RE - 756 - Sessão: 30/08/2018 às 18:00

RELATÓRIO

Trata-se de recursos interpostos por OSMAR FÁBIO DILLMANN contra decisão do Juízo da 102ª Zona Eleitoral, que indeferiu requerimento de transferência do domicílio eleitoral do recorrente, por entender não comprovado o vínculo social duradouro do eleitor com o Município de Santo Cristo.

O recorrente, em suas razões recursais (fls. 15-18), alega possuir vínculo social e esportivo com o Município de Santo Cristo, como demonstra mediante sua inscrição em associação local. Requer o deferimento de sua transferência de domicílio.

Nesta instância, a Procuradoria Regional Eleitoral manifestou-se pelo desprovimento do recurso (fls. 26-28).

É o relatório.

VOTO

O eleitor recorrente, Osmar Fábio Dillmann, requereu a transferência de seu domicílio eleitoral para o Município de Santo Cristo. O pleito foi indeferido em primeiro grau porque o eleitor não teria demonstrado vínculo social duradouro na localidade.

O domicílio eleitoral e sua transferência estão disciplinados nos arts. 42, parágrafo único, e 55, inc. III, do Código Eleitoral:

art. 42. O alistamento se faz mediante a qualificação e inscrição do eleitor.

Parágrafo único. Para o efeito da inscrição, é domicílio eleitoral o lugar de residência ou moradia do requerente, e, verificado ter o alistando mais de uma, considerar-se-á domicílio qualquer delas.

Art. 55. Em caso de mudança de domicílio, cabe ao eleitor requerer ao Juiz do novo domicílio sua transferência, juntando o título anterior.

§ 1° A transferência só será admitida satisfeitas as seguintes exigências:

(...)

III – residência mínima de 3 (três) meses no novo domicílio, atestada pela autoridade policial ou provada por outros meios convincentes.

A legislação vincula o domicílio eleitoral ao local de “residência ou moradia” do eleitor, conferindo à expressão um sentido mais elástico do que o atribuído pelo Código Civil. A partir do texto legal, doutrina e jurisprudência entendem não ser imperativo o ânimo de permanência na localidade, exigindo apenas a existência de um vínculo social, econômico, comercial ou afetivo com o município.

A respeito do conceito de domicílio eleitoral, transcrevo as palavras de José Jairo Gomes:

"No Direito Eleitoral, o conceito de domicílio é mais flexível que no Direito Privado. Com efeito, o artigo 4º, parágrafo único, da Lei n. 6.996/82, dispõe que, `para efeito de inscrição, domicílio eleitoral é o lugar de residência ou moradia do requerente, e, verificado ter o alistando mais de uma, considerar-se-á domicílio qualquer delas. É essa igualmente a definição constante do artigo 42, parágrafo único, do Código Eleitoral. Logo, o Direito Eleitoral considera domicílio da pessoa o lugar de residência, habitação ou moradia, ou seja, não é necessário haver animus de permanência definitiva, conforme visto.

Tem sido admitido como domicílio eleitoral qualquer lugar em que o cidadão possua vínculo específico, o qual poderá ser familiar, econômico, social ou político." (GOMES, José Jairo. Direito Eleitoral. 4. ed. Belo Horizonte: Del Rey, 2009, p. 110-111)
 

Neste mesmo sentido é o entendimento consolidado da jurisprudência, representado pelas seguintes ementas extraídas de julgados do egrégio Tribunal Superior Eleitoral:

RECURSO ESPECIAL. DOMICÍLIO ELEITORAL POR RELAÇÃO PROFISSIONAL. FATO CONSTANTE APENAS DO VOTO DIVERGENTE. ART. 941, § 3°, DO NOVO CPC. MATÉRIA DE DIREITO. PROVIMENTO DO RECURSO.

1. Os fatos constantes do voto vencido devem ser considerados pela instância revisora, mormente quando não estiverem em conflito com o que descrito no voto vencedor. Inteligência do art. 941, § 3º, do novo CPC.

2. O domicílio eleitoral, nos termos da jurisprudência do TSE, vai além do domicílio civil, sendo devida a autorização para a transferência quando estiverem comprovadas relações econômicas, sociais e/ou familiares entre o cidadão e o município para o qual se pretenda a transferência.

3. A análise do domicílio eleitoral, quando não há controvérsia a respeito dos fatos, é questão de direito e pode ser plenamente avaliada pela instância extraordinária.

Recurso especial provido.

Ação cautelar julgada procedente.

(TSE, Recurso Especial Eleitoral n. 7524, Acórdão, Relator Min. Henrique Neves Da Silva, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Tomo 200, Data 18.10.2016, Páginas 83-84)

ELEIÇÃO 2012. RECURSO ESPECIAL. REGISTRO DE CANDIDATO. DEFERIMENTO. DOMICÍLIO ELEITORAL. ABRANGÊNCIA. COMPROVAÇÃO. CONCEITO ELÁSTICO. DESNECESSIDADE DE RESIDÊNCIA PARA SE CONFIGURAR O VÍNCULO COM O MUNICÍPIO. PROVIMENTO.

1) Na linha da jurisprudência do TSE, o conceito de domicílio eleitoral é mais elástico do que no Direito Civil e se satisfaz com a demonstração de vínculos políticos, econômicos, sociais ou familiares. Precedentes.

2) Recurso especial provido para deferir o registro de candidatura.

(Recurso Especial Eleitoral n. 37481, Acórdão, Relator Min. Marco Aurélio Mendes De Farias Mello, Publicação: RJTSE - Revista de jurisprudência do TSE, Volume 25, Tomo 3, Data 18.02.2014, Página 518)

 

O eleitor Osmar Fábio Dillmann admite não possuir domicílio em Santo Cristo, mas afirma ter vínculos sociais e afetivos na localidade. Para demonstrar sua alegação, junta recibo de taxa de inscrição na Sociedade Centro Recreativo Tiradentes, datado de 20.11.2016 (fl. 07) - confirmação de inscrição em campeonato municipal de bolão masculino no ano de 2017, realizado no âmbito daquela associação (fl. 08) - e ficha com a inclusão de seu nome na equipe Tiradentes para a disputa do aludido campeonato (fl. 09).

Entendo que tais documentos são aptos a comprovar o pretendido vínculo social e afetivo com o Município de Santo Cristo.

Veja-se que o domicílio eleitoral não está constituído pela participação no evento esportivo, nem pela inscrição do eleitor no centro recreativo. Tais elementos apenas servem de prova, de evidência a respeito da existência de um vínculo social com o município.

A partir de tais elementos - e com base nas regras da experiência comum, como previsto no art. 375 do Código de Processo Civil -, conclui-se que a frequência a uma sociedade recreativa, por meio da qual integra equipe desportiva, envolve o comparecimento a encontros, treinamento e confraternizações que resultam na criação de laços de amizade com moradores locais.

O próprio engajamento na equipe municipal pode despertar o interesse do eleitor em participar das decisões políticas do município, como o maior ou melhor incentivo ao esporte a que se dedica naquela localidade.

Ademais, os documentos evidenciam um laço duradouro com o município, pois desde 2016 está inscrito na associação recreativa, tendo integrado a equipe no campeonato municipal de 2017 e agora, em 2018, pretende a transferência de seu domicílio eleitoral para a localidade.

Este Tribunal possui precedentes, admitindo que o envolvimento com atividades esportivas são capazes de demonstrar o vínculo afetivo e comunitário com o município:

Recurso. Indeferimento de inscrição eleitoral. Falta de comprovação de domicílio. Art. 42, parágrafo único, do Código Eleitoral.

Vínculo de natureza desportiva do eleitor com o município. Prova documental comprovando a participação efetiva no convívio social e nos eventos desportivos da cidade.

O conceito de domicílio eleitoral é mais amplo do que a definição constante no Código Civil, abarcando, além da residência e moradia, os vínculos patrimoniais, afetivos, profissionais e sociais que o eleitor mantenha com a localidade.

Deferimento da inscrição eleitoral.

Provimento. (TRE/RS, RE3-12, Des. Eleitoral Luis Felipe Paim Fernandes, julgado em 29.4.2014)

Assim, o envolvimento duradouro do eleitor com associação recreativa e atividades desportivas municipais permite concluir pela efetiva existência de laços sociais na localidade, aptos a caracterizar seu domicílio eleitoral.

Deve-se, portanto, dar provimento ao recurso, a fim de autorizar a transferência de domicílio eleitoral para o Município de Santo Cristo.

Registre-se que o cumprimento da sentença, com a anotação da transferência no cadastro eleitoral, somente poderá ocorrer com a viabilidade técnica do sistema da Justiça Eleitoral, tendo em vista o encerramento do prazo para inscrições e transferências de eleitores, nos termos do art. 91 da Lei n. 9.504/97. Ademais, tratando-se de eleições gerais, o recorrente não sofrerá prejuízo em seu direito de voto com a manutenção do atual domicílio eleitoral neste pleito.

 

DIANTE DO EXPOSTO, VOTO pelo provimento do recurso, a fim de deferir a transferência de seu domicílio eleitoral para Santo Cristo, nos termos do voto.