E.Dcl. - 39133 - Sessão: 14/11/2017 às 17:00

RELATÓRIO

Cuida-se de embargos de declaração, fls. 341-354, opostos por CLAUDIOMIRO GABBI PEZZETA em face do acórdão das fls. 332-337, o qual manteve, por unanimidade, sentença de desaprovação de contas relativas às eleições de 2016, determinada em sentença.

Em suas razões, sustenta ter interposto recurso alegando a) extemporaneidade da manifestação do MPE; b) a utilização de documentação não judicializada; c) a inobservância dos princípios da ampla defesa e do contraditório; d) a inexistência de pedido de julgamento de rejeição das contas pelo MPE e a impossibilidade de reabertura do prazo para elaboração de novo parecer; e) a ausência de relação dos documentos com o candidato, e f) a ausência de relação dos documentos com a campanha.

A partir de tais pontos, entende que o acórdão manteve, de maneira obscura e contraditória, a sentença de rejeição das contas do embargante.

Arrola uma série de contradições e omissões, as quais “embasaram a conclusão do voto condutor no que se refere ao aproveitamento da prova não judicializada como meio para firmar a convicção do juízo e a violação aos princípios do devido processo legal, contraditório e a ampla defesa”, quais sejam:

(1) a matéria submetida ao Tribunal não se propôs a discutir a utilização da prova emprestada, mas sim que “em momento algum foi possível contraditar os referidos elementos na mesma maneira de sua produção (testemunhal) por conta da natureza do seu surgimento (expediente investigativo)”;

(2) a ausência de contraditório nos “expedientes” eleitorais originários, para entender que o ponto relevante a ser enfrentado pelo acórdão dizia respeito em admitir as provas da forma com que se originaram, “em procedimento de prestação de contas onde não há qualquer produção probatória capaz de o embargante produzir depoimentos em juízo”;

(3) entende como contradição o fato de ter sido admitida a prova coletada como judicializada e, no entanto, ter sido afastada a existência de supostos gastos com alimentação sob o argumento de que as declarações tomadas no Ministério Público não foram repetidas em juízo;

(4) a submissão dos elementos obtidos nos “expedientes” somente poderá ocorrer nos autos de AIJE, distribuída na Zona Eleitoral em 12.12.2016, após a prolação de sentença no processo de prestação de contas e, considerando tal circunstância, não poderia ter sido indeferido o pedido do embargante, de utilização de provas, por juntada extemporânea;

(5) o acórdão desobedeceu os limites do efeito devolutivo, tendo firmado entendimento com base em documentos cuja análise não foram levados em consideração pelo Juízo de 1º Grau;

(6) a decisão do Tribunal se omitiu relativamente aos argumentos que justificariam as anotações existentes nas agendas apreendidas no posto de combustíveis;

(7) é obscuro o item do acórdão que autorizou a utilização de suposta prova emprestada e, ao mesmo tempo, negou o direito de apresentação de contraprova;

(8) o acórdão não restou fundamentado no relativo à aplicação dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, tendo em vista a inexistência de comprovação de má-fé.

Pugna pelo prequestionamento e o provimento dos embargos, para sejam sanados os vícios apontados.

É o relatório.

VOTO

O recurso é regular, tempestivo e comporta conhecimento.

Os aclaratórios merecem ser rejeitados, em que pese a alentada petição.

Aos vícios apontados:

(1) a matéria submetida ao Tribunal não se propôs a discutir a utilização da prova emprestada, mas sim que “em momento algum foi possível contraditar os referidos elementos na mesma maneira de sua produção (testemunhal) por conta da natureza do seu surgimento (expediente investigativo)”;

(2) a ausência de contraditório nos “expedientes” eleitorais originários, para entender que o ponto relevante a ser enfrentado pelo acórdão dizia respeito em admitir as provas da forma com que se originaram, “em procedimento de prestação de contas onde não há qualquer produção probatória capaz de o embargante produzir depoimentos em juízo”;

(3) entende como contradição o fato de ter sido admitida a prova coletada como judicializada e, no entanto, ter sido afastada a existência de supostos gastos com alimentação sob o argumento de que as declarações tomadas no Ministério Público não foram repetidas em juízo;

(4) a submissão dos elementos obtidos nos “expedientes” somente poderá ocorrer nos autos de AIJE, distribuída na Zona Eleitoral em 12.12.2016, após a prolação de sentença no processo de prestação de contas e, considerando tal circunstância, não poderia ter sido indeferido o pedido do embargante, de utilização de provas, por juntada extemporânea;

(5) o acórdão desobedeceu os limites do efeito devolutivo, tendo firmado entendimento com base em documentos cuja análise não foram levados em consideração pelo Juízo de 1º Grau;

(6) a decisão do Tribunal se omitiu relativamente aos argumentos que justificariam as anotações existentes nas agendas apreendidas no posto de combustíveis;

(7) é obscuro o item do acórdão que autorizou a utilização de suposta prova emprestada e, ao mesmo tempo, negou o direito de apresentação de contraprova;

(8) o acórdão não restou fundamentado no relativo à aplicação dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, tendo em vista a inexistência de comprovação de má-fé.

Não procede.

O embargante repisa questões já pontuadas.

Em resumo, a irresignação se dá porque em três ações eleitorais, de n. 363-65.2016.6.21.0023 (Representação com busca e apreensão, apensa), n. 366-20.2016.6.21.0023 (notícia-crime, apensa) e n. 368-87.2016.6.21.0023 (petição) houve a colheita de elementos de prova que contribuíram para o juízo de reprovação das contas.

O argumento central é que lá, naqueles procedimentos, não houve oportunidade de manifestação, o que ofenderia os princípios do contraditório e da ampla defesa.

Todavia, já restou assentado que a oportunidade de exercício do contraditório e da ampla defesa ocorreram aqui, nestes autos. O embargante teve oportunidade para se manifestar, fls. 209-220.

Ou seja: a prova que adentrou ao presente processo é judicializada, pois submetida ao crivo de Magistrado Eleitoral nos autos n. 363-65.2016.6.21.0023, n. 366-20.2016.6.21.0023 e n. 368-87.2016.6.21.0023. Como se tratavam de meios de prova cujo oferecimento de contraditório tornaria inócua a própria produção, o contraditório, por óbvio, restou transferido para os processos em que poderá haver a cominação de sanções: esta prestação de contas e a ação de investigação judicial eleitoral, citada pelo próprio embargante.

Nessa linha, trecho do acórdão embargado:

Na sequência, o recorrente argumenta que documentação não judicializada e estranha à lide não poderia ter sido juntada aos autos.

Pelo que consta na petição da fl. 16 e v., o Ministério Público afirma que os documentos contestados são “provas obtidas nos autos dos expedientes números 363-65.2016.6.21.0023, 366-20.2016.6.21.0023 e, 368-87.2016.6.21.0023”.

A numeração identifica ações em trâmite na 23ª Zona Eleitoral – Ijuí, das quais a mais antiga foi protocolada em 01.10.2016, o que afasta o argumento de ser documentação não judicializada. Nesses feitos, foram autorizadas a interceptação telefônica e a ordem de busca e apreensão de documentos, em procedimento que foi denominado “Operação Caixa de Pandora” (fl. 41).

Observo também que a documentação foi admitida nos autos como prova emprestada, com expressa autorização judicial para o compartilhamento (fl. 17), e que o recorrente teve oportunidade de sobre essa se manifestar, o que permite a análise conjunta da preliminar de nulidade pelo aproveitamento de provas imputadas unilaterais.

Daí a diferença do depoimento tomado unicamente pelo Ministério Público e, portanto, afastado por não estar judicializado: nas razões de embargo, o embargante confunde (1) a submissão da produção de prova à autoridade judiciária constitucionalmente competente (circunstância que nitidamente a judicializa), do (2) oferecimento do contraditório – ocorrido nesta prestação de contas, repito. Se o depoimento tomado pelo Parquet tivesse sido repetido em qualquer daqueles processos, poderia ser também aqui utilizado, após a concessão de oportunidade de manifestação do prestador de contas – garantido o contraditório, daí.

Ressalto que, nestes autos, na oportunidade oferecida para que se manifestasse, o embargante alegou, resumidamente, a impertinência da documentação, a qual não guardaria relação com o processo de prestação de contas.

A prova foi judicializada mediante a manifestação do Juiz Eleitoral da 23ª ZE nas três ações indicadas, e houve oportunidade de que a parte se manifestasse sobre o teor no feito em que ela poderia repercutir em sua esfera jurídica, qual seja, a presente prestação de contas.

Ainda, quanto à obscuridade alegada, de indeferimento do pedido de apresentação de “contraprova”, indico que, conforme despacho constante à fl. 325, este processo estava pautado para julgamento em 02.8.2017, e a retirada de pauta ocorreu devido a requerimentos apresentados às vésperas da sessão (27.7.2017, fls. 269 e 322) para que os procuradores do embargante pudessem acompanhar audiência da AIJE n. 682-33.2016.6.21.0023.

O deferimento se deu ao merecido respeito ao exercício da advocacia, decisão que sequer seria necessária, exatamente pela outorga de poderes a vários advogados, fls. 11 e 189.

Tivessem sido apresentados documentos juntamente ao recurso, eles seriam certamente considerados.

Esse foi o motivo do indeferimento de apresentação da dita “contraprova”: a sua absoluta extemporaneidade relativamente ao momento de instrução deste processo de prestação de contas.

No que diz respeito a uma suposta desobediência ao princípio do dispositivo, merece relevo o fato de que o acórdão deve dialogar com a peça recursal e eventuais contrarrazões.

Contudo, tal diretiva não impede que, para a construção da fundamentação, a análise de todo o acervo probatório. Foi o que ocorreu.

Para além, a fundamentação embargada fez referência a um argumento expresso do recorrente nas suas razões, qual seja, de que “os documentos juntados não possuem relação com o candidato ou com a campanha eleitoral”.

Transcrevo, novamente, trecho da sentença:

O recorrente argumenta que os documentos juntados não possuem relação com o candidato ou com a campanha eleitoral, e alega que o julgamento foi amparado em meras presunções.

De fato, há que se reconhecer que grande parte da documentação colacionada nestes autos não tem relação com CLAUDIOMIRO GABBI PEZZETTA.

No entanto, parte dela, em especial os documentos abaixo, comprovam a aquisição e o pagamento de combustível, pelo recorrente, junto ao Posto Burmann:

- cheque emitido pelo candidato (pessoa física) em 24.9.16, pós-datado para 10.11.2016, no valor de R$ 8.184,00, em favor de POSTO BURMANN (fls. 25 e 82);

- vale-combustível com as iniciais CP, assinatura do Posto de Combustíveis Burmann e seus responsáveis (fl. 28);

- anotação em agenda apreendida no posto de combustíveis que registra a aquisição de combustível por CLAUDIOMIRO PEZZETTA, no valor de R$ 2.260,00 (fl. 32);

- anotação em agenda apreendida no posto de combustíveis, com o registro “CLAUDIOMIRO PEZZETTA (TIRAR NOTAS) 1.000,00” e “CLAUDIOMIRO PEZZETA 55,00” (fl. 34);

- declarações acerca do candidato (fls. 37-40);

- impresso do posto de combustível registrando o nome do candidato e o valor de R$ 643,00, com data de 01.10.2016 (fl. 135);

- cupons fiscais do estabelecimento, com identificação do candidato (fl. 136); e

- comprovantes apreendidos na residência do candidato (fl. 145).

Trago relevo à apreensão do cheque emitido pelo candidato (pessoa física) em 24.9.16, pós-datado para 10.11.2016, no valor de R$ 8.184,00, em favor de POSTO BURMANN. A cártula, examinada em conjunto com os demais documentos constantes do processo, permite concluir que o recorrente adquiriu considerável quantidade de combustível e o distribuiu em forma de vales durante a campanha eleitoral, omitindo tais gastos em sua prestação de contas.

Grifei.

Ora, os fundamentos de decisão podem, por óbvio, observar todo o contexto da prova; estando o tribunal revisor impedido, apenas, de tornar mais grave a situação jurídica do recorrente, de forma objetiva (reformatio in pejus), o que não ocorreu no caso.

No que diz respeito à alegada omissão na aplicação dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, que adviria da ausência de má-fé, indico que a imperatividade da reprovação das contas, e a adoção total da sentença recorrida, foram destacadas expressamente, circunstância que logicamente afasta, por si só, a vindicada aplicação dos postulados constitucionais, como é possível concluir do seguinte trecho do acórdão:

A legislação eleitoral determina que todos os gastos realizados em campanha devem ser efetuados pela pessoa jurídica do candidato, passando pela conta bancária e, posteriormente, registrados na prestação de contas. Vejamos:

Art. 22. É obrigatório para o partido e para os candidatos abrir conta bancária específica para registrar todo o movimento financeiro da campanha.

[...]

§ 3o O uso de recursos financeiros para pagamentos de gastos eleitorais que não provenham da conta específica de que trata o caput deste artigo implicará a desaprovação da prestação de contas do partido ou candidato; comprovado abuso de poder econômico, será cancelado o registro da candidatura ou cassado o diploma, se já houver sido outorgado.

Comprovada nos autos a aquisição de combustível sem a observância das disposições legais, é imperativa a rejeição das contas.

Assim, a decisão combatida deve ser mantida em sua integralidade, confirmando a reprovação da prestação de contas do candidato.

 

Com essas considerações, VOTO pela rejeição dos embargos de declaração.