RE - 1497 - Sessão: 04/12/2017 às 17:00

VOTO DIVERGENTE – Dr. Bainy

Senhor Presidente, peço vênia para divergir do e. relator, não no que toca à preliminar, à qual igualmente entendo por afastá-la.

Contudo, tenho como irregulares as contribuições advindas de cargos demissíveis ad nutum, ainda que os contribuintes sejam filiados à agremiação.

Penso, que, aqui, há de preponderar a máxima tempus regit actum, quando emparelhada à possibilidade de aplicação de legislação mais benéfica ao jurisdicionado.

E tal posicionamento se dá devido a dois motivos principais, em resumo:

1 – O primeiro, digamos, tem natureza mais pragmática: o posicionamento do e. Tribunal Superior Eleitoral em casos análogos;

2 – Em segundo lugar, a substância em si da questão – a necessária diferenciação da aplicação da lei no tempo no Direito Eleitoral, o qual, diferentemente de outros ramos do direito – por exemplo, o penal ou o tributário, regula além das contendas judiciárias, é “árbitro” da competição eleitoral, circunstância que, ao meu sentir, faz valorizar a necessidade de garantia da paridade de armas dos competidores eleitorais.

Isso porque, ainda que na seara criminal e na tributária haja de um lado a sociedade, o Estado e, de outro, o acusado ou o contribuinte, a relação é, meramente, dual. Quanto se trata de Direito Eleitoral, há que se preservar a legitimidade da concorrência, da competição eleitoral.

Senão, vejamos.

Sabe-se que a Lei n. 13.488/17, publicada em 06.10.2017, alterou a redação do art. 31 da Lei n. 9.096/95 e retirou do elenco vedado o termo “autoridade”.

Ademais, houve um acréscimo, inc. V, com a seguinte redação:

Art. 31. É vedado ao partido receber, direta ou indiretamente, sob qualquer forma ou pretexto, contribuição ou auxílio pecuniário ou estimável em dinheiro, inclusive através de publicidade de qualquer espécie, procedente de:

[…].

V - pessoas físicas que exerçam função ou cargo público de livre nomeação e exoneração, ou cargo ou emprego público temporário, ressalvados os filiados a partido político. (Incluído pela Lei nº 13.488, de 2017) Grifei.

Ou seja, a partir da publicação da norma, não há mais a vedação, antes ocorrente, às doações advindas de cargos demissíveis ad nutum, desde que os ocupantes de tais cargos encontrem-se filiados a partido político.

Daí, manifesto divergência para entender que a aplicação da norma só pode operar ex nunc.

Essa a regra, aliás, do art. 6º da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro:

Art. 6º A Lei em vigor terá efeito imediato e geral, respeitados o ato jurídico perfeito, o direito adquirido e a coisa julgada.

Mas não é só.

Para além do comando acima, o qual veicula o princípio da segurança jurídica, busco suporte no art. 926, caput, do Código de Processo Civil:

Art. 926. Os tribunais devem uniformizar sua jurisprudência e mantê-la estável, íntegra e coerente.

E, aqui, trago inicialmente o elemento pragmático: os precedentes do e. Tribunal Superior Eleitoral que, em casos análogos, tem se manifestado pela aplicação da legislação vigente à época dos fatos:

ELEIÇÕES 2014. AGRAVO REGIMENTAL EM AGRAVO. DOAÇÃO ACIMA DO LIMITE LEGAL REALIZADA POR PESSOA JURÍDICA.REPETIÇÃO LITERAL DAS RAZÕES ELENCADAS EM AGRAVO. REVOGAÇÃO DO ART. 81 DA LEI DAS ELEIÇÕES PELA LEI 13.165/2015. INVIABILIDADE DE APLICAÇÃO RETROATIVA. DECLARAÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE PELO STF, VIA CONTROLE CONCENTRADO, DO CAPUT E § 1º DO ART. 81 DA LEI 9.504/97. NORMA VIGENTE NO MOMENTO DA DOAÇÃO.ACÓRDÃO REGIONAL EM CONFORMIDADE COM A JURISPRUDÊNCIA DESTA CORTE SUPERIOR. APLICAÇÃO DA SÚMULA 30 DO TSE. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO.

1. Das razões do Agravo Regimental, extrai-se que a agravante se limitou a reiterar, literalmente, os argumentos já expendidos no Agravo, deixando, contudo, de tangenciar os fundamentos lançados na decisão impugnada de que não há falar em inépcia da petição inicial, uma vez que os dados específicos da doação só poderiam ser obtidos após o ajuizamento da Representação, a teor da Súmula 46 do TSE; de que a revogação e a declaração de inconstitucionalidade do art. 81, caput e § 1º, da Lei 9.504/97 não atingem as situações consolidadas sob a égide daquela legislação; e de que o acórdão regional encontra-se em harmonia com a jurisprudência desta Corte Superior, com a incidência das Súmulas 30 do TSE e 83 do STJ.

2. Não há falar em afastamento da multa por doação acima do limite legal por pessoa jurídica por ter sido revogado o art. 81 da Lei das Eleições pela Lei 13.165/2015. Conforme a jurisprudência desta Casa, a revogação da norma que impõe multa não isenta os responsáveis no que se refere às sanções vigentes no momento em que a irregularidade foi praticada (AgR-AI 117-60/CE, Rel.Min. HENRIQUE NEVES DA SILVA, DJe 2.8.2016).

3. A declaração de inconstitucionalidade do art. 81 da Lei 9.504/97 operou seus efeitos a partir da sessão de julgamento da ADI 4.650/DF, alcançando as doações de campanha que se realizaram no prélio eleitoral de 2016 e nos subsequentes, não sendo essa a hipótese dos autos, que versa sobre doação realizada no pleito de 2014 (AgR-AI 82-59/MG, Rel. Min. LUIZ FUX, DJe 9.2.2017). Incidência das Súmulas 30 do TSE e 83 do STJ.4. Agravo Regimental desprovido.

(Agravo de Instrumento n. 1943, Acórdão, Relator Min. Napoleão Nunes Maia Filho, Publicação: DJE - Diário de justiça eletrônico, Data 04.09.2017, Página 45-46.)

ELEIÇÕES 2014. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO. DOAÇÃO DE RECURSOS ACIMA DO LIMITE LEGAL. PESSOA JURÍDICA. ADI Nº 4650. DECLARAÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE QUE NÃO SE APLICA A DOAÇÕES CONSOLIDADAS NAS ELEIÇÕES ANTERIORES À DATA DO JULGAMENTO. IRRETROATIVIDADE DA LEI Nº 13.165/2015. PRINCÍPIO DO TEMPUS REGIT ACTUM. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO. 1. A declaração de inconstitucionalidade do art. 81 da Lei nº 9.504/1997 operou os seus efeitos a partir da sessão de julgamento da ADI nº 4650, a saber, 17 de setembro de 2015, alcançando as doações de campanhas a se realizarem no prélio eleitoral de 2016 e os subsequentes, não sendo essa a hipótese dos autos, que versa sobre doação realizada no pleito de 2014. 2. A revogação do art. 81 da Lei das Eleições não alcança as doações realizadas em eleições anteriores, notadamente por se tratar de atos jurídicos perfeitos consolidados sob a égide de outro regramento legal eleitoral, situação que se equaciona pela incidência do princípio do tempus regit actum, nos termos do art. 6º da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro. 3. Agravo regimental desprovido

(Agravo Regimental no Agravo de Instrumento n. 130-29/MG Relator: Ministro Luiz Fux.)

RECURSO ESPECIAL. PRESTAÇÃO DE CONTAS. PARTIDO POLÍTICO. EXERCÍCIO FINANCEIRO E DE CAMPANHA DE 2014. DESAPROVAÇÃO. FALHAS GRAVES DE PERCENTUAL CONSIDERÁVEL. AFRONTA LEGAL. SÚMULA 24/TSE. NEGATIVA DE SEGUIMENTO.

1. Autos recebidos no gabinete em 28/6/2017.

2. Não se constata ofensa ao art. 275 do Código Eleitoral, pois a Corte a quo analisou os pontos em tese omissos, ainda que em sentido contrário aos interesses do recorrente, concluindo que: a) inexistiu cerceamento de defesa; b) as falhas revelam-se graves; c) descabe aplicar o princípio da proporcionalidade.

3. Irregularidades graves, de valor considerável, nas contas apreciadas em conjunto da Direção Regional e do Comitê Financeiro do Partido Socialismo e Liberdade (PC 1254-08 e PC 1273-14), referentes ao exercício financeiro e de campanha de 2014, a saber: a) recursos de origem não identificada (em quantitativo superior a 20% do total arrecadado), afrontando o art. 29 da Res.-TSE 23.406/2014; b) despesas com combustíveis (PC 1254-08), ausentes os respectivos recibos eleitorais, em ofensa ao arts. 10 e 40, b, c e d da Res.-TSE 23.406/2014; c) transferências diretas (PC 1273-14) a inúmeros candidatos e diretórios municipais, sem nenhum registro no ajuste contábil, somando mais de um milhão de reais.

4. Falhas que, em seu conjunto, comprometeram a transparência das contas, impedindo sua fiscalização pela Justiça Eleitoral.

5. As mudanças introduzidas pela Lei 13.165/2015 ao art. 37 da Lei 9.096/95 - em especial a retirada de suspensão de cotas do Fundo Partidário - são regras de direito material e não se aplicam às prestações de contas partidárias de exercícios anteriores, sob pena de afronta aos princípios da isonomia e da segurança jurídica. Precedentes.

6. O quantitativo e a natureza de falhas identificadas não permitem, no caso específico dos autos, aplicar os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade a fim de se reduzir o período de suspensão de repasse de cotas do Fundo Partidário.

7. Recurso especial a que se nega seguimento.

(Recurso Especial Eleitoral 1254-08. Data da decisão/julgamento: 20.9.2017, DJE de 09.10.2017, Relator: Min. Antonio Herman de Vasconcellos e Benjamin.)

Referido acórdão, aliás, se manifestou em virtude de irresignação da parte, nos seguintes termos:

[...]

Trata-se de agravo interposto pelo Partido Socialismo e Liberdade (PSOL) contra decisum da Presidência do TRE/MT que inadmitiu

recurso especial, em sede de prestação de contas, contra arestos assim ementados (fls. 103 e 143):

ELEIÇÕES 2014. PRESTAÇÃO DE CONTAS. PARTIDO POLÍTICO. ÓRGÃO DE DIREÇÃO REGIONAL. IRREGULARIDADES. FUNDO

PARTIDÁRIO. PERDA DE DIREITO. CONTAS DESAPROVADAS.

1. Desaprovam-se as contas de campanha de órgão partidário de direção regional, à vista de falhas de natureza grave que maculam significativamente a regularidade das contas e impedem a fiscalização da Justiça Eleitoral.

2. Aplica-se a sanção de perda do direito ao recebimento das quotas do Fundo Partidário do ano seguinte.

EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. ELEIÇÕES 2014. PRESTAÇÃO DE CONTAS. PARTIDO POLÍTICO. REDISCUSSÃO DO MÉRITO DA DECISÃO. DESCABIMENTO. LEI Nº 13.165/2015. APLICAÇÃO RETROATIVA. IMPOSSIBILIDADE. PRINCÍPÍOS DA ISONOMIA E DO OBSERVÂNCIA. RETROATIVIDADE. APLICAÇÃO EXCLUSIVA ÁREA PENAL. EMBARGOS CONHECIDOS E DESPROVIDOS.

1. Nega-se provimento aos Embargos de declaração opostos contra acórdão que tratou de todas as questões apontadas, não cabendo sua oposição com a finalidade de rediscussão do mérito da causa. A irresignação do Embargante deve ser levada a cabo pelas vias recursais próprias.

2. A legislação que regula a prestação de contas é aquela que vigorava na data em que apresentada a contabilidade, por força do princípio da anualidade eleitoral, da isonomia, do tempus regit actum e das regras que disciplinam o conflito de leis no tempo.

3. A regra que estipula a retroatividade da norma mais benéfica restringe-se à esfera penal, não se podendo aplicar retroativamente, salvo disposição em contrário, norma posterior que revoga sanção cominada para ilícito de natureza cível.

4. Embargos conhecidos e desprovidos.

Daqui em diante, somado ao êxito prático do posicionamento que defendo, passo a fundamentar conforme a ponderação dos valores postos em causa.

Tenho todo apreço à tese de evolução legislativa que, mediante sucessivos acordos sociais, repercuta no ordenamento jurídico e torne, a partir de determinado momento, lícito o que antes era ilícito, ou amenize sanções antes mais severas.

Contudo, entendo aplicável a lei da época em que ocorridos os fatos, porque além de processo judicial eleitoral, da jurisdição eleitoral, sublinho que a Justiça Eleitoral atua, também, como fiel da balança do pleito eleitoral, da competição em si mesma.

Daí, não entendo aplicável uma norma surgida, ainda que benéfica, a um desses competidores eleitorais, e não aplicável a outro que já tenha recebido resposta jurisdicional.

Exemplifico: duas agremiações apresentam contas: aliás, duelaram entre si na eleição de 2016 e, por aspectos diversos – seja a complexidade das contas em si mesmas, o aguerrimento dos advogados atuantes, ou a diferença de agilidade cartorária, um dos processos de prestação de contas recebe incidência dos novos comandos da Lei n. 13.488/2017, e o outro não, pois transitado em julgado antes de seu advento.

Terá sido concretizada a paridade de armas, a igualdade de chances no processo eleitoral, as quais fazemos referência frequentemente nos julgados desta Especializada?

Penso que não. O tratamento igualitário perante a legislação somente será concretizado se aplicado no processo eleitoral – e não me refiro aqui ao processo judicial eleitoral, mas àquela sequência de ocorrências entre as convenções partidárias e as diplomações dos candidatos.

Dentre eles as prestações de contas, as propagandas eleitorais.

Ou o registro de candidatos.

Imagine-se o seguinte caso: um candidato, nas eleições de 2016, candidatou-se comprovando 10 (dez) meses de domicílio eleitoral.

Nas eleições de 2016, a legislação exigia o prazo mínimo de 1 (um) ano de domicílio eleitoral na circunscrição do pleito.

Como o hipotético candidato recorreu do indeferimento da candidatura de 2016, e o processo ainda encontra sub judice, seria hoje aplicável o novel prazo de 6 (seis) meses de filiação previsto para as vindouras eleições de 2018, para deferir o registro do candidato, por se tratar de regra benéfica para o caso?

Penso novamente que não, exatamente porque o processo eleitoral de determinada eleição há de ser composto de segurança jurídica e, sobretudo, de paridade de armas entre os concorrentes, cabendo à Justiça Eleitoral deixar claro que, postas as regras para determinada eleição, elas deverão ser obedecidas de maneira igual pelos iguais, por todos aqueles que competiram no pleito.

Aliás, o próprio art. 16 da Constituição Federal, o qual prevê o princípio da anterioridade eleitoral de 1 (um) ano para que a legislação possa ser aplicada em futuras eleições, passa boa dose dessa concepção: a de prestígio de uma legislação estanque, hígida, para cada pleito a ser realizado.

Nessa linha, entendo pertinente transcrever trecho da divergência do Ministro Gilmar Mendes durante o julgamento do Recurso Especial Eleitoral n. 5199363, Rel. Ministra Luciana Lóssio, citado pelo e. Relator, em seu voto, como precedente de aplicação da lei mais benéfica, verbis:

De fato, o princípio da anterioridade eleitoral constitui uma garantia fundamental também destinada a assegurar o próprio exercício do direito de minoria parlamentar em situações nas quais, por razões de conveniência da maioria, o Poder Legislativo pretenda modificar, a qualquer tempo, as regras e critérios que regerão o processo eleitoral. A aplicação desse princípio não depende de considerações sobre a moralidade da legislação. 0 art. 16 e uma barreira objetiva contra abusos e desvios da maioria e dessa forma deve ser aplicado por esta Corte. A proteçãoo das minorias parlamentares exige reflexão acerca do papel das jurisdições constitucional e eleitoral nessa tarefa. As jurisdições constitucional e eleitoral cumprem as suas funções quando aplicam rigorosamente, sem subterfúgios calcados em considerações subjetivas de moralidade, o princípio da anterioridade eleitoral, previsto no art. 16 da Constituição, pois essa norma constitui urna garantia da minoria, urna barreira, portanto, contra a atuação sempre arneaçadora da majoria. Por outro, o art. 16 da CF/I 988, ao definir que "a lei que alterar o processo eleitoral entrará em vigor na data de sua publicação, não se aplicando a eleição que ocorra ate um ano da data de sua vigência", deixa clara a opção constitucional de que a legislação eleitoral de determinado pleito - o processo eleitoral em si - esteja definida um ano antes da eleição, permitindo aos participantes da disputa, com antecedência razoável, a ciência prévia das regras jurídicas que disciplinarão a competição que se avizinha (sistema eleitoral, atividade dos partidos políticos e dos candidatos, financia´mento de campanha, acesso aos meios de comunicação, propaganda, condições de elegibilidade, causas de inelegibilidade, entre outras), bem corno resguardando a própria ideia de igualdade de chances entre os contendores, entendida como a necessária concorrência livre e equilibrada entre os partícipes da vida política, sem a qual se compromete a própria essência do processo democrático. O processo eleitoral e, pois, uma sucessão de fases organizadas pela Constituição Federal de 1988 e pela legislação eleitoral, o qual se inicia, no momento pré-eleitoral, com a fixação de domicílio eleitoral (um ano antes do pleito pelo menos, art. 90 da Lei n° 9.504/1997), passa pela filiação partidária (prazo reduzido para seis meses antes do pleito - art. 90 da Lei n° 9.504/1997 -, salvo se o estatuto estabelecer prazo major - art. 20 da Lei n° 9.096/1 995) e chega-se as convenções partidárias, realizadas agora no período de 20 de julho a 5 de agosto (art. 80 da Lei n° 9.504/1997). A fase eleitoral, por sua vez, começa com o registro de candidatura, apresentado agora ate o dia 15 de agosto do ano da eleição (art. 11 da Lei n° 9.504/1997), oportunidade na qual a Justiça Eleitoral verificará as condições de elegibilidade, a eventual incidência em determinada causa de inelegibilidade e os documentos necessários; em seguida, começa a propaganda eleitoral, permitida a partir de 15 de agosto (art. 36 da Lei n° 9.504/1997); chega, então, o dia da eleição e, logo em seguida, a proclamação dos candidatos eleitos; após, a indispensável apresentação da prestação de contas, cuja omissão impede a diplomação (art. 29, § 20, da Lei n° 9.504/1997), e, por fim, a diplomação dos candidatos que foram consagrados pela vontade do povo.

Dessarte, tenho por prestigiar a paridade de armas, a igualdade de chances no processo eleitoral, em detrimento da aplicação pontual da retroatividade in bonam partem, e entender irregulares as contribuições advindas de cargos demissíveis ad nutum, ainda que os contribuintes sejam filiados à agremiação.

Essa a minha respeitosa divergência, a qual apresento ao Plenário.

Quanto ao mérito propriamente dito, trata-se de irregularidades referentes ao percebimento de recursos considerados como fonte vedada, o qual abarca a discussão acerca do alcance do termo “autoridade”, elemento semântico presente no art. 31, caput, e inciso II, da Lei n. 9.096/95:

Art. 31. É vedado ao partido receber, direta ou indiretamente, sob qualquer forma ou pretexto, contribuição ou auxílio pecuniário ou estimável em dinheiro, inclusive através de publicidade de qualquer espécie, procedente de:

[…]

II – autoridade ou órgãos públicos, ressalvadas as dotações referidas no art. 38;

A partir da redação legal, estabeleceram-se debates acerca do alcance do termo. Por exemplo, houve defesa à vinculação estrita à denominação do cargo ou, ainda, quem indicasse a necessidade de análise de existência, ou inexistência, de poder de decisão inerente às atribuições daquela posição na máquina burocrática estatal.

Em 2007, no julgamento da Consulta n. 1428 (Resolução TSE n. 22.585/07), o Tribunal Superior Eleitoral assentou a interpretação.

A consulta era a seguinte: “É permitido aos partidos políticos receberem doações ou contribuições de detentores de cargos demissíveis ad nutum da administração direta ou indireta da União, dos Estados e Municípios?”

E o e. TSE entendeu inviável a doação por detentor de cargo de chefia e direção:

Partido político. Contribuições pecuniárias. Prestação por titulares de cargos demissíveis ad nutum da administração direta ou indireta. Impossibilidade, desde que se trate de autoridade. Resposta à consulta, nesses termos. Não é permitido aos partidos políticos receberem doações ou contribuições de titulares de cargos demissíveis ad nutum da administração direta ou indireta, desde que tenham a condição de autoridades.

(CONSULTA n. 1428, Resolução n. 22.585 de 6.9.2007, Relator Min. JOSÉ AUGUSTO DELGADO, Relator designado Min. ANTONIO CEZAR PELUSO, Publicação: DJ – Diário de Justiça, Data 16.10.2007, Página 172.)

Está assentado, portanto, que são recursos de fonte vedada “as doações a partidos políticos realizadas por titulares de cargos demissíveis ad nutum da administração direta ou indireta que detenham condição de autoridades, vale dizer, que desempenhem função de direção ou chefia”, como decidido, por exemplo, no RE n. 60-88.2015.6.21.0022, cuja Relatora foi a Dra. Maria de Lourdes Galvão Braccini de Gonzalez, julgado em 30.08.2016, por unanimidade.

E, na linha da jurisprudência deste Tribunal Regional, há uma série de julgados. Colaciono, a título ilustrativo:

Prestação de contas partidária. Diretório municipal. Art. 5º, inc. II, da Resolução TSE n. 21.841/04. Exercício financeiro 2011.

Desaprovam-se as contas quando constatado o recebimento de doações de servidores públicos ocupantes de cargos demissíveis ad nutum e na condição de autoridades. No caso, recebimento de quantia expressiva advinda de cargos de coordenador, diretor de departamento e chefe de setores e unidades administrativas.

Manutenção das sanções de recolhimento de quantia idêntica ao valor doado ao Fundo Partidário e suspensão do recebimento das quotas pelo período de um ano.

Provimento negado.

(RE 34-80.2012.6.21.0124. Relator Dr. Ingo Wolfgang Sarlet, julgado em 26.08.2014, unânime.)

E consta do parecer conclusivo (fls. 224-225v.) que a agremiação partidária recebeu contribuições de fonte vedada que perfazem o total de R$ 41.268,00 (quarenta e um mil e duzentos e sessenta e oito reais – fl. 128), valor que corresponde à 65,79% das receitas do partido.

Em que pese a defesa levantar a tese de que o Tribunal Superior Eleitoral extrapolou de sua competência ao expedir resoluções acerca do tema, tenho que tal posicionamento é insustentável, tanto pela doutrina quanto por maciça jurisprudência eleitoral.

Como se percebe, a vedação da doação de autoridade decorre de dispositivo da Lei dos Partidos Políticos, não havendo como argumentar que resolução do Tribunal Superior Eleitoral estivesse usurpando competência legislativa. As resoluções sobre prestação de contas editadas pela Justiça Eleitoral apenas reproduzem, nesse ponto, a disposição legal.

É certo que os filiados a partidos políticos podem dispor de seus rendimentos, mas na medida em que a lei define como de fonte vedada as contribuições provenientes de autoridades, ao juiz cabe delimitar os limites do comando normativo e aplicar a lei, não constituindo a suposta natureza privada das contribuições argumento suficiente para afastar a ilegalidade. Se assim o fosse, a figura da fonte vedada seria letra morta, visto que muitas de suas hipóteses estão arroladas pessoas ou entidades de natureza privada.

Ao contrário do que defendem os recorrentes, a limitação é impositiva e possui eficácia erga omnes: detentor de cargos de chefia ou direção na administração pública direta ou indireta não pode repassar valores a partidos políticos, não havendo conflito entre a vedação e o disposto nas normas constitucionais e infraconstitucionais, nem em relação aos princípios invocados na peça recursal.

Ante o fato de serem incontroversas as práticas irregulares, impõe-se a manutenção da sentença de desaprovação, visto que se trata de vícios de natureza grave e insanável, capazes de resultar na desaprovação das contas, conforme entendimento do TSE:

AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL. PRESTAÇÃO DE CONTAS. EXERCÍCIO FINANCEIRO DE 2010. DESPROVIMENTO.

(…)

6. Segundo a jurisprudência do TSE, o recebimento de recursos de fonte vedada, em regra, é irregularidade capaz de ensejar, por si só, a desaprovação das contas. (grifado)

7. Agravo regimental desprovido.

(Agravo Regimental em Recurso Especial Eleitoral n. 14022, Acórdão de 11.11.2014, Relator Min. GILMAR FERREIRA MENDES, Publicação: DJE – Diário da justiça eletrônico, Tomo 230, Data 05.12.2014, Página 86.)

Por fim, quanto à suspensão do repasse de quotas do Fundo Partidário, determinada na sentença pelo período de 1 (um) ano, entendo, aqui, que o período há de ser reduzido, conforme a jurisprudência.

O caso comporta adequação da pena para o prazo de 4 (quatro) meses. Lembro que os valores que envolvem a doação por fontes vedadas englobam quantias de alguma expressão.

Diante do exposto, VOTO pela rejeição da preliminar de ilegitimidade passiva, pela aplicação da legislação vigente à época da prestação de contas e, no mérito, para entender irregulares as contribuições de cargos demissíveis ad nutum do PDT de Novo Hamburgo relativas ao exercício do ano de 2015 e prover parcialmente o recurso, para minorar a suspensão do repasse de novas quotas do Fundo Partidário para o período de 4 (quatro) meses, a partir do trânsito em julgado da decisão.

 

Des. Federal João Batista Pinto Silveira:

Senhor Presidente, peço vênia para divergir do nobre relator quanto à aplicação da alteração promovida pela Lei n. 13.488/17 aos exercícios anteriores a sua vigência.

Conforme referido, a Lei n. 13.488/17, publicada em 06.10.2017, promoveu alterações no art. 31 da Lei n. 9.096/95, eliminando do rol do dispositivo o termo “autoridade” e acrescentando um novo inciso V, com a seguinte redação:

Art. 31. É vedado ao partido receber, direta ou indiretamente, sob qualquer forma ou pretexto, contribuição ou auxílio pecuniário ou estimável em dinheiro, inclusive através de publicidade de qualquer espécie, procedente de:

[…].

V - pessoas físicas que exerçam função ou cargo público de livre nomeação e exoneração, ou cargo ou emprego público temporário, ressalvados os filiados a partido político. (Incluído pela Lei nº 13.488, de 2017.) Grifei.

Com efeito, essa disposição legal admitiu que servidores demissíveis ad nutum, desde que filiados a partido político, possam realizar doação sem que sejam consideradas como de fonte vedada.

Antes desse normativo, a jurisprudência dessa Corte e do TSE sufragava o entendimento de que servidores demissíveis ad nutum são considerados autoridades e não poderiam doar, devendo o órgão partidário recolher ao Tesouro Nacional a importância recebida indevidamente.

A controvérsia que surge é no seguinte sentido: Seria possível aplicar essa disposição a doações ocorridas antes da vigência da lei? Ou seja, seria possível convalidar doações que, à época do ato, eram consideradas ilícitas?

Penso que não, sob pena de malferimento do ato jurídico perfeito, da segurança jurídica e da isonomia processual.

Essa matéria não é nova, sendo que essa Corte e o TSE, quando chamados a apreciá-la, posicionaram-se no sentido de que o tempo rege o ato e, mesmo se tratando de norma mais benéfica, não é aplicável à hipótese a retroatividade ínsita aos feitos de natureza criminal.

Foi assim quando, recentemente, o TSE examinou a questão das doações realizadas por pessoas jurídicas após a revogação do art. 81 da Lei 9.504/97.

Por oportuno, cito jurisprudência consolidada do TSE que agasalha a máxima do tempus regit actum, nos termos do art. 6º da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro:

ELEIÇÕES 2014. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO. DOAÇÃO DE RECURSOS ACIMA DO LIMITE LEGAL. PESSOA JURÍDICA. ADI Nº 4650. DECLARAÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE QUE NÃO SE APLICA A DOAÇÕES CONSOLIDADAS NAS ELEIÇÕES ANTERIORES À DATA DO JULGAMENTO. IRRETROATIVIDADE DA LEI Nº 13.165/2015. PRINCÍPIO DO TEMPUS REGIT ACTUM. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO.

1. A declaração de inconstitucionalidade do art. 81 da Lei nº 9.504/97 operou os seus efeitos a partir da sessão de julgamento da ADI nº 4650, a saber, 17 de setembro de 2015, alcançando as doações de campanhas a se realizarem no prélio eleitoral de 2016 e os subsequentes, não sendo essa a hipótese dos autos, que versa sobre doação realizada no pleito de 2014.

2. A revogação do art. 81 da Lei das Eleições não alcança as doações realizadas em eleições anteriores, notadamente por se tratar de atos jurídicos perfeitos consolidados sob a égide de outro regramento legal eleitoral, situação que se equaciona pela incidência do princípio do tempus regit actum, nos termos do art. 6º da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro.

3. Agravo regimental desprovido.

(Agravo de Instrumento n. 13029, Acórdão, Relator Min. Luiz Fux, Publicação: DJE - Diário de justiça eletrônico, Data 16.10.2017.) (Grifei.)

ELEIÇÕES 2014. AGRAVO REGIMENTAL. AGRAVO. REPRESENTAÇÃO. DOAÇÃO ACIMA DO LIMITE LEGAL. PESSOA JURÍDICA.

1. A jurisprudência desta Corte já assentou que "o critério utilizado para aferição do limite para doações de campanha é o faturamento bruto da pessoa jurídica no ano anterior à eleição, declarado à Receita Federal" (AgR-REspe 264-47, rel. Min. Dias Toffoli, DJe de 3.6.2014).

2. A Corte de origem, fundamentadamente, decidiu, à míngua da ausência de declaração de Imposto de Renda, que o demonstrativo de resultado do exercício financeiro não é documento apto, por si só, a comprovar o faturamento da empresa no ano anterior da eleição, considerando se tratar de documentação não oficial e não revestida de presunção de veracidade nem tampouco de fé pública, principalmente ao confrontar com a certidão expedida pela Receita Federal quanto à doação sucedida e tendo em vista, ainda, a ausência de outros documentos de natureza fiscal que corroborassem tal informação.

3. A declaração de inconstitucionalidade do art. 81 da Lei nº 9.504/97 operou os seus efeitos a partir da sessão de julgamento da ADI nº 4650, a saber, 17 de setembro de 2015, alcançando as doações de campanhas a se realizarem no prélio eleitoral de 2016 e os subsequentes, não sendo essa a hipótese dos autos, que versa sobre doação realizada no pleito de 2014" (AI 82-59, rel. Min. Luiz Fux, DJe de 9.2.2017). No mesmo sentido: AgR-REspe 44-41, rel. Min. Henrique Neves da Silva, DJe de 27.9.2016; e AgR-AI 36-14, rel. Min. Luciana Lóssio, DJe de 1º.7.2016.Agravo regimental a que se nega provimento.

(Agravo de Instrumento n. 4952, Acórdão, Relator Min. ADMAR GONZAGA, Publicação: DJE - Diário de justiça eletrônico, Tomo 163, Data 23.08.2017, Página 105/106.) (Grifei.)

ELEIÇÕES 2014. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO. DOAÇÃO DE RECURSOS ACIMA DO LIMITE LEGAL. PESSOA JURÍDICA. DECADÊNCIA. NÃO OPERADA. ADI Nº 4650. DECLARAÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE QUE NÃO SE APLICA A DOAÇÕES CONSOLIDADAS NAS ELEIÇÕES ANTERIORES À DATA DO JULGAMENTO. IRRETROATIVIDADE DA LEI Nº 13.165/2015. PRINCÍPIO DO TEMPUS REGIT ACTUM. INEXISTÊNCIA DE CARÁTER CONFISCATÓRIO DA MULTA. PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE E DA RAZOABILIDADE. AFASTAMENTO DA MULTA OU FIXAÇÃO DO

SEU VALOR AQUÉM DO LIMITE MÍNIMO LEGAL. IMPOSSIBILIDADE. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO.

1. O prazo para o ajuizamento da representação por doação acima do limite legal é de 180 (cento e oitenta) dias, contados a partir da diplomação, conforme entendimento firmado por este Tribunal Superior.

2. A declaração de inconstitucionalidade do art. 81 da Lei nº 9.504/97 operou os seus efeitos a partir da sessão de julgamento da ADI nº 4650, a saber, 17 de setembro de 2015, alcançando as doações de campanhas a se realizarem no prélio eleitoral de 2016 e os subsequentes, não sendo essa a hipótese dos autos, que versa sobre doação realizada no pleito de 2014.

3. A revogação do art. 81 da Lei das Eleições não alcança as doações realizadas em eleições anteriores, notadamente por se tratar de atos jurídicos perfeitos consolidados sob a égide de outro regramento legal eleitoral, situação que se equaciona pela incidência do princípio do tempus regit actum, nos termos do art. 6º da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro.

4. O TSE já se pronunciou no sentido de que a multa por doação de campanha acima do limite legal não tem natureza confiscatória, já que não possui origem tributária, mas, sim, de penalidade aplicável em decorrência de prática de ato ilícito.

5. Os postulados fundamentais da proporcionalidade e da razoabilidade são inaplicáveis para o fim de afastar a multa cominada ou aplicá-la aquém do limite mínimo definido em lei, sob pena de vulneração da norma que fixa os parâmetros de doações de pessoas física e jurídica às campanhas eleitorais.

6. Agravo regimental desprovido.

(Agravo de Instrumento n. 8259, Acórdão, Relator Min. Luiz Fux, Publicação: DJE - Diário de justiça eletrônico, Tomo 29, Data 09.02.2017, Página 52-53.) (Grifei.)

Igualmente, essa Corte, no dia 07 de novembro de 2017, examinou a questão em debate, decidindo, à unanimidade, pela irretroatividade da norma, inclusive do próprio dispositivo legal ora examinado.

Transcrevo trecho do voto do eminente relator Des. Jorge Luís Dall'Agnol (RE 60-91) que, ao início do voto, analisou a irretroatividade do art. 37 da Lei 9.096/95 e, ao depois, fez expressa remissão a Lei 13.488/17 (Reforma Eleitoral):

Considerando a natureza da irregularidade e o montante apurado (R$ 78.716,35), o qual não se enquadra como insignificante – considerado de forma absoluta ou proporcional –, com esteio nos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade largamente adotados neste Tribunal, fixo em 02 (dois) meses a suspensão, com perda, do recebimento das quotas do Fundo Partidário, tal como prevista no art. 37 da Lei n. 9.096/95, em vigor durante o exercício financeiro de 2013, antes do advento das alterações introduzidas pela Lei n. 13.165/15.

Explico.

A defesa requereu, em caso de sanção, a aplicação da nova redação do caput e do § 3º do art. 37 da Lei n. 9.096/95, dada pela Lei n. 13.165/15, sob o argumento de se tratar de “lei mais benéfica”, excluindo-se, por via de consequência, a pena de suspensão de quotas do Fundo Partidário, in verbis:

Art. 37. A desaprovação das contas do partido implicará exclusivamente a sanção de devolução da importância apontada como irregular, acrescida de multa de até 20% (vinte por cento). (Redação dada pela Lei nº 13.165, de 2015)

[…]

§ 3º A sanção a que se refere o caput deverá ser aplicada de forma proporcional e razoável, pelo período de um a doze meses, e o pagamento deverá ser feito por meio de desconto nos futuros repasses de cotas do Fundo Partidário, desde que a prestação de contas seja julgada, pelo juízo ou tribunal competente, em até cinco anos de sua apresentação. (Redação dada pela Lei nº 13.165, de 2015)


 

Na linha da jurisprudência deste Tribunal, as alterações introduzidas pela Lei n. 13.165/15, que suprimiu a sanção de suspensão de novas quotas do Fundo Partidário, não têm aplicação retroativa aos fatos ocorridos antes de sua vigência, merecendo relevo o acórdão de relatoria do Des. Paulo Roberto Lessa Franz, julgado em 08.10.2015, nos autos do RE 31-80.2015.6.21.0008. 


 

Recurso. Prestação de contas. Partido político. Arts. 4º, caput e 14, inc. II, “n”, da Resolução TSE n. 21.841/04. Exercício financeiro de 2014.

A abertura de conta bancária é obrigatória, independentemente de ter havido movimentação financeira no período. Falha de natureza grave que impede a apresentação de extratos bancários correlatos, os quais são imprescindíveis para demonstrar a origem e a destinação dada aos recursos financeiros, bem como para comprovar a alegada ausência de movimentação financeira. Irregularidade insuperável, a comprometer, modo substancial, a fiscalização exercida pela Justiça Eleitoral.

As alterações introduzidas pela Lei n. 13.165/2015, que deram nova redação ao art. 37 da Lei n. 9.096/95, suprimindo a sanção de suspensão de novas contas do Fundo Partidário, não têm aplicação retroativa aos fatos ocorridos antes da sua vigência.

Redimensionamento, de ofício, do quantum de suspensão das cotas, em homenagem aos princípios da proporcionalidade e razoabilidade. Provimento negado. (TRE-RS. RE 31-80, relator Des. Paulo Roberto Lessa Franz, J. Sessão de 08.10.2015.) (Grifei.)


 

De forma mais recente, o Tribunal Superior Eleitoral também já se manifestou:

AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL. PRESTAÇÃO DE CONTAS DE PARTIDO POLÍTICO. DIRETÓRIO REGIONAL. EXERCÍCIO FINANCEIRO DE 2010. DESAPROVAÇÃO.

Agravo regimental

[…]

6. A título de obiter dictum e para efeito de orientação, a regra do novo caput do art. 37 da Lei nº 9.096/95, introduzida pela Lei nº 13.165/2015, somente pode ser aplicada na hipótese de desaprovação de contas por irregularidades apuradas nas prestações de contas apresentadas a partir da vigência do novo dispositivo, ou seja, a partir daquelas que vierem a ser prestadas até 30 de abril de 2016 em relação ao exercício atual (2015), ao passo que as sanções aplicáveis às prestações de contas referentes aos exercícios anteriores devem seguir a legislação vigente no momento da sua apresentação.

Agravo regimental a que se nega provimento. (TSE. Recurso Especial Eleitoral n. 6548, Acórdão, Relator Min. Henrique Neves Da Silva, Publicação: DJE - Diário de justiça eletrônico, Volume, Tomo 164, Data 25.08.2016, Página 35.) (Grifei.)

 

Trago à colação trecho do referido acórdão do TSE, cujos fundamentos agrego à presente decisão:

Na espécie, a nova regra do caput do art. 37 da Lei n. 9.096/95 não traz nenhuma indicação de sua aplicação às prestações de contas já julgadas pelas instâncias ordinárias, razão pela qual não há como reconhecer a sua aplicação às situações já consolidadas que foram apreciadas pelo Poder Judiciário de acordo com as regras vigentes, tanto no momento da consolidação dos fatos que estão retratados (ou não) nos demonstrativos apresentados pelas agremiações partidárias, quanto no momento da prestação jurisdicional caracterizada pela prolação das sentenças e dos acórdãos que examinaram e decidiram as mencionadas prestações de contas. 

Também nesse ponto, a alegação de que a matéria seria de ordem pública não tem importância para a análise da questão, visto que “o disposto no art. 50, inc. XXXVI, da Constituição Federal se aplica a toda e qualquer lei infraconstitucional, sem qualquer distinção entre lei de direito público e lei de direito privado, ou entre lei de ordem pública e lei dispositiva. Precedente do STF.” (ADI n° 493, rei. Ministro Moreira Alves, Tribunal Pleno, DJ de 4.9.1992). 

A impossibilidade de a lei nova ser aplicada aos fatos consolidados antes da sua edição - não para deles retirar efeitos futuros, como ocorre no caso da retrospecção da norma, mas, sim, para considerá-los ou não passíveis de sanção de natureza administrativa - torna-se mais forte ainda no âmbito do Direito Eleitoral, em que o princípio previsto no art. 16 da Constituição Federal aponta que as alterações legislativas que tenham reflexo no processo eleitoral somente são aplicáveis às eleições futuras que ocorrerem um ano após a edição da norma. De outro lado, o Direito Eleitoral - que também é composto pelas regras partidárias - tem como princípio fundamental a igualdade de chances entre os candidatos e entre os partidos políticos, de modo a assegurar que os direitos e deveres sejam respeitados e aplicados de forma igualitária nos pleitos eleitorais.

Assim, a aplicação de uma lei nova, para reduzir as sanções aplicadas aos partidos políticos cujas prestações de contas relativas aos exercícios passados ainda não foram examinadas ou acobertadas pela coisa julgada, atrairia desequilíbrio e desigualdade em relação àquelas agremiações que, conformando-se com as decisões proferidas pela Justiça Eleitoral, se submeteram às suspensões que lhes foram impostas em processos jurisdicionais.

Portanto, por esses fundamentos, a orientação possível de ser adotada caminha no sentido de considerar que a regra do novo caput do art. 37 da Lei no 9.096/95, introduzida pela Lei no 13.165/15, somente pode ser aplicada na hipótese de desaprovação de contas por irregularidades apuradas nas prestações de contas apresentadas a partir da vigência do novo dispositivo, ou seja, a partir daquelas que vierem a ser prestadas até 30 de abril de 2016 em relação ao exercício atual (2015), ao passo que as sanções aplicáveis às prestações de contas referentes aos exercícios anteriores devem seguir a legislação vigente no momento da sua apresentação.

Idêntica solução também se aplica à tese da retroação da Lei n. 13.488/17, haja vista que as recentes alterações promovidas envolvem regras de direito material e não se aplicam às prestações de contas partidárias de exercícios anteriores, sob pena de afronta aos princípios da isonomia e da segurança jurídica. (grifei)

Dessarte, não obstante os respeitáveis fundamentos trazidos pelo relator, penso que a orientação que assegura igualdade e é consentânea com os princípios processuais constitucionais e com o ato jurídico perfeito é aquela que aplica a nova disposição prevista no art. 31, inc. V, da Lei n. 9.096/95, levada a efeito pela Lei n. 13.488/17, a doações realizadas apenas a partir da vigência do normativo, ou seja, 06.10.2017.

É como voto.

 

Des. Jamil Andraus Hanna Bannura:

Senhor Presidente, acompanho integralmente a divergência. 

 

Des. Silvio Ronaldo Santos de Moraes:

Pedindo redobradas vênias ao nobre relator, acompanho a divergência inaugurada pelo Desembargador Eduardo Augusto Dias Bainy, que em robusto voto-vista trouxe judiciosos argumentos, reforçados pelo bem-lançado voto do Desembargador Federal João Batista Pinto Silveira, no sentido de que, no âmbito do Tribunal Superior Eleitoral, há diretriz jurisprudencial consolidada sobre o tema.

Conforme precedentes colacionados nos votos divergentes, a Corte Superior Eleitoral tem firme entendimento de que “a legislação que regula a prestação de contas é aquela que vigorava na data em que apresentada a contabilidade, por força do princípio da anualidade eleitoral, da isonomia, do tempus regit actum, e das regras que disciplinam o conflito de leis no tempo” (ED-ED-PC 96183/DF, Rel. Min. Gilmar Mendes, DJE de 18/3/2016).

Ademais, a manutenção dessa orientação nos julgados deste Tribunal Regional Eleitoral garante segurança jurídica aos jurisdicionados, indo ao encontro do art. 926 do Novo CPC, dispositivo que determina aos tribunais o dever de “uniformizar sua jurisprudência e mantê-la estável, íntegra e coerente”.

Com essas considerações, e com muito respeito ao entendimento em sentido contrário, acompanho a divergência.

 

Des. Jorge Luís Dall'Agnol:

Sr. Presidente, acompanho a divergência.

 

Des. Luciano Losekann:

Sr. Presidente, revejo minha posição e adiro ao voto divergente do Des. Bainy.