RE - 17411 - Sessão: 29/06/2018 às 17:00

RELATÓRIO

Trata-se de recurso interposto por MARIA LUIZA GONÇALVES NEVES, concorrente ao cargo de vereador, contra sentença do Juízo da 113ª Zona Eleitoral que desaprovou as contas referentes às eleições municipais de 2016, tendo em vista a utilização de recursos próprios sem que a candidata tenha declarado bens no registro de candidatura, doação por depósito em dinheiro acima de R$1.064,10 e inconsistências de informações sobre doações indiretas.

Em suas razões recursais (fls. 47-54), alega ter condições financeiras de arcar com as doações realizadas para sua campanha, acostando declaração de imposto de renda. Argumenta ter realizado saque e depósito da quantia em operações sucessivas no caixa do banco. Alega que a inconsistência nas informações decorre de falha formal no preenchimento do nome do doador. Requer a aprovação das contas.

Foram os autos com vista à Procuradoria Regional Eleitoral, que opinou pelo parcial provimento do recurso (fls. 71-76).

É o breve relatório.

 

VOTO

PRELIMINAR:

O recurso é tempestivo, pois respeitado o prazo de três dias previsto no art. 30, § 5º, da Lei n. 9.504/97. A sentença foi publicada no dia 16.11.2017 (fl. 43), quinta-feira, e o recurso foi interposto no dia 20.11.2017, segunda-feira seguinte (fl. 47).

Preliminarmente ainda cumpre registrar a viabilidade dos documentos apresentados com o recurso, conforme entendimento pacífico deste Tribunal.

Sobre o tema, adoto como razões de decidir os fundamentos expostos pelo Des. Eleitoral Jamil Bannura no RE n. 386-26, julgado em 25.7.2017:

Não olvido de julgados do egrégio TSE no sentido de que “julgadas as contas, com oportunidade prévia para saneamento das irregularidades, não se admite, em regra, a juntada de novos documentos” (TSE, AgReg no RESPE n. 239956, Relatora Min. Rosa Weber, DJE de 31.10.2016). Contudo, entendo que o rigorismo da preclusão deve ser mitigado em favor do esclarecimento dos fatos.

 

Decerto, a aferição e fiscalização contábil das contas dos candidatos em campanhas eleitorais, com o máximo de subsídios possíveis, caminha ao encontro do interesse público e da missão institucional da Justiça Eleitoral na garantia da legitimidade do processo eleitoral.

 

Nesse trilhar principiológico, o STJ tem admitido a juntada de documentos probatórios, em sede de apelação, desde que não sejam indispensáveis à propositura da ação, seja garantido o contraditório e ausente qualquer indício de má-fé (REsp 1.176.440-RO, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, julgado em 17.9.2013; REsp 888.467/SP, Rel. p/ Acórdão Min. Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, julgado em 01.9.2011).

 

Na seara eleitoral própria, o posicionamento encontra supedâneo no art. 266 do Código Eleitoral e está amparado pela reiterada jurisprudência deste Regional, convindo transcrever ementa da seguinte decisão:

 

Recurso Eleitoral. Prestação de contas. Candidato. Arrecadação e dispêndio de recursos de campanha. Resolução TSE n. 23.463/15. Eleições 2016.

Preliminar afastada. É faculdade do juiz eleitoral a conversão das contas simplificadas para o rito ordinário, a fim de que sejam apresentadas contas retificadoras. Art. 62 da Resolução TSE n. 23.463/15. A falta de conversão, frente à possibilidade de prolação da sentença com os elementos constantes nos autos, não acarreta cerceamento de defesa. Oportunizada a manifestação do candidato acerca do parecer do órgão técnico, ocasião em que juntados documentos.

Conhecimento dos documentos apresentados em grau recursal, nos termos do art. 266 do Código Eleitoral.

A ausência de registro de doação ou cessão de veículo automotor é irregularidade sanável. Apresentação de retificação das contas, de modo a suprir a omissão e possibilitar a aprovação da contabilidade.

Provimento. 

(TRE-RS - RE n. 522-39/RS, Relator Des. Federal Paulo Afonso Brum Vaz, Data de Julgamento: 14.3.2017.) (Grifei.)

 

Dessa forma, por se tratar de documentos simples, capazes de esclarecer de plano as irregularidades apontadas, entendo adequada a juntada dos novos documentos com o recurso.

 

MÉRITO:

Passando ao mérito, as contas foram desaprovadas em virtude de (a)  utilização de recursos próprios sem que a candidata tenha declarado bens no registro de candidatura; (b) doação por depósito em dinheiro acima de R$ 1.064,10; (c) inconsistências das informações sobre doações indiretas.

Relativamente à primeira falha, o órgão técnico verificou o aporte da quantia de R$9.500,00, proveniente de recursos próprios, não obstante a candidata não tenha declarado patrimônio por ocasião do registro de candidatura, em infringência ao disposto no art. 15 da Resolução TSE n. 23.463/15, que dispõe:

Art. 15. O candidato e os partidos políticos não podem utilizar, a título de recursos próprios, recursos que tenham sido obtidos mediante empréstimos pessoais que não tenham sido contratados em instituições financeiras ou equiparadas autorizadas a funcionar pelo Banco Central do Brasil e, no caso de candidatos, que não estejam caucionados por bem que integre seu patrimônio no momento do registro de candidatura, ou que ultrapassem a capacidade de pagamento decorrente dos rendimentos de sua atividade econômica. (Grifei.)

Quanto ao apontamento, a prestadora apresentou sua declaração de imposto de renda referente ao ano-calendário 2016 no qual se vê a percepção de rendimentos condizentes com o aporte de recursos próprios para sua campanha, logrando êxito em demonstrar sua capacidade econômica. Assim, embora tenha descumprido a regra acima transcrita, supriu, por outros meios, a finalidade buscada pela norma: demonstrar a capacidade econômica para a realização das doações.

No tocante à segunda falha, houve a doação de R$5.000,00 por meio de depósito em dinheiro e não por transferência bancária, como determina o art. 18, § 1º, da Resolução TSE n. 23.463/15 para valores acima de R$1.064,10:

Art. 18. As pessoas físicas somente poderão fazer doações, inclusive pela Internet, por meio de:

[...]

§ 1º As doações financeiras de valor igual ou superior a R$ 1.064,10 (mil e sessenta e quatro reais e dez centavos) só poderão ser realizadas mediante transferência eletrônica entre as contas bancárias do doador e do beneficiário da doação.

O sentido da norma é condicionar as doações acima de R$1.064,10 à utilização de um mecanismo mais eficiente de controle da origem dos recursos de campanha, impondo o seu trânsito prévio por instituições financeiras, a fim de melhor aferir a efetiva origem do valor.

Na hipótese, embora a prestadora não tenha respeitado a forma determinada, demonstrou por outros meios seguros de prova a origem do destino da doação.

Os documentos das fls. 08 e 09 comprovam que o valor exato de R$5.000,00 foi sacado de sua conta bancária pessoal no terminal 1015 da Caixa Econômica Federal às 11h43min e depositado, através do mesmo terminal, às 11h44min em sua conta de campanha.

Os documentos, com a precisão de valor e tempo, não deixam dúvida de que a doação de R$5.000,00 efetivamente provém da conta pessoal da candidata, estando comprovada a sua origem e afastada a irregularidade.

Nesse sentido já se manifestou este Tribunal:

RECURSO. PRESTAÇÃO DE CONTAS. CANDIDATO. VEREADOR. ELEIÇÕES 2016. PRELIMINAR. APRESENTAÇÃO DE DOCUMENTO COM O RECURSO. POSSIBILIDADE QUANDO NÃO EXIGIR NOVA ANÁLISE TÉCNICA OU DILIGÊNCIAS COMPLEMENTARES. MÉRITO. DOAÇÃO EM ESPÉCIE. DEPÓSITO DIRETO NA CONTA DE CAMPANHA. EXTRAPOLADO LIMITE LEGAL. ART. 18, § 1º, DA RESOLUÇÃO TSE N. 23.463/15. ORIGEM IDENTIFICADA. BOA-FÉ. PREJUÍZO AUSENTE. AFASTADO O RECOLHIMENTO DO VALOR AO TESOURO NACIONAL. PARCIAL PROVIMENTO. APROVAÇÃO COM RESSALVAS.

Superada a questão preliminar. A apresentação de novos documentos com o recurso, especialmente em sede de prestação de contas de campanha, não apresenta prejuízo à tramitação do processo, principalmente quando se trata de documentos simples capazes de esclarecer irregularidades apontadas e que visam salvaguardar o interesse público na transparência da contabilidade de campanha.

As doações financeiras de valor igual ou superior a R$ 1.064,10 somente podem ser realizadas mediante transferência eletrônica entre as contas bancárias do doador e do beneficiário. Depósito em espécie realizado diretamente na conta de campanha, acima do limite legal, em desobediência ao disposto no art. 18, § 1º, da Resolução TSE n. 23.463/15. Comprovada a origem da quantia depositada, oriunda da conta-corrente da candidata. Irregularidade meramente formal, com evidências, nos autos, da boa-fé do prestador e da ausência de prejuízo à confiabilidade das contas. Aprovação das contas, com ressalvas. Afastada a determinação de recolhimento de valor ao Tesouro Nacional.

Provimento parcial. (TRE/RS, RE n. 436-68, Relator Des. Eleitoral Jamil Bannura, julgado em 08.11.2017.)

Por fim, no tocante à inconsistência sobre informações do doador originário do valor de R$2.000,00, verifica-se mera divergência formal acerca do preenchimento do nome do doador.

A Direção Municipal do PDT efetuou doação de R$2.000,00 à campanha da recorrente. Em sua prestação de contas, informou que o valor é proveniente de Beatriz Silvane Lamb Souto. Por seu turno, as presentes contas registraram seu nome como Beatriz Lamb Souto, apenas sem “Silvane” (fl. 33). O CPF da doadora é idêntico nas duas prestações de contas, estando perfeitamente identificada, motivo pelo qual não há que se falar em irregularidade, pois se tratou de mera inconsistência formal, sem prejuízo à confiabilidade das contas.

Ante o exposto, VOTO pelo parcial provimento do recurso interposto, reformando a sentença de 1º grau, para aprovar com ressalvas as contas, afastando a determinação de recolhimento de valores ao Tesouro Nacional.