RE - 2770 - Sessão: 22/05/2018 às 17:00

RELATÓRIO

Trata-se de recurso interposto pelo PARTIDO DA SOCIAL DEMOCRACIA BRASILEIRA (PSDB) de SANTA MARIA contra sentença que desaprovou sua prestação de contas referente ao exercício financeiro de 2016 e determinou a devolução do valor de R$14.137,27 ao Tesouro Nacional, acrescido de multa de 5%, em virtude do recebimento de recursos de fonte vedada provenientes de detentores de cargo em comissão (fls. 129-131v.).

Nas razões recursais, o partido sustenta que o art. 31 da Lei n. 9.096/95, após as alterações promovidas pela Lei n. 13.488/17, passou a permitir que pessoas físicas realizassem contribuições partidárias, desde que filiadas à agremiação política. Uma vez que todos os doadores são filiados ao PSDB de Santa Maria, consoante listagem anexa ao recurso, alega que a nova legislação deve ser aplicada ao caso, a fim de que sejam consideradas lícitas as fontes dos recursos. Ao final, requer a aprovação das contas (fls. 135-141).

Com vista dos autos, a Procuradoria Regional Eleitoral opinou pelo desprovimento do recurso (fls. 154-159v.).

É o relatório.

VOTO

O recurso é adequado, tempestivo e comporta conhecimento.

No mérito, as contas foram desaprovadas porque constatado o recebimento de receitas oriundas de fontes vedadas, totalizando a quantia de R$14.137,27, originárias de doações de detentores de cargos públicos de chefia e direção demissíveis ad nutum, elencados nas fls. 79-80, dentre os quais se incluem Diretor de Estabelecimento (FASE), Chefe de Gabinete Parlamentar da Câmara de Vereadores, Chefe de Coordenaria (CORSAN).

De acordo com art. 12, § 1º, da Resolução TSE n. 23.464/15, que regulamenta o mérito da prestação de contas em análise, consideram-se “autoridades públicas”, para os fins do inc. IV do caput do mesmo dispositivo, aqueles, filiados ou não a partidos políticos, que exerçam cargos de chefia ou direção na administração pública direta ou indireta:

Art. 12.  É vedado aos partidos políticos e às suas fundações receber, direta ou indiretamente, sob qualquer forma ou pretexto, doação, contribuição ou auxílio pecuniário ou estimável em dinheiro, inclusive por meio de publicidade de qualquer espécie, procedente de:

[…].

IV – autoridades públicas.

§ 1º Consideram-se como autoridades públicas, para os fins do inciso IV do caput deste artigo, aqueles, filiados ou não a partidos políticos, que exerçam cargos de chefia ou direção na administração pública direta ou indireta.

Referida norma guarda estrita consonância com o entendimento firmado pelo TSE na Consulta n. 1428 (Resolução TSE n. 22.585/07), tendo em conta a interpretação conferida ao inc. II do art. 31 da Lei n. 9.096/95, em sua redação original, no sentido da impossibilidade de repasse de valores por titulares de cargos de direção e chefia, independentemente da filiação partidária.

Em suas razões de recurso, a agremiação sustenta a aplicabilidade, à espécie, do inc. V do art. 31 da Lei n. 9.096/95. Referido dispositivo foi incluído pela Lei n. 13.488/17, com vigência a partir de 06.10.2017, facultando as contribuições de filiados a partido político, ainda que ocupantes de cargos públicos de livre nomeação e exoneração.

Entretanto, o exame das contas relativas ao ano de 2016 deve considerar o texto do art. 31 da Lei n. 9.096/95 vigente ao tempo do exercício financeiro em questão, sem as posteriores alterações legislativas.

Isso porque o TSE tem entendimento consolidado no sentido de que “a legislação que regula a prestação de contas é aquela que vigorava na data em que apresentada a contabilidade, por força do princípio da anualidade eleitoral, da isonomia, do tempus regit actum, e das regras que disciplinam o conflito de leis no tempo” (ED-ED-PC n. 96183/DF, Relator Min. Gilmar Mendes, DJE de 18.3.2016).

Nessa esteira, este Tribunal pacificou o posicionamento de que, por primazia dos princípios da segurança jurídica e da paridade de armas entre os entes partidários, a licitude ou não das doações é regida pela lei vigente ao tempo do exercício financeiro, independentemente do caráter mais benéfico da posterior legislação, como se verifica pelo seguinte precedente:

RECURSO. PRESTAÇÃO DE CONTAS ANUAL. PARTIDO POLÍTICO. EXERCÍCIO DE 2015. PRELIMINAR. MANUTENÇÃO DOS DIRIGENTES PARTIDÁRIOS NO POLO PASSIVO. ILEGITIMIDADE NÃO CONFIGURADA. MÉRITO. RECEBIMENTO DE DOAÇÕES DE FONTES VEDADAS. ALTERAÇÃO LEGISLATIVA. PERMITIDA A CONTRIBUIÇÃO DE FILIADOS. INAPLICABILIDADE AO CASO CONCRETO. APLICAÇÃO DA LEGISLAÇÃO VIGENTE À ÉPOCA DOS FATOS. PRINCÍPIO DA SEGURANÇA JURÍDICA. MANUTENÇÃO DO JUÍZO DE IRREGULARIDADE DA DOAÇÃO. REDUÇÃO DO PRAZO DE SUSPENSÃO DO RECEBIMENTO DAS QUOTAS DO FUNDO PARTIDÁRIO. PARCIAL PROVIMENTO.

1. Preliminar rejeitada. O art. 38 da Resolução TSE n. 23.432/14 prevê que deverá ser determinada a citação do órgão partidário e dos responsáveis para que ofereçam defesa sempre que houver impugnação ou constatação de irregularidade no parecer conclusivo. A integração dos dirigentes na lide é consectário da responsabilização prevista na Lei dos Partidos Políticos. Manutenção dos dirigentes partidários para integrarem o polo passivo. Ilegitimidade passiva afastada.

2. Constituem recursos oriundos de fontes vedadas as doações a partidos políticos realizadas por titulares de cargos demissíveis ad nutum da administração direta ou indireta que detenham condição de autoridades, vale dizer, que desempenhem função de direção ou chefia.

3. A Lei n. 13.488/17, publicada em 06.10.17, alterou a redação do art. 31 da Lei n. 9.096/95 - Lei dos Partidos Políticos -, excluindo a vedação de doação de pessoa física que exerça função ou cargo público demissível ad nutum, desde que filiada ao partido beneficiário.

4. Inaplicabilidade ao caso concreto. Incidência da legislação vigente à época dos fatos. Prevalência do princípio da segurança jurídica e da paridade de armas no processo eleitoral, em detrimento da aplicação pontual da retroatividade in bonam partem. Manutenção do juízo de irregularidade das contribuições advindas de cargos demissíveis ad nutum, ainda que os contribuintes sejam filiados à agremiação.

5. Incontroverso o recebimento de recursos de fontes vedadas, em valor correspondente a 65,79% das receitas do partido, impõe-se a desaprovação das contas. Redução, entretanto, do prazo de suspensão do recebimento de quotas do Fundo Partidário para quatro meses.

6. Provimento parcial.

(TRE-RS, RE n. 14-97, Relator Des. Eleitoral Luciano André Losekann, sessão de 4.12.2017.) (Grifei.)

Destarte, sendo incontroverso o recebimento de doações provenientes de detentores de cargos demissíveis ad nutum, tais verbas são oriundas de fontes vedadas, por força do art. 31, inc. II, da Lei n. 9.096/95, conforme a disciplina legal vigente à época, impondo, como consequência, o recolhimento do respectivo valor ao Tesouro Nacional, nos termos do art. 14, § 1º, da Resolução TSE n. 23.464/15.

Além disso, a irregularidade equivale a 22,5% dos recursos arrecadados (R$62.817,92), razão pela qual se mostra consentânea com os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade a multa em 5% sobre a falha constatada, nos termos da bem-lançada sentença, quantia adequada e suficiente para punir a infração cometida.

ANTE O EXPOSTO, VOTO pelo desprovimento do recurso.