RE - 77007 - Sessão: 12/12/2017 às 17:00

RELATÓRIO

Trata-se de recurso interposto por DELAMAR COQUEJO, candidato ao cargo de vereador em Cristal, em face da sentença do Juízo da 12ª Zona Eleitoral que desaprovou as suas contas referentes às eleições municipais de 2016, com base no art. 68, inc. III, da Resolução TSE n. 23.463/14.

Em suas razões, o recorrente requer a juntada de documentos com os quais pretende sanar as irregularidades apontadas na sentença. Ao final, postula a aprovação das contas, ainda que com ressalvas (fls. 22-33).

Com vista dos autos, a Procuradoria Regional Eleitoral opinou, preliminarmente, pela anulação da sentença e o retorno dos autos à origem, a fim de que seja determinado o recolhimento ao Tesouro Nacional dos recursos de origem não identificada, nos termos do art. 26 da Resolução TSE n. 23.463/15. Em relação ao mérito, manifestou-se pelo desprovimento do recurso, a fim de que seja mantida a desaprovação das contas e seja determinado, de ofício, o recolhimento ao Tesouro Nacional dos recursos de origem não identificada – R$ 1.073,17 (fls. 39-46v.).

Em atenção ao princípio da não surpresa e do contraditório substancial, foi determinada a intimação da parte recorrente para que se manifestasse a respeito do parecer ministerial (fl. 48). Contudo, esta não ofereceu resposta (fl. 52).

É o relatório.

 

VOTO

Senhor Presidente,

Eminentes colegas:

O recurso é tempestivo e atende aos demais pressupostos recursais, motivo pelo qual dele conheço.

Em prefacial, a Procuradoria Regional Eleitoral lançou manifestação no sentido da nulidade da decisão de primeiro grau, ao fundamento de que houve omissão de qualquer enfrentamento explícito sobre a necessidade de transferência dos valores cujos doadores não foram identificados, nos termos dos arts. 18, inc. I, § 3º, e 26 da Resolução TSE n. 23.463/15.

Com efeito, ao reconhecer a existência de recursos de origem não identificada, cabia ao magistrado determinar o recolhimento da importância ao Tesouro Nacional, por força do que dispõe o art. 26 da Resolução TSE n. 23.463/2015:

Art. 26. O recurso de origem não identificada não pode ser utilizado por partidos políticos e candidatos e deve ser transferidos ao Tesouro Nacional, por meio de Guia de Recolhimento da União (GRU).

§ 1º Caracterizam o recurso como de origem não identificada:

I - a falta ou a identificação incorreta do doador; e/ou

II - a falta de identificação do doador originário nas doações financeiras; e/ou

III - a informação de número de inscrição inválida no CPF do doador pessoa física ou no CNPJ quando o doador for candidato ou partido político.

(...)

§6º Não sendo possível a retificação ou a devolução de que trata o § 5º, o valor deverá ser imediatamente recolhido ao Tesouro Nacional.

Grifei.

No entanto, tenho que, em prestígio à disposição que permite o julgamento da chamada “causa madura”, é possível superar a nulidade arguida e suprir a omissão do juízo a quo em relação à determinação de recolhimento de valores acaso o exame do mérito do feito assim recomende. Vejamos a previsão do Código de Processo Civil:

Art. 1.013. A apelação devolverá ao tribunal o conhecimento da matéria impugnada.

[...]

§ 3º Se o processo estiver em condições de imediato julgamento, o tribunal deve decidir desde logo o mérito quando:

I - reformar sentença fundada no art. 485;

II - decretar a nulidade da sentença por não ser ela congruente com os limites do pedido ou da causa de pedir;

III - constatar a omissão no exame de um dos pedidos, hipótese em que poderá julgá-lo;

IV - decretar a nulidade de sentença por falta de fundamentação.

[…].

A doutrina, em especial o estudo de Cristiana Zugno Pinto Ribeiro, anota que a aplicação do dispositivo demanda questão exclusivamente de direito ou ação em condições de imediato julgamento, nestes termos:

“O tribunal, em princípio, não deve avançar no exame das matérias não decididas ainda em primeiro grau, pois isso violaria o princípio do duplo grau de jurisdição. No entanto, essa ideia cede espaço à regra do § 3º do art. 1.013, pela qual em determinadas hipóteses em que o processo estiver em condições de imediato julgamento, o tribunal fica autorizado a decidir desde logo o mérito da demanda, sem restituir o processo para novo julgamento pela primeira instância.

Para tanto, é necessário que a causa esteja “madura” para julgamento, ou seja, que verse questão exclusivamente de direito ou esteja em condições de imediato julgamento.

Portanto, o tribunal não pode fazer uso da regra do § 3º do art. 1.013 se a causa exigir dilação probatória, sob pena de cerceamento de defesa. Contudo, quando já concluída a instrução probatória, poderá julgar desde logo o mérito.

[…]

No inciso II se inserem os casos de sentença extra petita, que é aquela que julga fora do pedido, ou seja, que concede ao autor pedido de natureza ou objeto diverso do que lhe foi demandado, bem como de sentença ultra petita, que é aquela que vai além do pedido, condenando o réu em quantidade superior da requerida pelo autor.

O inciso III diz respeito à sentença infra ou citra petita, que é aquela que não aprecia integralmente o pedido ou algum dos pedidos cumulados, sendo autorizado o tribunal a julgar desde logo o pedido sobre o qual a sentença se omitiu.” (Novo Código de Processo Civil Anotado / OAB. – Porto Alegre: OAB RS, 2015, pp. 787-788).

Considerando que, nestes autos, a instrução probatória foi perfectibilizada, que se trata de questão de direito e que a parte foi devidamente intimada para se manifestar sobre o ponto, rejeito a preliminar de nulidade veiculada pela Procuradoria Regional Eleitoral, tendo em vista a possibilidade de aplicação do art. 1.013, art. 3º, inc. III, do Código de Processo Civil.

Dessa forma, tendo em vista que o ponto omisso na sentença comporta imediato julgamento, deixo de decretar a nulidade da decisão.

Ainda, preliminarmente, cabe registrar que o candidato apresentou documentos novos em sede recursal.

O egrégio Tribunal Superior Eleitoral possui entendimento no sentido de que “julgadas as contas, com oportunidade prévia para saneamento das irregularidades, não se admite, em regra, a juntada de novos documentos” (TSE, AgReg no RESPE n. 239956, Relator Min. Rosa Weber. DJE: 31.10.2016).

Contudo, a teor do caput do art. 266 do Código Eleitoral, e na linha da reiterada jurisprudência desta Corte, compreendo não haver óbice ao conhecimento e à análise da documentação apresentada com o recurso.

Em relação ao mérito, entendo por superar a impropriedade relativa à falta de apresentação dos documentos referentes à cessão de uso de veículo, tido na sentença como uma das irregularidades ensejadoras da desaprovação, por afrontar o disposto nos arts. 65, § 1º, inc. II e 53, inc. II, da Resolução TSE n. 23.463/15.

Nota-se que as justificativas apresentadas pelo prestador, e os documentos que instruíram as razões (fls. 32-33), comprovam a propriedade do veículo utilizado em campanha, bem como a cessão de seu uso, de modo a elucidar a origem do recurso e sanar a irregularidade apontada.

De outro lado, também merece ser afastada a falha consistente na ausência de declaração, firmada pelo presidente do partido, comprovando o recebimento das sobras financeiras. Isso porque o recorrente juntou tal documento à fl. 30. Ademais, ainda que ausente tal comprovação, cabe ressaltar a modicidade do valor em comento, no montante de R$ 0,97, não se prestando para conduzir a um juízo de reprovação da contabilidade.

Por fim, quanto à impropriedade remanescente de análise, consistente na ausência de registro do recebimento de doações advindas de outros prestadores de contas, cabe consignar que de igual modo restou suprida pela documentação trazida pelo recorrente. Dos documentos das fls. 27, 30 e 31, é possível depreender-se que a importância de R$ 415,85, oriunda do Diretório Nacional do PDT, foi recebida pelo Diretório Municipal do PDT de Cristal e deste valor foram repassados R$ 83,17 ao ora recorrente. Tais valores referem-se a bens estimáveis em dinheiro (“santinhos”), que foram doados pelo partido ao candidato.

Ante o exposto, esclarecidas as inconsistências apontadas na sentença, deve o recurso ser parcialmente provido para que as contas sejam aprovadas com ressalvas.

Diante do exposto, VOTO pelo parcial provimento do recurso, no sentido de aprovar com ressalvas a prestação de contas de DELAMAR COQUEJO, relativa às eleições municipais de 2016.

É como voto, senhor Presidente.