E.Dcl. - 27757 - Sessão: 25/01/2018 às 17:00

RELATÓRIO

O MINISTÉRIO PÚBLICO ELEITORAL opôs embargos de declaração do acórdão que, nos autos da prestação de contas da candidata ao cargo de vereador VERA LÚCIA LUCION, relativa ao pleito de 2016 em Tapejara, (a) afastou a matéria preliminar suscitada pela Procuradoria Regional Eleitoral e (b) desproveu o recurso interposto, confirmando a sentença de aprovação com ressalvas.

Aduziu a ocorrência de omissão e contradição. Pugnou pelo provimento, com atribuição de efeitos infringentes, para que sejam sanados os vícios apontados (fls. 167-174).

Após, vieram os autos a mim conclusos.

É o relatório.

 

VOTO

Os embargos declaratórios são tempestivos (fls. 165-167) e preenchem os demais pressupostos de admissibilidade, razão pela qual deles conheço.

No mérito, inicialmente consigno que os aclaratórios servem para afastar obscuridade, contradição ou omissão que emergem do acórdão, assim como sanar erro material, nos termos do art. 275, caput, do Código Eleitoral c/c o art. 1.022 do Código de Processo Civil - CPC.

Nas razões do recurso, em síntese, foram deduzidos os seguintes argumentos:

(a) o acórdão foi omisso no tocante à necessidade de intimação da candidata com relação aos documentos apresentados pelo Parquet em primeiro grau, consistentes na existência de fato que caracteriza, em tese, omissão de gastos eleitorais; e

(b) o acórdão foi contraditório ao manter a aprovação das contas com ressalvas, uma vez que reconheceu a possibilidade de gravidade dos fatos narrados e a existência de indícios de ilícito eleitoral.

À guisa de conclusão, o embargante lançou os seguintes requerimentos (fl. 174):

“Assim, o Ministério Público Eleitoral requer sejam conhecidos e providos os presentes embargos declaratórios, com efeitos infringentes, a fim de que, sanadas a omissão e as contradições acima apontadas, seja reconhecida a nulidade da sentença; e, em caso de entendimento diverso, sejam julgadas as contas desaprovadas, tendo em vista o reconhecimento da prática de abuso de poder econômico, diante da existência de despesas eleitorais, custeadas com recursos de origem não identificada e que não transitaram pela conta-corrente respectiva, fato que enseja a desaprovação das contas, nos termos dos arts. 13, caput, e 29, II, IV e VIII, todos da Resolução TSE nº 23.463/15. Acaso assim não entenda, aplique-se o art. 933 caput, do CPC”.

Conforme se infere, a pretensão do embargante não se amolda às hipóteses de cabimento dos aclaratórios, traduzindo, em verdade, divergência quanto ao entendimento adotado pelos julgadores e ao resultado do julgamento.

O acórdão combatido apresentou fundamentação com as razões suficientes à formação do convencimento do Pleno deste Tribunal, em conformidade com a normativa do art. 371 do CPC, enfrentados os pontos anotados pelo embargante como omissos ou contraditórios, como pode ser visto no trecho abaixo transcrito (fls. 158-161v.):

[...]

Preliminares da Procuradoria Regional Eleitoral

A Procuradoria Regional Eleitoral, em seu parecer (fls. 139-143v.), requereu, em preliminar, a anulação da sentença em razão de:

a) não ter sido oportunizada a manifestação da candidata acerca das novas irregularidades apontadas pelo Ministério Público Eleitoral de piso; e

b) a sentença não enfrentar todos os argumentos deduzidos no processo capazes de, em tese, infirmar a conclusão adotada pelo julgador (art. 489, §1º, inc. IV, do CPC).

Cumpre esclarecer que a presente prestação de contas eleitorais seguiu o rito ordinário, em que pese aplicável o rito simplificado, consoante determina o art. 28, § 9º, da Lei n. 9.504/97, regulamentado pelo art. 57 e seguintes da Resolução TSE n. 23.463/15 – a qual dispõe, como é cediço, sobre a arrecadação e os gastos de recursos por partidos políticos e candidatos e sobre a prestação de contas nas eleições de 2016.

O parecer técnico da fl. 17 determinou a realização de diligências – rito ordinário – na forma do art. 64, § 1º da Resolução TSE n. 23.463/15.

O candidato, em cumprimento às diligências solicitadas, apresentou manifestação e juntou documentos às fls. 57-62.

Sobreveio parecer conclusivo pela aprovação com ressalvas das contas (fl. 63) e manifestação pelo Ministério Público Eleitoral de piso (fls. 65-117) pela sua desaprovação.

Ato contínuo, foi proferida sentença aprovando as contas com ressalvas (fls. 119-120).

Relativamente a não ter sido oportunizada manifestação à candidata, acerca das novas irregularidades apontadas, dispõem os arts. 62, 66 e 67, da Resolução TSE n. 23.463/15, conforme o rito aplicável:

Rito simplificado:

Art. 62. Existindo impugnação, irregularidade identificada pela análise técnica ou manifestação do Ministério Público Eleitoral contrária à aprovação das contas, o Juiz Eleitoral examinará as alegações e decidirá sobre a regularidade das contas ou, não sendo possível, converterá o feito para o rito ordinário e determinará a intimação do prestador de contas para que, no prazo de setenta e duas horas, apresente prestação de contas retificadora

acompanhada de todos os documentos e informações descritos no art. 48.

Rito ordinário:

Art. 66. Emitido parecer técnico conclusivo pela existência de irregularidades e/ou impropriedades sobre as quais não se tenha dado oportunidade específica de manifestação ao prestador de contas, a Justiça Eleitoral o notificará para, querendo, manifestar-se no prazo de setenta e duas horas contadas da notificação, vedada a juntada de documentos que não se refiram especificamente à irregularidade e/ou impropriedade apontada.

Art. 67. Apresentado o parecer conclusivo da unidade técnica e observado o disposto no art. 66, o Ministério Público Eleitoral terá vista dos autos da prestação de contas, devendo emitir parecer no prazo de quarenta e oito horas.

Parágrafo único. O disposto no art. 66 também é aplicável quando o Ministério Público Eleitoral apresentar parecer pela rejeição das contas por motivo que não tenha sido anteriormente identificado ou considerado pelo órgão técnico.

Ressalto que a jurisprudência tem reconhecido a nulidade na hipótese de ser proferida sentença de desaprovação sem que tenha sido oportunizada prévia manifestação acerca das irregularidades apontadas.

Não vislumbro, prima facie, qualquer prejuízo à recorrida, haja vista que a sentença não reconheceu os documentos apresentados pelo Ministério Público Eleitoral como aptos à desaprovação das contas e decidiu pela sua aprovação com ressalvas (fls. 119-120), nos estritos termos do parecer conclusivo (fl. 63 e v.).

Ademais, a candidata apresentou contrarrazões (fls. 132-135), não se insurgiu quanto a eventual cerceamento de defesa, inclusive se manifestou acerca da documentação de fls. 67-117, razão pela qual não se identifica a ocorrência de qualquer vício a necessitar o retorno dos autos à origem.

No que concerne à arguição de nulidade em razão de o magistrado deixar de analisar, na sentença, falha apontada pelo órgão ministerial, destaco que não houve a alegada omissão.

No ponto, o juízo a quo assim decidiu:

[…]

Em que pese o parecer do Ministério Público Eleitoral opinar pela desaprovação das contas e a existência de fortes indícios da prática ilícita, captação ilícita de sufrágio ou, até mesmo, abuso do poder econômico, o Inquérito Policial sequer foi concluído e tampouco se sabe se haverá denúncia e responsabilização da candidata, de modo que os documentos apresentados pelo Ministério Público não podem servir de base para a desaprovação.

[…]

Vê-se, portanto, que a decisão enfrentou a questão de fundo, sendo que não houve a oposição de embargos de declaração. Desse modo, o inconformismo quanto ao mérito não deve ensejar a nulidade da sentença.

Diante do exposto, afasto as preliminares de nulidade do feito, suscitadas pela Procuradoria Regional Eleitoral, e passo à análise do mérito.

Mérito

O MINISTÉRIO PÚBLICO ELEITORAL insurge-se da sentença de fl. 119-120 que julgou aprovadas as contas da candidata ao cargo de vereador, VERA LÚCIA LUCION, referente às eleições municipais de 2016 em Tapejara.

Nas razões recursais (fls. 123-125v.), sustenta, primeiramente, ter a candidata omitido movimentação financeira, consubstanciada na falta de registro nos extratos eletrônicos juntados às fls. 18-22 das despesas realizadas a título de combustíveis e de lubrificantes no valor de R$ 258,00.

Nesse aspecto, adianto que o “Extrato da Prestação de Contas Final” (fl. 07) apresentado pela candidata consigna, na despesa classificada como de “Combustíveis e Lubrificantes” – item “2.10” –, o citado valor de R$ 258,00.

Analisado com maior profundidade o extrato bancário à fl. 10, relativo ao mês de outubro, constata-se que o histórico de movimentação financeira se encerra no dia 28.9.2016, mesma data da emissão do extrato. É possível identificar, ainda, a existência do saldo de R$ 258,00.

A omissão dos extratos – no período de 28.9 até o encerramento da conta bancária – ensejou o respectivo apontamento pelo responsável técnico (relatório preliminar de diligências à fl. 17). O relatório de exame está acompanhado de relação de despesas (fls. 18-22), extraídas a partir do Sistema de Prestação de Contas Eleitorais – SPCE, a qual demonstra existência de gastos posteriores a 28.10, nos valores de R$ 200,00 (de 30.9.16, NF n. 353, série M55, descrição: gasolina comum) e de R$ 58,00 (de 28.9.16, NF n. 351, série M55, descrição: gasolina comum).

Referida irregularidade restou esclarecida a partir da manifestação de fls. 57-58, especialmente em razão da juntada de extratos bancários relativos ao período faltante, pelos quais foi possível verificar a compensação de cheque no valor de R$ 258,00, ocorrida em 31.10.2016.

A complementação da documentação, portanto, possibilitou o efetivo controle fiscalizatório das receitas e despesas declaradas à Justiça Eleitoral.

Prossigo.

O recorrente argumenta, ainda, que a documentação juntada ao parecer final – fls. 67-117 – comprova que a candidata e seus assessores efetuaram elevados gastos com combustíveis, o que evidenciaria a omissão de despesas e, consequentemente, de receitas de campanha.

As peças acostadas (termo de ocorrência policial, relatório de busca e apreensão, termos de declarações, entre outros) resultam de procedimento investigatório criminal instaurado para apurar possível infração penal, cujo conteúdo aponta a suposta distribuição de vales combustível em troca da colocação de adesivos em nome da candidata “Vera”.

Por intermédio da documentação juntada somente no parecer final pelo Ministério Público Eleitoral de primeiro grau, ainda que seja possível identificar a gravidade dos fatos e o forte indício da ocorrência de ilícito eleitoral, não é suficientemente apta a demonstrar o envolvimento, a utilização de recursos ilícitos ou a prática de “caixa dois” pela candidata.

A prova é indiciária, não foi produzida à luz do contraditório e, dessa forma, não permite juízo seguro de convicção.

Importa referir que a presente prestação de contas não foi impugnada no momento oportuno, tendo transcorrido in albis o prazo de 3 (três) dias, contados da publicação do edital (fls. 15 - 16), para os interessados – inclusive o Ministério Público Eleitoral –, para relatar fatos e indicar provas, indícios e circunstâncias, mediante petição fundamentada dirigida ao juízo eleitoral (art. 51, §1º, Resolução TSE n. 23.463/15).

Desse modo, não estando demonstrada de maneira robusta a irregularidade apontada – omissão de receitas e de despesas com aquisição de combustíveis pela recorrida –, subsistindo apenas impropriedade de natureza formal e inexistindo outras irregularidades aptas a comprometer lisura das contas, deve ser mantida a decisão que julgou as contas aprovada com ressalvas.

Ressalta-se que, em que pese não comprovada a realização de gastos ilícitos no âmbito desta ação, nada impede entendimento diverso em sede de representação por abuso, captação e/ou gastos ilícitos de recursos, não obstante a possibilidade de coincidência entre os fatos ora examinados, diante da existência de requisitos legais próprios e consequências jurídicas distintas.

[…]

De ver, portanto, que as questões trazidas nos aclaratórios foram integralmente apreciadas no contexto do acórdão impugnado, o que reflete a tentativa de rediscussão da matéria debatida nos autos, hipótese não abrigada por esta espécie recursal.

Nesse sentido, a jurisprudência deste Regional:

Embargos de declaração. Ação de investigação judicial eleitoral. Improcedência. Omissão e contradição. Art. 275, inc. II, do Código Eleitoral. Ausentes os vícios para o manejo dos aclaratórios. Inexistente omissão ou contradição a ser sanada. Decisão devidamente fundamentada, na qual debatidos os pontos trazidos pelo embargante.

Tentativa de rediscussão da matéria já apreciada, o que descabido em sede de embargos. Rejeição.

(TRE-RS – E.Dcl. n. 301-12.2016.6.21.0092 – Rel. DES. CARLOS CINI MARCHIONATTI – Julgado em 11.5.2017.)

 

Embargos de declaração. Acórdão que negou provimento a recurso contra sentença de procedência em representação por doação para campanha acima do limite legal.

Alegada ocorrência de contradição e obscuridade no exame de matéria essencial ao deslinde da controvérsia. Descabimento da tese invocada e impossibilidade de inovação temática em sede de embargos.

Enfrentamento de todas as questões necessárias ao deslinde da questão.

Desacolhimento.

(TRE-RS – RE n. 6210 – Rel. Desa. Federal Maria Lúcia Luz Leiria – Julgado em 10.7.2012.)

É desnecessário, enfim, que o julgador justifique, explicitamente, as razões de não ter utilizado legislação ou entendimento diversos para a solução do caso. Basta, para tanto, abordar os elementos essenciais da causa, com observância ao preconizado pela Constituição Federal, em seu art. 93, inc. IX:

Art. 93. […]

IX - todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos, e fundamentadas todas as decisões, sob pena de nulidade, podendo a lei limitar a presença, em determinados atos, às próprias partes e a seus advogados, ou somente a estes, em casos nos quais a preservação do direito à intimidade do interessado no sigilo não prejudique o interesse público à informação;

[…]

(Grifei.)

Ademais, por via de consequência, também em razão do teor e da suficiência da fundamentação do acórdão recorrido, afasto o pleito sucessivo de aplicação do art. 933 do CPC a fim de serem intimadas as partes para novamente se manifestar.

Logo, dentro desse contexto, a decisão embargada deve ser mantida nos seus exatos termos.

Diante do exposto, VOTO pela rejeição dos embargos declaratórios.