E.Dcl. - 1871 - Sessão: 06/03/2018 às 17:00

RELATÓRIO

Cuida-se de embargos de declaração opostos pelo MINISTÉRIO PÚBLICO ELEITORAL em face do acórdão das fls. 189-192v. que, por unanimidade, deu provimento parcial ao recurso do PARTIDO SOCIALISTA BRASILEIRO DE ESTEIO e reconheceu a licitude de doações efetuadas por vereador, mantendo o juízo de desaprovação e reduzindo o período de suspensão do recebimento de novas quotas do Fundo Partidário para dois meses.

Em suas razões (fls. 197-205v.), sustenta ter ocorrido omissão no relativo ao prequestionamento do art. 31, inc. II, da Lei n. 9.096/95, e aduz que a decisão incorreu em contradição ao quebrar a isonomia entre os candidatos e a paridade de armas na competição eleitoral. Afirma que o detentor de mandato eletivo é autoridade para os fins da vedação, e que o poder normativo das resoluções eleitorais não pode extrapolar o disposto em lei. Defende que importou em afronta ao princípio da isonomia e da paridade de armas entre os concorrentes, tanto em relação àqueles que cumpriram o disposto na consulta quanto em relação aos que não cumpriram e foram punidos. Requer o conhecimento e acolhimento dos embargos para sanar os vícios e conceder efeitos modificativos.

Em contrarrazões (fls. 222-224v.), a agremiação destaca a justiça da decisão, salientando que os vereadores não têm sido tratados como fonte vedada na jurisprudência pátria. Ao final, requer o não provimento dos embargos.

É o relatório.

VOTO

Os embargos são tempestivos, pois opostos em 05.02.2018, segunda-feira. A Procuradoria Regional Eleitoral foi intimada em 31.01.2018, quarta-feira.

Antecipo que os aclaratórios merecem ser parcialmente acolhidos, mas tão somente para corrigir o erro material de soma dos valores doados por vereadores.

Explico.

De fato: na soma total de valores doados por detentores de mandato de vereador, não foi incluído o montante doado por Harri José Janoni (R$ 4.500,00), o qual, acrescido ao valor de R$ 3.500,00, referido no acórdão e doado por Jaime da Rosa Ignácio, totaliza R$ 8.000,00.

No mérito, contudo, tenho que os aclaratórios devem ser rejeitados, em que pesem os argumentos expostos pelo Parquet.

Note-se que o art. 31, inc. II, da Lei n. 9.096/95, dispositivo legal que, na redação vigente à época da arrecadação de recursos, vedava o recebimento de doações provenientes de autoridade, encontra-se mencionado no corpo do voto, inclusive, para entender irregular a doação de Jussara Krug.

Ou seja, não houve omissão ou contradição, mas decisão fundamentada, inclusive com citação de precedente, no sentido de que não houve subsunção do referido comando legal, art. 31, inc. II, da Lei n. 9.096/95, às doações de Harri José Janoni e Jaime da Rosa Ignácio.

Ademais, as argumentações, (1) no sentido de que o detentor de mandato eletivo seria autoridade, bem como que (2) o poder normativo das resoluções eleitorais não pode extrapolar o disposto em lei, não são hábeis, sequer em tese, para a oposição de embargos, pois configuram tentativa de rediscussão do mérito da decisão impugnada.

Ainda, tenho que a evolução de posicionamento do tribunal não representa afronta ao princípio da isonomia e da paridade de armas entre os concorrentes.

Primeiro porque, conforme consignado nas contrarrazões aos embargos, o TSE não tem posição definida sobre a doação de titulares de mandatos eletivos, e, presente no corpo do acórdão embargado, a matéria aguarda julgamento no Supremo Tribunal Federal, de modo que não é possível afirmar que a mudança de posicionamento deste Tribunal implica violação da isonomia e da paridade de armas.

Note-se que o STF poderá, inclusive, modular os efeitos da decisão que venha a tomar.

Dito de outro modo, a questão é controversa e há ausência de posicionamento dos tribunais superiores sobre a matéria.

Note-se que a modulação é apenas uma possibilidade, não uma imposição, e tal providência certamente não é exigível em decisões de tribunais regionais que representem viragens jurisprudenciais.

Mesmo o Supremo Tribunal Federal, quando recomendou a aplicação do princípio da anterioridade eleitoral também em relação às mudanças jurisprudenciais, o fez quanto às decisões do Tribunal Superior Eleitoral, e não de forma irrestrita, como se verifica na ementa do processo julgado em regime de repercussão geral:

RECURSO EXTRAORDINÁRIO. REPERCUSSÃO GERAL. REELEIÇÃO. PREFEITO. INTERPRETAÇÃO DO ART. 14, § 5º, DA CONSTITUIÇÃO. MUDANÇA DA JURISPRUDÊNCIA EM MATÉRIA ELEITORAL. SEGURANÇA JURÍDICA. [...]

II. MUDANÇA DA JURISPRUDÊNCIA EM MATÉRIA ELEITORAL. SEGURANÇA JURÍDICA. ANTERIORIDADE ELEITORAL. NECESSIDADE DE AJUSTE DOS EFEITOS DA DECISÃO. Mudanças radicais na interpretação da Constituição devem ser acompanhadas da devida e cuidadosa reflexão sobre suas consequências, tendo em vista o postulado da segurança jurídica. Não só a Corte Constitucional, mas também o Tribunal que exerce o papel de órgão de cúpula da Justiça Eleitoral deve adotar tais cautelas por ocasião das chamadas viragens jurisprudenciais na interpretação dos preceitos constitucionais que dizem respeito aos direitos políticos e ao processo eleitoral. Não se pode deixar de considerar o peculiar caráter normativo dos atos judiciais emanados do Tribunal Superior Eleitoral, que regem todo o processo eleitoral. Mudanças na jurisprudência eleitoral, portanto, têm efeitos normativos diretos sobre os pleitos eleitorais, com sérias repercussões sobre os direitos fundamentais dos cidadãos (eleitores e candidatos) e partidos políticos. No âmbito eleitoral, a segurança jurídica assume a sua face de princípio da confiança para proteger a estabilização das expectativas de todos aqueles que de alguma forma participam dos prélios eleitorais. A importância fundamental do princípio da segurança jurídica para o regular transcurso dos processos eleitorais está plasmada no princípio da anterioridade eleitoral positivado no art. 16 da Constituição. O Supremo Tribunal Federal fixou a interpretação desse artigo 16, entendendo-o como uma garantia constitucional (1) do devido processo legal eleitoral, (2) da igualdade de chances e (3) das minorias (RE 633.703). Em razão do caráter especialmente peculiar dos atos judiciais emanados do Tribunal Superior Eleitoral, os quais regem normativamente todo o processo eleitoral, é razoável concluir que a Constituição também alberga uma norma, ainda que implícita, que traduz o postulado da segurança jurídica como princípio da anterioridade ou anualidade em relação à alteração da jurisprudência do TSE. Assim, as decisões do Tribunal Superior Eleitoral que, no curso do pleito eleitoral (ou logo após o seu encerramento), impliquem mudança de jurisprudência (e dessa forma repercutam sobre a segurança jurídica), não têm aplicabilidade imediata ao caso concreto e somente terão eficácia sobre outros casos no pleito eleitoral posterior. III. REPERCUSSÃO GERAL. Reconhecida a repercussão geral das questões constitucionais atinentes à (1) elegibilidade para o cargo de Prefeito de cidadão que já exerceu dois mandatos consecutivos em cargo da mesma natureza em Município diverso (interpretação do art. 14, § 5º, da Constituição) e (2) retroatividade ou aplicabilidade imediata no curso do período eleitoral da decisão do Tribunal Superior Eleitoral que implica mudança de sua jurisprudência, de modo a permitir aos Tribunais a adoção dos procedimentos relacionados ao exercício de retratação ou declaração de inadmissibilidade dos recursos repetitivos, sempre que as decisões recorridas contrariarem ou se pautarem pela orientação ora firmada. IV. EFEITOS DO PROVIMENTO DO RECURSO EXTRAORDINÁRIO. Recurso extraordinário provido para: [...]

(2) deixar assentados, sob o regime da repercussão geral, os seguintes entendimentos: (2.1) o art. 14, § 5º, da Constituição, deve ser interpretado no sentido de que a proibição da segunda reeleição é absoluta e torna inelegível para determinado cargo de Chefe do Poder Executivo o cidadão que já exerceu dois mandatos consecutivos (reeleito uma única vez) em cargo da mesma natureza, ainda que em ente da federação diverso; (2.2) as decisões do Tribunal Superior Eleitoral que, no curso do pleito eleitoral ou logo após o seu encerramento, impliquem mudança de jurisprudência, não têm aplicabilidade imediata ao caso concreto e somente terão eficácia sobre outros casos no pleito eleitoral posterior.

(RE 637485, Relator: Min. GILMAR MENDES, Tribunal Pleno, julgado em 01.8.2012, ACÓRDÃO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-095 DIVULG 20.05.2013 PUBLIC 21.5.2013)

Segundo, o precedente invocado pelo embargante em voto de lavra do Des. Federal João Batista Pinto Silveira (Embargos de Declaração no RE n. 201-64) não trata de evolução no posicionamento do colegiado acerca de interpretação jurídica sobre expressão constante em dispositivo legal, mas versou sobre tratamento desigual dos jurisdicionados.

Dessa forma, por qualquer ângulo que se observe os argumentos veiculados nos aclaratórios, não é possível vislumbrar a alegada omissão ou afronta ao princípio da isonomia e da paridade de armas.

 

Com essas considerações, VOTO pelo parcial acolhimento dos aclaratórios, somente para corrigir erro material e considerar como valor total de doações oriundas de vereadores a quantia de R$ 8.000,00, e rejeitar os embargos relativamente aos demais vícios alegados.