RE - 38632 - Sessão: 12/12/2017 às 17:00

RELATÓRIO

Trata-se de recurso interposto por JOSÉ MÁRIO DA SILVA SANTOS, concorrente ao cargo de vereador, contra sentença do Juízo da 113ª Zona Eleitoral que desaprovou as contas referentes às eleições municipais de 2016, tendo em vista a existência de doações declaradas por outros prestadores, mas que não foram registradas na presente prestação (fl. 40 e v.).

Em suas razões recursais (fls. 44-49), suscita a nulidade da sentença, pois não pôde se manifestar sobre o parecer conclusivo. No mérito, sustenta que juntou prova da prestação de contas retificadora do candidato Maurício Dziedricki, argumentando ser indevida a desaprovação por falhas formais. Requer a aprovação das contas.

Foram os autos com vista à Procuradoria Regional Eleitoral, que opinou, preliminarmente, pela nulidade da sentença, e, no mérito, pelo desprovimento do recurso (fls. 56-62).

É o breve relatório.

 

VOTO

Preliminar

Tempestividade

O recurso é tempestivo, pois respeitado o prazo de três dias previsto no art. 30, § 5º, da Lei n. 9.504/97. A sentença foi publicada no dia 22.9.2017 (fl. 41), sexta-feira, ao que se seguiu a interposição do recurso no dia 27 do mesmo mês (fl. 44), quarta-feira.

Nulidade da sentença por omissão de recolhimento

Preliminarmente, a sentença desaprovou as contas em razão da existência de registro de doação realizada pelo candidato Maurício Dziedricki em benefício do candidato José da Silva Santos, mas que não foi registrada na presente prestação de contas.

A Procuradoria Regional Eleitoral lançou manifestação no sentido da nulidade da decisão de primeiro grau, ao fundamento de que negou vigência à determinação expressa do art. 26 da Resolução TSE n. 23.463/15, o qual determina o recolhimento ao Tesouro de valores provenientes de origem não identificada.

Ressalta o órgão ministerial que a inobservância do ordenamento jurídico, matéria de ordem pública, não está acobertada pela preclusão, razão pela qual os autos devem retornar à origem para que nova decisão seja proferida.

Apesar dos bem expostos argumentos, entendo que a preliminar deve ser rejeitada.

A sentença não fundamentou a desaprovação na ausência de identificação do doador, mas em razão da divergência entre as presentes contas e a de Maurício Dziedricki.

No caso atual, nem se poderia falar de recurso de origem não identificada, pois o recorrente sustenta que não recebeu os recursos que foram informados nas contas de Maurício Dziedricki. A falha, portanto, era de divergência de informações, e não de omissão do doador, pois, caso houvesse mesmo a doação, seu doador estaria perfeitamente identificado.

Assim, como a sentença não se baseia em ausência de identificação do doador, não há que se falar em omissão de recolhimento de valores nem em nulidade da decisão, pois o juiz não se omitiu na aplicação de uma norma de ordem pública, mas interpretou os fatos, concluindo pela caracterização de irregularidade distinta da pretendida pelo Ministério Público.

Essa situação apenas poderia ser alterada mediante recurso do fiscal da lei, e não em sede de recurso exclusivo do prestador, sob pena de operar-se a vedada reformatio in pejus, conforme pacífica jurisprudência:

ELEIÇÕES 2012. AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL. VEREADOR. PRESTAÇÃO DE CONTAS. CAMPANHA ELEITORAL. IMÓVEL. SUBLOCAÇÃO. FATOS E PROVAS. REEXAME. DESCABIMENTO. DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL. NÃO DEMONSTRAÇÃO. DESPROVIMENTO.

1. Desnecessária a intimação de candidato para se manifestar sobre parecer técnico que se refere às mesmas falhas já apontadas e conhecidas do candidato.

2. Constitui reformatio in pejus o agravamento da pena imposta quando não houve recurso da parte contrária sobre a matéria.

3. Alterar a conclusão do Tribunal Regional, que assentou a constatação de despesas com sublocação de imóvel sem os correspondentes recibos eleitorais, demandaria o vedado reexame de fatos e provas nesta via excepcional.

4. A tese suscitada não teve o devido dissídio evidenciado, porquanto não realizado o cotejo analítico para verificação da similitude fática entre a decisão atacada e os paradigmas colacionados, conforme exigência da Súmula nº

28/TSE.

5. Agravo regimental desprovido.

(Recurso Especial Eleitoral n. 32860, Acórdão, Relatora Min. Luciana Christina Guimarães Lóssio, Publicação: DJE - Diário de justiça eletrônico, Tomo 196, Data 11.10.2016, Página 70 – grifei.)

Do exposto, máxime frente a ausência do manejo recursal pelo Ministério Público, reconhecida a preclusão da matéria e a impossibilidade de agravamento da posição jurídica do recorrente, afasto a preliminar de nulidade da sentença.

Nulidade por ausência de notificação sobre o parecer conclusivo

O recorrente suscita nulidade do processo porque não foi notificado para se manifestar acerca do parecer conclusivo, em ofensa ao art. 66 da Resolução TSE n. 23.463/15.

Não prospera a pretendida nulidade.

O referido dispositivo regulamentar apenas impõe a notificação do prestador após o parecer conclusivo se este basear-se em irregularidades “sobre as quais naõ se tenha dado oportunidade específica de manifestação”.

No caso, o motivo da desaprovação, a divergência dessas contas com registros de outros prestadores, foi apontado no parecer técnico, havendo manifestação específica do prestador sobre o ponto quando se manifestou sobre a primeira análise técnica das contas.

Dessa forma, desnecessária a notificação do prestador após o parecer conclusivo, pois foi baseado em irregularidade sobre a qual o candidato já havia se manifestado anteriormente.

Admissibilidade de documentos com o recurso

Ainda preliminarmente, cumpre registrar a viabilidade dos novos documentos apresentados com o recurso.

O egrégio Tribunal Superior Eleitoral possui entendimento no sentido de que “julgadas as contas, com oportunidade prévia para saneamento das irregularidades, não se admite, em regra, a juntada de novos documentos” (TSE, AgReg no RESPE n. 239956, Relator Min. Rosa Weber. DJE: 31.10.2016).

Todavia, a apresentação de novos documentos com o recurso não apresenta prejuízo à tramitação do processo, especialmente quando se trata de documentos simples, capazes de esclarecer de plano as irregularidades apontadas, sem a necessidade de nova análise técnica ou diligências complementares.

Ademais, o interesse público na transparência das contas de campanha, aliada à ausência de prejuízo à célere tramitação das contas, caracteriza a vedação de novos documentos em segundo grau como formalismo excessivo, que deve ser evitado por não servir aos propósitos do rito legal.

Dessa forma, entendo adequada a juntada dos novos documentos com o recurso.

Mérito

No mérito, a sentença desaprovou as contas em razão de divergências existentes entre as contas do ora recorrente e as do candidato Maurício Dziedricki. Enquanto não havia registro de doações provenientes de outros candidatos na demonstração contábil do recorrente, o candidato Maurício apontou ter destinado R$ 250,46 em doações ao presente prestador.

Falhas dessa natureza, decorrentes da inconsistência de informações extraídas de cruzamento de dados, prejudicam a confiabilidade das contas, pois os gastos declarados pelos prestadores não são confirmados por dados externos à prestação de contas, obtidos pela Justiça Eleitoral com o intuito de aferir a segurança das declarações prestadas.

Nesse sentido é a jurisprudência:

Prestação de contas. Candidato. Arrecadação e dispêndio de recursos de campanha. Resolução TSE n. 23.406/14. Eleições 2014. Persistência de irregularidades insanáveis, mesmo após a juntada de documentos e prestação de contas retificadora por parte do candidato. A retificação das contas realizada apenas pelo candidato, com a manutenção da prestação de contas do Comitê Financeiro Único do partido, importou na divergência de informações entre os dados declarados, uma vez que os recibos eleitorais anteriormente informados foram modificados no que tange aos valores e à origem dos recursos. A alteração unilateral, feita pelo candidato, sem a anuência dos doadores originários, carece de confiabilidade. Necessidade de convergência entre as informações sobre os recursos que foram movimentados entre o candidato e o Comitê. Desaprovação.

(TRE/RS, Prestação de Contas n 240615, ACÓRDÃO de 03.12.2015, Relator DR. LEONARDO TRICOT SALDANHA, Publicação: DEJERS - Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Tomo 91, Data 11.12.2015, Página 6.)

Todavia, no presente caso, está demonstrado que houve um equívoco no registro das contas do doador.

O recorrente acostou ao seu recurso comprovante de retificação das contas do candidato Maurício Dziedricki. Consultando a declaração de Maurício no sistema de divulgação de contas da Justiça Eleitoral, não se verifica mais registro de doação ao candidato ora recorrente, nem mesmo a anotação de despesas estimáveis em dinheiro.

Comprovado que o terceiro candidato retificou suas contas, para excluir o registro que constituía a única mácula nas contas do presente prestador, deve ser aprovada a movimentação financeira do recorrente.

Ante o exposto, VOTO por afastar as preliminares suscitadas e pelo provimento do recurso para aprovar as contas.