RE - 59863 - Sessão: 12/12/2017 às 17:00

RELATÓRIO

Trata-se de recurso interposto por SALETE APARECIDA COSTA DOMINGUES, candidata ao cargo de vereador em Santo Ângelo, em face da sentença de fls. 65-66v., do Juízo da 45ª Zona Eleitoral, que desaprovou as suas contas referentes às eleições municipais de 2016 e determinou o recolhimento de R$ 562,00 ao Tesouro Nacional, em razão de inconsistência no extrato bancário entregue à Justiça Eleitoral, da identificação de dívida de campanha e do recebimento de doação com recursos próprios sem prova da capacidade econômica para tanto.

Em suas razões, fls. 70-75, a candidata argumenta que as falhas são meramente formais e não impedem a fiscalização pela Justiça Eleitoral. Requer o afastamento da imposição de recolhimento de valores ao Tesouro Nacional e a aprovação das contas, ou, subsidiariamente, a aprovação com ressalvas.

Com vista dos autos, a Procuradoria Regional Eleitoral opinou pelo desprovimento do apelo (fls. 82-85v.).

É o relatório.

 

VOTO

O recurso é tempestivo. A publicação da sentença ocorreu em 12.09.2017, fl. 67, e a irresignação foi apresentada em 15.09.2017, fl. 70.

Presentes os demais pressupostos recursais, dele conheço.

Inicialmente, em relação ao pedido de recebimento do recurso no efeito suspensivo, destaco que, em sede de processo eleitoral, há de se observar o disposto no art. 257, § 2º, do Código Eleitoral, in verbis:

Art. 257. Os recursos eleitorais não terão efeito suspensivo.

[…]

§ 2º O recurso ordinário interposto contra decisão proferida por juiz eleitoral ou por Tribunal Regional Eleitoral que resulte em cassação de registro, afastamento do titular ou perda de mandato eletivo será recebido pelo Tribunal competente com efeito suspensivo.

Conforme se depreende do dispositivo transcrito, não se inserem dentre as hipóteses permissivas de atribuição de efeito suspensivo os recursos contra sentenças de processos de prestações de contas.

Ademais, o art. 26, § 2º, da Resolução TSE n. 23.463/15 prevê o recolhimento de valores após o quinto dia do trânsito em julgado da decisão que julgar as contas de campanha.

Assim, enquanto houver recurso pendente de análise jurisdicional, a sentença em questão, ex vi legis, não gera qualquer restrição à esfera jurídica da candidata.

Dessa forma, o pedido não comporta acolhimento, pois não se vislumbra utilidade na atribuição judicial de efeito suspensivo ao apelo.

No mérito, as contas da candidata foram desaprovadas na origem diante do reconhecimento das seguintes irregularidades: a) os extratos bancários oferecidos indicam outra titular, diversa da prestadora; b) há uma dívida de campanha no valor de R$ 62,00; e c) a renda conhecida da candidata é incompatível com a doação de recursos próprios na cifra de R$ 562,00.

Passo à análise dos apontamentos.

No tocante à falha na entrega dos extratos bancários, assim entendeu o magistrado sentenciante (fl. 65v.):

O primeiro apontamento refere que o extrato da conta bancária entregue pela candidata (fls.06 e 07) não é de sua pessoa, sendo outro o titular. Intimada, a candidata não juntou os extratos. Esta divergência nas informações impede a aferição da real movimentação financeira declarada, infringindo o art. 48, II, “a” da Resolução TSE n. 23.463/15.

De fato, verifica-se que os extratos apresentados referem-se à campanha de outra candidata. Instada a suprir a inconsistência, a prestadora limitou-se a sustentar que a falha é meramente formal, prosseguindo na omissão dos documentos relativos à sua própria contabilidade.

A finalidade da prestação de contas é viabilizar o controle da origem de todos os recursos de campanha e seus respectivos destinos, sendo imprescindível a apresentação dos extratos bancários completos para o cumprimento dessa finalidade.

Por tal motivo, o art. 48, inc. II, al. “a”, da Resolução TSE n. 23.463/15 impõe categoricamente a apresentação dos extratos bancários integrais e autênticos da conta aberta em nome do candidato:

Art. 48. Ressalvado o disposto no art. 57, a prestação de contas, ainda que não haja movimentação de recursos financeiros ou estimáveis em dinheiro, deve ser composta, cumulativamente:

II - pelos seguintes documentos:

a) extratos da conta bancária aberta em nome do candidato e do partido político, inclusive da conta aberta para movimentação de recursos do Fundo Partidário, quando for o caso, nos termos exigidos pelo inciso III do art. 3º, demonstrando a movimentação financeira ou sua ausência, em sua forma definitiva, contemplando todo o período de campanha, vedada a apresentação de extratos sem validade legal, adulterados, parciais ou que omitam qualquer movimentação financeira; (Grifei.)

Nesse trilhar, o juízo de desaprovação das contas entendeu que a ausência dos extratos impediu a fiscalização pela Justiça Eleitoral. No entanto, no caso em tela, verifico ser possível aferir a movimentação financeira de campanha.

Em relação à dívida de campanha, no montante de R$ 62,00, a prestadora esclareceu que se trata de parcela do débito relativo ao fornecimento de material gráfico de propaganda com a empresa Terra Vermelha, cuja nota fiscal encontra-se na folha 17. Além disso, declara que o remanescente da dívida será quitado pelo Diretório Municipal do Partido dos Trabalhadores (fl. 20).

Muito embora o art. 27, § 3º, da Resolução TSE n. 23.463/15 faculte a assunção solidária da dívida pelo partido político, a sistemática do instituto reclama a apresentação de acordo formal e expresso entre as partes, contendo, inclusive, a anuência do credor. Além disso, exige-se a elaboração de cronograma de pagamento e a indicação da fonte de recursos para o adimplemento da obrigação.

Na hipótese concreta, não foram observados os requisitos legais para a transferência do débito.

Cabe ressaltar, entretanto, que a falha em questão envolve a cifra absoluta de R$ 62,00 ou, em termos percentuais, cerca de 4% do total de despesas de campanha (R$ 1.424,00), apresentando-se desprovida de repercussão financeira suficiente a motivar a reprovação das contas, mas impondo-lhes o registro de ressalvas.

Registro precedente do TSE neste exato sentido:

ELEIÇÕES 2014. AGRAVO INTERNO EM AGRAVO INTERNO. MANUTENÇÃO DA DECISÃO AGRAVADA.

1. Afasta-se a alegação do agravado de ausência de pedido no Agravo Interno, pois perceptível sua existência nas razões recursais.

2. A explicitação das irregularidades, conforme os termos da decisão agravada, não ofende o princípio da inércia da jurisdição, pois cumpre ao Julgador decidir a matéria impugnada e devolvida nas razões recursais.

3. Hipótese em que é possível a aplicação dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade para aprovar as contas com ressalvas quando há, no acórdão regional, elementos que permitam mensurar se os valores relativos às falhas identificadas são ínfimos em comparação ao montante dos recursos arrecadados em campanha, e nele (no acórdão) não se averiguar a má-fé do candidato ou a gravidade das circunstâncias diante do caso concreto.

4. Agravo Interno ao qual se nega provimento.

(Recurso Especial Eleitoral n. 70024, Acórdão, Relator Min. Napoleão Nunes Maia Filho, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Tomo 040, Data 24.02.2017, p. 52.) (Grifei.)

Por fim, a respeito da arrecadação de recursos financeiros próprios para campanha, no montante de R$ 562,00; o art. 21, § 1º, da Resolução TSE n. 23.463/15 dispõe:

Art. 21. (…).

§ 1º O candidato poderá usar recursos próprios em sua campanha até o limite de gastos estabelecido na forma do art. 4º para o cargo ao qual concorre (Lei n. 9.504/1997, art. 23, §1°).

Na sequência, ao dispor acerca da comprovação dos recursos arrecadados e gastos realizados, o art. 56 do mesmo diploma faculta à Justiça Eleitoral exigir do candidato a comprovação da origem e a disponibilidade das receitas auferidas na campanha, bem como a sua não caracterização como fonte vedada.

Em consulta ao sítio eletrônico do Sistema de Divulgação de Contas Eleitorais (www.divulgacandcontas.tse.jus.br), verifico que a candidata declarou tão somente possuir um automóvel no valor de R$ 8.000,00, bem como não especificou a atividade remunerada que exerce, registrando o termo “outros” quanto a sua ocupação.

Diante desse panorama, o juízo a quo caracterizou a doação como recursos de origem não identificada, julgando desaprovadas as contas e determinando o recolhimento da quantia ao Tesouro Nacional.

Contudo, o valor absoluto da doação representa quase metade do quantum disposto no art. 18, § 1º, da Resolução TSE n. 23.463/15 como sendo parâmetro do conceito de pequeno valor.

Ainda, constato que o somatório de receitas em espécie auferidas pela candidata alcançou a modesta cifra de R$ 1.062,00; dos quais R$ 500,00 foram depositados pela Direção Municipal do PT, sendo o restante advindo de recursos da própria candidata.

Em vista da inexpressiva movimentação de recursos na campanha, considero que a quantia é insignificante e incapaz de malferir a análise contábil, sendo que a falta de informação precisa a respeito da capacidade financeira da doadora enseja, nesse caso, apenas ressalva na escrituração.

Nesse sentido, colaciono a seguinte ementa do TSE:

ELEIÇÕES 2016. AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL. PRESTAÇÃO DE CONTAS. CANDIDATO. PRÍNCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE E DA RAZOABILIDADE. APLICABILIDADE. APROVAÇÃO COM RESSALVAS.

1. "Com base na compreensão da reserva legal proporcional, nem toda irregularidade identificada no âmbito do processo de prestação de contas autoriza a automática desaprovação de contas de candidato ou de partido político, competindo à Justiça Eleitoral verificar se a irregularidade foi capaz de inviabilizar a fiscalização" (AgR-REspe 2159-67, rel. Min. Gilmar Mendes, DJe de 11.3.2016).

2. Com relação à falha de omissão de receitas e despesas, consistiu ela no valor de R$ 295,20, a qual a própria Corte de origem assinalou não ser "capaz de levar à desaprovação das contas, sendo o caso de anotação de ressalvas, conforme o art. 68, II, da Res. TSE 23.463/2016".

3. Não obstante, o Tribunal a quo entendeu apta a ensejar a desaprovação das contas a irregularidade alusiva a doação que consistiu em recurso de origem não identificada. Todavia, conforme consta da decisão regional, é certo que a falha apontada correspondeu a aproximadamente 12% do total de recursos arrecadados para campanha eleitoral, mas é de se ponderar que se trata de uma campanha para vereador e o valor absoluto corresponde a R$ 1.000,00, a revelar o seu caráter diminuto, o que permite a aprovação com ressalvas.

4. Para fins de aplicação do princípio da razoabilidade e da proporcionalidade no âmbito dos processos de prestação de contas, a gravidade da falha tem relevância para a aferição da questão, mas outras circunstâncias podem ser ponderadas pelo julgador no caso concreto, notadamente se o vício, em termos percentuais ou absolutos, se mostra efetivamente expressivo. Precedente: AgR-AI 211-33, red. para o acórdão Min. Henrique Neves, DJe de 19.8.2014.

Agravo regimental a que se nega provimento.

(Recurso Especial Eleitoral n. 27324, Acórdão, Relator Min. ADMAR GONZAGA, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Data 29.9.2017.) (Grifei.)

A partir dos extratos eletrônicos dispostos no Sistema de Divulgação de Contas Eleitorais, constato que a doação foi realizada por meio de depósito bancário devidamente identificado com a aposição da inscrição do CPF da candidata, alcançando o requisito previsto na legislação eleitoral para a arrecadação desse valor. Assim, deve ser afastada a determinação de recolhimento da quantia ao Tesouro Nacional.

 

Diante do exposto, VOTO pelo provimento parcial do recurso, no sentido de aprovar com ressalvas a prestação de contas de SALETE APARECIDA COSTA DOMINGUES, relativa às eleições municipais de 2016, afastando a determinação de recolhimento de valores ao Tesouro Nacional.