RE - 50427 - Sessão: 07/11/2017 às 17:00

(Voto divergente)

Senhor Presidente, peço vênia para divergir do voto lançado pelo eminente relator quanto ao reconhecimento da ilicitude da interceptação telefônica.

Não se duvida que a escuta de conversas telefônicas seja um meio de prova excepcional, submetido à reserva de jurisdição e condicionado à inexistência de “outros meios disponíveis” para apurar os fatos, conforme exige o art. 2º, inc. II, da Lei n. 9.296/96.

O digno relator concluiu que o deferimento da interceptação com base unicamente na certidão lavrada pelo chefe de cartório não seria suficiente para justificar a medida, tendo em vista entendimento da Suprema Corte no sentido de que denúncias anônimas não bastam ao deferimento da interceptação telefônica.

Todavia, entendo que a interceptação foi legalmente deferida. O órgão ministerial, ao tomar ciência de supostos ilícitos eleitorais, por meio da certidão cartorária, instaurou os pertinentes procedimentos de investigação e requereu ao juiz eleitoral a quebra do sigilo de comunicação telefônica.

Diante da peculiaridade temporal do caso, a interceptação era efetivamente o único meio disponível, considerando que a notícia foi recebida apenas três dias antes do pleito. Qualquer medida adicional que fosse exigida levaria inevitavelmente ao perecimento da investigação, pois não havia tempo hábil para diligências complementares antes da eleição, quando os supostos delitos findariam.

Além disso, a certidão que deu início à apuração dos ilícitos não pode ser comparada a mera denúncia anônima. As certidões públicas gozam de presunção de veracidade e legitimidade e o documento dos autos, especificamente, relatou não apenas um fato, mas diversas ocorrências, omitindo o nome dos eleitores envolvidos em respeito ao receio dos próprios noticiantes de sofrerem represálias.

Assim, verificando-se as peculiaridades do caso, a autorização de quebra do sigilo de comunicação observou os requisitos constitucionais e legais exigidos para a medida.

Agrego, ainda, às minhas razões, as precisas considerações tecidas pelo ilustre Procurador Regional Eleitoral:

As interceptações telefônicas foram autorizadas por magistrado competente, dentro dos parâmetros preestabelecidos pela Lei 9.296/96, inclusive no que concerne ao amplo e irrestrito acesso ao seu resultado pelos recorrentes.

Conforme documentado em termo de audiência (fl. 245), as defesas confirmaram que receberam as senhas para ter acesso às interceptações e ao procedimento que autorizou a interceptação, concordando que não haveria qualquer nulidade no que tange a esse aspecto.

A autorização judicial para a quebra do sigilo telefônico de FERNANDO OSCAR CLASSMANN levou em consideração: (1) o teor da certidão expedida pelo Chefe do Cartório Eleitoral de Santa Rosa, no sentido de que “durante a atividade Cartorária, a Justiça Eleitoral vem recebendo inúmeras denúncias, no sentido de que os candidatos Miro Jesse e Fernando Classmann estariam abusando do poder econômico, promovendo ampla e [in]discriminada compra de votos, nas eleições municipais de 2016” (fl. 18); (2) o fato de faltarem, na ocasião, apenas três dias para a realização do pleito; e (3) a cominação de pena de reclusão ao crime de corrupção eleitoral (fl. 147-153), estando, portanto, conforme à Lei 9.296/96.

Ressalta-se, conforme sinalado pelo MPE à origem, que a indispensabilidade da prova é evidente, já que o único meio de que se dispunha, a poucos dias do pleito, para a investigação das ilicitudes delatadas. Por certo, qualquer outra medida por parte do Ministério Público iria frustrar completamente a investigação.

Também a decisão recorrida realiza percuciente análise da situação, merecendo ser transcrita:

I.1.1. POR QUE NÃO HÁ IRREGULARIDADE NA INTERCEPTAÇÃO TELEFÔNICA?

Não há qualquer irregularidade na interceptação telefônica. A interceptação telefônica foi realizada com a minha autorização judicial. Mais: fundamentei, como deve ser fundamentada, a decisão, atendendo a todas as normativas inerentes à espécie, bastando, para comprovar o que digo, verificar a decisão, acima reproduzida, e o alvará de autorização de fls. 190-196.

O prazo legal também foi obedecido.

No mais, a interceptação era indispensável, pois era o único meio de que se dispunha para a investigação. Qualquer outra medida por parte do Ministério Público, a poucos dias do pleito, como no caso, iria frustrar completamente a investigação. E aqui reside a imprescindibilidade da prova.

Assim, postular a interceptação telefônica era a medida mais acertada pelo Ministério Público Eleitoral para poder obter a difícil prova sobre a ilicitude de compra e venda de votos. Nesse sentido, apenas para exemplificar, vejam-se os fundamentos dos seguintes acórdãos do TRE/RS aplicáveis ao caso (julgamentos dos RE 308- 10.2012.6.21.0103 e RE 305-55.2012.6.21.0103):

“Sabe-se que, dada a popularização da telefonia, é por este meio que se estabelecem contatos de toda a sorte, mesmo que para o crime ou para a prática ilícita. A natureza das condutas investigadas não é do tipo de atividades que se façam em praça pública, a altos brados, razão pela qual a prova destas práticas exige a interceptação (artigo 2º, II, da Lei das Interceptações). Assim, é evidente que restaram presentes todas as condições para que se estabelecesse a quebra do sigilo telefônico que, requerida, foi judicialmente concedida por ordem devidamente fundamentada, em estrita observância às regras jurídicas vigentes”.

Ainda sobre a imprescindibilidade da interceptação telefônica em casos como o ora em apreciação, dissertou o Des. Luis Felipe Paim Fernandes, Desembargador do TRE/RS, por ocasião da prolação do voto condutor dos recursos eleitorais interpostos contra as sentenças proferidas nas mesmas representações eleitorais RE 308- 10.2012.6.21.0103 e RE 305-55.2012.6.21.0103 do Município de São José do Ouro, que praticamente trataram da mesma matéria aqui discutida:

“A excepcionalidade desses instrumentos de investigação, contudo, não os exclui, a priori, do acervo probatório. Sempre que necessários, e que se façam presentes, os requisitos legais são legítimos, ainda, que sejam invasivos e desconfortáveis aos investigados. Adstritos ao cumprimento das regras inerentes ao Estado Democrático de Direito, são mecanismos eficazes ' e muitas vezes exclusivos ' para apuração da verdade. A pequena cidade de São José do Ouro, premida pelo embate político e pelo próprio poder público, viu-se mergulhada num cenário patológico, no qual eleitores, candidatos e agentes públicos consorciaram-se para um balcão de escambo de votos por benesses. Daí que o Estado, postas essas circunstâncias, precisa valer-se da excepcionalidade para restaurar a normalidade. Num quadro tal como o desenhado, o fato de a fagulha inicial das investigações ter sido oriunda de fonte anônima é bastante comum, dado o receio natural das represálias e das perseguições, passíveis até de comprometer a integridade física do denunciante”.

[…]

I.1.3. POR QUE AS DECISÕES DO STJ E DO STF COLACIONADAS PELA DEFESA DE FERNANDO OSCAR CLASSMANN NÃO SE ADEQUAM AO CASO OBJETO DA PRESENTE INVESTIGAÇÃO

A defesa do investigado Fernando Classmann colacionou ementa de julgado do STJ às fls. 148-149 e parte de um voto de Ministro, no caso o Ministro Celso de Melo, em um julgado do STF às fls. 149- 152. Com isso intenta fundamentar a nulidade da interceptação. Ora, não há qualquer adequação desses julgados ao caso específico dos autos. Noutras palavras, tais julgados não se aplicam ao caso dos autos e, portanto, não servem para fundamentá-lo. É ônus da parte aportar argumentos de princípio nos autos (MOTTA, Francisco José Borges. Ronald Dworkin e a decisão jurídica. Belo Horizonte: Juspodivm, 2017, p. 218-219). Esses argumentos devem ser apresentados de forma integrada e coerente, como observação de uma virtude de responsabilidade moral da parte (Idem, p. 218), moral esta traduzida para a linguagem jurídica no sentido de moralidade institucionalizada. Assim, cumpre à parte que invocar uma decisão judicial em seu favor, tal como um julgado ou parte de um voto de um julgado, fazer a exata demonstração da correspondência de tais julgados, votos e fundamentos, e das correspondentes ementas que cita, com o caso concreto, e isso, no caso destes autos, não foi feito. Logo, não há como levar em consideração tais precedentes. E aqui farei a distinção entre ambos os casos, o da ementa e o da fundamentação citadas, e o que está sendo julgado.

Veja-se que o primeiro julgado, que é um Recurso em Habeas Corpus nº 53.124-RJ, impetrado no STJ, trata de quebra de sigilo telefônico fundado em denúncia anônima, o que contaminaria as provas decorrentes. No caso objeto do dito recurso havia uma informação de inteligência de que casas noturnas seriam locais de venda de droga, e com base nisso foi deferida a interceptação, inclusive com localização de agentes diferentes. Pois bem. No caso desta investigação judicial eleitoral, a interceptação foi deferida com base numa certidão de agente público, um escrivão eleitoral, que goza de fé pública e que levou ao conhecimento do Ministério Público aquilo que lhe vieram trazer ao conhecimento alguns munícipes e eleitores do Município. A interceptação foi fundamentada, atingindo, em princípio, pessoas certas e definidas na própria decisão que a determinou, com exceção dos investigados Irineo e Carla, que também são co-autores dos ilícitos eleitorais que acabaram sendo gravados quando da interceptação. Ocorreu, assim, como dito, o encontro fortuito das provas, que, consoante a doutrina referida, ocorre em interceptações telefônicas, em especial na situação de conexão entre as provas localizadas e as circunstâncias que originaram as escutas das conversas. Ficaram constatados, pois, nas gravações dois ilícitos eleitorais, sendo constatado também que os identificados e investigados na decisão da interceptação terminaram por ser realmente responsáveis por tais ilícitos. E isso possibilita admitir a prova no processo. No mais, como dito, a prova feita pela interceptação era e é indispensável, pois é o único meio de que se dispunha para a investigação. Qualquer outra medida por parte do Ministério Público, a poucos dias do pleito, como no caso dos autos, certamente iria frustrar completamente a investigação. E aqui reside a imprescindibilidade da prova. Assim, postular a interceptação telefônica, repito, foi a medida mais acertada pelo Ministério Público Eleitoral para poder obter a difícil prova sobre a ilicitude de compra e venda de votos.

Por sua vez, quanto aos fundamentos constantes do voto do Ministro Celso de Mello ao julgar o Recurso Extraordinário nº 2514451, colacionado pela defesa, tenho que também não se aplicam ao caso desta investigação judicial eleitoral. Vale aqui tudo o que foi dito com relação à inaplicabilidade do primeiro julgado ao caso destes autos. Além de a prova colhida na interceptação não ser ilícita, pois o decreto da interceptação, como já referi alhures, foi fundamentado como deve ser, o que faz, portanto, com que a medida seja considerada lícita, não há como desconsiderar, repito, o encontro fortuito da prova em momento posterior ao daquele em que a restrição à privacidade ocorreu, que foi o momento em que este juízo autorizou a escuta.

DIANTE DO EXPOSTO, divirjo do relator, para afastar a preliminar de nulidade da interceptação telefônica, admitindo-a como prova lícita.

Destaco.

 

Afastada essa preliminar, no mérito, a interceptação telefônica demonstra prática de abuso de poder, prevista no art. 22 da Lei Complementar n. 64/90, e captação ilícita de sufrágio, disciplinada no art. 41-A da Lei n. 9.504/97.

Dois fatos foram apurados nesta ação.

No primeiro fato, Fernando Classmann, vereador candidato à reeleição, anuiu com que Ireneo Isidoro, cabo eleitoral, oferecesse a moradores de uma localidade de Santa Rosa um serviço de patrola em troca de seus votos.

No diálogo gravado, Ireneo fala com Fernando e deixa claro que os eleitores da localidade somente votariam em Fernando se o serviço fosse feito. O candidato então assegura ao interlocutor que a vantagem será alcançada aos eleitores.

O diálogo é descrito na sentença:

Nesta ligação, Fernando Oscar Classmann recebe telefonema de interlocutor que se identifica como seu tio e utiliza o telefone de nº. 55 9631-3718, o mesmo refere 'tô fazendo uma campanha pra ti aqui antes da ponte de Santa Rosa a direita aqui, tá, e, mas o pessoal vai precisar de um favor teu semana que vem ai viu', Fernando afirma 'mas sem dúvida', o interlocutor acrescenta 'é um serviço com a patrola aqui tá', Fernando diz 'tchê, mas isso conseguimos', o interlocutor informa 'antes da ponte aqui a direita, tem moradores aqui, antes da entrada da Água Santa, sabe onde é que é?', Fernando comenta 'eu conheço, sei na União', o interlocutor reforça 'vão votar em você mas eles querem, diz que procuraram todo mundo aí e ninguém resolveu nada, tá', Fernando garante 'não pode deixar, pode confirmar com eles que vão ver o resultado', na sequência, o interlocutor diz 'viu e se tu não fizer eu vou ter que fazer, vim fazer aqui, porque nós somos Classmann né tu entende, não me deixe esse povo mal aí tá bom', Fernando concorda 'não,pode deixar'.

Pelo diálogo gravado, fica evidente que o serviço de patrola foi realizado em troca dos votos de eleitores residentes naquela localidade. Ireneo esclarece a Fernando Classmann que fez campanha no local e que os eleitores queriam o serviço, buscado por outros meios, mas somente obtido com a promessa do voto em Fernando.

Caracterizada, portanto, a entrega de benefício a eleitores em troca de seus votos.

O fato é analisado de forma minuciosa pela sentença, cuja fundamentação adoto como razões de decidir:

II.3.1.1. ANÁLISE DO PRIMEIRO FATO

Passo à análise da prova oral produzida em audiência, que serve tanto para o primeiro como para o segundo fato.

Eis o que disseram as testemunhas ouvidas em Juízo:

MAURO GODOY PRUDENTE FILHO, testemunha arrolada pelo Ministério Público, disse ser Analista Judiciário, trabalhando há 16 anos e 4 meses no Cartório Eleitoral. Referiu que já trabalhou em sete eleições; no último pleito, recebeu denúncias por compras de votos de candidatos, principalmente envolvendo Miro Jesse e Fernando Oscar Classmann. Em relação a este, as denúncias diziam que os gastos por ele efetuados eram muito superiores ao declarados à Justiça Eleitoral, isso principalmente em 2012. Nas eleições de 2016, as denúncias eram de 'Caixa 2', que gastos eram excessivos e não eram declarados à Justiça Eleitoral. Chegou à Justiça Eleitoral também que o candidato pagava festas e bebidas em troca de votos, o que tomou ciência por denúncia anônima. Quando essas pessoas procuravam a Justiça Eleitoral para fazerem denúncias, a orientação era de que fizessem uma representação por escrito ou procurassem o Ministério Público Eleitoral, mas muitas pessoas diziam que não queriam se incomodar, não queriam se envolver, mas queriam 'providências' da Justiça Eleitoral. Referiu que, nas eleições de 2012, o então candidato Orlando Desconsi recusou ao convite para comparecer à solenidade de diplomação, dizendo que a Justiça Eleitoral tinha sido conivente e leniente com a corrupção. Que então a Juíza Eleitoral Miroslava pediu ao depoente que conversasse com aquele candidato, o que foi feito. Nesse encontro, foi referido, principalmente, quanto à conduta de Miro Jesse, candidato a vereador. Na ocasião, o depoente disse a Orlando Desconsi que nada 'formal' teria chegado à Justiça Eleitoral, por isso não foi tomada nenhuma providência. Já nas eleições de 2016, as mesmas denúncias de compra de votos, envolvendo Miro Jesse e Fernando Classmann, chegaram ao cartório eleitoral, sendo que algumas denúncias foram feitas antes das eleições, outras durante e outras após as eleições. Que as denúncias eram anônimas, e frequentes, em relação aos candidatos Miro Jesse e Fernando Classmann. Então, o depoente fez uma certidão e deu ciência dos fatos ao Juiz Eleitoral. Disse novamente que muitas pessoas iam até o cartório eleitoral, mas não queriam se identificar ou fazer 'por escrito'. Referiu que ficou 'conhecido' na sociedade por trabalhar na Justiça Estadual e muitas pessoas, inclusive, abordavam o depoente na rua, na escola da filha, delatando as 'compra de votos', mas não queriam se 'identificar' ou deixarem seus nomes consignados. Nas eleições de 2012, as contas de Fernando Classmann foram aprovadas, embora os comentários dessem conta de que os gastos teriam sido cerca de R$ 200.000,00 (duzentos mil reais), mas isso não foi apurado pela Justiça Eleitoral, porque a análise é feita com base nas informações juntadas pelo candidato. Nas eleições de 2016, os gastos foram declarados em cerca de R$ 20.000,00 (vinte mil reais). Disse que, em 2012, procurou o então candidato Orlando Desconsi a pedido da Juíza Eleitoral. O único convidado que mandou, por escrito, justificativa de ausência à solenidade de diplomação foi Orlando Desconsi. Que a 'denúncia' feita por Orlando Desconsi ocorreu após as eleições, no momento da diplomação. Que agora, em 2016, as denúncias foram feitas antes das eleições. Que em 2012, também aconteceram denúncias anônimas, mas a Juíza da época não pediu que o depoente certificasse o que 'tinham lhe contado', diferentemente destas eleições, em que o Juiz Eleitoral determinou que certificasse as denúncias. Essa foi diferença do ano de 2012 para 2016. Que fez a certidão e passou para o Ministério Público Eleitoral, como solicitado pelo Juiz Eleitoral. Em relação à certidão da fl. 08 dos autos, notadamente quanto do 3º parágrafo, disse que JEAN JARCZEWSKI, além de delegado da coligação, atuou como advogado do Partido Trabalhista Brasileiro (PTB), na prestação de contas, em 2013, 2014, 2015 e 2016. Que desde 2013, a prestação de contas deve ser feita por advogado com procuração nos autos. Nas denúncias anônimas, não falaram que SEAN estava comprando votos. Não sabe se SEAN tem filiação partidária. Sabe que SEAN e Fernando Classmann são sócios no escritório de advocacia. Que não sabe se Fernando Classmann apoiou a coligação de Orlando Desconsi em 2012. Que Miro Jesse apoiou Vicini em 2012. Que a Justiça Eleitoral já recebeu denúncias anônimas que não se confirmaram.

O que se pode extrair do depoimento do escrivão eleitoral? Ora, nada mais nada menos que todo o caminho percorrido até a descoberta dos fatos narrados na presente investigação eleitoral: após a testemunha ter recebido inúmeras denúncias de que o representado FERNANDO OSCAR CLASSMANN estava 'comprando de votos', MAURO firmou a certidão da fl. 08 dos autos e a encaminhou ao Ministério Público Eleitoral. Com fundamento no certificado e no uso de suas atribuições legais, o MPE instaurou o devido Procedimento Investigatório; diligenciou acerca de nomes e telefones das pessoas referidas na aludida certidão e, à vista do resultado das diligências, postulou judicialmente a interceptação telefônica dos representados FERNANDO OSCAR CLASSMANN e SEAN JARCZEWSKI, já que este seria o único meio hábil, às vésperas da eleição, para se buscar a prova das ilicitudes informadas. Captaram-se, então, vários diálogos suspeitos, dentre os quais os que fundamentam a presente investigação, provando que as denúncias recebidas pelo Chefe do Cartório Eleitoral realmente tinham pertinência.

Não existe, portanto, qualquer caráter de perseguição ' ou 'persecutório', como refere a defesa do investigado FERNANDO OSCAR CLASSMANN ' na certidão do Sr. MAURO PRUDENTE, já que expressou fielmente a percepção do povo sobre a campanha do citado candidato, qual seja, de que ele, por si ou por seus cabos eleitorais ou simpatizantes, estava promovendo ampla e indiscriminada compra de votos.

II.3.1.1.1 TESES DA DEFESA DO INVESTIGADO IRINEO ISIDORO CLASSMANN

Em síntese, a defesa do investigado Irineo Classmann sustenta que o trabalho de terraplenagem na residência de Valter Palhano foi solicitado na Prefeitura, diretamente, sendo realizado em 5 de julho de 2016. Isso, então, nada teria a ver com a ligação feita por Irineo a Fernando. O investigado Irineo não seria cabo eleitoral do investigado Fernando, mas tio deste, o que justificaria o 'tom de brincadeira' da ligação que fez ao candidato. Sustenta também que Irineo não vota em Santa Rosa, mas em Três de Maio, razão pela qual não teria interesse nas eleições ocorridas no município, e que, na conversa com o Sr. Arão, no intuito de cativá-lo como cliente de suas óticas em Três de Maio e Santa Rosa, Irineo prontificou-se a levar demanda a Fernando Classmann para que este desse uma atenção nas ruas vicinais da região, pois Fernando era vereador na época. Quanto às conversas telefônicas, a defesa diz que o investigado Irineo, portanto, teria 'mentido' para o investigado Fernando sobre a conquista de votos e que o Sr. Arão não prometeu votar em Fernando, pois vota em Três de Maio. Aduz, ainda, que não foi oferecido pelo investigado Irineo qualquer serviço de patrola em área particular em troca de votos, pois Arão é eleitor em Três de Maio, e que foi no intuito de angariar clientes para sua loja de jóias e ótica que Irineo ligou para Fernando Classmann, demonstrando atenção ao bem-estar de Arão. A defesa alega, ainda, que o eleitor visitado por Irineo não foi Valter Palhano, mas, sim, Arão Cesar da Silva. Além disso, não haveria captação ilícita de sufrágio porque não houve promessa em troca de votos, e, para configurar abuso de poder econômico ou político, deve haver conduta tendente a buscar o voto do eleitor; deve haver ampla prova e potencialidade lesiva do ato, sendo que não houve potencialidade lesiva e prova de conduta abusiva.

II.3.1.1.2. TESES DA DEFESA DO INVESTIGADO FERNANDO OSCAR CLASSMANN

Em suma, a defesa de Fernando Classmann arguiu a nulidade das interceptações telefônicas, pois autorizada única e exclusivamente com base em denúncias anônimas. A certidão do cartório eleitoral, a postura do Ministério Público e o deferimento da interceptação pelo juízo teriam caráter de perseguição, sendo que as provas obtidas não podem ser utilizadas por ofensa direta à Constituição. Disse também que o trabalho de terraplenagem na residência de Valter Palhano foi solicitado na Prefeitura, diretamente, sendo realizado em 5 de julho de 2016, e que o investigado Irineo não é cabo eleitoral do investigado Fernando, mas tio deste, o que justificaria o tom de brincadeira da ligação que fez ao candidato. Aduziu, ainda, que Irineo não vota em Santa Rosa, mas em Três de Maio, razão pela qual não teria interesse nas eleições ocorridas no município distinto do de seu domicílio eleitoral. Alegou que o eleitor visitado por Irineo é Arão Cesar da Silva, e não Valter Palhano, a quem nem mesmo conhece, e que não há falar em captação ilícita de sufrágio porque a ligação não teve qualquer objetivo eleitoral, sequer se podendo falar em eleitor do Município de Santa Rosa, não havendo, ainda, qualquer promessa em troca de votos. Ainda, argumentou que, para reconhecer o abuso de poder econômico ou político, deve haver ampla prova e potencialidade lesiva do ato, não havendo, pois, prova de conduta abusiva.

II.3.1.1.3. O QUE DISSERAM AS TESTEMUNHAS ARROLADAS PELO INVESTIGADO IRENEO CLASSMANN? E POR QUE AS TESES AVENTADAS, TANTO DE IRINEO COMO DE FERNANDO CLASSMANN, NÃO PODEM SER ACOLHIDAS?

As testemunhas arroladas pelo demandado IRENEO relacionam-se unicamente ao PRIMEIRO FATO e disseram o seguinte:

ARÃO CÉSAR DA SILVA disse que vota em Três de Maio e vende mandioca e melado. Referiu que conhece Ireneo, que comprou melado do depoente. Não conhece Fernando Classmann. Que IRENEO esteve em sua casa antes das eleições comprando melado. Sabe que ele telefonou para alguém, mas não sabe para quem. Que Ireneo não lhe pediu votos, porque vota em Três de Maio. Não conhece SEAN. Não sabe o dia em que teve essa conversa, mas foi às vésperas da eleição.

VALTER DORNELES PALHANO, por sua vez, disse que não conhece IRENEO e que este nunca foi na sua casa. Disse também que ninguém lhe visitou para pedir votos, não conhecendo nenhum dos investigados.

ADÃO MARTINELI disse que já dirigiu para Ireneo, porque este tinha feito uma cirurgia e não podia dirigir. Que numa tarde passou em seu conhecido ARÃO para comprar um melado. Que já foi colega de serviço de ARÃO. Acha que ARÃO vota em Três de Maio. Não viu IRENEO pedir votos.

Tais testemunhas, arroladas para lançar dúvidas sobre o PRIMEIRO FATO da inicial, em verdade, nada de relevante trouxeram ao deslinde causa, pois seus depoimentos nem de longe atingem ou nublam os fatos e fundamentos postos na inicial. As testemunhas não negam a existência do áudio que fundamenta a demanda, cuja conversa inclusive foi admitida pelos próprios investigados nas suas respostas. Além disso, sequer o Ministério Público Eleitoral referiu que a promessa dos 'serviços de patrola' foi negociada com este ou aquele eleitor (Valter, Arão, Adão etc.). Essa negociação ocorreu, sim, com pessoa determinável, o que, consoante a melhor doutrina, já serve para caracterizar a captação ilícita de sufrágio. Veja-se que a presente investigação é fundada num diálogo interceptado em que os investigados IRENEO CLASSMANN e FERNANDO OSCAR CLASSMANN prometem tais serviços para um 'pessoal' da localidade, ou seja, várias pessoas, para um 'povo', como se extrai do diálogo:

'vão votar em você, mas eles querem...', 'pode confirmar com eles', 'nós somos Classmann' 'não me deixe esse povo mal...'.

E é por isso que, se um ou outro morador daquela localidade não vota em Santa Rosa, a ilicitude investigada não se descaracteriza, pois os serviços de patrola prometidos pelos investigados IRENEO ISIDORO CLASSMANN e FERNANDO OSCAR CLASSMANN agraciariam vários moradores/eleitores.

Saliento, com o apoio da doutrina, que a conduta da captação ilícita de sufrágio não precisa ser, necessariamente, praticada pelo próprio candidato para configuração da conduta proibida pelo art. 41-A da LE. Nesse aspecto, resta consagrada a possibilidade de caracterização da captação ilícita de sufrágio quando houver prova da participação (direta ou indireta) ou, mesmo, a mera anuência do candidato no ato praticado por terceiro (ZILIO, Rodrigo Lopez. Direito Eleitoral. Porto Alegre: Verbo Jurídico, 2012, p. 491). De qualquer sorte, ensina Zílio, 'para configurar a infração ao art. 41-A da LE, é indispensável a prova da responsabilidade subjetiva do candidato ' seja através de sua conduta, participação (direta ou indireta) ou anuência explícita na conduta de terceiro. Assim, não é possível a responsabilização do candidato pelo art. 41-A da LE na condição de mero beneficiário da conduta; contudo, se houver a compra de voto por terceiro, beneficiando determinado candidato, esta será responsabilizado sempre que houver prova suficiente da sua participação ou anuência no ilícito cometido' (Idem, p. 491).

O TSE, aliás, tem reiteradamente decidido que 'para caracterizar a captação ilícita de sufrágio, exige-se prova robusta de pelo menos uma das condutas previstas no art. 41-A da Lei nº 9.504/97, da finalidade de obter o voto do eleitor e da participação ou anuência do candidato beneficiado' (Recurso Especial Eleitoral nº 36335 ' Rel. Aldir Passarinho ' j. 15.02.2011).

Como já referido alhures, a conduta também deve ser dirigida a quem tenha capacidade eleitoral ativa, ou seja, necessária a existência de um eleitor em um dos pólos da infração eleitoral. O eleitor deve estar na plenitude do gozo de seus direitos políticos; havendo perda ou suspensão dos direitos políticos (art. 15 da CF), não resta perfectibilizada a conduta do art. 41-A da LE, porque ausente violação ao bem jurídico tutelado. Segundo Rodrigo Zílio, 'Porque o tipo proscreve a conduta efetuada com o fim de obter voto, não se verifica a captação ilícita quando o agir é direcionado a eleitor que possua o direito de voto em circunscrição diversa do candidato que praticou ou concorreu para o ilícito' (Idem, p. 491).

Isso, porém, não se aplica ao caso dos autos porque, como já referi, os investigados IRENEO CLASSMANN e FERNANDO OSCAR CLASSMANN prometeram os serviços de patrola a um 'povo'. Assim, como dito, se um ou outro morador daquela localidade que seria beneficiada pelo serviço de patrola não vota em Santa Rosa, o ilícito não se descaracteriza, pois os serviços de patrola prometidos pelos investigados IRENEO ISIDORO CLASSMANN e FERNANDO OSCAR CLASSMANN ainda assim contemplariam vários moradores/eleitores daquele local.

Também como já referido, para a configuração do ilícito a conduta deve ser dirigida a eleitor determinado ou determinável. Neste passo, diz Zílio, 'é necessário traçar o elemento distintivo entre a captação ilícita de sufrágio ' que é vedada ' e a promessa de campanha ' que, em princípio, é permitida' (Idem, p. 491). Quando a conduta é dirigida a pessoa determinada e é condicionada a uma vantagem, em uma negociação personalizada em troca do voto, caracteriza-se a captação ilícita de sufrágio. Diversa é a hipótese de uma promessa de campanha, que é genericamente dirigida a uma coletividade, mas sem uma proposta em concreto como condicionante do voto. A distinção nem sempre é fácil e, em regra, fica relegada ao caso concreto' (Idem, p. 491-492).

A doutrina, porém ' e aqui a citação de Rodrigo Zílio reprisa a doutrina de Francisco de Assis Vieira Sanseverino (SANSEVERINO, Francisco de Assis Vieira. Compra de votos ' análise à luz dos princípios democráticos. Porto Alegre: Verbo Jurídico, 2007) -, é muito tranquila no sentido de que, para o enquadramento da conduta no art. 41-A, deve haver a compra, a negociação do voto do eleitor, com promessas de vantagens mais concretas e específicas, de forma a corromper a consciência do eleitor (Idem, p. 492). Já as promessas de campanha eleitoral, normalmente apresentadas pelos candidatos, embora também dirigidas aos eleitores e com a finalidade de obter os seus votos, têm caráter mais genérico. A promessa concreta de qualquer vantagem, mesmo dirigida a eleitores indeterminados, de forma genérica, condicionadas à obtenção do voto do eleitor, de modo a corrompê-lo, pode, porém, confirmar a infração. Assim, por exemplo, "há uma infração se o candidato promete, através de qualquer meio de propaganda eleitoral (panfleto, rádio, televisão, jornal), doar ou entregar algum bem ou vantagem ao eleitor que comparecer em seu comitê, como vales (para rancho, alimentação, combustível), consulta médica, dinheiro, etc'. Nesse sentido, todo método de persuasão lícito, com o desiderato de obter a adesão do eleitor, é admitido no processo eletivo, porquanto a propaganda eleitoral, exercida nos limites da licitude, é um método fundamental para o aperfeiçoamento da ordem democrática. De outra sorte, o que vedado é a negociata ou a mercantilização do sufrágio, através da apresentação de uma proposta individualizada ao eleitor, que importe em vantagem ou proveito de cunho pessoal, desde que o corruptor ' ou candidato por ele indicado (no caso de ato praticado por terceiro) ' receba como contrapartida o voto do corrompido'.

O TSE, repriso uma vez mais, tem entendido que 'para caracterização do art. 41-A da Lei das Eleições, não se faz indispensável a identificação do eleitor' (Recurso Especial Eleitoral nº 25.215 ' Rel. Caputo Bastos ' j. 04/08/2005). Assim, em caso de pluralidade de eleitores corrompidos, é possível reconhecer o ato ilícito sem a necessidade de qualificação individual de cada um, até mesmo porque a exigência da identificação nominal dos eleitores significa o esvaziamento da norma punitiva. Assim, o oferecimento de vantagem ou benefício dirigida a moradores de uma associação de bairro, concretizada em uma reunião da comunidade local, em tese, é possível de se caracterizar como infração ao art. 41-A da LE. Esse é, como se vê, o que ocorre no caso dos autos.

Apenas para não passar ao largo, faço questão de enfrentar outro argumento, que soa até jocoso: a alegação de fl. 135 de que IRENEO teria 'mentido' para o investigado Fernando Oscar Classmann sobre a conquista de referidos votos. Convenhamos: a ligação é muita clara. É impossível pensar que IRENEO, um senhor de 55 anos de idade, fosse telefonar a seu sobrinho/candidato à reeleição, às vésperas do pleito, para lhe aplicar uma 'mentirinha de que conseguiu votos para ele'. Mais não precisaria dizer. O que ocorreu, de fato, foi que IRENEO CLASSMANN, fazendo campanha para seu sobrinho FERNANDO OSCAR CLASSMANN, e com a anuência expressa deste, prometeu serviços de terraplanagem a eleitores da circunscrição da 42ª Zona Eleitoral. Nada mais nada menos que isso. De resto, eventuais informações da empresa de telefonia VIVO em nada alteram os fatos e o conteúdo das ligações. É irrelevante ao deslinde da presente ação saber se as ligações vieram de uma ou de outra casa na localidade de Bela União.

Desnecessário tecer quaisquer comentários sobre as teses defensivas de Fernando Classmann porque já enfrentadas anteriormente. Bastaria dizer, no entanto, e ainda, que, como vereador que era à época do período eleitoral, o investigado Fernando Classmann tinha acesso à Prefeitura e poderia usar a máquina pública para se beneficiar. Isso, inclusive, configura abuso de poder político e econômico, o que será analisado adiante.

Quanto ao segundo fato, Fernando Classmann e Carla Cristina de Oliveira Gomes entregaram 06 quilos de galeto para 31 eleitores em troca de seus votos. Segue transcrição do diálogo, tal como realizado na sentença:

Nesta ligação Fernando Oscar Clasmann recebe ligação de uma mulher (não identificada), que utiliza o telefone de nº. (55) 9677-6093, sendo que a interlocutora diz 'tenho uma ótima notícia pra te dar, boa demais', Fernando responde 'fala querida', interlocutora diz 'adivinha, eu e o Sean agora acamo de fechar trinta e um voto pra ti, trinta e um, não é treze', Fernando responde 'mas que coisa boa', interlocutora diz 'aham', Fernando responde 'vocês são fera', interlocutora explica 'o Sean tava aqui em casa agora, e daí nós fomos lá na mulher e já, aham, a família dela chegou de Bento, vieram só pra votar, aqui', Fernando responde 'que bom', interlocutora salienta 'e tem trinta pessoa, trinta e uma pessoa veio, entre tio, sobrinho, tudo, sabe, aham, e daí ela pegou e veio aqui ontem, e daí eu disse, não beleza, daí eu liguei pro Moreira, o Moreira tinha dito que não, ela só pediu ajuda em seis quilo de galeto, porque ela não tinha pra dar comida pra tudo a gente', Fernando diz' mas isso não importa', interlocutora salienta 'e agora o Sean foi lá e deu, O Sean foi lá e remato.

O diálogo evidencia que os cabos eleitorais de Fernando Classmann conseguiram que um número considerável de eleitores viajassem para o município com o único intuito de votar no candidato representado, sendo recompensados, como contrapartida, com o fornecimento de 06 quilos de galeto.

Também aqui se pode perceber a presença da entrega de benesse a eleitores, o que só foi realizado porque se deslocaram ao município para votar no candidato.

Os requisitos para a configuração da captação ilícita de sufrágio foram descritos de forma acertada no parecer ministerial:

Novamente, restam presentes todos os requisitos para a configuração da conduta de captação ilícita de sufrágio:

a) uma conduta ocorrida durante o período eleitoral (prática de uma ação: doar, prometer, etc.), com participação direta ou indireta do candidato – entrega de galeto com expressa anuência do candidato em 01/10/2016 (dia anterior ao pleito), nos termos do diálogo:

CARLA: e tem trinta pessoa, trinta e uma pessoa veio, entre tio, sobrinho, tudo, sabe, aham, e daí ela pegou e veio aqui ontem, e daí eu disse, não beleza, daí eu liguei pro Moreira, o Moreira tinha dito que não, ela só pediu ajuda em seis quilo de galeto, porque ela não tinha pra dar comida pra tudo a gente.

FERNANDO: mas isso não importa.

CARLA: e agora o Sean foi lá e deu, o Sean foi lá e remato.

 

b) a especial finalidade de obter o voto (elemento subjetivo da conduta), o galeto fora entregue em troca do voto dos eleitores, conforme trecho do diálogo:

CARLA: adivinha, eu e o Sean agora acabamo de fechar trinta e um voto pra ti, trinta e um, não é treze.

FERNANDO: mas que coisa boa.

CARLA: aham.

FERNANDO: vocês são fera.

CARLA: o Sean tava aqui em casa agora, e daí nós fomos lá na mulher e já, aham, a família dela chegou de Bento, vieram só pra votar, aqui.

FERNANDO: que bom.

CARLA: e tem trinta pessoa, trinta e uma pessoa veio, entre tio, sobrinho, tudo, sabe, aham, e daí ela pegou e veio aqui ontem, e daí eu disse, não beleza, daí eu liguei pro Moreira, o Moreira tinha dito que não, ela só pediu ajuda em seis quilo de galeto, porque ela não tinha pra dar comida pra tudo a gente.

CARLA: e agora o Sean foi lá e deu, o Sean foi lá e remato.

 

c) o direcionamento da conduta a eleitor(es) determinado(s) ou determinável(eis) – 31 eleitores da mesma família:

CARLA: o Sean tava aqui em casa agora, e daí nós fomos lá na mulher e já, aham, a família dela chegou de Bento, vieram só pra votar, aqui.

FERNANDO: que bom.

CARLA: e tem trinta pessoa, trinta e uma pessoa veio, entre tio, sobrinho, tudo, sabe, aham, e daí ela pegou e veio aqui ontem, e daí eu disse, não beleza, daí eu liguei pro Moreira, o Moreira tinha dito que não, ela só pediu ajuda em seis quilo de galeto, porque ela não tinha pra dar comida pra tudo a gente.

Da mesma forma, os fatos, somados, apresentam gravidade suficiente para alterar a normalidade do pleito, sendo aptos, também, à caracterização de abuso do poder econômico e político.

A distribuição de alimentos para garantir que considerável número de eleitores votassem no candidato, por menores que tenham sido os recursos empregados para esta finalidade, bem como a realização de obra pública para uma comunidade de eleitores - unicamente porque se comprometeram a votar no candidato - caracterizam o claro desvio dos propósitos da atividade do parlamentar.

Correto, portanto, o juízo firmado em primeiro grau.

No tocante ao termo inicial da inelegibilidade de 08 anos, fixado pelo juiz a contar do trânsito em julgado da sentença, tal deve ser readequado, para ser contado a partir do dia da eleição, tal como fixado pelo TSE na sua súmula de número 19: “O prazo de inelegibilidade decorrente da condenação por abuso do poder econômico ou político tem início no dia da eleição em que este se verificou e finda no dia de igual número no oitavo ano seguinte (art. 22, inc. XIV, da LC n. 64/90).”

 

Diante do exposto, uma vez reconhecida a licitude da interceptação telefônica, no mérito, voto pelo parcial provimento do recurso, apenas para fixar o dia da eleição como marco inicial da inelegibilidade aplicada, mantendo a sentença nos demais termos.

 

 

(Após as sustentações orais e a manifestação do douto representante do Ministério Público Eleitoral, pediu vista dos autos o Des. Carlos Cini Marchionatti - Presidente. Julgamento suspenso.)

 

(Participaram do julgamento os eminentes Des. Carlos Cini Marchionatti - presidente -, Des. Jorge Luís Dall'Agnol, Dr. Jamil Andraus Hanna Bannura, Dr. José Ricardo Coutinho Silva, Dr. Silvio Ronaldo Santos de Moraes , Dr. Eduardo Augusto Dias Bainy e Des. Federal João Batista Pinto Silveira, bem como o douto representante da Procuradoria Regional Eleitoral.)