RE - 22789 - Sessão: 12/03/2018 às 18:00

RELATÓRIO

Cuida-se de recurso interposto por CRISTIANO SILVA DE OLIVEIRA, referente à campanha eleitoral de 2016, na qual concorreu ao cargo de vereador de Porto Alegre/RS pelo Partido Trabalhista Brasileiro (PTB), contra sentença que desaprovou suas contas com fundamento no art. 68, inc. III, da Resolução TSE n. 23.463/15 e no art. 30, inc. III, da Lei n. 9.504/97, diante de inconsistências no confronto entre as informações prestadas pelo candidato e pelos doadores, e da omissão relativa à despesa registrada na prestação de contas e aquela constante na base de dados da Justiça Eleitoral.

Em suas razões, o recorrente alega que prestou esclarecimentos, declarando que o equívoco se originou das contas do candidato a prefeito, Maurício Dziedrick, e que essas foram devidamente retificadas e enviadas ao sistema da Justiça Eleitoral. Diz não ser razoável ter suas contas desaprovadas em razão de erro cometido por terceiro.

Com vista dos autos, a Procuradoria Regional Eleitoral opinou pela anulação da sentença, a fim de que o magistrado determine o recolhimento da importância de R$ 222,32. Em caso diverso, no mérito, pelo desprovimento do recurso e, de ofício, pela determinação do recolhimento do montante de R$ 222,32 ao Tesouro Nacional.

Em face da matéria preliminar, foi dada vista dos autos ao recorrente, que se manifestou nas fls. 73-80.

É o breve relatório.

VOTO

O recurso é tempestivo.

A Procuradoria Eleitoral suscitou preliminar de anulação da sentença porque não teria havido determinação de recolhimento do montante apontado como irregular.

As contas foram desaprovadas devido à existência de registro de doações estimáveis em dinheiro efetuadas pelo candidato Maurício Dziedricki, em benefício do ora prestador, com valores diversos dos anotados nesta prestação de contas.

Apesar dos bem expostos argumentos, entendo que a preliminar deve ser rejeitada.

A sentença não fundamentou a desaprovação na ausência de identificação do doador, mas na divergência entre as contas do ora recorrente e as do candidato Maurício Dziedricki.

Neste feito, nem se poderia falar de recurso de origem não identificada, pois o recorrente sustenta que não recebeu os valores apontados nas contas de Maurício Dziedricki. A falha, portanto, era de divergência de informações, e não de omissão do doador, pois, caso houvesse mesmo a doação, tal como registrada pelo candidato Maurício, seu doador estaria perfeitamente identificado.

Assim, como a sentença não se baseia em ausência de identificação do doador, não há que se falar em falta de recolhimento de valores nem em nulidade da decisão, pois o juiz não se omitiu na aplicação de uma norma de ordem pública, mas interpretou os fatos, concluindo pela caracterização de irregularidade distinta da pretendida pelo Ministério Público.

Ademais, essa situação apenas poderia ser alterada mediante recurso do fiscal da lei, e não em sede de recurso exclusivo do prestador, sob pena de operar-se a vedada reformatio in pejus, nos termos do que decidido pelo Tribunal:

RECURSO. PRESTAÇÃO DE CONTAS. CANDIDATO. VEREADOR. ELEIÇÕES 2016. AFASTADA A PRELIMINAR DE NULIDADE DA SENTENÇA. NÃO DETERMINADO O COMANDO DE RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL PELO MAGISTRADO SENTENCIANTE. INAPLICÁVEL O JULGAMENTO DA "CAUSA MADURA". PENALIDADE NÃO SUSCITADA DURANTE A TRAMITAÇÃO DO FEITO. MATÉRIA PRECLUSA. PROIBIÇÃO DA REFORMATIO IN PEJUS. MÉRITO. DOAÇÃO EM ESPÉCIE. DEPÓSITO DIRETO NA CONTA DE CAMPANHA. EXTRAPOLADO LIMITE LEGAL. ART. 18, § 1º, DA RESOLUÇÃO TSE N. 23.463/15. ORIGEM NÃO COMPROVADA. MANTIDA A DESAPROVAÇÃO. NÃO DETERMINADO O REPASSE DA QUANTIA IRREGULAR AO ERÁRIO. DESPROVIMENTO.

1. Afastada a preliminar. Reconhecido pelo magistrado sentenciante o emprego em campanha de recursos de origem não identificada, sem a determinação do comando de recolhimento da importância irregular ao Tesouro Nacional. Impossibilidade de agravamento da situação do recorrente quando, durante a tramitação do feito, aquela penalidade nunca foi suscitada. A ausência de irresignação quanto a esse ponto da decisão conduz ao inevitável reconhecimento da preclusão da matéria, pois a interposição do apelo dirigido a este Tribunal tem a única finalidade de melhorar a situação da parte, com a aprovação integral das contas. Defeso a invocação da matéria na instância ad quem, dado que a determinação de recolhimento de valores ao Tesouro Nacional configurará inegável prejuízo para a parte que interpõe o apelo. Vedada a reformatio in pejus, nos termos do art. 141 do Código de Processo Civil. Inaplicável ao feito o entendimento de que a questão está madura para julgamento, podendo ser determinado o recolhimento de ofício pelo Tribunal. Não caracterizada nulidade.

2. Mérito. As doações financeiras de valor igual ou superior a R$ 1.064,10 somente podem ser realizadas mediante transferência eletrônica entre as contas bancárias do doador e do beneficiário da doação. Realizado depósito em dinheiro, diretamente na conta de campanha e acima do limite legal, em desobediência ao disposto no art. 18, § 1º, da Resolução TSE n. 23.463/15. Caracterizado o recebimento de recurso de origem não identificada. Manutenção da sentença de desaprovação. Não determinado o comando de recolhimento do valor empregado ao Tesouro Nacional.

Desprovimento.

(Recurso Eleitoral n. 63662, Acórdão de 14.12.2017, Relator: DR. LUCIANO ANDRÉ LOSEKANN.) (Grifei.)

Do exposto, máxime frente à ausência do manejo recursal pelo Ministério Público, reconhecida a preclusão da matéria e a impossibilidade de agravamento da posição jurídica do recorrente, afasto a preliminar de nulidade da sentença.

Passando ao mérito, o levantamento técnico contábil apurou divergência entre o valor declarado como recebido em recurso de bem estimável em dinheiro pelo prestador e o que foi apontado na prestação de contas do doador, candidato a prefeito Maurício Alexandre Dziedricki.

Equivale dizer, o examinador realizou cruzamento de dados entre as informações dadas pelo candidato e as registradas pelo doador.

Em que pese a importância desse procedimento para averiguação de eventual caixa dois, ou de veracidade das informações prestadas, tenho que, na espécie, a divergência detectada não maculou a confiabilidade das contas, e não pode servir de amparo para configurar o recurso como de origem não identificada ou mesmo para impor a rejeição das contas.

Explico.

A diferença total entre o valor declarado como recebido em recurso de bem estimável em dinheiro pelo prestador e o informado na prestação de contas do doador – Maurício Alexandre Dziedricki – é de R$ 223,36, sendo que em algumas doações a divergência verificada alcançou cifras de R$ 0,10 ou R$ 0,94.

Esse montante é insignificante e, como argumentado no apelo, é razoável inferir ter sido gerado por equívoco no lançamento da prestação de contas do doador, máxime em se tratando de recurso estimável em dinheiro, doado em forma de rateio entre os candidatos à vereança, a título de produção de programas de rádio, televisão ou vídeo.

Ademais, a simples falta de correspondência exata em relação aos valores não pode ter como consequência direta a presunção de que se trata de valor de origem não identificada.

A essência da natureza do processo de prestação de contas é declaratória e o que se presume é a boa-fé do candidato.

Além disso, a prestação de contas que se examina é a de Cristiano Silva de Oliveira, não sendo dado ao julgador a desaprovação de contas com fundamento em eventual equívoco no lançamento de uma informação que foi declarada em prestação de contas de terceiro.

Aliás, o parecer técnico apontou que teria havido omissão de registro do pagamento de despesa no valor de R$ 510,00, o que revelaria indícios de omissão de gastos.

Todavia, como a despesa foi perfeitamente liquidada, sendo possível identificar o fornecedor, não verifico gravidade suficiente a comprometer a lisura e transparência das contas.

Assim, tenho como autorizada, na espécie, a aplicação dos postulados da proporcionalidade e da razoabilidade, seguindo sedimentada jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral para aprovar com ressalvas as contas do recorrente:

AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL. PRESTAÇÃO DE CONTAS. VALOR IRRISÓRIO. MÁ-FÉ. AUSÊNCIA. PRÍNCIPIO DA PROPORCIONALIDADE. APROVAÇÃO DAS CONTAS COM RESSALVA. DESPROVIMENTO.

1. Se as falhas, em seu conjunto não comprometem a análise da regularidade da prestação de contas e atingem percentual diminuto (1,25 %) em relação aos recursos movimentados na campanha, é possível a aplicação dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, a ensejar a aprovação das contas com ressalva.

2. Agravo regimental desprovido.

(TSE - Agravo Regimental no Recurso Especial Eleitoral n. 6159- 63.2010.6.05.0000, Salvador/BA, relator Ministro Dias Toffoli, julgado em 05.12.2013, publicado no DJE 029, em 11.02.2014, p. 38.)

Por derradeiro, colaciono ementa de recente julgado deste Tribunal, no qual se apurou divergência igualmente entre os valores registrados nas contas do doador Maurício Dziedrick e nas do prestador:

RECURSO. PRESTAÇÃO DE CONTAS. CANDIDATO. VEREADOR. DESAPROVAÇÃO. ELEIÇÕES 2016. PRELIMINAR. DIVERGÊNCIA ENTRE O ENTENDIMENTO DO MINISTÉRIO PÚBLICO E DO JUIZ DE PRIMEIRO GRAU. NEGATIVA DE VIGÊNCIA A DISPOSITIVO LEGAL NÃO CARACTERIZADA. MÉRITO. DIFERENÇAS NO REGISTRO DE DOAÇÕES ENTRE AS CONTAS DO PRESTADOR E DO CANDIDATO DOADOR. VALOR IRRISÓRIO. APROVAÇÃO COM RESSALVAS. PROVIMENTO PARCIAL.

Preliminar de nulidade rejeitada. A sentença não fundamentou a desaprovação das contas na ausência de identificação do doador, razão pela qual não houve a alegada omissão na aplicação do disposto no art. 26 da Resolução TSE n. 23.463/15. Negativa de vigência e de nulidade não caracterizadas.

Divergência entre o registro de doações realizadas pelo candidato ao cargo de prefeito e as informações lançadas na prestação de contas do recorrente. O montante do valor irregular representa 0,9% do total arrecadado, insignificante para prejudicar a confiabilidade das contas. Reforma da sentença para aprovar as contas com ressalvas.

Provimento parcial.

(RE 240-88.2016.6.21.0113, julgado em 25.01.2018, Relator Dr. JAMIL ANDRAUS HANNA BANNURA.) (Grifei.)

Ante o exposto, rejeito a preliminar e, no mérito, VOTO pelo parcial provimento do recurso interposto, reformando a sentença para aprovar as contas com ressalvas.