RE - 4810 - Sessão: 19/02/2018 às 17:00

RELATÓRIO

Trata-se de recurso interposto por PARTIDO DOS TRABALHADORES (PT) de Palmeira das Missões, NEREU PIOVESAN e MARINA DA SILVA contra sentença do Juízo da 032ª Zona Eleitoral, que desaprovou as contas referentes ao exercício financeiro de 2011, determinou o recolhimento, ao Fundo Partidário, da quantia de R$ 32.194,22 (trinta e dois mil e cento e noventa e quatro reais e vinte e dois centavos) e cominou a suspensão do recebimento das quotas do Fundo Partidário pelo período de 06 (seis) meses (fls. 221-224).

Nas suas razões, alegam que as contribuições provenientes do prefeito e do vice-prefeito, que totalizam a quantia de R$ 25.885,48 (vinte e cinco mil e oitocentos e oitenta e cinco reais e quarenta e oito centavos), não devem ser consideradas como recursos de fonte vedada, ao argumento de que os detentores de mandato eletivo não se enquadram no conceito de autoridade pública. Requer a reforma da sentença, a fim de aprovar as contas. Subsidiariamente, postula que a receita proveniente dos detentores de mandato eletivo seja desconsiderada (fls. 227-230).

Foram os autos com vista à Procuradoria Regional Eleitoral, que opinou pelo desprovimento do recurso (fls. 235-241).

É o relatório.

 

VOTO

O recurso é tempestivo. Presentes os demais pressupostos de admissibilidade, merece conhecimento.

No mérito, o PARTIDO DOS TRABALHADORES (PT) de Palmeira das Missões teve suas contas do exercício de 2011 desaprovadas, com a determinação de recolhimento, ao Fundo Partidário, da quantia de R$ 32.194,22 (trinta e dois mil e cento e noventa e quatro reais e vinte e dois centavos) e a suspensão do repasse de quotas do Fundo Partidário por 06 (seis) meses. Fundamentalmente, o juízo de reprovação foi firmado em virtude da ausência dos extratos bancários completos e do recebimento de recursos oriundos de fontes vedadas.

Em defesa, os recorrentes aduzem que, do total relacionado, a quantia de R$ 25.885,48 (vinte e cinco mil e oitocentos e oitenta e cinco reais e quarenta e oito centavos), proveniente de contribuições do prefeito e do vice-prefeito, não deve ser considerada como oriunda de fonte vedada, ao argumento de que os detentores de mandato eletivo não são enquadrados como autoridade pública.

Pois bem.

De início, impõe salientar que as irregularidades possuem natureza grave, como ressaltado na sentença e indicado no parecer do d. Procurador Regional Eleitoral.

Isso porque sem a apresentação dos extratos bancários em sua completude, as informações prestadas não se revestem da segurança para o controle das contas, conforme já se manifestou a jurisprudência:

Recurso. Prestação de contas anual. Partido político. Art. 4º, caput, da Resolução TSE n. 21.841/04. Exercício financeiro de 2014. Falta de abertura de conta bancária para o registro da movimentação financeira e da apresentação dos extratos bancários correspondentes. Providências imprescindíveis, seja para demonstrar a origem e a destinação dada aos recursos, seja para comprovar a alegada ausência de movimentação financeira à Justiça Eleitoral. Inaplicabilidade da norma que desobriga a apresentação das contas por órgãos partidários que não tenham movimentação financeira e que exclui a sanção de suspensão de quotas do Fundo Partidário, haja vista a irretroatividade dos efeitos das alterações decorrentes da Lei n. 13.165/15, conforme entendimento firmado por este Tribunal. Readequação, de ofício, do prazo de suspensão do recebimento de novas quotas do Fundo Partidário para 1 (um) mês. Provimento negado.

(Recurso Eleitoral n. 3350, Acórdão de 25.01.2016, Relator DES. FEDERAL LUÍS ALBERTO D'AZEVEDO AURVALLE, Publicação: DEJERS - Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Tomo 16, Data 29.01.2016, Página 4.)

PRESTAÇÃO DE CONTAS - PARTIDO POLÍTICO - DIRETÓRIO ESTADUAL - EXERCÍCIO FINANCEIRO 2012 - LEI Nº 9.096/95 E RESOLUÇÃO TSE Nº 21.841/2004 - AUSÊNCIA DE DOCUMENTOS INDISPENSÁVEIS - CONTAS DESAPROVADAS.

1. A ausência de documentos exigidos pela legislação, dentre eles os extratos bancários consolidados e definitivos, impede o efetivo controle da Justiça Eleitoral sobre as contas dos partidos políticos, ensejando a sua desaprovação.

2. A ausência de movimentação financeira por parte do partido ou ausência de recebimento de quotas do fundo partidário não afasta a agremiação partidária da obrigatoriedade de apresentar os documentos indispensáveis elencados no artigo 13 da Lei n. 9.096/95, os quais são essenciais para a comprovação do não recebimento de recursos.

(PRESTACAO DE CONTAS n. 29193, Acórdão n. 46985 de 25.03.2014, Relatora RENATA ESTORILHO BAGANHA, Publicação: DJ - Diário de Justiça, Data 28.3.2014.) (Grifei.)

Neste sentido, vale dizer que a ausência de apresentação dos extratos bancários - de forma consolidada e definitiva - fere os arts. 12 e 14, inc. I, al. “n”, da Resolução TSE n. 21.841/04 - aplicável às contas relativas ao exercício sob exame - os quais estabelecem que a prestação de contas ofertada deve refletir a real movimentação financeira e patrimonial do partido político, mostrando-se obrigatório o acompanhamento das peças e dos documentos necessários à apreciação da contabilidade pela Justiça Eleitoral. Ressalta-se que os recorrentes não se manifestaram em relação ao apontamento.

Além disso, as contas foram desaprovadas em razão do recebimento de recursos oriundos de fonte vedada, que totalizaram a quantia de R$ 32.194,22 (trinta e dois mil e cento e noventa e quatro reais e vinte e dois centavos), referente a contribuições de autoridades públicas.

Em defesa, os recorrentes argumentam que as receitas provenientes de detentores de mandato eletivo não devem ser consideradas como recursos oriundos de fonte vedada.

Tal irresignação comporta provimento.

Recentemente, este Tribunal entendeu por conferir interpretação que afasta a vedação de contribuição de agentes políticos, conforme ementa que segue:

RECURSO. PRESTAÇÃO DE CONTAS. PARTIDO POLÍTICO. EXERCÍCIO FINANCEIRO DE 2016. RECEBIMENTO DE DOAÇÃO REALIZADA POR DETENTOR DE MANDATO ELETIVO. VEREADOR. INTERPRETAÇÃO RESTRITIVA DA NORMA. NÃO CARACTERIZADA FONTE VEDADA. LICITUDE DA DOAÇÃO. REFORMA DA SENTENÇA. APROVAÇÃO DAS CONTAS. PROVIMENTO.

Configuram recursos de fontes vedadas as doações a partidos políticos advindas de autoridades públicas, vale dizer, aqueles que exercem cargos de chefia ou direção na administração pública, direta ou indireta. Definição expressa no texto do art. 12 da Resolução TSE n. 23.464/15.

No caso, a agremiação partidária recebeu recursos de detentor de mandato eletivo de vereador. O texto normativo não contempla os agentes políticos. Impossibilidade de se dar interpretação ampliativa à norma que traz uma restrição de direitos. O detentor de mandato eletivo não é titular de cargo nomeado em razão de vinculações partidárias, ao contrário, exerce "munus" público, eleito pelo povo. As doações realizadas por essa espécie de agente não possuem a potencialidade de afetar o equilíbrio entre as siglas partidárias. Caracterizada, assim, a licitude da doação efetuada pelo vereador. Fonte vedada não caracterizada. Reforma da sentença para aprovar as contas. Provimento.

(RE N. 13-93, Rel. Desembargador Federal João Batista Pinto Silveira. Julgado em 6.12.2017. Unânime.)

Colho do voto do relator Des. Federal João Batista Pinto Silveira trecho da percuciente análise tecida sobre o tema, o qual tomo expressamente como razões de decidir:

[...]

Primeiro, porque a norma é restritiva de direito, não podendo ser dada interpretação ampliativa.

Segundo, porque não se amoldam ao detentor de mandato eletivo os argumentos que sustentaram a compreensão de que os demissíveis ad nutum devam ser considerados autoridades.

O detentor de mandato eletivo não é titular de cargo nomeado em razão de vinculações partidárias, ao contrário, exerce munus público, eleito pelo povo, consagrando o princípio democrático e republicano.

Nessa medida, as doações realizadas por exercente de mandato eletivo não possuem a potencialidade de afetar o equilíbrio entre as siglas partidárias.

Dessarte, a vedação imposta pela Resolução TSE n. 23.464/2015, ao proibir doações por servidores que exercem a função pública em caráter precário tem o objetivo de obstar a partidarização da administração pública, principalmente diante dos princípios da moralidade, da dignidade do servidor e da necessidade de preservação contra abuso de autoridade e do poder econômico.

Não é o caso dos exercentes de mandato eletivo, que apenas estão sujeitos à perda do mandato em hipóteses restritas e taxativas, desde que observados o contraditório e ampla defesa.

Nessa esteira de entendimento, devem ser reconhecidos como lícitos os recursos provenientes do prefeito Lourenço Ardenghi Filho (R$ 24.681,48), do vice-prefeito Nereu Piovesan (R$ 1.204,00), do vereador Jorge de Moraes Brizola (R$ 917,00) e da vereadora Jurema dos Santos (R$ 1.087,00), relacionados no exame de prestação de contas nas fls. 180-181.

No entanto, a mesma sorte não favorece as teses em relação às demais autoridades, pois o art. 31, inc. II, da Lei n. 9.096/95, antes das alterações promovidas pela Lei n. 13.488/17, vedava o recebimento de doações procedentes de autoridades públicas:

Art. 31. É vedado ao partido receber, direta ou indiretamente, sob qualquer forma ou pretexto, contribuição ou auxílio pecuniário ou estimável em dinheiro, inclusive através de publicidade de qualquer espécie, procedente de:

[...]

II - autoridade ou órgãos públicos, ressalvadas as dotações referidas no art. 38;

Note-se que os cargos de secretário, chefe e coordenador se encaixam na vedação, visto estarem diretamente ligados ao exercício de direção ou chefia. Trago novamente precedente deste Tribunal:

Recurso. Prestação de contas. Partido político. Doação de fonte vedada. Art. 31, inc. II, da Lei n. 9.096/95. Exercício financeiro de 2013.

Desaprovam-se as contas quando constatado o recebimento de doações de servidores públicos ocupantes de cargos demissíveis ad nutum da administração direta ou indireta, que detenham condição de autoridades, vale dizer, desempenhem função de direção ou chefia. Excluída da condição de doação irregular a realizada pelo detentor do cargo de assessor de gabinete.

Período de suspensão do recebimento de cotas do Fundo Partidário mitigado conforme os parâmetros da razoabilidade. Redução do valor a ser recolhido ao mesmo fundo, diante da revisão das doações consideradas como de fonte vedada.

Provimento parcial.

(RE N. 27-72. Relatora Desa. Federal Maria de Fátima Labarrère. Julgado em 5.3.2015. Unânime.)

Acrescento que este Regional, no julgamento do RE n. 14-97.2016.6.21.0076, debateu acerca da incidência imediata da alteração introduzida no art. 31 da Lei n. 9.096/95 pela Lei n. 13.488/17, que admite as doações advindas de ocupantes de cargos demissíveis ad nutum, desde que filiados a partido político, e fixou entendimento pela aplicação da legislação vigente à época da prestação de contas.

Por elucidativo, transcrevo a ementa do referido julgado:

RECURSO. PRESTAÇÃO DE CONTAS ANUAL. PARTIDO POLÍTICO. EXERCÍCIO DE 2015. PRELIMINAR. MANUTENÇÃO DOS DIRIGENTES PARTIDÁRIOS NO POLO PASSIVO. ILEGITIMIDADE NÃO CONFIGURADA. MÉRITO. RECEBIMENTO DE DOAÇÕES DE FONTES VEDADAS. ALTERAÇÃO LEGISLATIVA. PERMITIDA A CONTRIBUIÇÃO DE FILIADOS. INAPLICABILIDADE AO CASO CONCRETO. APLICAÇÃO DA LEGISLAÇÃO VIGENTE À ÉPOCA DOS FATOS. PRINCÍPIO DA SEGURANÇA JURÍDICA. MANUTENÇÃO DO JUÍZO DE IRREGULARIDADE DA DOAÇÃO. REDUÇÃO DO PRAZO DE SUSPENSÃO DO RECEBIMENTO DAS QUOTAS DO FUNDO PARTIDÁRIO. PARCIAL PROVIMENTO.

1. Preliminar rejeitada. O art. 38 da Resolução TSE n. 23.432/14 prevê que deverá ser determinada a citação do órgão partidário e dos responsáveis para que ofereçam defesa sempre que houver impugnação ou constatação de irregularidade no parecer conclusivo. A integração dos dirigentes na lide é consectário da responsabilização prevista na Lei dos Partidos Políticos. Manutenção dos dirigentes partidários para integrarem o polo passivo. Ilegitimidade passiva afastada.

2. Constituem recursos oriundos de fontes vedadas as doações a partidos políticos realizadas por titulares de cargos demissíveis ad nutum da administração direta ou indireta que detenham condição de autoridades, vale dizer, que desempenhem função de direção ou chefia.

3. A Lei n. 13.488/17, publicada em 06.10.17, alterou a redação do art. 31 da Lei n. 9.096/95 - Lei dos Partidos Políticos -, excluindo a vedação de doação de pessoa física que exerça função ou cargo público demissível ad nutum, desde que filiada ao partido beneficiário.

4. Inaplicabilidade ao caso concreto. Incidência da legislação vigente à época dos fatos. Prevalência do princípio da segurança jurídica e da paridade de armas no processo eleitoral, em detrimento da aplicação pontual da retroatividade in bonam partem. Manutenção do juízo de irregularidade das contribuições advindas de cargos demissíveis ad nutum, ainda que os contribuintes sejam filiados à agremiação.

5. Incontroverso o recebimento de recursos de fontes vedadas, em valor correspondente a 65,79% das receitas do partido, impõe-se a desaprovação das contas. Redução, entretanto, do prazo de suspensão do recebimento de quotas do Fundo Partidário para quatro meses. 

6. Provimento parcial. 

(Grifei.)

Desta forma, considero como oriundos de fonte vedada os recursos recebidos de autoridades, na soma de R$ 4.304,74 (quatro mil e trezentos e quatro reais e setenta e quatro centavos), devendo ser determinado seu recolhimento em favor do Tesouro Nacional.

A quantia arrecadada de origem irregular deverá ser recolhida ao Erário, nos termos do entendimento manifestado pelo TSE - na resposta à consulta CTA n. 116-75, julgada em 16.02.2016 - e adotado por este Regional em 4.5.2016, a partir do julgamento da prestação de contas PC n.  7242, de relatoria da Dra. Maria de Lourdes Galvão Braccini de Gonzalez.

Por fim, ressalto que a jurisprudência deste Tribunal está consolidada no sentido de que não cabe aprovação com ressalvas na hipótese de recebimento de recursos de fonte vedada, por consistir em irregularidade grave e insanável que macula as contas como um todo.

Daí, as falhas identificadas comprometem o controle e a confiabilidade das receitas e despesas, não autorizando a aprovação das contas em virtude da aplicação do princípio da transparência.

No que concerne ao prazo de suspensão de repasse das quotas de Fundo Partidário, determinado no patamar de 06 (seis) meses, tenho que é de ser mantido.

Não se olvida que este Regional, mediante juízo de proporcionalidade e razoabilidade, amiúde reduz aquelas suspensões fixadas no patamar máximo previsto pela Resolução TSE n. 21.841/04, de 12 (doze) meses. Os parâmetros observados, para tal redução, são a gravidade, o valor e o percentual alcançado pelas irregularidades, bem como o comportamento do partido político durante a prestação de contas.

No caso em análise, observa-se que as contas se referem ao exercício 2011 e apenas foram apresentadas em 03.5.2016. Outrossim, além do recebimento de recursos oriundos de fonte vedada, a contabilidade foi desaprovada em virtude da não apresentação dos extratos bancários na forma consolidada e definitiva.

Logo, considerando a gravidade das falhas, deve ser mantida a decisão de desaprovação das contas, com a suspensão do recebimento das quotas do Fundo Partidário pelo período de 06 (seis) meses e a devolução da quantia de R$ 4.304,74 (quatro mil e trezentos e quatro reais e setenta e quatro centavos) ao Tesouro Nacional.

Diante do exposto, VOTO pelo provimento parcial do recurso, apenas para reduzir para R$ 4.304,74 (quatro mil e trezentos e quatro reais e setenta e quatro centavos) a quantia a ser recolhida ao Tesouro Nacional, mantendo a sentença que desaprovou as contas e determinou a suspensão do recebimento das quotas do Fundo Partidário pelo período de 06 (seis) meses.