RE - 5347 - Sessão: 29/06/2018 às 17:00

RELATÓRIO

Trata-se de recurso interposto pelo PARTIDO SOCIALISTA BRASILEIRO (PSB) de ALVORADA contra a sentença (fls. 101-102v.) que desaprovou sua prestação de contas relativa ao exercício financeiro de 2015, determinou o recolhimento de R$ 1.850,00 ao Tesouro Nacional e a suspensão do repasse de quotas do Fundo Partidário pelo período de 3 (três) meses, em razão do recebimento de recursos oriundos de fontes vedadas.

Em suas razões (fls. 109-111), sustenta que a Lei n. 13.488/17 promoveu alteração no entendimento firmado acerca de fontes vedadas, passando a considerar como lícitos os recursos provenientes de detentores de cargos demissíveis ad nutum desde que filiados a partido político. Em razão disso, requer a aplicação retroativa da norma mais benéfica, a fim de que seja reformada a decisão de primeiro grau e aprovadas as contas do órgão partidário.

Com vista dos autos, a Procuradoria Regional Eleitoral opinou pelo desprovimento do recurso (fls. 115-121v.).

É o relatório.

VOTO

O recurso é adequado, tempestivo e comporta conhecimento.

No mérito, a sentença recorrida desaprovou a contabilidade em razão do recebimento de recursos de fontes vedadas provenientes de contribuições de titulares de cargos públicos com poder de autoridade, ressalvando os detentores de função de assessoramento relacionados no parecer conclusivo, a saber: Pedro de Moura Almeida, Antonio Marcelo da Silva Gony e Jane Teresinha de Lemos Nunes.

A respeito da irregularidade identificada, o recorrente invoca a aplicação retroativa da Lei n. 13.488/17, que passou a considerar como lícitas as contribuições de detentores de cargos demissíveis ad nutum desde que filiados a partido político.

Ocorre que, para o exame das contas, deve incidir o texto do art. 31 e seus incisos da Lei n. 9.096/95, vigente ao tempo do exercício financeiro em questão – 2015 – sem as posteriores alterações legislativas.

Isso porque o TSE tem entendimento consolidado no sentido de que “a legislação que regula a prestação de contas é aquela que vigorava na data em que apresentada a contabilidade, por força do princípio da anualidade eleitoral, da isonomia, do tempus regit actum, e das regras que disciplinam o conflito de leis no tempo” (ED-ED-PC n. 96183/DF, Relator Min. Gilmar Mendes, DJE de 18.3.2016).

Nesse sentido manifestou-se esta Corte, por ocasião do julgamento do RE n. 14-97.2016.6.21.0076, após debater acerca da incidência imediata da alteração introduzida no art. 31 da Lei n. 9.096/95 pela Lei n. 13.488/17, fixando posicionamento, por maioria, pela aplicação da legislação vigente à época do exercício da prestação de contas.

Colaciono a ementa do referido julgado:

RECURSO. PRESTAÇÃO DE CONTAS ANUAL. PARTIDO POLÍTICO. EXERCÍCIO DE 2015. PRELIMINAR. MANUTENÇÃO DOS DIRIGENTES PARTIDÁRIOS NO POLO PASSIVO. ILEGITIMIDADE NÃO CONFIGURADA. MÉRITO. RECEBIMENTO DE DOAÇÕES DE FONTES VEDADAS. ALTERAÇÃO LEGISLATIVA. PERMITIDA A CONTRIBUIÇÃO DE FILIADOS. INAPLICABILIDADE AO CASO CONCRETO. APLICAÇÃO DA LEGISLAÇÃO VIGENTE À ÉPOCA DOS FATOS. PRINCÍPIO DA SEGURANÇA JURÍDICA. MANUTENÇÃO DO JUÍZO DE IRREGULARIDADE DA DOAÇÃO. REDUÇÃO DO PRAZO DE SUSPENSÃO DO RECEBIMENTO DAS QUOTAS DO FUNDO PARTIDÁRIO. PARCIAL PROVIMENTO.

1. Preliminar rejeitada. O art. 38 da Resolução TSE n. 23.432/14 prevê que deverá ser determinada a citação do órgão partidário e dos responsáveis para que ofereçam defesa sempre que houver impugnação ou constatação de irregularidade no parecer conclusivo. A integração dos dirigentes na lide é consectário da responsabilização prevista na Lei dos Partidos Políticos. Manutenção dos dirigentes partidários para integrarem o polo passivo. Ilegitimidade passiva afastada.

2. Constituem recursos oriundos de fontes vedadas as doações a partidos políticos realizadas por titulares de cargos demissíveis ad nutum da administração direta ou indireta que detenham condição de autoridades, vale dizer, que desempenhem função de direção ou chefia.

3. A Lei n. 13.488/17, publicada em 06.10.17, alterou a redação do art. 31 da Lei n. 9.096/95 - Lei dos Partidos Políticos -, excluindo a vedação de doação de pessoa física que exerça função ou cargo público demissível ad nutum, desde que filiada ao partido beneficiário.

4. Inaplicabilidade ao caso concreto. Incidência da legislação vigente à época dos fatos. Prevalência do princípio da segurança jurídica e da paridade de armas no processo eleitoral, em detrimento da aplicação pontual da retroatividade in bonam partem. Manutenção do juízo de irregularidade das contribuições advindas de cargos demissíveis ad nutum, ainda que os contribuintes sejam filiados à agremiação.

5. Incontroverso o recebimento de recursos de fontes vedadas, em valor correspondente a 65,79% das receitas do partido, impõe-se a desaprovação das contas. Redução, entretanto, do prazo de suspensão do recebimento de quotas do Fundo Partidário para quatro meses. 

6. Provimento parcial. (Grifei.)

Assim sendo, importa referir que, em 2007, no julgamento da Consulta n. 1428 (Resolução TSE n. 22.585/07), o Tribunal Superior Eleitoral assentou não ser permitido aos partidos políticos receberem doações ou contribuições de titulares de cargos demissíveis ad nutum da administração direta ou indireta, quando ostentem a condição de autoridades.

A questão, que até então estava abrangida pela ressalva prevista no § 1º do art. 5º da Resolução TSE n. 21.841/04, passou a ser regulada não apenas pela Resolução TSE n. 22.585/07, mas também pela Resolução TSE n. 23.077, de 04.6.2009.

A Resolução TSE n. 23.077/09 foi publicada a partir dessa orientação jurisprudencial e determinou que, durante as arrecadações dos exercícios financeiros seguintes, os partidos políticos observassem o entendimento firmado pelo TSE na Consulta n. 1428 (Resolução TSE n. 22585/07) no que concerne à contribuição de filiados, tendo em conta a interpretação dada ao inc. II do art. 31 da Lei n. 9.096/95, que concluiu pela impossibilidade de doação de titulares de cargos de direção e chefia.

Após a consolidação sobre a interpretação dada pelo TSE ao art. 31, caput, inc. II, da Lei n. 9.096/95, os tribunais eleitorais de todo o país, inclusive este TRE, passaram a julgar as contas partidárias com observância à vedação de contribuições de titulares de cargos demissíveis ad nutum da administração direta ou indireta com poder de autoridade:

Recurso. Prestação de contas. Partido político. Doação de fonte vedada. Art. 31, II, da Lei n. 9.096/95. Exercício financeiro de 2013.

Desaprovam-se as contas quando constatado o recebimento de doações de servidores públicos ocupantes de cargos demissíveis ad nutum da administração direta ou indireta, que detenham condição de autoridade, vale dizer, desempenhem função de direção ou chefia.

Redução, de ofício, do período de suspensão do recebimento de cotas do Fundo Partidário, conforme os parâmetros da razoabilidade. Manutenção da sanção de recolhimento de quantia idêntica ao valor recebido irregularmente ao Fundo Partidário.

Provimento negado.

(TRE-RS, Recurso Eleitoral n. 2346, Acórdão de 12.3.2015, Relator Dr. Ingo Wolfgang Sarlet, Publicação: DEJERS - Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Tomo 45, Data 16.3.2015, p. 02.)

Recurso Eleitoral. Prestação de Contas Anual. Exercício 2012. Partido Democrático Trabalhista – PDT de Taquara. Contas desaprovadas. Preliminar de impugnação de documentos como prova válida. Exame remetido à análise da questão de fundo. Preliminar de cerceamento de defesa afastada, em face de haver, nos autos, comprovação de que o partido teve oportunidade de se manifestar sobre documentos acostados. Não é permitido aos partidos políticos receberem doações ou contribuições de titulares de cargos demissíveis ad nutum da administração direta ou indireta, desde que tenham a condição de autoridades. Configuradas doações de fonte vedada. Servidores ocupantes de cargos demissíveis ad nutum.

Afastadas do cálculo do valor a ser recolhido ao Fundo Partidário as doações de assessores e procuradores jurídicos, os quais não são considerados autoridades. Deram parcial provimento ao recurso, apenas ao efeito de reduzir o valor recolhido ao Fundo Partidário.

(TRE-RS, Recurso Eleitoral n. 8303, Acórdão de 12.11.2014, Relator Des. Luiz Felipe Brasil Santos, Publicação: DEJERS - Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Tomo 207, Data 14.11.2014, p. 02.)

Recurso. Prestação de contas. Partido político. Exercício de 2010.

Desaprovação pelo julgador originário. Aplicação da pena de suspensão das cotas do Fundo Partidário pelo período de doze meses, bem como o recolhimento de valores, ao mesmo fundo, relativos a recursos recebidos de fonte vedada e de fonte não identificada.

A documentação acostada em grau recursal milita em prejuízo do recorrente, uma vez que comprova o recebimento de valores de autoridade pública e de detentores de cargos em comissão junto ao Executivo Municipal. A maior parte da receita do partido provém de doações de pessoas físicas em condição de autoridade, prática vedada nos termos do artigo 31, incisos II e III, da Lei n. 9.096/95.

Provimento negado.

(TRE-RS, Recurso Eleitoral n. 4550, Acórdão de 19.11.2013, Relator Dr. Jorge Alberto Zugno, Publicação: DEJERS - Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Tomo 216, Data 22.11.2013, p. 02.)

No caso dos autos, afastada a quantia proveniente dos detentores de função de assessoramento, remanesceu o montante de R$ 1.850,00, referente a recursos oriundos de contribuintes que se enquadram no conceito de autoridade, por serem ocupantes de cargos de chefia e liderança, conforme previsão do art. 12, inc. XII e § 2º, da Resolução TSE n. 23.432/14:

Art. 12 - É vedado aos partidos políticos e às suas fundações receber, direta ou indiretamente, sob qualquer forma ou pretexto, doação, contribuição ou auxílio pecuniário ou estimável em dinheiro, inclusive por meio de publicidade de qualquer espécie, procedente de:

(...)

XII - autoridades públicas;

(...)

§ 2º Consideram-se como autoridades públicas, para os fins do inciso XII do caput deste artigo, aqueles, filiados ou não a partidos políticos, que exerçam cargos de chefia ou direção na administração pública direta ou indireta.

§ 3º As vedações previstas neste artigo atingem todos os órgãos partidários, inclusive suas fundações, observado o disposto no § 2º do art. 20 desta Resolução.

Constatado o recebimento de recursos oriundos de fontes vedadas, o valor respectivo deve ser recolhido ao Tesouro Nacional, nos termos do art. 14, § 1º, da Resolução TSE n. 23.432/14.

Reproduzo o dispositivo:

Art. 14. O recebimento direto ou indireto dos recursos previstos no art. 13 desta resolução sujeitará o órgão partidário a recolher o montante ao Tesouro Nacional, por meio de Guia de Recolhimento da União (GRU), até o último dia útil do mês subsequente à efetivação do crédito em qualquer das contas bancárias de que trata o art. 6º desta resolução, sendo vedada a devolução ao doador originário.

§ 1º O disposto no caput deste artigo também se aplica aos recursos provenientes de fontes vedadas, que não tenham sido estornados no prazo previsto no § 3º do art. 11, os quais deverão, nesta hipótese, ser recolhidos ao Tesouro Nacional.

Todavia, não obstante a gravidade da irregularidade e a obrigatoriedade do seu recolhimento ao Erário, observo que ela equivale a apenas 8,66% dos recursos arrecadados no exercício (fl. 11), ou seja, menos de 10% da receita da agremiação, permitido, na esteira do entendimento do egrégio TSE e deste Tribunal, a partir da aplicação dos postulados da razoabilidade e da proporcionalidade, a aprovação das contas com ressalvas, e não a sua desaprovação, afastando-se, por conseguinte, a penalidade de suspensão de quotas do Fundo Partidário.

Nesse sentido:

AGRAVOS. RECURSOS ESPECIAIS. PRESTAÇÃO DE CONTAS PARTIDÁRIAS. EXERCÍCIO DE 2012. DESAPROVAÇÃO. RECURSO DE FONTE VEDADA. RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. VALOR IRRISÓRIO. SUSPENSÃO DE COTAS. FUNDO PARTIDÁRIO. PROPORCIONALIDADE. RAZOABILIDADE. PROVIMENTO DO RECURSO DO PARTIDO.

1. Autos recebidos no gabinete em 21/3/2017.

2. No caso, é possível aprovar com ressalvas as contas, em atenção aos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, pois a soma de valores das falhas constatadas - R$ 47.277,35 - corresponde a aproximadamente 6,5% da receita, não comprometendo o controle financeiro pela Justiça Eleitoral. Precedentes.

3. Recurso especial parcialmente provido para aprovar com ressalvas as contas. Prejudicado o recurso do Parquet.

(TSE - RESPE n. 724220136210000 Porto Alegre/RS 67842016, Relator Min. Antonio Herman De Vasconcellos E Benjamin, Data de Julgamento: 10.4.2017, Data de Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico - 02.5.2017, pp. 99-102.) (Grifei.)

AGRAVO NOS PRÓPRIOS AUTOS. RECURSO ESPECIAL. PRESTAÇÃO DE CONTAS. PARTIDO POLÍTICO. PDT. EXERCÍCIO FINANCEIRO DE 2014. DESAPROVAÇÃO. RECURSOS DE FONTE VEDADA. ART. 31, II, DA LEI Nº 9.096/95. AUTORIDADE PÚBLICA. OCUPANTES DE CARGO DE CHEFIA E DIREÇÃO. PRECEDENTES. PERCENTUAL DIMINUTO. PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE E DA RAZOABILIDADE. APLICAÇÃO. APROVAÇÃO COM RESSALVA. DETERMINAÇÃO DE RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL MANTIDA. RECURSO ESPECIAL A QUE SE DÁ PARCIAL PROVIMENTO.

(TSE - AI n. 865520156210000 Porto Alegre/RS 40712017, Relator Min. Luiz Fux, Data de Julgamento 03.10.2017, Data de Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico - 20.10.2017, pp. 77-81.)

RECURSO. PRESTAÇÃO DE CONTAS. PARTIDO POLÍTICO. EXERCÍCIO FINANCEIRO 2015. DOAÇÕES RECEBIDAS. DOAÇÃO DO DIRETÓRIO NACIONAL DO PARTIDO. REGULAR. DOAÇÃO ORIGEM NÃO IDENTIFICADA. AUSÊNCIA DE RECIBOS ELEITORAIS. RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. APROVAÇÃO COM RESSALVAS. PROVIMENTO PARCIAL.

1. Doação proveniente do Diretório Nacional da agremiação devidamente identificada com data, origem e CNPJ do doador. Evidenciada regularidade da doação. Afastado recolhimento do numerário ao Tesouro Nacional.

2.Recebimento de doação de origem não identificada, em desacordo com a previsão contida nos arts. 7º, caput, e 8º, § 2º, da Resolução TSE n. 23.432/14. Situação que acarreta o recolhimento ao Tesouro Nacional. Quantia de pequena expressão, que representa 6,8% do montante integral. Aprovação com ressalvas.

Provimento parcial.

(TRE/RS - Recurso Eleitoral n. 664 – Acórdão de 04.12.2017, Relator Des. Federal João Batista Pinto Silveira, Pulbicação: DEJERS - Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Data 6.12.2017, p. 11)

Logo, concluo que o juízo de desaprovação deve ser reservado para aquelas situações em que há o comprometimento absoluto das contas ou mesmo quando as irregularidades alcançam montante vultoso, o que não é o caso em análise.

ANTE O EXPOSTO, voto pelo provimento parcial do recurso, para aprovar com ressalvas as contas do PARTIDO SOCIALISTA BRASILEIRO (PSB) de ALVORADA, relativas ao exercício financeiro de 2015, mantendo a determinação de recolhimento ao Tesouro Nacional (art. 14 da Resolução TSE n. 23.432/14) da quantia de R$1.850,00 (contribuições de fontes vedadas), com a atualização monetária até a data da efetiva devolução, nos termos em que deferida pela r. sentença.