RE - 3804 - Sessão: 22/05/2018 às 17:00

RELATÓRIO

Trata-se de recurso interposto pelo PARTIDO PROGRESSISTA (PP) (fls. 85-90), do Município de Bento Gonçalves, e por CARLOS JOSÉ PERIZZOLO e ENIO DE PARIS, respectivamente presidente e tesoureiro da grei, contra sentença do Juízo da 8ª Zona (fls. 81-82v.) que desaprovou a prestação de contas relativa ao exercício financeiro de 2016, determinando a suspensão do repasse de novas quotas do Fundo Partidário pelo período de um ano e o recolhimento do valor de R$ 8.496,91 ao Tesouro Nacional, em virtude do recebimento de recursos de fonte vedada, com fundamento no art. 46, inc. III, al. “a”, da Resolução TSE n. 23.464/15.

Em suas razões recursais, os recorrentes aduziram prejuízo à defesa, em razão do indeferimento da prova oral requerida. Afirmaram que o juízo de primeiro grau, ao indeferir o pedido de produção de prova oral, violou o princípio da ampla defesa. Sustentaram, ainda, que os cargos dos responsáveis pelas doações efetuadas ao PP não se enquadram no conceito de autoridade pública. Postularam a reforma da decisão, para que seja autorizada a produção de provas reivindicada, culminando no afastamento das irregularidades apontadas e na aprovação das contas partidárias.

Nesta instância, com vista dos autos, a Procuradoria Regional Eleitoral opinou, preliminarmente, pela anulação da sentença, por não ter aplicado a multa disposta no caput do art. 37 da Lei n. 9.096/95, introduzida pela Lei n. 13.165/15. No mérito, manifestou-se pelo desprovimento do recurso (fls. 95-101).

É o relatório.

 

VOTO

Admissibilidade

O recurso é tempestivo (fls. 84-85) e preenche os demais pressupostos de admissibilidade, razão por que dele conheço.

Preliminares

Da nulidade da sentença

A Procuradoria Regional Eleitoral opinou, preliminarmente, pela anulação da sentença, a fim de que os autos retornem à origem, para que seja aplicada a multa de até 20%, prevista no art. 37 da Lei n. 9.096/95 (redação dada pela Lei n. 13.165/15) c/c art. 49 da Resolução TSE n. 23.464/15.

Tal penalidade, introduzida pela reforma eleitoral de 2015, deve ser aplicada nas prestações de contas referentes ao exercício financeiro de 2016, conforme definiu o egrégio Tribunal Superior Eleitoral:

SEGUNDOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. PRESTAÇÃO DE CONTAS DE DIRETÓRIO NACIONAL. EXERCÍCIO FINANCEIRO DE 2009. DESAPROVADA PARCIALMENTE. AUSÊNCIA DE VÍCIOS. REJEIÇÃO DOS EMBARGOS.

1. QUESTÃO DE ORDEM. As alterações promovidas no caput do art. 37 da Lei nº 9096/1995, reproduzidas no art. 49 da Res.-TSE nº 23.464/2015, são regras de direito material e, portanto, aplicam-se às prestações de contas relativas aos exercícios de 2016 e seguintes. Entendimento contrário permitiria que contas das agremiações partidárias relativas a um mesmo exercício financeiro fossem analisadas com base em regras materiais diversas, o que não se pode admitir. É preciso conferir tratamento isonômico a todos os partidos políticos, sem alterar as regras aplicáveis a exercícios financeiros já encerrados, em razão do princípio da segurança jurídica. O Plenário do TSE, analisando a questão relativa à alteração legislativa promovida pela mesma lei ora em análise na Lei das Eleições quanto ao registro do doador originário nas doações, assentou que "a regra constante da parte final do § 12 do art. 28 da Lei nº 9.504/97, com a redação conferida pela Lei nº 13.165/2015, não pode ser aplicada, [...] seja porque a lei, em regra, tem eficácia prospectiva, não alcançando fatos já consumados e praticados sob a égide da lei pretérita" (ED-REspe nº 2481-87/GO, rel. Min. Henrique Neves da Silva, julgado em 1º.12.2015). A modalidade de sanção em decorrência da desaprovação de contas prevista na nova redação do caput do art. 37 da Lei nº 9.096/1995, conferida pela Lei nº 13.165/2015, somente deve ser aplicada às prestações de contas relativas ao exercício de 2016 e seguintes.

[...]

5. Embargos de declaração rejeitados.

(TSE, PC n. 96183, Acórdão, Relator Min. Gilmar Ferreira Mendes, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Tomo 54, Data 18.3.2016.)

 

É o caso dos autos, em que se examina a prestação de contas partidárias do exercício financeiro de 2016. Contudo, o pedido do Parquet não pode ser acolhido, vez que a magistrada consignou expressamente, na sentença, a aplicabilidade da Resolução TSE n. 23.464/15, diploma normativo editado sob a égide das alterações legais veiculadas pela Lei n. 13.165/15.

Destarte, não é cabível a concepção de que houve equívoco quanto ao regime jurídico aplicável no julgamento do caso concreto. O que ocorreu foi uma omissão no tocante à aplicação do art. 49 da Resolução TSE n. 23.464/15, o qual reproduz o teor do contido no art. 37 da Lei n. 9.096/95, com a redação conferida pela Lei n. 13.165/15, relativo à multa de até 20% da importância apontada como irregular.

Este colegiado já teve oportunidade de manifestar-se sobre a matéria, em caso análogo de lavra do Dr. Luciano André Losekann, no qual foi afastada a preliminar de nulidade em razão de ter sido aplicado o regime jurídico adequado (RE n. 16-66, julgado na sessão de 14.3.2018):

RECURSO. PRESTAÇÃO DE CONTAS. PARTIDO POLÍTICO. EXERCÍCIO FINANCEIRO DE 2016. REJEITADA A PRELIMINAR DE NULIDADE DA SENTENÇA. MÉRITO. MOVIMENTAÇÃO FINANCEIRA SEM O TRÂNSITO PELA CONTA BANCÁRIA. FALHA GRAVE. DESPROVIMENTO.

1. Preliminar de nulidade da sentença rejeitada. Consignada expressamente na decisão a aplicação da Resolução TSE n. 23.464/15, diploma normativo editado sob a égide das alterações legais veiculadas pela Lei n. 13.165/15. Inexistência de equívoco quanto ao regime jurídico aplicável no julgamento do caso concreto. Verificada, no entanto, omissão no tocante à aplicação do art. 49 da citada resolução, com referência à multa de 20% da importância assumida como irregular. Tratando-se de recurso interposto unicamente pelo prestador, incabível a análise do ponto sem o aviamento de apelo do Ministério Público. Preclusão.

2. Mérito. Recebimento de receitas em dinheiro e realização de despesas sem o trânsito dos valores pela conta bancária. Falha grave que inviabiliza o controle e a atuação fiscalizatória da Justiça Eleitoral, comprometendo a transparência e a confiabilidade das contas.

3. Provimento negado.

(Grifei.)

Por essas circunstâncias, afasto a preliminar de nulidade da sentença suscitada pela Procuradoria Regional Eleitoral.

Do cerceamento de defesa

De plano, do mesmo modo, afasto a preliminar de cerceamento de defesa arguida pelos recorrentes, lançada sob os argumentos de que o juiz a quo indeferiu a prova testemunhal requerida.

Para tanto, adoto o parecer da Procuradoria Regional Eleitoral, o qual esgotou a apreciação da matéria (fls. 95-101):

II.I.III. Do alegado cerceamento de defesa

O cerne conducente ao julgamento da desaprovação das contas circunscreveu-se à caracterização como fontes vedadas das doações efetuadas pelos contribuintes listados à fl. 75. Em suas razões, o recorrente argumenta ter sofrido prejuízo à defesa, em razão do indeferimento da prova oral requerida à fl. 78, que tinha por fim “a designação de audiência para oitiva de todas as pessoas enumeradas na fl. 75, a fim de comprovar que as atividades que desenvolvem não caracterizam cargos demissíveis ad nutum”.

Sem razão o recorrente. No aspecto da produção de prova oral requerida, observa-se que “as pessoas enumeradas na fl. 75” representam nada menos do que 23 (vinte e três) pessoas que fizeram doações para o partido, e a parte interessada não trouxe argumentos relevantes do quão útil e indispensável seria protrair a instrução para lhes tomar tão extensa oitiva.

Ademais, embora a legislação de regência preveja a possibilidade de produção probatória, não se deve descurar que o procedimento de contas é eminentemente formal, cujo exame se baseia sobremaneira em exames técnicos contábeis da prova documental, e não testemunhal.

Também, na linha do que preleciona o artigo 370 do Código de Processo Civil, deve-se observar que o juiz é o destinatário da prova, cabendo-lhe, portanto, direcionar o curso da instrução. Assim, mediante a avaliação da necessidade ou não da produção probatória, tem ele o poder indeferir diligências que nada ou pouco podem acrescentar para o processo e aquelas meramente protelatórias.

In casu, o MM. Juiz a quo sentenciou o feito com base nos elementos de prova coligidos, sem vislumbrar relevância na prova oral, já que o cerne da matéria ficou suficientemente provado pela prova documental.

Nesse diapasão, não se verificando qualquer fundamento fático ou de direito a demonstrar a imprescindibilidade da colheita da prova testemunhal postulada, não merece acolhida a alegação de prejuízo por suposto cerceamento de defesa.

(Grifei.)

Nesse mesmo sentido, em enfrentamento de questão análoga, disse a juíza sentenciante, “[...] por tratar-se de processo de prestação de contas de exercício financeiro e por já ter sido dada oportunidade prévia de defesa em relação às irregularidades apontadas”, agregando que “há prova suficiente de que as doações foram originadas de fontes vedadas e prova em contrário somente poderia ser documental” (fl. 81 e v.).

Colho, na mesma toada, o precedente deste Tribunal:

Recurso. Prestação de contas. Partido Político. Fonte vedada. Resolução TSE n. 23.432/14. Exercício financeiro de 2015.

1. Afastada a preliminar de nulidade da sentença por ausência de intimação para alegações finais. Previsão contida no art. 40 da Resolução TSE n. 23.464/15, a qual dispõe que, encerrada a produção de provas, deve ser dada vista às partes para alegações finais. Todavia, no caso, não houve produção de provas, visto a matéria probatória depender exclusivamente de prova documental, e trazida aos autos pelo prestador. Rejeitada igualmente a prefacial de cerceamento de defesa. Produção de prova testemunhal indeferida, uma vez que o conceito de autoridade pública é temática exclusivamente de direito.

2. Configuram recursos de fontes vedadas as doações a partidos políticos advindas de titulares de cargos demissíveis ad nutum da administração direta ou indireta que tenham a condição de autoridades, vale dizer, que desempenhem função de direção ou chefia. Reconhecida como fonte vedada as quantias recebidas de Coordenador, Chefe de Gabinete, Secretário e Procurador.

3. Confirmada a sentença que determinou o recolhimento do montante recebido indevidamente ao Tesouro Nacional. Adoção dos critérios da razoabilidade e proporcionalidade para reduzir o prazo de suspensão do recebimento de quotas do Fundo Partidário para três meses.

Provimento parcial.

(TRE-RS, Recurso Eleitoral n. 1847, Acórdão de 14.12.2016, Relator DES. PAULO AFONSO.)

Passo, portanto, ao exame da questão de fundo.

Mérito

O Juízo da 8ª Zona Eleitoral desaprovou a prestação de contas do PARTIDO PROGRESSISTA (PP), do Município de Bento Gonçalves, relativa ao exercício financeiro de 2016, aplicando as penalidades de suspensão do repasse de novas quotas do Fundo Partidário pelo período de um ano e o recolhimento do valor de R$ 8.496,91 ao Tesouro Nacional, em virtude do recebimento de recursos de fonte vedada, com fundamento no art. 46, inc. III, al. “a”, da Resolução TSE n. 23.464/15.

Segundo o detalhamento do parecer técnico conclusivo de fls. 73-74, a agremiação recebeu doações de Secretários, Coordenadores e Diretores de pastas da Prefeitura do Município de Bento Gonçalves, dentre o período de janeiro a dezembro de 2016, num total de R$8.496,91, vedadas nos termos do art. 12, inc. IV, da Resolução TSE n. 23.464/15.

A irregularidade das doações em foco é inequívoca, visto que todos os doadores eram exercentes de cargos de direção ou chefia junto à administração pública direta ou indireta, os quais, a toda evidência, encerravam poder decisório e de gerenciamento de pessoas e de recursos, inserindo-se, assim, no conceito de “autoridade” para fins de incidência da vedação legal.

De acordo com a jurisprudência consolidada no âmbito deste Tribunal, as contribuições ou doações efetuadas por detentores de cargo demissível ad nutum da administração pública direta ou indireta, que exerçam função de direção ou chefia, vale dizer, com poder de autoridade, configuram recursos de fonte vedada (TRE-RS, PC n. 76-79, Relator Dr. Leonardo Tricot Saldanha, julgado em 31.5.2016 e RE n. 18-62, Relatora Dra. Gisele Vieira de Azambuja, julgado em 02.8.2016).

Resta sedimentado, no âmbito jurisprudencial, tanto neste TRE quanto no TSE, o entendimento de que os detentores de função comissionada com poder de autoridade não podem contribuir aos partidos.

Após a consolidação da interpretação dada pelo TSE ao art. 31, caput, inc. II, da Lei n. 9.096/95, os tribunais eleitorais de todo o país, inclusive este TRE, passaram a julgar as contas partidárias com observância à vedação de contribuições de titulares de cargos demissíveis ad nutum, da administração direta ou indireta, com poder de autoridade:

Recurso. Prestação de contas. Partido político. Doação de fonte vedada. Art. 31, II, da Lei n. 9.096/95. Exercício financeiro de 2013.

Desaprovam-se as contas quando constatado o recebimento de doações de servidores públicos ocupantes de cargos demissíveis ad nutum, da administração direta ou indireta, que detenham condição de autoridade, vale dizer, desempenhem função de direção ou chefia.

Redução, de ofício, do período de suspensão do recebimento de cotas do Fundo Partidário, conforme os parâmetros da razoabilidade. Manutenção da sanção de recolhimento de quantia idêntica ao valor recebido irregularmente ao Fundo Partidário.

Provimento negado.

(TRE-RS, Recurso Eleitoral n. 2346, Acórdão de 12.3.2015, Relator Dr. Ingo Wolfgang Sarlet, Publicação: DEJERS - Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Tomo 45, Data 16.3.2015.)

 

Recurso Eleitoral. Prestação de Contas Anual. Exercício 2012. Partido Democrático Trabalhista (PDT) de Taquara. Contas desaprovadas. Preliminar de impugnação de documentos como prova válida. Exame remetido à análise da questão de fundo. Preliminar de cerceamento de defesa afastada, em face de haver, nos autos, comprovação de que o partido teve oportunidade de se manifestar sobre documentos acostados. Não é permitido aos partidos políticos receberem doações ou contribuições de titulares de cargos demissíveis ad nutum da administração direta ou indireta, desde que tenham a condição de autoridades. Configuradas doações de fonte vedada. Servidores ocupantes de cargos demissíveis ad nutum.

Afastadas do cálculo do valor a ser recolhido ao Fundo Partidário as doações de assessores e procuradores jurídicos, os quais não são considerados autoridades. Deram parcial provimento ao recurso, apenas ao efeito de reduzir o valor recolhido ao Fundo Partidário.

(TRE-RS, Recurso Eleitoral n. 8303, Acórdão de 12.11.2014, Relator Des. Luiz Felipe Brasil SantisS, Publicação: DEJERS - Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Tomo 207, Data 14.11.2014.)

 

Recurso. Prestação de contas. Partido político. Exercício de 2010.

Desaprovação pelo julgador originário. Aplicação da pena de suspensão das cotas do Fundo Partidário pelo período de doze meses, bem como o recolhimento de valores, ao mesmo fundo, relativos a recursos recebidos de fonte vedada e de fonte não identificada.

A documentação acostada em grau recursal milita em prejuízo do recorrente, uma vez que comprova o recebimento de valores de autoridade pública e de detentores de cargos em comissão junto ao Executivo Municipal. A maior parte da receita do partido provém de doações de pessoas físicas em condição de autoridade, prática vedada nos termos do art. 31, inc. II e III, da Lei n. 9.096/95.

Provimento negado.

(TRE-RS, Recurso Eleitoral n. 4550, Acórdão de 19.11.2013, Relator Dr. Jorge Alberto Zugno, Publicação: DEJERS - Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Data 22.11.2013.)

 

Dessarte, merece ser desconsiderada qualquer argumentação no sentido de que as doações efetuadas pelos filiados que ocupam cargo em comissão de direção ou de chefia são regulares, uma vez manifesta a contrariedade a normas que, em rol taxativo, impossibilitam o recebimento de recursos por fonte vedada.

Nessa mesma esteira é o parecer da Procuradoria Regional Eleitoral (fl. 98), cujos fundamentos incorporo às razões de decidir:

A sentença, tal qual proferida – e no mesmo sentido do parecer técnico conclusivo às fls. 73-75 e do parecer da Promotoria de Justiça Eleitoral à fl. 79 – aplica com acerto a lei eleitoral, fazendo cumprir a mens legis, em todos os seus termos, considerando a irregularidade que se apresenta nos autos: o recebimento de valores de fontes vedadas.

Conforme apurado pela análise técnica, a quantia arrecadada de fontes vedadas totalizou R$ 8.496,91, ao passo que o total da arrecadação do partido no ano analisado somou R$ 18.469,26.

In casu, restou evidenciado, conforme planilha acostada à fl. 75, que o diretório recebeu, no decorrer no exercício de 2016, contribuições de diversos coordenadores (de divisão, de departamento, de fiscalização, de frota e logística, de políticas de trânsito, de obras públicas), vinculados à Prefeitura de Bento Gonçalves, e de um secretário adjunto e do do diretor geral do gabinete do Prefeito. No mesmo sentido, no relatório "demonstrativo de contribuições recebidas" (fls. 28/31), o próprio partido declarou ter recebido tais contribuições.

 

A regra foi criada com intuito moralizador, na expectativa de que os partidos políticos não vislumbrassem contrapartida financeira ou manipulação de órgão da administração pública quando da indicação de ocupantes de cargo em comissão. O servidor indicado deve contribuir com seu trabalho e está impedido de retornar o valor público recebido a título de remuneração ao partido. Tendo influência política representada pelo seu poder de autoridade no âmbito do cargo que exerce, o detentor de cargo em comissão não poderá alcançar valores ao partido ao qual é filiado ou de que é apoiador.

Nessa linha, embora não mais subsista a vedação às doações realizadas por ocupantes de cargos demissíveis ad nutum, desde que sejam filiados a partido político, por força da nova redação conferida ao art. 31 da Lei n. 9.096/95 pela Lei n. 13.488/17, tal inovação não tem aplicação retroativa, conforme firmado por este Tribunal no julgamento do RE n. 14-97, de relatoria do Dr. Luciano André Losekann, cuja ementa transcrevo a seguir:

RECURSO. PRESTAÇÃO DE CONTAS ANUAL. PARTIDO POLÍTICO. EXERCÍCIO DE 2015. PRELIMINAR. MANUTENÇÃO DOS DIRIGENTES PARTIDÁRIOS NO POLO PASSIVO. ILEGITIMIDADE NÃO CONFIGURADA. MÉRITO. RECEBIMENTO DE DOAÇÕES DE FONTES VEDADAS. ALTERAÇÃO LEGISLATIVA. PERMITIDA A CONTRIBUIÇÃO DE FILIADOS. INAPLICABILIDADE AO CASO CONCRETO. APLICAÇÃO DA LEGISLAÇÃO VIGENTE À ÉPOCA DOS FATOS. PRINCÍPIO DA SEGURANÇA JURÍDICA. MANUTENÇÃO DO JUÍZO DE IRREGULARIDADE DA DOAÇÃO. REDUÇÃO DO PRAZO DE SUSPENSÃO DO RECEBIMENTO DAS QUOTAS DO FUNDO PARTIDÁRIO. PARCIAL PROVIMENTO.

1. Preliminar rejeitada. O art. 38 da Resolução TSE n. 23.432/14 prevê que deverá ser determinada a citação do órgão partidário e dos responsáveis para que ofereçam defesa sempre que houver impugnação ou constatação de irregularidade no parecer conclusivo. A integração dos dirigentes na lide é consectário da responsabilização prevista na Lei dos Partidos Políticos. Manutenção dos dirigentes partidários para integrarem o polo passivo. Ilegitimidade passiva afastada.

2. Constituem recursos oriundos de fontes vedadas as doações a partidos políticos realizadas por titulares de cargos demissíveis ad nutum da administração direta ou indireta que detenham condição de autoridades, vale dizer, que desempenhem função de direção ou chefia.

3. A Lei n. 13.488/17, publicada em 06.10.17, alterou a redação do art. 31 da Lei n. 9.096/95 - Lei dos Partidos Políticos -, excluindo a vedação de doação de pessoa física que exerça função ou cargo público demissível ad nutum, desde que filiada ao partido beneficiário.

4. Inaplicabilidade ao caso concreto. Incidência da legislação vigente à época dos fatos. Prevalência do princípio da segurança jurídica e da paridade de armas no processo eleitoral, em detrimento da aplicação pontual da retroatividade in bonam partem. Manutenção do juízo de irregularidade das contribuições advindas de cargos demissíveis ad nutum, ainda que os contribuintes sejam filiados à agremiação.

5. Incontroverso o recebimento de recursos de fontes vedadas, em valor correspondente a 65,79% das receitas do partido, impõe-se a desaprovação das contas. Redução, entretanto, do prazo de suspensão do recebimento de quotas do Fundo Partidário para quatro meses.

6. Provimento parcial.

(TRE-RS, RE n. 14-97, Relator Dr. Luciano André Losekann, julgado em 04.12.2017.) (Grifei.)

 

Desse modo, como, no caso concreto, as doações foram todas realizadas em período anterior à edição da Lei n. 13.488/17, restou caracterizado o recebimento de recursos de fontes vedadas pela agremiação. Outrossim, o montante envolvido e o percentual expressivo da irregularidade, correspondente a 46% do total arrecadado de R$ 18.469,26 (fls. 73-74), ensejam a reprovação das contas, bem como, inequivocamente, o dever de transferência da quantia envolvida ao Tesouro Nacional (art. 14, § 1º, da Resolução TSE n. 23.464/15).

A irregularidade apontada suscitou, ainda, a aplicação na sentença da penalidade de suspensão do repasse de novas quotas do Fundo Partidário pelo período de um ano, ante a previsão do art. 47, inc. I, da Resolução TSE n. 23.464/15 c/c art. 36, II, da Lei n. 9.096/95.

Este Tribunal já se pronunciou sobre a matéria, nesse mesmo sentido, ao julgar o RE n. 46-42 da relatoria do Dr. Silvio Ronaldo Santos de Moraes, em 18.12.2017, assim: “a penalidade de suspensão de novas quotas do Fundo Partidário por um ano está de acordo com a expressa determinação prevista no art. 36, inc. II, da Lei n. 9.096/95, considerando tratar-se de irregularidade insanável que compromete de forma grave as contas do exercício”.

TODAVIA, considerando o reiterado entendimento do TSE em casos tais (v.g.: AI n. 6176, Rel. Min. ADMAR GONZAGA, DJE de 01.12.2017 - REspe n. 26298, Rel. Min. ADMAR GONZAGA, DJE de 22.9.2017), com a aplicação dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, proponho nova reflexão por esta Corte no sentido de concluir pela possibilidade de dosimetria desta sanção entre 01 e 12 meses.

Assim, em face das circunstâncias dos autos, da gravidade e das falhas detectadas, bem como a inexistência de indícios de má-fé pelo prestador e a repercussão dos valores irregulares sobre a totalidade das contas, entendo proporcional suspender o repasse de quotas do Fundo Partidário por 03 (três) meses.

Por fim, afasto o requerimento da Procuradoria Regional Eleitoral de aplicação ex officio da penalidade de multa sobre a importância considerada irregular, não fixada pelo juízo de origem, tendo em vista, como decorrência lógica, as razões por mim expendidas no exame da prefacial lançada pelo agente ministerial.

Logo, por essas circunstâncias, impõe-se a manutenção da desaprovação das contas do partido recorrente e da determinação de recolhimento de R$ 8.496,91 ao Tesouro Nacional, com a redução da suspensão do repasse de novas quotas do Fundo Partidário para três meses.

Dispositivo

Diante do exposto, afastada a matéria preliminar, VOTO pelo provimento parcial do recurso, apenas para reduzir o período de suspensão do repasse de quotas do Fundo Partidário para 03 (três) meses, mantidos os demais termos da sentença.