E.Dcl. - 4994 - Sessão: 02/04/2018 às 18:00

RELATÓRIO

O MINISTÉRIO PÚBLICO ELEITORAL opõe embargos de declaração, com pedido de atribuição de efeitos infringentes, em face do acórdão que deu parcial provimento ao recurso interposto pelo PARTIDO DOS TRABALHADORES (PT) de ITATIBA DO SUL, para manter a desaprovação das contas, reduzir o valor a ser recolhido ao Tesouro Nacional e atribuir ao Diretório Nacional do Partido dos Trabalhadores a obrigação de recolher os valores recebidos de fonte vedada ao Tesouro Nacional.

Em suas razões, sustenta, preliminarmente, a nulidade do acórdão por afronta aos princípios do devido processo legal, da não surpresa e do contraditório substancial, em razão da ausência de prévia oportunidade de manifestação sobre o entendimento de que os recursos de fontes vedadas, repassados ao diretório recorrente por seu órgão superior, devem ser recolhidos ao Erário pelo diretório nacional. Invoca o art. 10 do CPC. Suscita a violação aos princípios da isonomia e da segurança jurídica, no ponto em que a decisão reformou a sentença para não aplicar o entendimento firmado na resposta dada pelo TRE-RS à Consulta n. 109-98, pois contrariou a jurisprudência que aplicou o referido precedente. No mérito, assevera a existência de contradição e equívoco quanto ao raciocínio de que o recolhimento dos recursos oriundos de fonte vedada deve ficar a cargo do diretório nacional da agremiação, porquanto a arrecadação foi realizada pelo diretório municipal, ora recorrente. Afirma também haver contradição e omissão quanto ao prequestionamento do art. 31, inc. II, da Lei n. 9.096/95 e aos julgados do TSE e do TRE-RS que trataram do enquadramento dos agentes políticos no conceito de autoridade. Entende não ter sido demonstrada a razão da modificação do entendimento jurisprudencial deste Tribunal, defendendo que as contribuições partidárias realizadas por agentes políticos sejam consideradas como fontes vedadas. Colaciona precedentes jurisprudenciais e requer o acolhimento da matéria preliminar, a fim de que seja oportunizado prazo para manifestação sobre a responsabilidade pelo recolhimento dos valores arrecadados de fontes vedadas ao Tesouro Nacional e, subsidiariamente, o provimento dos declaratórios com atribuição de efeitos modificativos.

Em virtude da possibilidade de atribuição de efeitos modificativos ao recurso, o PARTIDO DOS TRABALHADORES de ITATIBA DO SUL foi intimado a apresentar contrarrazões, mas deixou transcorrer o prazo sem manifestação.

É o relatório.

 

VOTO

O recurso é adequado, tempestivo e comporta conhecimento.

1. Preliminares

Inicialmente, examino a matéria preliminar.

a) Ofensa ao princípio da não surpresa

A Procuradoria Regional Eleitoral sustenta que, ao concluir pelo dever do diretório nacional de recolher os valores recebidos de fontes vedadas, e não do recorrente, o acórdão desrespeitou o art. 10 do Código de Processo Civil, que prevê que o “juiz não pode decidir, em grau algum de jurisdição, com base em fundamento a respeito do qual não se tenha dado às partes oportunidade de se manifestar, ainda que se trate de matéria sobre a qual deva decidir de ofício”.

Examinando os autos, verifico que nesta instância, após a vista concedida ao Ministério Público Eleitoral para oferta do parecer de mérito das fls. 150-156v., o feito foi despachado, de ofício, para realização de diligências, conforme decisão da fl. 158.

Na referida decisão, foi determinada a remessa dos autos ao órgão técnico deste Tribunal para realização de novo cálculo dos recursos arrecadados de fonte vedada pela agremiação, provenientes de autoridades, com exclusão dos detentores de mandato eletivo, em razão do entendimento firmado pelo Tribunal na sessão de 06.12.2017, quando do julgamento dos recursos RE n. 14-78 e RE n. 13-93, da relatoria do ilustre Desembargador Federal João Batista Pinto Silveira.

Conforme constou expressamente do acórdão, nos referidos julgados, este Tribunal reviu sua jurisprudência, fixada na resposta à Consulta CTA n. 109-98, da relatoria do Dr. Leonardo Tricot Saldanha, e decidiu pela possibilidade de detentores de mandato eletivo realizarem contribuição pecuniária aos partidos políticos.

A decisão da fl. 158 consignou que, em razão dos aludidos julgados  que reviram o entendimento até então existente no âmbito deste Tribunal, seriam consideradas regulares as doações efetuadas por detentores de mandato eletivo.

Por essa razão, os autos foram remetidos ao órgão técnico que realizou o novo cálculo do valor recebido de fontes vedadas, juntando-se aos autos a informação da fl. 161, que consigna: “a integralidade das doações apuradas como Fontes Vedadas são oriundos de repasses do Diretório Nacional do PT”.

Devido ao referido apontamento, no julgamento do mérito recursal, o acórdão embargado ponderou que “os repasses foram realizados pelo diretório nacional, órgão que efetivamente recebeu os recursos vedados dos contribuintes detentores de cargos com poder de autoridade”.

A decisão concluiu que o dever de recolhimento do valor irregular é do diretório nacional, com base na jurisprudência do TSE, segundo a qual a desaprovação de contas de partido político, por recebimento de recursos oriundos de fonte vedada pela legislação, não tem o condão de contaminar automaticamente as contas do candidato a quem foi repassada parcela destes recursos e que os tenha empregado em sua campanha eleitoral (Rel. Min. Luiz Fux, DJE 16.02.2016):

Nessa hipótese, deve ser aplicado entendimento no sentido de ser indevida a determinação, nos presentes autos, de recolhimento dos valores considerados irregulares ao Tesouro Nacional, pois a questão é passível de conhecimento em feito diverso, oriundo do ente nacional do partido.

As contas do diretório nacional, o qual efetivamente recebeu os recursos de fonte vedada, são inconfundíveis com as contas do diretório municipal para o qual foram repassados os recursos, de maneira que o recolhimento da quantia irregularmente recebida somente pode ser determinado, de forma autônoma e independente, pelo órgão jurisdicional competente para o exame da contabilidade do diretório nacional.

Assim, é no processo de contas do diretório nacional do partido que devem ser valoradas as contribuições irregulares verificadas pelo exame técnico.

O c. TSE aplicou este raciocínio ao consignar, no julgamento do Recurso Especial Eleitoral n. 85911, que a desaprovação de contas de partido político, no caso, diretório municipal, devido ao recebimento de recursos oriundos de fonte vedada pela legislação, não tem o condão de contaminar automaticamente as contas do candidato a quem foi repassada parcela destes recursos e que os tenha empregado em sua campanha eleitoral (Rel. Min. Luiz Fux, DJE 16/02/2016).

A mesma consideração pode ser realizada na situação dos autos, pois ainda que a irregularidade impeça a aprovação das contas, dado o manifesto recebimento de recursos de fonte vedada, é inviável a ordem de recolhimento dos valores, pois tal efeito deve ser apurado no processo de prestação de contas do exercício financeiro de 2016 do diretório nacional do partido, e não nas contas do diretório municipal a quem foi repassado o recurso.

De igual modo e, pela mesma razão, merece ser afastada a penalidade de suspensão de novas quotas do Fundo Partidário por um ano, determinada na sentença por força do art. 36, II, da Lei n. 9.096/95.

Assim, a única sanção devida, no caso concreto, é a pena de multa sobre a falha constatada nas contas.

Como se vê, a readequação, de ofício, da responsabilidade pelo recolhimento dos valores ao Tesouro Nacional foi tomada na premissa de que a obrigação de devolver o recurso é do órgão que diretamente recebeu o repasse ilícito, o qual teria maior efetividade para a identificação da irregularidade.

Esse entendimento visa, igualmente, evitar a ocorrência de bis in idem mediante repetição de idêntica determinação quando do julgamento das contas do Diretório Nacional pelo Tribunal Superior Eleitoral.

Todavia, nas razões de embargos, a Procuradoria Regional Eleitoral aponta questão de suma importância relativa à ausência de prévio debate sobre a responsabilidade da devolução dos valores irregulares ao Tesouro Nacional e à proibição de haver a decisão surpresa no processo. Tais institutos decorrem da garantia instituída pelo princípio constitucional do contraditório, máxima que enseja ao juiz o poder-dever de ouvir as partes sobre todos os pontos do processo, incluídos os que possivelmente poderão ser decididos de ofício.

Efetivamente, não houve prévia intimação acerca da readequação da responsabilidade pela obrigação de devolver os recursos de fontes vedadas ao Erário.

Entendo, contudo, não ser caso de prolação de eventual nulidade, porque, da leitura das judiciosas ponderações apresentadas nos embargos de declaração, mormente do exame dos dados de doadores originários, verifico ser recomendável que se mantenha o comando sentencial para que o recorrente restitua os valores ao Tesouro Nacional.

Apesar de a jurisprudência do TSE ter se assentado de que é do ente que recebe imediatamente o recurso de fonte vedada a obrigação de recolher os valores, o caso concreto demonstra que o PT de Itatiba do Sul foi o real destinatário e usuário dos recursos repassados pelos servidores do município, enquadrados como fonte vedada de arrecadação.

Por tudo o que dos autos consta, é possível verificar ter sido realizada uma inequívoca triangularização das contribuições partidárias entre os órgãos de direção municipal e nacional do partido, pois os ocupantes de cargos com poder de autoridade, lotados no Município de Itatiba do Sul, efetuaram contribuições ao Diretório Nacional do PT que foram imediatamente repassadas ao Diretório Municipal do PT de Itatiba do Sul.

Então, sem sombra de dúvidas, o Diretório Nacional do PT apenas mediou o ingresso da receita irregular para o diretório municipal: o real destinatário dos valores doados pelos ocupantes de cargos de chefia junto à municipalidade.

Assim, tendo em conta que o diretório nacional do partido figurou como mero intermediário da operação, impende agregar efeitos modificativos ao recurso para manter a determinação de que os valores sejam restituídos pelo recorrente, na forma fixada na sentença, exatamente como requer a Procuradoria Regional Eleitoral.

Para evitar a dupla determinação de recolhimento dos mesmos valores, quando do exame das contas do Diretório Nacional do Partido dos Trabalhadores, mostra-se suficiente o encaminhamento de ofício ao TSE consignando que o recolhimento dos recursos indevidamente recebidos já fora determinado nos autos do presente processo, para consideração do fato nas contas do exercício financeiro de 2016.

Dessa forma, supera-se a preliminar, sem pronúncia de eventual nulidade porque, no ponto em questão, o recurso será provido no mérito, com o aclaramento e a reforma parcial do acórdão embargado.

b) Quebra do princípio da isonomia ou da paridade de armas e da segurança jurídica

Não verifico, entretanto, a existência de quebra dos princípios da isonomia e da segurança jurídica em face da aplicação do entendimento recentemente fixado pelo Tribunal nos recursos RE n. 14-78 e RE n. 13-93.

Importa ressaltar que a contradição que dá azo ao manejo de embargos de declaração é aquela existente entre os termos da decisão embargada, e não entre seus fundamentos e a jurisprudência existente sobre o assunto discutido nos autos.

Além disso, há que se ter presente que a jurisprudência, enquanto interpretação reiterada dada à lei pelos tribunais, é dinâmica e, não raras vezes, sofre superação de entendimentos, circunstância que se acentua no âmbito do Direito Eleitoral devido à sua própria natureza célere e dinâmica, o que faz com que entendimentos mudem de eleição para eleição.

No âmbito da common law, a alteração ou superação da jurisprudência é conhecida como overruling, termo utilizado quando se é tomada uma decisão posterior que torna o precedente inconsistente.

Esse é exatamente o caso dos autos.

E, apesar de ter sido superada a diretriz jurisprudencial até então existente no âmbito do TRE-RS, essa circunstância não ofende os princípios invocados pelo embargante, pois não há que se falar em direito subjetivo à inalterabilidade da jurisprudência.

Assim, afasto a preliminar.

2. Mérito

No mérito, não há omissão alguma no julgado quanto ao disposto no art. 31, inc.II, da Lei n. 9.096/95.

Foi expressamente considerado o conteúdo desse dispositivo legal e devidamente esclarecido que, apesar de a sentença ter registrado que o total de recursos de fontes vedadas era de R$ 10.037,29, seriam desconsideradas desse montante as contribuições de R$ 6.304,77 que foram repassadas por detentores de mandato eletivo porque o Tribunal decidiu não mais aplicar o entendimento estabelecido na resposta à Consulta n. 109-98.

Colaciono o trecho da decisão:

O valor irregular, de R$ 2.820,04, representa 22,49% do total da receita recebida pela agremiação, no montante de R$ 12.533,71.

(...)

Além disso, não devem ser consideradas, como fontes vedadas, as contribuições de R$ 6.304,77, repassadas por detentores de mandato eletivo, tendo em vista que este Tribunal decidiu não mais aplicar o entendimento contido na resposta deste Tribunal à Consulta n. 109-98, julgada em 23.09.2015, publicada em 25/09/2015 no Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS.

Na sessão de 06/12/2017, a partir dos julgamentos dos recursos RE 14-78 e RE 13-93, da relatoria do ilustre Desembargador Federal João Batista Pinto Silveira, este Tribunal decidiu pela possibilidade de detentores de mandato eletivo realizarem contribuição pecuniária a partido político, revendo o entendimento exarado na Consulta CTA 109-98.

No caso em tela, o Partido dos Trabalhadores de Itatiba do Sul questionou o conceito de autoridade e o próprio dispositivo legal que define a fonte vedada, fato que possibilita a ampla devolução da matéria para que o Tribunal delimite sua incidência.

Em especial, os argumentos veiculados pelo partido na fl. 146 foram formulados no sentido de que os detentores de cargo eletivo não são autoridades públicas para os fins da restrição às contribuições.

Assim, não se verifica qualquer omissão, contradição ou nulidade no acórdão embargado em relação a esse argumento. Foi devidamente demonstrada a razão da modificação do entendimento jurisprudencial sobre o tema.

Embora a insurgência da Procuradoria Regional Eleitoral e sua convicção de que os agentes políticos devem ser considerados no conceito de autoridade, este Tribunal verificou não haver amparo legal para que um candidato, após eleito, seja proibido de doar ao partido pelo qual se elegeu.

Em verdade, soa até mesmo desarrazoado que uma pessoa filie-se, candidate-se e que, enquanto não eleita, possa contribuir para a democracia alcançando, voluntariamente, verbas à legenda com cuja ideologia se identifica, defende e propaga, mas que, após obter o mandato nas urnas, seja proibida de doar.

Ao debruçar-se sobre o tema, o Tribunal entendeu que o legislador dirigiu o inc. II do art. 31 da Lei n. 9.096/95 aos detentores de cargos de livre nomeação e exoneração, com poder de autoridade, e não aos ocupantes de mandato eletivo.

Ademais, essa tese vem sendo arguida pela Procuradoria Regional Eleitoral em todos os processos que tratam de contribuição de agentes políticos, evidenciando-se a intenção de reapreciação da lide, o que não é admissível mediante a oposição de embargos de declaração.

Por esse motivo, transcrevo os argumentos trazidos pelo nobre Des. Federal João Batista Pinto Silveira, quando do julgamento dos embargos de declaração no RE n. 13-93, na sessão de 31.01.2018:

Quanto à superação do posicionamento adotado na CTA n. 10.998, tenho que a evolução no posicionamento deste Tribunal não representou afronta ao princípio da isonomia e da paridade de armas entre os concorrentes.

Primeiro porque, conforme foi consignado na decisão embargada, o “TSE não tem posição definida sobre a doação de titulares de mandatos eletivos”, e a matéria pende de julgamento no Supremo Tribunal Federal, de modo que o jurisdicionado não detinha a segurança jurídica necessária para afirmar que a mudança de posicionamento deste Regional implicaria em violação da isonomia e da paridade de armas. Dito de outro modo, a questão é controversa, e a ausência de posicionamento dos tribunais superiores sobre a matéria impede que o jurisdicionado tenha legítima expectativa de continuidade das decisões em um ou outro sentido.

(...)

Note-se: se em espécies de tal repercussão - jurisprudência dominante e casos repetitivos – a modulação é apenas uma possibilidade, não uma imposição, tal providência certamente não é exigível em decisões de tribunais regionais que representem viragens jurisprudenciais.

Mesmo o Supremo Tribunal Federal, quando recomendou a aplicação do princípio da anterioridade eleitoral também em relação às mudanças jurisprudenciais, o fez em relação às decisões do Tribunal Superior Eleitoral, e não de forma irrestrita, como se verifica na ementa do processo julgado em regime de repercussão geral:

RECURSO EXTRAORDINÁRIO. REPERCUSSÃO GERAL. REELEIÇÃO. PREFEITO. INTERPRETAÇÃO DO ART. 14, § 5º, DA CONSTITUIÇÃO. MUDANÇA DA JURISPRUDÊNCIA EM MATÉRIA ELEITORAL. SEGURANÇA JURÍDICA.[…] II. MUDANÇA DA JURISPRUDÊNCIA EM MATÉRIA ELEITORAL. SEGURANÇA JURÍDICA. ANTERIORIDADE ELEITORAL. NECESSIDADE DE AJUSTE DOS EFEITOS DA DECISÃO. Mudanças radicais na interpretação da Constituição devem ser acompanhadas da devida e cuidadosa reflexão sobre suas consequências, tendo em vista o postulado da segurança jurídica. Não só a Corte Constitucional, mas também o Tribunal que exerce o papel de órgão de cúpula da Justiça Eleitoral devem adotar tais cautelas por ocasião das chamadas viragens jurisprudenciais na interpretação dos preceitos constitucionais que dizem respeito aos direitos políticos e ao processo eleitoral. Não se pode deixar de considerar o peculiar caráter normativo dos atos judiciais emanados do Tribunal Superior Eleitoral, que regem todo o processo eleitoral. Mudanças na jurisprudência eleitoral, portanto, têm efeitos normativos diretos sobre os pleitos eleitorais, com sérias repercussões sobre os direitos fundamentais dos cidadãos (eleitores e candidatos) e partidos políticos. No âmbito eleitoral, a segurança jurídica assume a sua face de princípio da confiança para proteger a estabilização das expectativas de todos aqueles que de alguma forma participam dos prélios eleitorais. A importância fundamental do princípio da segurança jurídica para o regular transcurso dos processos eleitorais está plasmada no princípio da anterioridade eleitoral positivado no art. 16 da Constituição. O Supremo Tribunal Federal fixou a interpretação desse artigo 16, entendendo-o como uma garantia constitucional (1) do devido processo legal eleitoral, (2) da igualdade de chances e (3) das minorias (RE 633.703).

Em razão do caráter especialmente peculiar dos atos judiciais emanados do Tribunal Superior Eleitoral, os quais regem normativamente todo o processo eleitoral, é razoável concluir que a Constituição também alberga uma norma, ainda que implícita, que traduz o postulado da segurança jurídica como princípio da anterioridade ou anualidade em relação à alteração da jurisprudência do TSE. Assim, as decisões do Tribunal Superior Eleitoral que, no curso do pleito eleitoral (ou logo após o seu encerramento), impliquem mudança de jurisprudência (e dessa forma repercutam sobre a segurança jurídica), não têm aplicabilidade imediata ao caso concreto e somente terão eficácia sobre outros casos no pleito eleitoral posterior. III. REPERCUSSÃO GERAL. Reconhecida a repercussão geral das questões constitucionais atinentes à (1) elegibilidade para o cargo de Prefeito de cidadão que já exerceu dois mandatos consecutivos em cargo da mesma natureza em Município diverso (interpretação do art. 14, § 5º, da Constituição) e (2) retroatividade ou aplicabilidade imediata no curso do período eleitoral da decisão do Tribunal Superior Eleitoral que implica mudança de sua jurisprudência, de modo a permitir aos Tribunais a adoção dos procedimentos relacionados ao exercício de retratação ou declaração de inadmissibilidade dos recursos repetitivos, sempre que as decisões recorridas contrariarem ou se pautarem pela orientação ora firmada. IV. EFEITOS DO PROVIMENTO DO RECURSO EXTRAORDINÁRIO. Recurso extraordinário provido para: […] (2) deixar assentados, sob o regime da repercussão geral, os seguintes entendimentos: (2.1) o art. 14, § 5º, da Constituição, deve ser interpretado no sentido de que a proibição da segunda reeleição é absoluta e torna inelegível para determinado cargo de Chefe do Poder Executivo o cidadão que já exerceu dois mandatos consecutivos (reeleito uma única vez) em cargo da mesma natureza, ainda que em ente da federação diverso; (2.2) as decisões do Tribunal Superior Eleitoral que, no curso do pleito eleitoral ou logo após o seu encerramento, impliquem mudança de jurisprudência, não têm aplicabilidade imediata ao caso concreto e somente terão eficácia sobre outros casos no pleito eleitoral posterior.

(RE 637485, Relator: Min. GILMAR MENDES, Tribunal Pleno, julgado em 01.8.2012, ACÓRDÃO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-095 DIVULG 20.5.2013 PUBLIC 21.5.2013.)

Com essas considerações, merece ser mantida a decisão nesse ponto.

Quanto ao pedido de prequestionamento, a nova redação do art. 1.025 do Código de Processo Civil considera incluídos no acórdão os elementos que o embargante suscitou, sendo prescindível a manifestação explícita para esse fim.

 

ANTE O EXPOSTO, afasto a preliminar de quebra dos princípios da isonomia e da segurança jurídica e, no mérito, VOTO pelo acolhimento parcial, a fim de aclarar o acórdão e atribuir efeitos infringentes aos embargos de declaração para manter a determinação de que o Diretório Municipal do PT de Itatiba do Sul recolha ao Tesouro Nacional a quantia recebida de fontes vedadas, na forma fixada na sentença.

Nos termos da fundamentação, permanecem inalterados os demais termos do acórdão embargado, o qual reduziu a quantia considerada como oriunda de fontes vedadas para R$ 2.820,08 (dois mil oitocentos e vinte reais e oito centavos) e fixou pena de multa de R$ 14,10 (quatorze reais e dez centavos).

Por fim, com o objetivo de evitar dupla penalização, expeça-se ofício ao Tribunal Superior Eleitoral informando ter sido determinado por este Tribunal, no presente julgamento, que os recursos oriundos de fontes vedadas recebidos pelo Diretório Nacional do Partido dos Trabalhadores, no exercício 2016, e repassados ao Diretório Municipal do PT de Itatiba do Sul, sejam recolhidos pelo diretório municipal, com cópia dos acórdãos prolatados no feito.