PC - 5853 - Sessão: 18/11/2019 às 14:00

RELATÓRIO

Cuida-se da prestação de contas do exercício de 2015 do DIRETÓRIO ESTADUAL do PARTIDO DOS TRABALHADORES (PT).

A Secretaria de Controle Interno e Auditoria (SCI) realizou exame preliminar da documentação apresentada, apontando a necessidade de sua complementação (fl. 402 e v.).

O partido trouxe aos autos documentos (fls. 418-463) e, em exame da prestação de contas, o órgão técnico apontou irregularidades, sugerindo a abertura de prazo para manifestação (fls. 468-476).

A agremiação colacionou esclarecimentos e documentos (fls. 519-632) e sobreveio parecer conclusivo, opinando pela desaprovação das contas e indicando que as irregularidades sujeitas à devolução ao Tesouro Nacional representavam R$ 668.155,59 (fls. 637-644).

Em parecer, a Procuradoria Regional Eleitoral manifestou-se pela desaprovação das contas e pela determinação de recolhimento de R$ 962.666,77 do Tesouro Nacional, bem como pela suspensão do repasse das quotas do Fundo Partidário pelo prazo de 12 meses (fls. 653-665).

O PARTIDO DOS TRABALHADORES (PT) e ARY VANAZZI apresentaram defesa (fls. 673-687) e regularização da representação processual da grei partidária, sobrevindo exclusão do responsável SERGIO LUIZ ALVES NAZARIO da demanda em razão de falecimento (fl. 721 e v.).

Em nova manifestação, o órgão técnico analisou os documentos juntados com a defesa, mantendo o teor do parecer conclusivo pela desaprovação das contas, porém alterando o valor a ser recolhido para R$ 183.072,78 (fls. 847-850).

O prestador apresentou alegações finais (fls. 858-868) e foi juntado parecer do Ministério Público Eleitoral pela desaprovação de contas, com manifestação pelo recolhimento de R$ 517.583,96 do Tesouro Nacional, bem como pela suspensão do repasse das quotas do Fundo Partidário pelo prazo de 12 meses (fls. 876-894).

Na sequência, o partido e o dirigente postularam a realização de novo exame técnico para que fossem observadas as disposições da Lei n. 13.831/19, em especial, na parte em que incluiu o art. 55-D na Lei dos Partidos Políticos (fls. 895-898).

Como a inconstitucionalidade do mencionado dispositivo havia sido suscitada pela Procuradoria Regional Eleitoral, as partes foram intimadas a se manifestarem (fl. 921) e juntaram petição (fls. 928-940).

É o relatório.

VOTO

Senhora Presidente,

Eminentes colegas:

Inicio por examinar a questão preliminar relativa à alegação de inconstitucionalidade do art. 55-D da Lei n. 9.096/95, suscitada pela Procuradoria Regional Eleitoral.

O art. 55-D foi introduzido na Lei dos Partidos Políticos pela Lei n. 13.831, de 17 de maio de 2019, com o seguinte teor:

Art. 55-D. Ficam anistiadas as devoluções, as cobranças ou as transferências ao Tesouro Nacional que tenham como causa as doações ou contribuições feitas em anos anteriores por servidores públicos que exerçam função ou cargo público de livre nomeação e exoneração, desde que filiados a partido político.

Como a questão do recebimento de recursos oriundos de fonte vedada - doações ou contribuições feitas no exercício financeiro em questão por servidores públicos que exerciam função ou cargo público de livre nomeação e exoneração – será examinada neste julgamento, cabe a apreciação incidental da constitucionalidade do mencionado dispositivo.

Em relação ao recolhimento dos valores ao Tesouro Nacional, nesse momento considerado decorrência possível acaso reconhecida concretamente a irregularidade, esta Corte Eleitoral já se manifestou sobre a existência de vício na instituição da anistia, tendo reconhecido, à unanimidade, a inconstitucionalidade do dispositivo legal em comento, consoante ementa que transcrevo no ponto que interessa:

RECURSO. PRESTAÇÃO DE CONTAS. PARTIDO POLÍTICO. EXERCÍCIO DE 2015. DESAPROVAÇÃO. MATÉRIA PRELIMINAR ACOLHIDA. INCIDENTE DE INCONSTITUCIONALIDADE. ART. 55-D DA LEI N. 9.096/95, INCLUÍDO PELA LEI N. 13.831/19. MÉRITO. RECEBIMENTO DE RECURSOS DE ORIGEM NÃO IDENTIFICADA E DE FONTE VEDADA. PORCENTAGEM REPRESENTATIVA DAS IRREGULARIDADES DIANTE DA TOTALIDADE DOS RECURSOS ARRECADADOS NO PERÍODO. AFASTADA A APLICAÇÃO DOS POSTULADOS DA PROPORCIONALIDADE E DA RAZOABILIDADE. MANUTENÇÃO DO JUÍZO DE DESAPROVAÇÃO. REDUZIDO O PERÍODO DE SUSPENSÃO DO FUNDO PARTIDÁRIO. AFASTADA A CONDIÇÃO DE QUE A SANÇÃO SUBSISTA ATÉ QUE OS ESCLARECIMENTOS SEJAM ACEITOS PELA JUSTIÇA ELEITORAL. PROVIMENTO PARCIAL.

1. Incidente de inconstitucionalidade suscitado pelo Procurador Regional Eleitoral. 1.1. O art. 55-D da Lei n. 9.096/95, norma legal objeto do aludido incidente, incluído pela Lei n. 13.831/19, assinala a anistia das devoluções, cobranças ou transferências ao Tesouro Nacional que tenham como causa as doações ou contribuições efetuadas, em anos anteriores, por servidores públicos os quais exerçam função ou cargo público de livre nomeação e exoneração, desde que filiados a partido político. Ausência de notícia de que tenha havido oferecimento dos dados relativos à previsão de estimativa de impacto orçamentário e financeiro quando da tramitação da proposta legislativa prevendo a renúncia da receita. Omissão que afronta a exigência constitucional incluída pela EC n. 95/16 no art. 113 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias. A legislação infraconstitucional igualmente exige seja comprovado o impacto orçamentário e financeiro à concessão de benefício que gere a diminuição de receita da União, nos termos do art. 14 da Lei de Responsabilidade Fiscal e arts. 114 e 116 da Lei n. 13.707/18. 1.2. A anistia das verbas consideradas como oriundas de fontes vedadas - benefício instituído em causa própria e sem qualquer finalidade pública subjacente - atenta ao princípio da moralidade administrativa e desvirtua a natureza jurídica do instituto. 1.3. Vício de inconstitucionalidade formal e material. Acolhimento da preliminar. Afastada, no caso concreto, a aplicação do art. 55-D da Lei n. 9.096/95, incluído pela Lei n. 13.831/19. (...)

(...)

(TRE/RS, Incidente de Arguição de Inconstitucionalidade, RE n. 35-92.2016.6.21.0005, Rel. Des. Eleitoral Gerson Fischmann, DEJERS de 23.8.2019.) (Grifo nosso.)

Pelas razões acima elencadas, o art. 55-D da Lei n. 9.096/95 é inconstitucional por instituir hipótese de incidência destoante das normas extraídas da Constituição Federal, devendo ser afastada sua aplicação no caso concreto.

Assim, declaro incidentalmente a inconstitucionalidade do dispositivo.

Passando ao exame do mérito, consigno que, com o exame da documentação relativa ao exercício de 2015 encaminhada pelo DIRETÓRIO ESTADUAL do PARTIDO DOS TRABALHADORES (PT), a Secretaria de Controle Interno e Auditoria (fls. 637-644):

a) recomendou que a agremiação apresente, em exercícios futuros, detalhamento dos serviços contábeis prestados, mesmo que em caráter eventual, transitório ou extraordinário;

b) apontou a existência de omissão no registro de dívida no valor de R$ 8.916,00;

c) indicou o recebimento de R$ 334.511,18 provenientes do Fundo Partidário em período no qual estava vigente suspensão da distribuição de quotas;

d) constatou irregularidades na aplicação de recursos do Fundo Partidário no valor de R$ 40.000,00;

e) identificou o recebimento de recursos de origem não identificada no valor de R$ 603.624,03;

f) e verificou recebimento de recursos oriundos de fonte vedada no valor de R$ 24.531,56.

Após a análise das provas produzidas nos autos, o órgão técnico considerou que foi sanada a irregularidade relativa à aplicação dos recursos do Fundo Partidário (item D) e identificados parte dos recursos recebidos, de forma que a falha reportada no item E foi redimensionada para R$ 158.541,22 (fls. 847-850).

Passo então a enfrentar individualmente os apontamentos.

1. Detalhamento dos serviços contábeis prestados

A análise dos documentos contábeis identificou despesa cuja descrição constante no documento contábil era imprecisa e potencialmente sobreposta à outra despesa realizada (fls. 468-476, item 2.2.2).

Com a manifestação do prestador de contas, a realização do gasto foi devidamente justificada e a unidade técnica recomendou que a agremiação apresente, em exercícios futuros, detalhamento dos serviços contábeis prestados, mesmo que em caráter eventual, transitório ou extraordinário.

A Resolução TSE n. 23.432/14 estabelece que a “comprovação dos gastos deve ser realizada por meio de documento fiscal idôneo, sem emendas ou rasuras, devendo conter a data de emissão, a descrição detalhada, o valor da operação e a identificação do emitente e do destinatário ou dos contraentes pelo nome ou razão social, CPF ou CNPJ e endereço” (art. 18).

Diante do comando que exige a especificação dos gastos no documento fiscal, fica consignada a recomendação para que o partido político, em exercícios futuros, observe as disposições normativas que impõem a apresentação de comprovantes com descrição detalhada dos produtos/serviços adquiridos.

2. Omissão no registro de dívida

A SCI apontou a ausência de registro oficial da dívida realizada junto à gráfica (fl. 532) nos exercícios 2015 e 2016 e que o “partido efetuou o registro da dívida de R$ 8.916,00 somente quando provocado por esta unidade técnica” (fls. 637-644).

A inclusão da dívida foi efetuada no livro contábil do ano de 2017 (fl. 534), de forma que a omissão do registro no exercício da competência é mácula na contabilidade.

Assim, deve ser consignada a ressalva na contabilidade em razão da omissão da dívida de R$ 8.916,00.

3. Recebimento de recursos do Fundo Partidário durante o período de suspensão

Foi verificado o recebimento de R$ 334.511,18 provenientes do Fundo Partidário em período no qual estava vigente a sanção de suspensão de repasse de tais recursos ao partido.

A agremiação reconhece o fato e a Secretaria de Controle Interno e Auditoria informa que efetuou comunicado à Assessoria de Exame de Contas Eleitorais e Partidárias (ASEPA) do Tribunal Superior Eleitoral para subsidiar o exame das contas do diretório nacional da agremiação.

Trata-se, portanto, de irregularidade cuja ocorrência é admitida, residindo a controvérsia apenas sobre a necessidade de recolhimento de tais valores ao Tesouro Nacional.

A Procuradoria Regional Eleitoral destaca os arts. 52 e 61, § 2º, da Resolução TSE n. 23.432/14, argumentando que, além da desaprovação das contas, deve ser determinada a devolução do montante ao Tesouro Nacional.

Na hipótese, apesar da ocorrência da irregularidade, tenho que o descumprimento da ordem de suspensão do repasse deve ser imputado ao órgão nacional do partido. Para tanto, tenho que a comunicação da ocorrência ao Tribunal Superior Eleitoral é apta a possibilitar a imposição das penalidades pelo descumprimento da ordem judicial nos autos da prestação de contas do interessado naquele tribunal, que é o órgão com competência para deliberar sobre o sancionamento.

Veja-se que a imposição de restituição do montante neste processo poderia ocasionar o duplo recolhimento do valor transferido no período proibido (pelo órgão regional, nestes autos, e pelo nacional, em sua prestação de contas do exercício), o que configuraria enriquecimento indevido para a União.

Da mesma forma, é a “aplicação irregular”, e não o “recebimento irregular” que determina o recolhimento de valores, tal qual dispõe a norma invocada pelo Ministério Público Eleitoral, verbis:

Art. 61. [...]

§ 2º Caso constatada impropriedade ou irregularidade na aplicação dos recursos do Fundo Partidário ou no recebimento dos recursos de que tratam os arts. 12 e 13 desta Resolução, o órgão partidário e os seus responsáveis serão notificados para fins de devolução ao erário, se já não demonstrada a sua realização. (Grifei.)

De igual modo, os arts. 12 e 13 tratam do recebimento de recursos de fonte vedada e origem não identificada, categorias nas quais não se pode incluir os repasses do Fundo Partidário.

Assim, diante da ausência de suporte legal para determinação de recolhimento de valores nestes autos, cabe tão somente a consideração da mácula em desfavor do prestador de contas.

No mesmo sentido – reconhecimento da irregularidade sem determinação de recolhimento de valores – posicionou-se a Corte nos autos da PC n. 75-89, de relatoria do Desembargador Eleitoral Jamil Bannura, julgado em 12.9.17.

Deixo, portanto, de determinar o recolhimento ao Tesouro Nacional dos valores recebidos durante o período de suspensão do repasse do Fundo Partidário.

4. Recebimento de recursos de origem não identificada

A análise técnica apontou que parte dos recursos recebidos pelo DIRETÓRIO ESTADUAL do PARTIDO DOS TRABALHADORES (PT) não teve os doadores devidamente identificados, contrariando o disposto nos art. 13, inc. I, da Resolução TSE n. 23.432/14, bem como que a forma de arrecadação não teria observado o disposto nos arts. 7º e 8º do mesmo diploma.

A SCI consigna que “a identificação da Direção Estadual do partido como doador/contribuinte no extrato bancário não é informação válida, visto que inviabiliza a identificação da real origem do recurso (doador originário)” (fls. 468-476).

A agremiação argumenta que (fls. 863-864):

21. Inicialmente, cumpre referir que em relação aos valores referidos ao Anexo 03 o Prestador em Nota Explicativa já havia declarado que, realizadas diligências não conseguiu realizar a identificação dos doadores originários de 03 (Três) depósitos no valor de R$ 10.000,00 (Dez mil reais) cada um e, portanto, pacifica a obrigação de realizar o recolhimento deses valores ao Erário.

22. Enfrentada a questão a valores incontroversos quanto a inexistência de identificação dos doadores originários se faz possível avançar na apreciação do presente tópico.

23. De marcar que, à época dos fatos era recente a alteração das normas legais que passaram a consagrar a obrigação de que cada crédito fosse individualizado no momento em que houvesse o recolhimento dos valores com a identificação no comprovante de depósito do CPF do doador.

24. Daí que, no exercício de 2015 em determinadas situações foram recolhidos a conta corrente da agremiação através de seu CNPJ valores como, por exemplo, em 16 de dezembro de 2015, data em que há um depósito no montante de R$ 12.500,00 e diversos depósitos de R$ 1.000,00, os quais correspondiam a consolidação de doações em valores menores.

25. No entanto, posteriormente na escrituração contábil foram os doadores(as) originários devidamente identificados consoante se o comprova o Livro-Razão – Exercício 2015, página 96 e ss.

26. De registrar que acima exposto é congruente com outros documentos de comprovação acostados aos autos como, por exemplo, o compact disc acostado aos autos fl. 52, no arquivo que leva o nome Doação de Pessoas Físicas Filiadas bem como, de documento juntado a fl. 60 e ss. dos autos.

27. Desta maneira, ainda tenham sido recolhidos valores a conta-corrente da agremiação através de depósitos realizados via seu CNPJ a luz dos documentos acima referidos é plenamente possível a identificação dos doadores originários dos valores.

28. Assim, poder-se-ia referir a impropriedade técnica na realização dos depósitos, mas que sanada pelos registros contábeis realizados que permite apurar a origem dos valores.

29. Ressalte-se, que os procedimentos acima descritos eram corriqueiros e considerados adequados em exercícios anteriores ao ora apreciado.

(Grifos no original.)

Como se percebe, o prestador de contas reconhece a ausência de identificação de parte das doações, bem como justifica a existência de depósitos de valores provenientes de doações efetuados com o CNPJ do donatário como prática corriqueira em exercícios anteriores.

O partido também argumenta que alguns dos depósitos corresponderam à consolidação de doações de valores menores e sustenta ser possível identificar os doadores por outros documentos constantes nos autos.

Ocorre que a Resolução TSE n. 23.432/14 foi publicada em 16 de dezembro de 2014, de forma a regular a prestação de contas para o exercício seguinte – 2015, não sendo admissível a tese de que a agremiação tenha sido surpreendida com a necessidade de identificação individual dos doadores quando do depósito dos valores.

A norma estabelece de forma bastante clara que as “contas bancárias somente poderão receber doações ou contribuições com identificação do respectivo número de inscrição no Cadastro de Pessoas Físicas (CPF) ou no Cadastro Nacional de Pessoa Jurídica (CNPJ) do doador ou contribuinte (art. 7º), de forma que não há como relevar que, durante todo o exercício, o partido tenha efetuado depósitos de doações em sua conta bancária informando seu próprio CNPJ.

Assim, reconheço a ausência de identificação dos depósitos relacionados nas fls. 492-493, que perfazem o total de R$ 158.541,22 e caracterizam recursos de origem não identificada.

Em atenção ao disposto no art. 61, § 2º, já transcrito nesta decisão, deve ser determinado o recolhimento de tal montante ao Tesouro Nacional.

5. Recebimento de recursos de fonte vedada

A unidade técnica apurou a existência de arrecadação de recursos advindos de contribuintes considerados autoridades pela Lei n. 9.096/95, caracterizando fontes vedadas no exercício de 2015, no montante de R$ 24.531,56.

A redação do dispositivo aplicável da Lei dos Partidos Políticos era a seguinte por ocasião do exercício em exame:

Art. 31. É vedado ao partido receber, direta ou indiretamente, sob qualquer forma ou pretexto, contribuição ou auxílio pecuniário ou estimável em dinheiro, inclusive através de publicidade de qualquer espécie, procedente de:

I - entidade ou governo estrangeiros;

II - autoridade ou órgãos públicos, ressalvadas as dotações referidas no art. 38;

[…]

Por seu turno, a Resolução TSE n. 23.432/14 estabelecia que

Art. 12. É vedado aos partidos políticos e às suas fundações receber, direta ou indiretamente, sob qualquer forma ou pretexto, doação, contribuição ou auxílio pecuniário ou estimável em dinheiro, inclusive por meio de publicidade de qualquer espécie, procedente de:

I – entidade ou governo estrangeiro;

II – órgão ou entidade da Administração Pública Direta e Indireta, inclusive Fundações Públicas;

III – concessionário ou permissionário de serviço público;

IV – entidade de direito privado que receba, na condição de beneficiária, contribuição compulsória em virtude de disposição legal;

V – entidade de utilidade pública;

VI – entidade de classe ou sindical;

VII – pessoa jurídica sem fins lucrativos que receba recursos do exterior;

VIII – entidades beneficentes e religiosas;

IX – entidades esportivas;

X – organizações não governamentais que recebam recursos públicos;

XI – organizações da sociedade civil de interesse público;

XII – autoridades públicas;

XIII – fundações instituídas em virtude de lei e para cujos recursos concorram órgãos ou entidades governamentais; e

XIV – cartórios de serviços notariais e de registros.

[...]

§ 2º Consideram-se como autoridades públicas, para os fins do inciso XII do caput deste artigo, aqueles, filiados ou não a partidos políticos, que exerçam cargos de chefia ou direção na administração pública direta ou indireta. (Grifei.)

Diante da proibição de recebimento de doações provenientes de ocupantes de cargos de chefia ou direção na administração pública direta ou indireta, foi identificado o ingresso de recursos provenientes de doadores ocupantes de cargos de gerente, chefe de gabinete, diretor, coordenador e chefe de comissão de órgãos da administração pública direta e indireta, no valor de R$ 24.531,56 (tabela da fl. 849).

Em suas alegações finais (fls. 858-868), a agremiação invoca a aplicação da Lei n. 13.488/17, que consagrou a faculdade de os filiados contribuírem para a manutenção dos partidos políticos, e da Lei n. 13.831/19, que introduziu o art. 55-D na Lei dos Partidos Políticos, anistiando as devoluções determinadas em razão de “doações ou contribuições feitas em anos anteriores por servidores públicos que exerçam função ou cargo público de livre nomeação e exoneração, desde que filiados a partido político”.

Inicialmente, é incontroverso que os cargos comissionados ocupados pelos doadores ao tempo das liberalidades inserem-se no conceito de autoridade pública prevista no art. 31, inc. II, da Lei n. 9.096/95, com a redação vigente ao tempo dos fatos, conforme regulamentação insculpida no art. 12, inc. XII e § 2°, da Resolução TSE n. 23.432/14, acima transcritos, bem como que a redação do art. 31, inc. II, da Lei n. 9.096/95, à época dos fatos, coibia aos partidos o recebimento de doações procedentes de autoridades públicas.

Quanto à aplicação retroativa das disposições previstas pela Lei n. 13.488/17, é de se ressaltar que as prestações de contas são regidas pela lei vigente à época dos fatos – tempus regit actum, em prol, resumidamente, dos princípios da isonomia e da segurança jurídica.

Nesse sentido:

AGRAVO REGIMENTAL. DIRETÓRIO ESTADUAL DE PARTIDO. PRESTAÇÃO DE CONTAS. EXECUÇÕES. INVIÁVEL O PARCELAMENTO MEDIANTE DESCONTOS DOS REPASSES DO FUNDO PARTIDÁRIO. POSSIBILIDADE COM RECURSOS PRÓPRIOS. ART. 44 DA LEI 9.096/95. RESOLUÇÃO TSE N. 21.841/04. EXERCÍCIO FINANCEIRO DE 2012.

1. As alterações introduzidas pela Lei n. 13.165/15 ao art. 37 da Lei 9.096/95 não se aplicam às prestações de contas partidárias de exercícios anteriores. A nova redação dada retirou a suspensão de quotas do Fundo Partidário e estabeleceu exclusivamente a imposição de multa de até 20% sobre o valor a ser recolhido. Tratando-se de prestação de contas do exercício financeiro de 2012, devem ser observadas as normas de direito material previstas na Resolução TSE n. 21.841/04.

2. Irretroatividade da Lei n. 13.488/17, in casu, por ser processo de exercício anterior a sua vigência. Obediência aos princípios do tempus regit actum, da isonomia e da segurança jurídica.

3. Agremiação condenada a recolher valores ao Fundo Partidário e ao Tesouro Nacional. Possibilidade de parcelamento. Vedado o uso de recursos do Fundo Partidário na medida em que o art. 44 da lei 9.096/95 prevê hipóteses taxativas de sua aplicação.

4. Negado provimento. (TRE-RS, PC n. 6380, Acórdão de 31.01.2018, Relator DES. CARLOS CINI MARCHIONATTI, Publicação: DEJERS - Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS.)

Na hipótese, as doações realizadas no exercício de 2015, antes da edição da Lei n. 13.488/17, devem ser caracterizadas como recursos oriundos de autoridades – fontes vedadas pela legislação eleitoral.

Assim, a nova disposição não cabe ser aplicada à hipótese porque ocorridas antes da sua vigência.

Nessa linha de raciocínio, aliás, já há precedente deste Tribunal, cuja relatoria coube ao d. Des. João Batista Pinto Silveira:

RECURSO. PRESTAÇÃO DE CONTAS. PARTIDO POLÍTICO. EXERCÍCIO FINANCEIRO DE 2017. DESAPROVAÇÃO. RECURSOS PROCEDENTES DE FONTES VEDADAS. DETENTORES DE CARGOS DEMISSÍVEIS AD NUTUM. IRRETROATIVIDADE DA LEI N. 13.488/17. DUPLO TRATAMENTO JURÍDICO DAS DOAÇÕES DE PESSOAS FÍSICAS EXERCENTES DE CARGOS DE CHEFIA E DIREÇÃO. MANUTENÇÃO DA SENTENÇA DE DESAPROVAÇÃO DAS CONTAS. RETIFICAÇÃO DO MONTANTE A SER RECOLHIDO AO TESOURO NACIONAL. REDUÇÃO DAS PENALIDADES DE SUSPENSÃO DO REPASSE DE VERBAS DO FUNDO PARTIDÁRIO E DE MULTA. PROVIMENTO PARCIAL.

1. Recebimento de recursos procedentes de fontes vedadas. É proibido aos partidos políticos receberem doações ou contribuições de titulares de cargos demissíveis ad nutum da Administração direta ou indireta, quando ostentarem a condição de autoridades. No caso dos autos, identificado o recebimento de doações de recursos financeiros de ocupantes de funções de direção e chefia.

2. Irretroatividade da Lei n. 13.488/17. 2.1. Posicionamento, deste Tribunal, pela aplicação do art. 31 da Lei n. 9.096/95 em sua redação original, devido à irretroatividade de novas disposições legais, ainda que mais benéficas ao prestador de contas, em homenagem aos princípios do tempus regit actum, da isonomia e da segurança jurídica. 2.2. Duplo tratamento jurídico das doações de pessoas físicas exercentes de cargos de chefia e direção na Administração Pública, em decorrência da sucessão legislativa. Devido ao fato de a Lei n. 13.488/17 ter entrado em vigor no dia 06.10.2017, cumpre aplicar, em relação às contribuições anteriores a esta data, a redação original do art. 31 da Lei dos Partidos Políticos, bem como as prescrições do art. 12, inc. IV e § 1º, da Resolução TSE n. 23.464/15, as quais vedavam as contribuições ainda que provenientes de filiados a partidos políticos. Todavia, as contribuições realizadas a partir de 06.10.2017 devem observar o disposto no art. 31, inc. V, da Lei n. 9.096/95 em sua nova redação, que ressalva a licitude dos auxílios pecuniários quando advindos de filiados a partidos políticos.

[...]

Provimento parcial.

(Recurso Eleitoral n. 14-74. Relator Des. João Batista Pinto Silveira. Julgado em 04.02.2019, unânime.) (Grifei.)

Ainda, cabe apontar que o recorrente, além de invocar a alteração legislativa trazida pela Lei n. 13.488/17, conforme acima abordado, alega que as contribuições consideradas de fonte vedada foram realizadas espontaneamente pelos filiados para custeio das atividades do partido.

Ocorre que, diante do regime jurídico aplicável, não cabe indagar o caráter de liberalidade da doação ou qualquer outra circunstância de cunho subjetivo em relação ao ingresso das aludidas receitas, uma vez que a regra proibitiva incide objetivamente, bastando a ocorrência do aporte dos recursos.

Reconheço como provenientes de fonte vedada as doações realizadas por autoridades ao partido político no valor de R$ 24.531,56.

Conforme já exposto, tendo sido declarada incidentalmente a inconstitucionalidade do art. 55-D da Lei n. 9.096/95, fica afastada a possibilidade de reconhecimento da anistia, devendo ser determinado o recolhimento de R$ 24.531,56 ao Tesouro Nacional, com fundamento no art. 61, § 2º, da Resolução TSE n. 23.432/14.

À guisa de conclusão, repriso que considerei como

- ressalva na contabilidade a omissão da dívida de R$ 8.916,00;

- irregular o recebimento de R$ 334.511,18 provenientes do Fundo Partidário em período no qual estava vigente a pena de suspensão de repasse de tais recursos ao partido;

- falha a ausência de identificação dos depósitos que perfazem o total de R$ 158.541,22, cujo montante equivalente deve ser recolhido ao Tesouro Nacional; e

- irregularidade o recebimento de recurso de fonte vedada no valor de R$ 24.531,56, impondo-se o recolhimento do montante ao Tesouro Nacional.

As máculas acima especificadas atingem o quantitativo de R$ 526.499,96 e representam 32,18% das receitas do exercício (R$ 1.635.913,70 – fl. 06), de forma a comprometer substancialmente a contabilidade e atrair a desaprovação das contas.

Reconhecido o recebimento de recursos de origem não identificada e de fonte vedada, impõe-se seja recolhido ao Tesouro Nacional o valor de R$ 183.072,78.

A análise técnica informou que os recursos sem identificação representam 11,91% do total de outros recursos financeiros arrecadados no exercício e que os valores oriundos de fonte vedada, 1,84% do mesmo montante.

Considerando esses parâmetros, relativamente à sanção prevista no art. 36 da Lei n. 9.096/95, que apena o recebimento de recursos de fonte vedada e origem não identificada, pondero que, em observância à gravidade e ao quantum da irregularidade, em dosagem que não inviabilize a manutenção das atividades do partido, cabe a fixação da suspensão do repasse de verbas do Fundo Partidário pelo período de 1 (um) mês.

Tal parâmetro encontra sustentação na jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral, que também se posiciona no sentido de que essa modalidade de sanção não é operação meramente aritmética entre os patamares mínimo e máximo previstos em lei e o valor correspondente às falhas. (Recurso Especial Eleitoral n. 2259, Acórdão, Relator Min. Admar Gonzaga, Publicação: DJE - Diário de justiça eletrônico, Data: 27.11.2017.)

Além desses consectários, fica o partido advertido para que, em exercícios futuros, observe as disposições normativas que impõem a apresentação de comprovantes com descrição detalhada dos produtos/serviços adquiridos.

ANTE O EXPOSTO, DECLARO, incidentalmente, a inconstitucionalidade do art. 55-D da Lei n. 9.096/95, incluído pela Lei n. 13.831/19. No mérito, VOTO pela desaprovação das contas do exercício financeiro de 2015 do DIRETÓRIO ESTADUAL do PARTIDO DOS TRABALHADORES (PT), pela determinação de recolhimento de R$ 183.072,78 (cento e oitenta e três mil e setenta e dois reais e setenta e oito centavos) ao Tesouro Nacional, e pela suspensão do repasse de verbas do Fundo Partidário pelo período de 1 (um) mês, nos termos da fundamentação.

É como voto, senhora Presidente.