RE - 1871 - Sessão: 18/12/2017 às 16:00

RELATÓRIO

Trata-se de recurso interposto pelo PARTIDO SOCIALISTA BRASILEIRO – PSB de Esteio, fls. 174-178, contra sentença que desaprovou suas contas, referentes ao exercício de 2015, em virtude do recebimento de doações de detentores de cargo eletivo – vereadores, especificamente, e de ocupante de cargo demissível ad nutum. A magistrada determinou, ainda, o recolhimento de R$ 9.500,00 ao Tesouro Nacional, bem como a suspensão do recebimento de novas quotas do Fundo Partidário pelo período de 1 (um) ano, fls. 169-170.

O processo foi objeto de acórdão deste Tribunal, em julgamento que decidiu pela nulidade da sentença, decorrente da não citação dos dirigentes partidários responsáveis, fls. 132-133.

O partido sustenta que a questão em discussão ainda não é pacificada, em virtude do trâmite de ação direta de inconstitucionalidade. Cita a Consulta n. 109-98.2015.6.21.0000, oriunda deste Tribunal, e entende inviável a aplicação de punição retroativa. Sustenta que há questões não pacificadas entre os Tribunais Regionais no que concerne às contribuições de ocupantes de cargo eletivo e, relativamente às contribuições dos cargos demissíveis ad nutum, aduz tratar-se de parcelas em atraso. Traz considerações de contexto político e requer a reforma da decisão, dando as contas por aprovadas, ou a suspensão do processo até que o STF decida a ADIN n. 5.494, sob pena de dano irreparável.

Sem contrarrazões.

Nesta instância, os autos foram com vista à Procuradoria Regional Eleitoral, que ratificou, fl. 185, o parecer anteriormente apresentado, fls. 121-127, no sentido do desprovimento do recurso, pelo repasse de R$ 9.500,00 ao Tesouro Nacional e pela suspensão de verbas do Fundo Partidário pelo período de 1 (um) ano.

É o relatório.

VOTO

O recurso é tempestivo. A decisão foi publicada no DEJERS de 3.10.2017, fl. 172, e o recurso interposto no dia 6.10.2017, fl. 174.

O Diretório Municipal do Partido Socialista Brasileiro – PSB de Esteio recorre da sentença constante às fls. 169-171.

Sustenta, preliminarmente, a suspensão do julgamento do presente processo até a decisão do Supremo Tribunal Federal na Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 5.494, com pedido de medida cautelar, ajuizada pelo Partido da República (PR), em face da expressão “autoridade” contida na parte inicial do inc. II do art. 31 da Lei Federal 9.096/95. A inicial daquela ADI postula, em síntese, a procedência da ação para que se declare a inconstitucionalidade da expressão aludida, por alegada ofensa a dispositivos constitucionais.

Sem razão.

Em primeiro lugar, os dispositivos constantes em leis ordinárias possuem presunção de constitucionalidade, até manifestação do Poder Judiciário em sentido contrário, seja em sede de controle difuso, seja em controle concentrado.

Ademais, no caso em específico, o Ministro Relator, Luiz Fux, aplicou o art. 12 da Lei n. 9.868/99 para submeter ao Plenário do STF a manifestação sobre a ação como um todo, abstendo-se de manifestar-se acerca de medida liminar pleiteada.

Art. 12. Havendo pedido de medida cautelar, o relator, em face da relevância da matéria e de seu especial significado para a ordem social e a segurança jurídica, poderá, após a prestação das informações, no prazo de dez dias, e a manifestação do Advogado-Geral da União e do Procurador-Geral da República, sucessivamente, no prazo de cinco dias, submeter o processo diretamente ao Tribunal, que terá a faculdade de julgar definitivamente a ação.

E, finalmente, lembro que, em sede de controle concentrado, há a prerrogativa do STF de modular os efeitos da decisão, circunstância que afasta, por completo, a alegação de “dano irreparável” – a Suprema Corte pode, inclusive, determinar eventuais compensações financeiras que entenda pertinentes, às agremiações partidárias.

Afasto, portanto a preliminar.

Ao mérito.

O PSB de Esteio recebeu juízo de desaprovação das contas, em resumo pelo recebimento de valores de fontes entendidas como vedadas – cargos de vereador e assessora – e outras irregularidades de cunho formal.

O recurso merece provimento parcial, no que tange às doações realizadas por ocupantes dos cargos de vereador, em valor total de R$ 3.500,00.

Isso porque, recentemente, este Tribunal entendeu por conferir interpretação que afasta a vedação de contribuição de ocupantes do cargo de vereador, conforme ementa que segue:

RECURSO. PRESTAÇÃO DE CONTAS. PARTIDO POLÍTICO. EXERCÍCIO FINANCEIRO DE 2016. RECEBIMENTO DE DOAÇÃO REALIZADA POR DETENTOR DE MANDATO ELETIVO. VEREADOR. INTERPRETAÇÃO RESTRITIVA DA NORMA. NÃO CARACTERIZADA FONTE VEDADA. LICITUDE DA DOAÇÃO. REFORMA DA SENTENÇA. APROVAÇÃO DAS CONTAS. PROVIMENTO.

Configuram recursos de fontes vedadas as doações a partidos políticos advindas de autoridades públicas, vale dizer, aqueles que exercem cargos de chefia ou direção na administração pública, direta ou indireta. Definição expressa no texto do art. 12 da Resolução TSE n. 23.464/15.

No caso, a agremiação partidária recebeu recursos de detentor de mandato eletivo de vereador. O texto normativo não contempla os agentes políticos. Impossibilidade de se dar interpretação ampliativa à norma que traz uma restrição de direitos. O detentor de mandato eletivo não é titular de cargo nomeado em razão de vinculações partidárias, ao contrário, exerce "munus" público, eleito pelo povo. As doações realizadas por essa espécie de agente não possuem a potencialidade de afetar o equilíbrio entre as siglas partidárias. Caracterizada, assim, a licitude da doação efetuada pelo vereador. Fonte vedada não caracterizada. Reforma da sentença para aprovar as contas. Provimento.

(RE 13-93, Rel. Desembargador Federal João Batista Pinto Silveira. Julgado em 6.12.2017. Unânime.)

Colho do voto do relator, Des. Federal João Batista Pinto Silveira, trecho da percuciente análise tecida sobre o tema, a qual tomo expressamente como razões de decidir:

[...]

Primeiro, porque a norma é restritiva de direito, não podendo ser dada interpretação ampliativa.

Segundo, porque não se amoldam ao detentor de mandato eletivo os argumentos que sustentaram a compreensão de que os demissíveis ad nutum devam ser considerados autoridades.

O detentor de mandato eletivo não é titular de cargo nomeado em razão de vinculações partidárias, ao contrário, exerce munus público, eleito pelo povo, consagrando o princípio democrático e republicano.

Nessa medida, as doações realizadas por exercente de mandato eletivo não possuem a potencialidade de afetar o equilíbrio entre as siglas partidárias.

Dessarte, a vedação imposta pela Resolução TSE n. 23.464/2015, ao proibir doações por servidores que exercem a função pública em caráter precário tem o objetivo de obstar a partidarização da administração pública, principalmente diante dos princípios da moralidade, da dignidade do servidor e da necessidade de preservação contra abuso de autoridade e do poder econômico.

Não é o caso dos exercentes de mandato eletivo, que apenas estão sujeitos à perda do mandato em hipóteses restritas e taxativas, desde que observados o contraditório e ampla defesa.

Afasto, portanto, a irregularidade.

No que concerne, contudo, ao valor de R$ 1.500,00, doado por Jussara Regina Antunes Krug, não assiste razão ao partido recorrente.

Isso porque, conforme destacado pela sentença recorrida, em 18.11.2015, data da doação sob exame, referida doadora ocupava o cargo de “Diretor Legislativo”.

E o argumento recursal de que se tratava de contribuição em atraso, do período em que Jussara era assessora (foi exonerada do cargo de assessor em 1º.9.2017, fl. 106), não procede, pela carência de prova.

Trata-se de mera alegação.

Ademais, em se tratando de doação ou contribuição voluntária – até mesmo porque a arrecadação compulsória é vedada, não há como falar em “atraso”: a doação é de ser considerada sob as circunstâncias da data em que realizada.

O cargo ocupado por Jussara na ocorrência da doação, portanto, era o de Diretor Legislativo, situação que merece a reprimenda legal.

E o art. 31, inc. II, da Lei n. 9.096/95 veda o recebimento de doações procedentes de autoridades públicas:

Art. 31. É vedado ao partido receber, direta ou indiretamente, sob qualquer forma ou pretexto, contribuição ou auxílio pecuniário ou estimável em dinheiro, inclusive através de publicidade de qualquer espécie, procedente de:

[...]

II - autoridade ou órgãos públicos, ressalvadas as dotações referidas no art. 38;

Note-se que o cargo de direção se encaixa à vedação:

Recurso. Prestação de contas. Partido político. Doação de fonte vedada. Art. 31, II, da Lei n. 9.096/95. Exercício financeiro de 2013.

Desaprovam-se as contas quando constatado o recebimento de doações de servidores públicos ocupantes de cargos demissíveis ad nutum da administração direta ou indireta, que detenham condição de autoridades, vale dizer, desempenhem função de direção ou chefia. Excluída da condição de doação irregular a realizada pelo detentor do cargo de assessor de gabinete.

Período de suspensão do recebimento de cotas do Fundo Partidário mitigado conforme os parâmetros da razoabilidade. Redução do valor a ser recolhido ao mesmo fundo, diante da revisão das doações consideradas como de fonte vedada.

Provimento parcial.

(RE 27-72. Relatora Desa. Federal Maria de Fátima Labarrère. Julgado em 5.3.2015. Unânime.)

Ainda, reconhecida como fonte vedada a doação, impõe-se a manutenção da sentença que desaprovou a contabilidade e determinou o recolhimento da quantia glosada, inclusive no que se refere à sua destinação para o Tesouro Nacional.

No tocante à suspensão do repasse de novas quotas do Fundo Partidário, plausível a aplicação dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, pois não há indícios de má-fé ou do propósito de prejudicar a fiscalização exercida por esta Justiça especializada, afigurando-se adequada a redução da pena de suspensão de 1 (um) ano, para 2 (dois) meses, considerados, inclusive, os valores envolvidos.

Ante o exposto, VOTO pelo provimento parcial do recurso para, mantendo a desaprovação das contas do PSB de Esteio relativas ao exercício de 2015:

a) afastar a irregularidade no tocante às doações de vereadores;

b) manter a sentença no que diz respeito à doação de ocupante do cargo de Diretor Legislativo e determinar o recolhimento de R$ 1.500,00 ao Tesouro Nacional;

c) de ofício, determinar a redução do período de suspensão do recebimento de novas quotas do Fundo Partidário para dois meses.