E.Dcl. - 29304 - Sessão: 14/11/2017 às 17:00

RELATÓRIO

COLIGAÇÃO A FORÇA DA MUDANÇA, CLÓVIS ALBERTO GELAIN, AMARILDO LUIZ PITOL, PARTIDO DEMOCRÁTICO TRABALHISTA e PARTIDO DOS TRABALHADORES opuseram embargos de declaração da decisão (fls. 1.011-1.029v.) que – nos autos da Ação de Investigação Judicial Eleitoral por uso indevido de veículo ou meio de comunicação, cumulada com representação por captação ilícita de sufrágio e conduta vedada a agentes públicos, relativa ao pleito municipal de 2016 em Rondinha, – proveu parcialmente o recurso interposto para reformar a sentença e condenar EZEQUIEL PASQUETTI, ALDOMIR CANTONI e o PARTIDO PROGRESSISTA ao pagamento de multa de R$ 10.641,00.

Aduziram (fls. 1.033-1.040v.) a existência de omissão, dúvida, obscuridade e contradição no acórdão embargado. Pugnaram pelo provimento dos embargos, para que sejam sanados os vícios apontados com a atribuição de efeitos infringentes.

Após, vieram os autos a mim conclusos.

É o relatório.

VOTO

Os embargos declaratórios são tempestivos e preenchem os demais pressupostos de admissibilidade, razão pela qual deles conheço.

No mérito, inicialmente consigno que os aclaratórios servem para afastar obscuridade, dúvida, contradição ou omissão que emergem do acórdão, nos termos do art. 275, caput, do Código Eleitoral c/c o art. 1.022 do Código de Processo Civil.

Reproduzo a síntese dos argumentos lançados pelos embargantes (fls. 1.033-1.040v.):

1. Prática de Conduta Vedada – Art. 73, VI, VII da Lei n. 9.504/97

[...]

Diante disso, está claro, como já demonstrado no Recurso Eleitoral, que os gastos com publicidade institucional realizadas por ocasião da realização do DIA DO PORCO devem ser considerados para efeitos de calcular o excesso de gastos em publicidade institucional no primeiro semestre de 2016, em comparação aos anos anteriores. O fato é que, ao menos parte do recurso destinado ao DIA DO PORCO foi utilizada para publicidade institucional, conforme plano de trabalho de fls. 197.

Assim, o acórdão deve pronunciar-se sobre estes gastos em publicidade, pois sua efetividade eleva em muito o porcentual de gastos em publicidade institucional acima do permitido, certamente próximo a 100% de excesso pela natureza das despesas.

Outro aspecto gerado pelo gasto em publicidade institucional com os recursos DO DIA DO PORCO é que efetivamente parte da publicidade foi realizada dentro do período vedado de 3 meses, tendo em vista que o DIA DO PORCO foi em 12 de agosto, e o período vedado iniciou em 03/07/2016.

Sendo assim, o respeitável Relator deverá considerar estas circunstâncias, não tratadas pelo acórdão, sendo que, ao analisar poderá refletir sobre a alteração das potencialidades, e que consequentemente poderão levar à majoração das condenações, que – respeitosamente – ao ver dos embargantes deverá modificar para a perda dos mandatos.

Neste ponto, pretende-se esclarecer ainda, o fato de os gastos efetuados a mais que a média terem sido utilizados para a prática de conduta vedada, mediante publicidade institucional irregular.

2. Conduta vedada – art. 73, § 10, da Lei n. 9.504/97

Outro aspecto não considerado pelo acórdão e, portanto omisso nesse item, embora de profunda análise, está relacionado às circunstâncias do DIA DO PORCO. Notemos que Vossa Excelência ao produzir o acórdão, tratou sobre a subvenção de R$ 45.000,00 destinada para realização do evento, apenas sob o aspecto da possibilidade de tal evento e entidade receber o recurso público em ano eleitoral.

[…]

Ao analisar o presente fato, alimentação e distribuição de brindes gratuitamente aos participantes, em ato com a participação e fala do candidato a reeleição, certamente Vossa Excelência terá condições de elevar os embargos a condição modificativa do acórdão em seu desfecho final, transformando punição para além da multa e sua majoração, igualmente a cassação dos mandatos.

[…]

3. Violação ao art. 74 da Lei n. 9.504/97 e art. 37, § 1º, da Constituição Federal

Notemos que, não estamos diante de apenas uma conduta vedada exercida pelos réus, e sim diante de várias, sendo que na soma das condutas irregulares, deve aportar condenação condizente com o efeito das mesmas de forma integrada.

[…]

4. Abuso de poder e de autoridade

Excelência, outro ponto que deve ser enfrentado pelo acórdão, são as circunstâncias do projeto de barragem do arroio lambari, as quais não foram adequadamente tratadas no acórdão.

[…]

Nesse sentido, é necessário que o nobre relator se manifeste quanto a estas circunstâncias apresentadas e que não constaram do acórdão, em relação ao abuso de poder e autoridade.

Conforme se infere, a peça apresentada não se ajusta aos fins do recurso a que se refere, pois, na verdade, consiste em divergência quanto ao entendimento de fundo adotado na decisão embargada.

O acórdão combatido foi devidamente lançado e apresenta fundamentação com as razões, suficientes, do entendimento do Pleno deste Tribunal (fls. 1.011-1.029v.):

[...]

a) Conduta vedada – art. 73, inc. VI, al. “b”, da Lei n. 9.504/97

Os representantes imputaram ao prefeito, candidato à reeleição, EZEQUIEL PASQUETTI, a prática de três fatos tipificados no art. 73, inc. VI, al. “b”, da Lei n. 9.504/97, consistentes na autorização/realização de publicidade institucional, no período de três meses que antecedem o pleito, in verbis:

[...]

O primeiro fato diz respeito à publicidade institucional mediante a realização, no dia 05 de julho de 2016, de uma reunião pública de apresentação do “Plano de Controle de Cheias do Arroio Lambari – Projeto de Reservatório de Detenção de Águas Pluviais Município de Rondinha”.

Afirmam os representantes que a referida cerimônia “teve todos os contornos atribuídos a um grande ato de inauguração” (fl. 31), com a expedição de convites oficiais a autoridades e lideranças da comunidade (fl. 108 e v.), a formação de uma mesa com autoridades – lideradas pelo prefeito, ora candidato –, bem como a lavratura de ata, acompanhada de lista de presenças (fls. 120-125). Ressaltam que o ato em questão foi divulgado nos veículos de comunicação, tendo a lista de presença contado com mais de 100 assinaturas, estimando o comparecimento de mais de 300 pessoas. Acrescentam que o município efetuou ainda gastos com publicidade institucional com a contratação de carro de som, no período de 4 e 5 de julho de 2016 (nota de empenho n. 3.811/2016, no valor de R$ 210,00, liquidado em 01.8.2016 – fls. 117-119), visando garantir o sucesso da reunião, além da publicação de matérias de natureza institucional, no referido período, em jornais com os quais mantém contrato.

Ao apreciar a questão, o juízo de primeiro grau assim decidiu (fls. 824-828v.):

[…]

Os representados EZEQUIEL PASQUETTI e ALDOMIR CANTONI recorrem da decisão sustentando que “a situação concreta trata apenas de um convite à população para tratar de aspectos técnicos do projeto de barragem do Rio Lambari”, sendo que a conduta não se amoldaria à proibição legal que trata da “propaganda de produtos e serviços” e da “publicidade institucional”, consoante prevê o art. 73, inc. VI, al. “b”, Lei n. 9.504/97.

[...]

O art. 37, §1º, da Constituição Federal afirma: “§ 1º A publicidade dos atos, programas, obras, serviços e campanhas dos órgãos públicos deverá ter caráter educativo, informativo ou de orientação social […]”.

No caso, é incontroverso que a reunião foi realizada para tratar do assunto da barragem, com a participação de mais de uma centena de pessoas, a qual teve caráter informativo à comunidade acerca de obra a se realizar. A característica da referida reunião afasta, prima facie, sua classificação como de natureza “mercadológica” (propaganda de produtos e serviços que tenham concorrência no mercado) ou “legal”.

Com relação à configuração da propaganda como “de utilidade pública”, para fins de incidência da exceção prevista na parte final da al. “b” do inc. VI do art. 73 da Lei n. 9.504/97, esta depende do reconhecimento antecedente da grave e urgente necessidade pública pela Justiça Eleitoral. Ademais, aludidos requisitos não se verificam no caso dos autos.

Segundo a jurisprudência pacífica do TSE, para a configuração da conduta vedada em questão, não é necessário que a mensagem divulgada na publicidade apresente caráter eleitoreiro:

[...]

Assim, o fato – publicidade da obra realizada nos três meses que antecedem as eleições –, ainda que não se possa assegurar sua finalidade eleitoral, subsume-se perfeitamente à norma proibitiva de publicidade de natureza institucional em regência, motivo pelo qual agiu corretamente o juízo de piso ao reconhecer sua irregularidade.

A conduta ora identificada, praticada pelo prefeito e candidato à reeleição EZEQUIEL PASQUETTI, beneficia a chapa majoritária, o que importa em responsabilização do candidato a vice-prefeito, ALDOMIR CANTONI, bem como o PARTIDO PROGRESSISTA (PP), nos termos do art. 73, § 8º, da Lei n. 9.504/97. Desse modo, a decisão deve ser modificada, nesse ponto, de modo a responsabilizar igualmente o PARTIDO PROGRESSISTA (PP), na qualidade de beneficiário.

No que se refere ao segundo fato, consiste na distribuição, pela Prefeitura de Rondinha, no período de três meses que antecedeu as eleições, de uma cartilha (um exemplar juntado à fl. 80), denominada “Informativo Municipal”, contendo 16 páginas coloridas, tamanho tabloide (aprox.), datada de “Março 2016”, na qual são divulgadas realizações sob os tópicos “investimentos”, “obras”, “desenvolvimento”, “educação e cultura”, “saúde”, “agricultura”, “viver bem” e “assistência social”, com a tiragem de 3.500 unidades.

A alegada distribuição do material, em data próxima das eleições, é confirmada unicamente pelo depoimento de Cristiane Ferreira da Luz Lucietto, ouvida na qualidade de informante (audiência – fls. 763-765), ao declarar:

[...]

Vê-se, portanto, que a única prova coletada é insuficiente para comprovar a ocorrência da distribuição do encarte durante o período que antecede as eleições.

Portanto, não tendo restado claramente demonstrada a conduta espúria, deve ser desprovido o recurso dos representantes neste item.

Quanto ao terceiro fato, apontam os representantes que a Prefeitura de Rondinha, durante os meses de julho e agosto de 2016, manteve contrato de publicidade institucional com o site “www.diariors.com.br”, tendo sido, inclusive, veiculadas diversas notícias (fls. 138-146).

Em resposta (fls. 412-148), os representados informaram que qualquer publicação que possa ter ocorrido no período não pode ser imputada à administração municipal, diante da ausência de autorização desta, haja vista que os contratos com os meios de comunicação foram suspensos no período. Juntam, como comprovação de suas alegações, ofícios expedidos em 23.6.2017 (fls. 649-653), e ressaltam a existência da cláusula contratual (fls. 644-653) que afirma: “No período vedado pela legislação eleitoral não haverá publicação e veiculação de informações e reportagens, assim como não haverá repasse de recursos interrompendo o contrato”.

A sentença (fls. 824-828v.) acolheu os argumentos esposados pelos representados e, por consequência, afastou a tese dos representantes.

Evidencia-se, da prova acostada (fls. 138-46), que, no período que antecedeu as eleições, foram, efetivamente, publicadas matérias de natureza institucional no sítio eletrônico “www.diariors.com.br”, cuja empresa era contratada pelo Município de Rondinha (fls. 45-46, 86-87 e 644-645).

Nesse diapasão, colaciono trecho do parecer da Procuradoria Regional Eleitoral (fls.991-1004v.) que, de forma minuciosa, analisou a prova dos autos:

[...]

Importa mencionar que, comprovada a divulgação de publicidade institucional no período vedado, resta configurada a infração ao art. 73, inc. VI, al. “b”, da Lei n. 9.504/97, sendo desnecessária a existência de provas de que o prefeito tenha autorizado a divulgação da referida publicidade ou, ainda, que tenha proibido a sua veiculação por meio de ofícios.

Colaciono os seguintes precedentes do TSE, com situações análogas a dos autos:

[...]

Ressalta-se que não se está reconhecendo a responsabilidade objetiva meramente pela existência da propaganda. No caso, o Chefe do Poder Executivo Municipal deveria ter tomado efetivas providências para impedir e/ou retirar toda e qualquer publicidade, em cumprimento à vedação prevista na legislação eleitoral, principalmente quando as publicidades foram elaboradas pelo assessor de imprensa da prefeitura e continuaram a ser divulgadas pela contratada.

Logo, a sentença deve ser reformada, para o fim de reconhecer a irregularidade da conduta de EZEQUIEL PASQUETTI, na condição de prefeito. Outrossim, a veiculação das referidas matérias em páginas da internet, nas quais os eleitores possuem acesso, importou em benefício ao candidato a vice-prefeito e ao partido participante das eleições majoritárias, o que atrai a aplicação da multa prevista no § 4º do art. 73 da Lei das Eleições.

b) Conduta vedada – art. 73, inc. VII, da Lei n. 9.504/97

Consoante a exordial, o candidato à reeleição EZEQUIEL PASQUETTI, na qualidade de Prefeito de Rondinha, realizou despesas com publicidade no primeiro semestre de 2016 (ano eleitoral), em montante superior à média dos primeiros semestres dos três anos anteriores (2013, 2014 e 2015), contrariando, assim, o art. 73, inc. VII da Lei n. 9.504/97, verbis:

Lei n. 9.504/97:

Art. 73. São proibidas aos agentes públicos, servidores ou não, as seguintes condutas tendentes a afetar a igualdade de oportunidades entre candidatos nos pleitos eleitorais:

[...]

VII - realizar, no primeiro semestre do ano de eleição, despesas com publicidade dos órgãos públicos federais, estaduais ou municipais, ou das respectivas entidades da administração indireta, que excedam a média dos gastos no primeiro semestre dos três últimos anos que antecedem o pleito; (Redação dada pela Lei nº 13.165, de 2015). Grifei.

[...]

§ 1º Reputa-se agente público, para os efeitos deste artigo, quem exerce, ainda que transitoriamente ou sem remuneração, por eleição, nomeação, designação, contratação ou qualquer outra forma de investidura ou vínculo, mandato, cargo, emprego ou função nos órgãos ou entidades da administração pública direta, indireta, ou fundacional.

[...]

§ 4º O descumprimento do disposto neste artigo acarretará a suspensão imediata da conduta vedada, quando for o caso, e sujeitará os responsáveis a multa no valor de cinco a cem mil UFIR.

Os representantes afirmam que a Prefeitura de Rondinha realizou gastos (valor liquidado) com publicidade institucional, no primeiro semestre de 2016 – ano eleitoral –, na quantia de R$ 22.725,24 (vinte e dois mil, setecentos e vinte e cinco reais e vinte e quatro centavos), ou seja, em valor superior à média apurada (R$ 17.318,83) nos primeiros semestres dos últimos três anos (fl. 40):

[...]

Instrui os presentes autos a relação de despesas liquidadas (fls. 128-136),

que foram realizadas pela Prefeitura de Rondinha em publicidade institucional, referentes aos

primeiros semestres dos anos de 2013 a 2016, informações extraídas do Tribunal de Contas do

Estado do Rio Grande do Sul.

O juízo singular, ao apreciar os gastos com publicidade institucional realizados, julgou (fls. 824-828v.):

[...]

Os representados EZEQUIEL PASQUETTI e ALDOMIR CANTONI recorrem (fls. 917-928) da decisão sustentando que os valores não são expressivos a ponto de violar o bem jurídico tutelado, uma vez que o objetivo da norma é garantir a isonomia entre os candidatos. Requereram, com fundamento nos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, que sejam afastadas ou, alternativamente, reduzidas as multas fixadas.

Os representantes, em contrapartida, também interpuseram recurso, requerendo a majoração da pena de multa arbitrada, a condenação do PARTIDO PROGRESSISTA (PP), bem como alegando que tais fatos comprometeram a igualdade de oportunidades entre os candidatos, razão pela qual postulam seja aplicada a pena de cassação do registro e do diploma.

É incontroverso nos autos que, no primeiro semestre do ano de 2016, a Prefeitura de Rondinha realizou gastos com publicidade institucional acima dos efetuados nos primeiros semestres dos anos anteriores, fato que enseja a responsabilidade de EZEQUIEL PASQUETTI, prefeito municipal e candidato à reeleição.

Nas lições de Rodrigo López Zilio, “O objetivo do legislador é sofrear a difusão de publicidade institucional em ano eleitoral, afetando a voluntariedade de opção de sufrágio do eleitor, com quebra na igualdade de oportunidade entre os candidatos.” (em Direito Eleitoral. 5.ed., Porto Alegre: Verbo Jurídico, 2016. p. 621.)

A conduta é vedada pela legislação eleitoral em vista de sua natural capacidade de prejudicar a igualdade entre os candidatos, daí porque é pacífica a jurisprudência sobre o caráter objetivo da ilicitude. Veja-se:

[...]

Cabe ressaltar que a conduta vedada foi praticada pelo então prefeito e candidato à reeleição, EZEQUIEL PASQUETTI, em favor das eleições majoritárias, razão pela qual o representado e candidato a vice-prefeito, ALDOMIR CANTONI, bem como o PARTIDO PROGRESSISTA (PP) figuram como beneficiários, nos termos do § 8º, art. 73 da Lei n. 9.504/97: “§ 8º Aplicam-se as sanções do § 4º aos agentes públicos responsáveis pelas condutas vedadas e aos partidos, coligações e candidatos que delas se beneficiarem”.

Nesse sentido, é a jurisprudência:

[...]

Portanto, tanto o candidato a vice-prefeito quanto o partido da chapa majoritária restaram beneficiados pela publicidade institucional ilícita, razão pela qual a sanção deve alcançar a ambos.

Inaplicável, na espécie, o princípio da proporcionalidade ou da razoabilidade, como pretendem os representados, para fins de eximir o responsável e os beneficiados de qualquer sanção, sob pena de tornar inócua a norma proibitiva. Consoante a jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral, em verdade, o princípio da proporcionalidade deve ser observado para fins de fixação da multa a que se refere o § 4º – respeitando-se o máximo e o mínimo legal – ou ainda para as penas de cassação de registro e de diploma estabelecidas no § 5º, hipótese em que deve ser levada em conta a gravidade da conduta.

A infração à legislação em comento enseja, desde logo, a aplicação da pena de multa, cuja análise da gravidade, a ensejar a fixação ou até mesmo o reconhecimento do abuso de poder, será realizada, ao final, levando-se em consideração o conjunto probatório.

c) Conduta vedada – art. 73, § 10, da Lei n. 9.504/97

Consta da inicial que o candidato a reeleição pela Prefeitura de Rondinha, EZEQUIEL PASQUETTI, teria repassado o valor de R$ 45.000,00 (quarenta e cinco mil reais) à Associação dos Produtores de Suínos do Rio Grande do Sul (ACSURS), com a intenção de subvencionar o “42ª Dia Estadual do Porco”, evento este realizado no dia 12 de agosto de 2016 em Rondinha.

Os representantes sustentaram que a conduta se enquadra na vedação prevista no art. 73, § 10, da Lei n. 9.504197, que trata da vedação da distribuição gratuita de bens, valores ou benefícios por parte da Administração, exceto nos casos de calamidade pública, de estado de emergência ou de programas sociais autorizados em lei e já em execução orçamentária no exercício anterior.

Destacam o montante do valor repassado (R$ 45.000,00), cujo ato teria caracterizado a prática de abuso do poder político e econômico e, ao final, requereram a cassação dos registros ou diplomas dos demandados EZEQUIEL PASQUETTI e ALDOMIR CANTONI, bem como a sanção de inelegibilidade para as eleições que se realizassem nos 8 (oito) anos após o pleito.

A juíza eleitoral julgou improcedente o pedido com base nos seguintes fundamentos (fls. 824-828v.):

[...]

Em suas razões recursais, os representantes defenderam (fls. 833-915) que, no caso em tela, não se trata de calamidade ou estado de emergência e que, quanto aos programas sociais, não foram atendidos os requisitos previstos na norma, quais sejam, estarem autorizados em lei e já em execução orçamentária no exercício anterior.

Primeiramente, cumpre diferenciar, para fins de incidência, a conduta prevista no inc. IV daquela contida no § 10 do art. 73 da Lei das Eleições.

[...]

Feitas essas considerações, importa referir que o evento – 42º Dia Estadual do Porco –, subvencionado pela Prefeitura, destinou recursos à Associação dos Produtores de Suínos do Rio Grande do Sul (ACSURS), a quem incumbiu a sua realização/execução.

De acordo com a linha exegética adotada pelo Tribunal Superior Eleitoral, os bens, valores, auxílios ou benefícios objetos da vedação do art. 73, § 10, da Lei n. 9.504/97 são aqueles de cunho assistencialista, como a distribuição de animais (RO n. 149655/AL, DJE de 24.2.2012, rei. Mm. Arnaldo Versiani); as isenções tributárias (Cta n. 153169/DE, DJE de 28.10.2011, rei. Mm. Marco Aurélio); a distribuição de bens de caráter assistencial (AgR-Al n. 116967/RJ, DJE de 17.08.2011, rei. Min. Nancy Andrighi); a distribuição de cestas básicas (AgR-REspe n. 997906551/SC, DJE de 19.4.2011, rei. Min. Aidir Passarinho); a doação de bens perecíveis (Pet n. 100080/DE, DJE de 24.8.2010, rei. Mm. Marco Aurélio); e o repasse de valores destinados à assistência social (Cta n. 95139/DF, DJE de 4.8.2010, rei. Mm. Marco Aurélio).

Nessa acepção, a transferência de recursos, para uma associação civil, de âmbito estadual, sem fins lucrativos, com vistas ao fomento à atividade econômica da suinocultura, não se enquadra no conceito de “distribuição gratuita de bens, valores ou benefícios”.

Cito a seguinte ementa do Tribunal Superior Eleitoral:

[...]

Salienta-se que a referida festividade reúne suinocultores de todo o Rio Grande do Sul, faz parte do calendário estadual de eventos desde 1974 (fl. 466) e se encontra em sua 42º edição.

Não por acaso, este Tribunal já se manifestou, por exemplo, favoravelmente à promoção da divulgação, pelo Governo do Estado do Rio Grande do Sul, da tradicional feira agropecuária Expointer:

[...]

Nesse contexto, deve ser mantida a decisão proferida pelo juízo singular que julgou improcedente a representação por infração ao art. 73, § 10, da Lei das Eleições.

d) Abuso de autoridade – art. 74 da Lei n. 9.504/97 c/c art. 37, § 1º, CF

O desrespeito ao princípio da impessoalidade, na propaganda institucional, no período de três meses anteriores ao pleito, com reflexos na disputa, configura o abuso e a violação ao art. 74 da Lei n. 9.504/97 (TSE. Ac. n. 5304, de 25.11.2004, rel. Min. Luiz Carlos Madeira).

Os representantes sustentam a ocorrência de violação ao art. 74 da Lei n. 9.504/97 e art. 37, § 1º, da Constituição Federal:

Lei n. 9.504/97:

[...]

Consoante a jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral, a caracterização do abuso de autoridade previsto no art. 74 da Lei n. 9.504/97 requer seja demonstrada, de forma objetiva, afronta ao disposto no art. 37, § 1º, da CF, ou seja, que haja ruptura do princípio da impessoalidade com a menção na publicidade institucional a nomes, símbolos ou imagens, que caracterizem promoção pessoal ou de servidores públicos (TSE. Ac. De 3.12.2013 no REspe n. 44530, rel. Min. Luciana Lóssio).

Já para a configuração do abuso, é irrelevante o fato de a propaganda ter ou não sido veiculada nos três meses antecedentes ao pleito (TSE. Ac. n. 25101, de 9.8.2005, rel. Min. Luiz Carlos Madeira).

Prossigo.

A representação proposta (fls. 02-74) menciona que o candidato à reeleição EZEQUIEL PASQUETTI, ao assumir a Prefeitura em 2012, passou a padronizar os órgãos públicos e demais estruturas com as cores de seu partido, formando um padrão visual na cor azul claro, com detalhes em vermelho e branco.

Para além da pintura de bens públicos com as cores da campanha eleitoral, os representantes alegaram que o candidato usou a tinta adquirida pela Prefeitura para pintar seu comitê eleitoral, a qual teria sido transportada por um veículo da Prefeitura em horário de expediente.

Os representantes juntaram diversas fotos de obras do município, do prédio onde instalado o comitê de campanha dos representados, além do veículo responsável pelo suposto transporte das tintas (fls. 152-70).

Em juízo (audiência – fls. 763-5), procedeu-se à oitiva da informante Cristiane Ferreira da Luz Lucietto, responsável pelas fotos obtidas (fls. 168-9), a qual afirmou ter presenciado uma Kombi da Prefeitura estacionada em frente ao prédio do comitê de campanha dos representados, porém negou ter visto o transporte das latas de tinta.

A sentença (fls. 824-828v.) muito bem analisou os fatos, ao considerar insuficiente a prova acerca da padronização visual das obras do município, cujas razões adoto:

[...]

Narram os representantes, também, um possível desvio de finalidade em razão da confecção do “Informativo Municipal” (fl. 80) – já descrito no item referente à infração ao art. 73, inc.VI, al. "b", da Lei n. 9.504/97 –, o qual teve por objetivo a promoção pessoal dos representados EZEQUIEL PASQUETTI e ALDOMIR CANTONI, candidatos à chapa majoritária, bem como dos vereadores DEJANE INES ZORZI TONIN, NEREI PERGHER, EDUARDO ZORZI e MARILAINE DE MORAES.

Indicam, em suma, que o mencionado material utiliza expressões que enaltecem a imagem dos referidos candidatos, promovendo a continuidade da atual gestão, bem como faz uso de fotos pessoais, associando obras públicas e projetos municipais.

Conforme já analisado (item “a”), a prova dos autos é insuficiente para comprovar a ocorrência da distribuição do encarte durante o período que antecede as eleições, o que afasta, portanto, a incidência do art. 74 da Lei n. 9.504/97, restando unicamente a análise do possível abuso.

Por óbvio, a veiculação da cartilha, tendo por conteúdo informações sobre atos e obras de governo, trouxe alguma exposição à imagem do prefeito, enquanto administrador do município. Isso, todavia, não caracterizou desvio de finalidade de modo a configurar abuso.

Não se verificou, ainda que de forma subliminar, qualquer intenção de exaltar a figura do gestor em detrimento de outras administrações.

Da mesma forma, não se pode concluir que sobressai a finalidade eleitoral, pois os dizeres veiculados estão desprovidos de menções a eventual candidatura, restringe-se à divulgação dos atos da atual Administração, sem extrapolar seu caráter informativo. Não se depreende de seu conteúdo a intenção de massificar a imagem do candidato, com vistas à captação dos eleitores.

Ademais, impõe-se destacar que nada indica que os eleitores tenham associado as matérias à continuidade dos candidatos apoiados pelo então prefeito.

Nesse sentido, colho a seguinte jurisprudência:

[...]

Por essas razões, não restou configurado o desvio de finalidade – art. 36, § 1º, da Constituição Federal – e, por consequência, o alegado abuso de autoridade e/ou poder – art. 22 da Lei Complementar n. 64/90.

e) Do abuso de poder – art. 22, inc. XIV, LC n. 64/90

O art. 14, § 9º, da Constituição Federal, assegura a defesa da normalidade e legitimidade das eleições:

[...]

Dele deflui a Lei Complementar n. 64/90, na qual se encontra a AIJE (art. 22), cuja finalidade precípua é apurar o abuso do poder econômico ou político (ou emanado de autoridade), bem como a utilização indevida de veículos ou meios de comunicação social em benefício de candidato ou partido político.

Para a procedência da AIJE, requer-se seja demonstrada, modo inequívoco, a violação do bem jurídico protegido, qual seja, a normalidade e legitimidade do pleito.

Uma vez configurado o ilícito, a procedência da representação instrumentalizada leva à declaração de inelegibilidade, por oito anos - de todos os que hajam para ele contribuído - e à cassação do registro ou do diploma do candidato beneficiado.

Esta a legislação de regência:

[...]

Importante destacar, ainda, que, dadas as características do processo eleitoral, algumas vezes um só fato ou conjunto de fatos pode caracterizar abuso de poder econômico ou político, utilização indevida dos meios de comunicação e, ainda, prática de conduta vedada.

Trata-se, pois, de AIJE por abuso de poder, supostamente praticado pelo representado EZEQUIEL PASQUETTI, subsistindo os seguintes fatos, em razão de terem sido afastados os demais:

a) publicidade institucional mediante a realização, no dia 05 de julho de 2016, de uma reunião pública de apresentação do “Plano de Controle de Cheias do Arroio Lambari – Projeto de Reservatório de Detenção de Águas Pluviais Município de Rondinha”;

b) manutenção de contrato de publicidade institucional, durante os meses de julho e agosto de 2016, com o site “www.diariors.com.br”, tendo sido, inclusive, veiculadas diversas notícias (fls. 138-46); e c) realização de despesas com publicidade no primeiro semestre de 2016 (ano eleitoral), em montante superior à média dos primeiros semestres dos três anos anteriores (2013, 2014 e 2015).

De início, cumpre pontuar que o que interessa à Justiça Eleitoral é perquirir sobre o comprometimento da normalidade e legitimidade do pleito em virtude das práticas a ele imputadas.

Assim, o que importa analisar é se realmente houve lançamento antecipado e promoção indevida da candidatura de EZEQUIEL PASQUETTI e ALDOMIR LUIZ CANTONI e se tais fatos possuíram gravidade bastante para comprometer a normalidade e legitimidade do pleito de 2016.

E, na espécie, tenho que as três condutas, consubstanciadas na realização e/ou gastos com publicidade institucional, não possuem gravidade suficiente a ensejar as graves sanções previstas no art. 22, inc. XIV, da LC n. 64/90.

É bem verdade que existe presunção de dano à regularidade das eleições relativamente às condutas previstas no art. 73 da Lei n. 9.504 /97 (TSE. AgR-AI 11.488/PR, Rel. Min. Arnaldo Versiani, DJe de 30.11.2009).

Impõe-se destacar que, em sede de Ação de Investigação Judicial Eleitoral, ainda que se possa aventar de possível desrespeito à lei eleitoral, tal fato, por si só não é capaz de dar ensejo à procedência da demanda, porquanto a configuração do abuso de poder requer a demonstração da gravidade das circunstâncias que o caracterizam, nos termos do art. 22, inc. XVI, da LC n. 64/90, in verbis:

[...]

Dessa forma, cabe ao julgador analisar o caso sob a perspectiva da gravidade dos fatos.

Sobre o alcance do termo “abuso” para a efetiva configuração do ilícito eleitoral, José Jairo Gomes leciona que (Direito Eleitoral, Del Rey, Belo Horizonte, 5ª Edição, 2010, p. 167):

[...]

Para que se caracterize o ilícito eleitoral, portanto, faz-se necessária a presença de um enaltecimento excessivo dos atos de governo e/ou referências maciças às qualidades de determinado candidato.

Assim, o que se verifica na espécie é a veiculação de informações concernentes à administração do município, sem referências, ainda que indireta, à candidatura dos representados.

[...]

O Egrégio Tribunal Superior Eleitoral tem-se pronunciado acerca da necessidade imperativa de avaliar a proporcionalidade da conduta de modo a amparar as severas sanções de cassação de diploma e de inelegibilidade por abuso de poder, previstas no art. 22 da LC 64/90:

[...]

Em resumo, considero que o contexto fático delineado nos autos conduz à convicção de que a conduta investigada não se revelou suficientemente grave a ponto de comprometer a higidez do processo eleitoral e, consequentemente, configurar ato abusivo capaz de acarretar a severa pena de cassação de diploma e de inelegibilidade, nos termos exigidos no inc. XVI do art. 22 da Lei Complementar n. 64/90.

(grifos no original.)

Isso equivale a dizer que os presentes embargos se revestem da tentativa de rediscussão da matéria, hipótese que não encontra abrigo nesta espécie recursal.

Nesse sentido a jurisprudência:

Embargos de declaração. Ação de investigação judicial eleitoral. Improcedência. Omissão e contradição. Art. 275, inc. II, do Código Eleitoral. Ausentes os vícios para o manejo dos aclaratórios. Inexistente omissão ou contradição a ser sanada. Decisão devidamente fundamentada, na qual debatidos os pontos trazidos pelo embargante.

Tentativa de rediscussão da matéria já apreciada, o que descabido em sede de embargos. Rejeição.

(TRE-RS – E.Dcl. 301-12.2016.6.21.0092 – Rel. DES. CARLOS CINI MARCHIONATTI – J. Sessão de 11.5.2017)

 

Embargos de declaração. Acórdão que negou provimento a recurso contra sentença de procedência em representação por doação para campanha acima do limite legal.

Alegada ocorrência de contradição e obscuridade no exame de matéria essencial ao deslinde da controvérsia. Descabimento da tese invocada e impossibilidade de inovação temática em sede de embargos.

Enfrentamento de todas as questões necessárias ao deslinde da questão.

Desacolhimento.

(TRE/RS – RE n. 6210 – Rel. Desa. Federal Maria Lúcia Luz Leiria – J. Sessão de 10.7.2012.)

 

Ao julgador cabe apreciar a questão conforme o que ele entender relevante à lide. Não está o Tribunal obrigado a julgar a questão posta a seu exame nos termos pleiteados pelas partes, mas sim com o seu livre convencimento, consoante dispõe o art. 131 do CPC, utilizando-se dos fatos, provas, jurisprudência, aspectos pertinentes ao tema e da legislação que entender aplicável à espécie. [...]

(STJ – REsp 521120 – Rel. Min. Nancy Andrighi – 3ª Turma – DJE de 5.03.2008.)

 

Logo, por não vislumbrar razões para o acolhimento pleiteado, a decisão embargada deve ser mantida nos seus exatos termos.

Diante do exposto, VOTO pelo conhecimento e pela rejeição dos embargos declaratórios opostos pela COLIGAÇÃO A FORÇA DA MUDANÇA, CLÓVIS ALBERTO GELAIN, AMARILDO LUIZ PITOL, PARTIDO DEMOCRÁTICO TRABALHISTA - PDT e PARTIDO DOS TRABALHADORES - PT.