RE - 84917 - Sessão: 27/04/2018 às 13:30

RELATÓRIO

Trata-se de recurso eleitoral interposto por EMERSON AGUINELO DA SILVA LEITE (fls. 79-86) contra sentença do Juízo da 131ª Zona Eleitoral (fls. 72-73) que desaprovou sua prestação de contas relativa ao cargo de vereador, disputado nas eleições de 2016 no Município de Sapiranga, em virtude da declaração de recursos próprios estimáveis em dinheiro referentes à cessão de veículo próprio para uso durante a campanha, sem a correspondente anotação em sua declaração de bens por ocasião do registro da sua candidatura.

Em suas razões, o recorrente sustenta que a falha identificada constitui erro formal, insuficiente para comprometer a regularidade e a transparência das contas, conforme dispõem os arts. 30, § 2º-A, da Lei n. 9.504/97 e 68, inc. II, da Resolução TSE n. 23.463/15, dispositivos aos quais o Juiz Eleitoral da origem teria negado vigência ao sentenciar o feito. Requereu a aprovação das contas ou, alternativamente, a aprovação com ressalvas.

Nesta instância, a Procuradoria Regional Eleitoral opinou, preliminarmente, pela nulidade da sentença, com o retorno dos autos ao juízo de primeiro grau para que se manifeste quanto ao disposto nos arts. 18, 19 e 26 da Resolução TSE n. 23.463/15, determinando o recolhimento, ao Tesouro Nacional, dos recursos de origem não identificada, no montante de R$1.225,00. No mérito, opinou pelo desprovimento do recurso, com a determinação, de ofício, por esta Casa, do recolhimento da referida quantia ao Tesouro Nacional (fls. 92-105).

É o relatório.

 

VOTO

Admissibilidade

A sentença foi publicada no DEJERS no dia 07.11.2017 (fl. 77) e o recurso interposto em 10.11.2017 (fl. 79), dentro, portanto, do tríduo legal. Preenchidos, também, os demais pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso.

Preliminar de Nulidade da Sentença e Pedido de Determinação de Recolhimento de Ofício de Valores ao Tesouro Nacional

Inicialmente, afasto a prefacial suscitada pela Procuradoria Regional Eleitoral de nulidade da sentença, devido à falta de determinação de recolhimento, ao Tesouro Nacional, dos valores de origem não identificada, no montante de R$1.225,00, em alegada negativa de vigência aos arts. 18, 19 e 26 da Resolução TSE n. 23.463/15, abaixo transcritos:

Art. 18. As pessoas físicas somente poderão fazer doações, inclusive pela Internet, por meio de:

I - transação bancária na qual o CPF do doador seja obrigatoriamente identificado;

(…)

Art. 19. Os bens e/ou serviços estimáveis em dinheiro doados por pessoas físicas devem constituir produto de seu próprio serviço, de suas atividades econômicas e, no caso dos bens, devem integrar seu patrimônio.

§ 1º Os bens próprios do candidato somente podem ser utilizados na campanha eleitoral quando demonstrado que já integravam seu patrimônio em período anterior ao pedido de registro da respectiva candidatura.

(…)

Art. 26. O recurso de origem não identificada não pode ser utilizado por partidos políticos e candidatos e deve ser transferidos ao Tesouro Nacional, por meio de Guia de Recolhimento da União (GRU).

§ 1º Caracterizam o recurso como de origem não identificada:

I - a falta ou a identificação incorreta do doador; e/ou

II - a falta de identificação do doador originário nas doações financeiras; e/ou

III - a informação de número de inscrição inválida no CPF do doador pessoa física ou no CNPJ quando o doador for candidato ou partido político.

(…)

§ 6º Não sendo possível a retificação ou a devolução de que trata o § 5º, o valor deverá ser imediatamente recolhido ao Tesouro Nacional.

Com efeito, a irregularidade apontada pela Procuradoria Regional Eleitoral não foi aventada pelo examinador das contas ao emitir o parecer técnico conclusivo, no qual, aliás, restou expressamente consignada a ausência de recebimento de recursos de origem não identificada (fl. 67).

O Ministério Público Eleitoral de primeiro grau também não apontou a existência de recursos sem identificação de origem ao se manifestar nos autos (fl. 70 e v.).

Ao sentenciar o feito, o juiz a quo adotou integralmente a análise feita no parecer técnico conclusivo para desaprovar a contabilidade de campanha, sem fazer qualquer referência à movimentação de recursos de origem não identificada. Dessa forma, ausente a qualificação de recursos dessa natureza, inexiste nulidade a ser reconhecida na sentença por este Tribunal, em decorrência da suposta omissão quanto ao sancionamento pretendido pela Procuradoria Regional Eleitoral.

Por essas razões, rejeito a preliminar de nulidade da sentença, assim como o pedido de determinação, de ofício, do recolhimento de valores de origem não identificada ao Tesouro Nacional, sob pena de agravamento, quanto a este ponto, da situação jurídica do candidato sem que tivesse sido interposto recurso pelo órgão ministerial de primeira instância, em contrariedade ao princípio da vedação da reformatio in pejus.

Mérito

Inicialmente, observo que a contabilidade de campanha foi apresentada à Justiça Eleitoral em 12.11.2016 (fl. 02), ou seja, após 1º.11.2016, data-limite estabelecida pelo art. 45, caput, da Resolução TSE n. 23.463/15.

Entretanto, a extemporaneidade da entrega das contas não compromete a confiabilidade da documentação contábil, tampouco prejudica a efetividade da fiscalização e o controle jurisdicional da arrecadação e das despesas realizadas durante a campanha, constituindo, assim, falha de caráter formal, insuficiente para motivar o juízo de desaprovação.

Nesse sentido, é a orientação consolidada por este Tribunal, como se extrai da ementa do seguinte aresto:

PRESTAÇÃO DE CONTAS DE CAMPANHA. PARTIDO POLÍTICO. DIRETÓRIO ESTADUAL. ELEIÇÕES 2016. FALTA DE ENTREGA DA PRESTAÇÃO DE CONTAS PARCIAL. APRESENTAÇÃO INTEMPESTIVA DAS CONTAS FINAIS. AUSÊNCIA DE CONTA BANCÁRIA ESPECÍFICA DE CAMPANHA. APROVAÇÃO COM RESSALVAS.

1. Omissão quanto à entrega da prestação de contas parcial. Falha sem aptidão para prejudicar a transparência da escrituração, pois não tendo participado do pleito por meio da arrecadação ou do dispêndio de recursos, inexistiam dados a serem previamente tornados públicos.

2. Apresentação extemporânea da prestação de contas final. Não observado o comando normativo do art. 45, “caput”, da Resolução TSE n. 23.463/15. A extemporaneidade da apresentação das contas, entretanto, não prejudica a confiabilidade dos documentos contábeis, tampouco obstaculiza a efetiva fiscalização da movimentação financeira pela Justiça Eleitoral. Configurada falha formal.

3. Ausência de conta bancária para movimentação financeira de campanha. O prestador é órgão estadual e as contas dizem respeito ao pleito municipal. A distinção entre o âmbito de atuação partidária e de realização da campanha torna crível a ausência da esfera partidária regional na eleição. Ademais, não realizados arrecadação ou gastos eleitorais, motivos pelos quais o descumprimento da exigência normativa não compromete o exame das informações contábeis prestadas.

4. Aprovação com ressalvas.

(TRE-RS, RE n. 207-93, Relator Dr. Silvio Ronaldo Santos de Moraes, julgado em 04.12.2017.) (Grifei.)

No condizente ao mérito propriamente dito, as contas do candidato atinentes ao pleito de 2016 foram desaprovadas em virtude da declaração de recursos próprios estimáveis em dinheiro, no valor de R$250,00, referentes à cessão temporária do veículo IDEA, placa IMZ7217, para uso durante a campanha, sem a correspondente comprovação de que o bem integrava o seu patrimônio, como exige o art. 19, caput, da Resolução TSE n. 23.463/15.

Em suas razões recursais, o candidato alegou que a ausência da declaração do bem por ocasião do registro da sua candidatura não dificultou o controle dos recursos e despesas efetuados durante a sua campanha, amoldando-se ao conceito de falha de caráter formal, que não compromete o resultado das contas, atraindo o juízo de aprovação com ressalvas, em conformidade com o art. 30, § 2º-A, da Lei n. 9.504/97 e o art. 68, inc. II, da Resolução TSE n. 23.463/15.

De fato, o veículo não foi incluído na declaração de bens do candidato ao requerer o registro da sua candidatura à Justiça Eleitoral, conforme consulta à página <http://divulgacandcontas.tse.jus.br/divulga/#/candidato/2016/2/88994/ 210000007501>.

Tampouco o candidato demonstrou ser o proprietário do veículo, mediante a juntada do correspondente certificado de registro e licenciamento, ao longo da instrução processual, ou mesmo ao interpor o recurso, valendo-se de faculdade reiteradamente admitida por este Regional, com fundamento no art. 266, caput, do Código Eleitoral (RE n. 330-47, Relator Des. Federal João Batista Pinto Silveira, e RE n. 332-17, Relator Dr. Eduardo Augusto Dias Bainy, julgados, respectivamente, em 06 e 22.11.2017).

Todavia, a irregularidade compreende o valor de R$250,00, o qual possui diminuta expressividade econômica e alcança tão somente 3,2% dos recursos destinados ao financiamento da campanha, os quais totalizaram o montante de R$7.717,97 (fl. 03).

Nesse contexto contábil, em que o valor nominal e percentual da falha não tem representatividade econômica para comprometer a confiabilidade das contas, sem a constatação do recebimento de receitas de fonte vedada ou de origem não identificada, ou, ainda, de indícios de má-fé por parte do prestador, a inconsistência torna-se superável, permitindo sejam as contas aprovadas com ressalvas.

Nesse sentido, a jurisprudência desta Casa:

RECURSO. PRESTAÇÃO DE CONTAS. CANDIDATO. GASTOS DE CAMPANHA COM PESSOAL. RESOLUÇÃO TSE N. 23.463/15. ART. 38, I. EXCEDIDO. PERCENTUAL ÍNFIMO. MÁ FÉ. INEXISTÊNCIA. PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE E RAZOABILIDADE. APLICAÇÃO. APROVAÇÃO COM RESSALVAS. ELEIÇÕES 2016.

1. Recurso de prestação de contas desaprovadas.

2. Comprovada a ausência de má-fé, possível a aplicação do princípio da proporcionalidade e razoabilidade quando as falhas apontadas representam menos de 5% do total de recursos movimentados pelo prestador. A jurisprudência do Egrégio Tribunal Superior Eleitoral tem aplicado tais princípios em situações em que as irregularidades alcancem o limite de até 10% da movimentação financeira.

3. Falta de gravidade na falha que não compromete a confiabilidade das informações prestadas, proporcionando a fiscalização pela Justiça Eleitoral e propiciando a aprovação com ressalvas.

Acolhimento parcial.

(TRE-RS, RE n. 837-72, Relator Dr. Eduardo Augusto Dias Bainy, julgado em 25.7.2017.) (Grifei.)

 

RECURSO. PRESTAÇÃO DE CONTAS. CANDIDATO. VEREADOR. ELEIÇÕES 2016. NULIDADE DA SENTENÇA. NÃO RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. PRELIMINAR AFASTADA. MÉRITO. DOAÇÃO ESTIMADA EM DINHEIRO. DIVERGÊNCIA DAS DECLARAÇÕES. COMPROVAÇÃO DA ORIGEM DOS VALORES. PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE E DA RAZOABILIDADE. APROVAÇÃO COM RESSALVAS. PARCIAL PROVIMENTO.

1. Rejeitada a preliminar diante da ausência de prejuízo pela não determinação do recolhimento dos valores ao Tesouro Nacional.

2. As falhas apresentadas e a não retificação dos documentos não comprometeram a análise da movimentação financeira, presumindo a boa-fé do prestador e considerando ter sido apenas um equívoco no seu lançamento. Sendo a divergência do valor doado de pequena monta, plausível fazer uso dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade para aprovar as contas com ressalvas.

3. Provimento parcial.

(TRE-RS, RE n. 244-28, Relator Des. Federal João Batista Pinto Silveira, julgado em 19.12.2017.) (Grifei.)

Por fim, esclareço que a Procuradoria Regional Eleitoral também apontou falha concernente à quantia de R$975,00, por ter sido declarada a título de cessão ou locação de veículos sem o correspondente lançamento de despesas com combustíveis, a qual, somada ao valor de R$250,00, perfariam o montante de R$1.225,00 sem origem identificada, passível de recolhimento ao Tesouro Nacional, com base no art. 26 da Resolução TSE n. 23.463/15.

Contudo, como visto, tal apontamento não integrou o conteúdo do parecer conclusivo (fl. 67 e v.), da manifestação do órgão ministerial de origem (fl. 70 e v.), ou mesmo da sentença (fls. 72-73), de modo que a análise desse tópico, com a possibilidade de agravamento da situação jurídica do recorrente, sem que tivesse sido interposto recurso pelo órgão ministerial da origem, implicaria manifesta violação ao princípio da non reformatio in pejus (art. 141 do Código de Processo Civil).

Dispositivo

Diante do exposto, afastada a matéria preliminar aventada pela Procuradoria Regional Eleitoral, VOTO pelo parcial provimento do recurso, para aprovar com ressalvas as contas apresentadas por EMERSON AGUINELO DA SILVA, relativas às eleições municipais de 2016, com fundamento no art. 68, inc. II, da Resolução TSE n. 23.463/15.