E.Dcl. - 14431 - Sessão: 06/12/2017 às 17:00

RELATÓRIO

Cuida-se de embargos de declaração, com pedido de efeitos infringentes, opostos pelo MINISTÉRIO PÚBLICO ELEITORAL, em face do acórdão constante às fls. 127-131, que, à unanimidade, negou provimento a recurso interposto em prestação de contas.

Nas razões, o Parquet aduziu a ocorrência de omissão e contradição no aresto embargado. Sustenta que não houve a análise devida da alegação de silêncio da sentença em relação à aplicação do art. 26 da Resolução TSE n. 23.463/15, levando em consideração o disposto no art. 18, § 3º, do mesmo diploma. Argumenta, ainda, que o entendimento de que os doadores foram identificados não é apto a sanar a gravidade da irregularidade, impondo-se a determinação ex officio do recolhimento dos valores ao Tesouro Nacional. Requer sejam atribuídos efeitos infringentes aos embargos, a fim de que seja reconhecida a nulidade da sentença e, subsidiariamente, seja determinado o recolhimento das quantias recebidas indevidamente ao Tesouro Nacional (fls. 138-142v.).

É o relatório.

 

VOTO

O recurso é regular, tempestivo e comporta conhecimento.

No mérito, o embargante sustenta: (a) não foi analisada devidamente a alegada omissão existente na sentença, pois não aplicado o disposto no art. 18, § 3º, da Resolução TSE n. 23.463/15, o que se mostra contraditório com o reconhecimento de violação ao art. 19 da aludida normatização; e (b) ausente o enfrentamento quanto a argumentos que embasam a gravidade da irregularidade em questão, quais sejam, a violação aos arts. 13 e 18 da Resolução TSE n. 23.463/15.

O acórdão embargado reconheceu ter havido fundamentação expressa da sentença no sentido de que, no caso, o recolhimento ao Tesouro Nacional seria incabível, uma vez que o magistrado sentenciante não vislumbrou irregularidades envolvendo recursos de origem não identificada. Destaco o seguinte excerto da decisão ora embargada:

Não se verifica, na sentença recorrida, a omissão de um dever legal decorrente do recebimento de recursos de origem não identificada, mas o entendimento do magistrado de que a irregularidade apurada constitui falha distinta da ausência de identificação do doador.

Destarte, insubsistente a alegação de omissão quanto ao art. 26 da Resolução TSE n. 23.463/15.

Da mesma forma, não há contradição no concernente ao reconhecimento de violação ao art. 19 e à ausência de aplicação do art. 18, § 3º, ambos da Resolução TSE n. 23.463/15.

A única falha reconhecida na decisão embargada consistiu no recebimento de doações de combustíveis, estimáveis em R$ 5.900,00, adquiridos por terceiros, todos suficientemente identificados nas contas de campanha, e cedidos aos candidatos, em ofensa ao art. 22 da Lei n. 9.504/97 e arts. 13 e 19 da Resolução TSE n. 23.463/15.

Diante da natureza dos recursos em tela, percebe-se que o art. 18, § 3º, da Resolução TSE n. 23.463/15, não se subsume à espécie.

Com efeito, o dispositivo mencionado expressamente consigna sua aplicação às “doações financeiras recebidas em desacordo com este artigo”, ou seja, refere-se às contribuições realizadas de modo diverso da transação bancária com identificação do CPF do doador, bem como às doações acima de R$ 1.064,10 efetuadas sem observância da transferência eletrônica entre as contas do doador e do beneficiário.

Portanto, a dita regra é inaplicável à hipótese de doação estimável em dinheiro sem demonstração de que o doador é proprietário do bem, caso dos autos.

Nesse tópico, ainda, a evidência de que as doações podem haver ocorrido de forma indireta, ou seja, que os bens estimáveis foram entregues pelas pessoas físicas ao partido, o qual os repassou aos candidatos, não é suficiente para descaracterizar a essência de produtos estimáveis em dinheiro e convertê-los em receitas financeiras.

Ademais, o art. 14, incs. II e III, da Resolução TSE n. 23.463/15 autoriza que as pessoas físicas realizem doações, em dinheiro ou estimáveis, aos partidos e candidatos, bem como que esses doem entre si recursos, desde que identificada a origem. Portanto, o procedimento narrado nos autos não permite inferir, por si só, sem outros elementos de convicção a lhe dar suporte, a existência de burla ou fraude à legislação, nem impede, de modo apriorístico, a aplicação dos postulados de proporcionalidade e da razoabilidade e mitigarem a gravidade concreta da conduta.

Na sequência, o embargante afirma a existência de omissão no voto, ao argumento de que “a mera análise feita pelo TRE-RS de que os doadores foram identificados, por si só, não é apta a sanar a gravidade da irregularidade em questão”.

Entretanto, o acórdão analisou a incidência dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade à espécie, referenciando precedentes do TSE e analisando pormenorizadamente os aspectos fáticos que conferem amparo à aplicação da bagatela, embora admitindo a contrariedade à disciplina normativa.

Destaco os seguintes trechos da decisão:

Na hipótese, o valor de R$ 5.900,00 não se mostra expressivo, e representa 6,74% da movimentação total de recursos, incapaz, portanto, de prejudicar a fiscalização e a confiabilidade do conjunto das contas.

Registre-se, ainda, que os doadores, embora tenham realizado doações estimáveis em dinheiro em contrariedade à disposição do art. 19 da Resolução TSE n. 23.463/15, foram perfeitamente identificados, com seu CPF e data da doação (fl. 35).

Dessa forma, considerando os documentos juntados e a baixa repercussão em face do montante total de gastos, além da evidência de boa-fé do prestador, as contas devem ser aprovadas com ressalvas, pois não maculada sua confiabilidade.

Desse modo, não há lacuna quanto ao ponto, mas divergência entre o entendimento do embargante e a solução conferida ao caso, o que deve ser debatido em recurso adequado à superior instância.

Assim, voto por acolher parcialmente os embargos, integrando ao acórdão embargado a fundamentação acima, incapaz, todavia, de modificar as conclusões lá indicadas.