE o declarante atendia os pedidos dos eleitores, entregando pessoalmente o valor solicitado para o pagamento de suas demandas; QUE admite ter pago o aluguel da Sra. Jussara Lopes, conforme recibo no valor de R$ 380,00 (trezentos e oitenta reais), referente ao aluguel do mês de outubro de 2016, que apresenta neste ato; QUE esse valor foi pago diretamente ao proprietário do imóvel alugado, Sr. Cleiton M. Da Cruz; QUE no momento em que fazia o pagamento da dívida do eleitor, colocava um banner dos candidatos Corinha Molling, seu vice, Bentinho, e do candidato a vereador Dorly Dambros, todos do Partido Progressista; QUE o declarante compromete-se a informar a esta AP, os endereços e telefones de Jussara Lopes e Cleiton M. Da Cruz; QUE apresenta o recibo nº 45471, da empresa Transporte e Com. De Gás Steyer Ltda., referente a aquisição de um botijão de gás, retirado na referida empresa e entregue para uma moradora do seu bairro, em troca de votos; QUE também compromete-se, oportunamente, repassar os dados dessa moradora, na qual também foi colocado banner do seu partido político; QUE expõe um recibo no valor de R$ 200,00 (duzentos reais), de 25/09/2016, referente ao pagamento de aluguel da Sra. Adriana Raquel Diefenbal; QUE aludido pagamento de aluguel foi feito em troca de seu voto e da colocação de propaganda política em sua residência (…)

Os recibos mencionados no seu depoimento encontram-se encartados na fl. 44. Afora isso, o noticiante não voltou a entrar em contato com a Polícia Federal e tentativas de localizá-lo resultaram infrutíferas, conforme dá conta a certidão datada de 18-09-2017 (fl. 46).

Nada obstante, foram identificadas e ouvidas duas das pessoas por ele referidas. Cleiton Maicon Rodrigues da Cruz confirmou ser sua a assinatura no primeiro recibo da fl. 44 e disse ter recebido referido valor como pagamento do aluguel de ex-inquilina de um dos imóveis de seu pai. Disse que nunca foi procurado por ninguém pedindo voto e, inclusive, seu domicílio eleitoral é no Paraná (fl. 54).

Adriana Raquel Diefenbach, por sua vez, confirmou ter sido visitada por Erico e pelo então candidato Derly em julho de 2016 (fl. 51):

(…) QUE nesta visita, Erico comentou com Dorly que a declarante estava com o fornecimento de água interrompido e encontrava-se muito doente; QUE o candidato se sensibilizou com a situação precária de saúde da declarante e tirou do bolso a quantia de duzentos reais, entregando para ela; QUE frisa a declarante que Dorly Dambros em nenhum momento solicitou para votar nele, pelo contrário, após entregar o dinheiro ele foi embora imediatamente; QUE nunca recebeu proposta de compra de seu voto; QUE acredita que Dorly Dambros deu o dinheiro de “bom coração”, pois já indo embora; QUE a declarante afirma que não votou nesse candidato, pois sequer sabia o nome dele, sendo que apenas há alguns meses tomou conhecimento dos fatos, porque recebeu um telefonema de Erico Munhoz, de um número de Santa Catarina, dizendo que ela deveria comparecer numa audiência na Polícia Federal, alegando que vendeu seu voto para o candidato Dorly Dambros; QUE somente nesta conversa tomou conhecimento do nome do político; QUE lembra ainda, que Erico Munhoz durante a conversa por telefone comentou com a declarante que iria ganhar um bom dinheiro e ajudaria quem ajudasse ele; QUE acrescenta a declarante que está revoltada com a situação, pois teve que pedir dinheiro emprestado para vir depor, por causa do Sr. Erico Munhoz, que não tem palavra, sendo que o mesmo está constantemente bêbado.

Segundo Relatório de Missão Policial de 07-11-2017, Jussara Lopes encontra-se em local incerto e não sabido; e o endereço constante no recibo de gás apresentado pelo noticiante não possibilitou a identificação da suposta eleitora que teria sido beneficiada (pois inexiste o número 336 na rua indicada). Tentado novamente contato com o noticiante, não foi possível encontrá-lo no endereço por ele indicado nem em outros constantes dos bancos de dados (fl. 57).

Como se verifica pela apuração realizada, não há indícios da participação de Corinha Molling. Os eleitores ouvidos negaram o pedido de voto e não referem o nome da candidata. Resta apenas a versão do noticiante Érico, mas que ficou isolada entre os elementos de informação colhidos.

Não obstante, vislumbram-se indícios de prática delituosa por Dorly Dambros, referido pela eleitora Adriana e por Érico, justificando-se eventual prosseguimento das investigações em relação a eles.

Nesse sentido o parecer ministerial:

Com efeito, nenhuma das pessoas ouvidas referiu ter sido procurada pela Prefeita Municipal, CORINHA BEATRIS ORNES MOLLING, seja pessoalmente, seja por alguém a seu mando, a fim de trocar seu voto por alguma benesse. O único elemento que pesa em desfavor da referida investigada é a palavra do noticiante Erico Munhoz Nascimento, a qual é insuficiente, por si só, para justificar o oferecimento de uma ação penal. Além disso, conforme consignado pela digna autoridade policial condutora da investigação, foram esgotadas as diligências possíveis e o noticiante não mais se apresentou nem foi possível localizá-lo para que complementasse os informes.

Por outro lado, depreende-se do depoimento de Adriana Raquel Diefenbach a possível prática do crime de corrupção eleitoral (CE, art. 299) pelo então candidato a vereador, DORLY DAMBROS, na medida em que, independentemente de pedido expresso de voto, deu duzentos reais para eleitora (título eleitoral em anexo) durante visita de promoção de sua candidatura.

Ademais, conquanto Erico Munhoz Nascimento tenha afirmado que trabalhou como cabo eleitoral de DORLY DAMBROS e a eleitora Adriana Raquel Diefenbach tenha confirmado que ambos compareceram juntos à sua residência, o candidato a vereador não declarou a respectiva despesa de contratação desse cabo eleitoral na prestação de contas de sua candidatura à Justiça Eleitoral (impressão em anexo), conduta que pode, ao menos em tese, configurar o crime de falsidade ideológica com finalidade eleitoral (CE, art. 350).

Nesse contexto, não havendo indícios da prática de crime pela Prefeita Municipal, mas, por outro lado, havendo indícios da eventual prática de crimes eleitorais por candidato a vereador (não eleito), não subsiste a atribuição desta PRERS para a formação de opinio delicti, impondo-se a devolução dos autos à primeira instância.

Assim, inexistindo indícios de crime pela Prefeita de Sapiranga, não se justifica a manutenção da competência originária, motivo pelo qual acolho o pleito ministerial e determino o arquivamento do presente feito em relação à referida investigada por falta de elementos de informação, com a ressalva do disposto no art. 18 do Código de Processo Penal e no art. 11 da Resolução TSE n. 23.363/11, declinando da competência em relação aos demais investigados.

 

DIANTE DO EXPOSTO, voto pelo arquivamento do expediente em relação à investigada Corinha Beatris Ornes Molling, com a ressalva do disposto no art. 18 do Código de Processo Penal e no art. 11 da Resolução TSE n. 23.363/11, declinando da competência ao juízo de primeiro grau, para a autoridade competente adotar as medidas que entender cabíveis quanto ao objeto do presente inquérito.