RE - 33804 - Sessão: 06/12/2017 às 17:00

RELATÓRIO

Cuida-se de recursos eleitorais interpostos por JOÃO LUIS RODRIGUES OLIVEIRA e LEONARDO RODRIGUES VARGAS contra sentença de parcial procedência, que reconheceu a prática da conduta vedada prevista no art. 77 da Lei n. 9.504/97 pelo segundo recorrente e condenou-o à pena de multa, deixando, de outro lado, de reconhecer a prática da conduta vedada no que tange aos recorridos ELISANDRO ALEX DA SILVA PAZ e ALESSANDRO LEMOS CHAVES.

JOÃO LUIS RODRIGUES OLIVEIRA postula a reforma da sentença, ao argumento de que todos os candidatos compareceram à inauguração da iluminação do Estádio Centenário de Rosário do Sul, razão pela qual deve ser aplicada a pena de cassação do diploma dos recorridos.

LEONARDO RODRIGUES VARGAS sustenta que a fotografia da fl. 11 apenas permite concluir que a imagem foi retratada entre amigos, à noite, em uma via pública não identificada. Aduz que a jurisprudência do TSE tem afastado a configuração do ilícito eleitoral quando se tratar de mera presença à inauguração de obra pública, como no caso.

Nesta instância, a Procuradoria Regional Eleitoral manifestou-se pelo parcial provimento do recurso de JOÃO LUIS RODRIGUES OLIVEIRA e pelo desprovimento do interposto por LEONARDO RODRIGUES VARGAS.

É o relatório.

 

VOTO

Os recursos são tempestivos.

Na questão de fundo, cuida-se de representação ajuizada com fundamento na prática de conduta vedada, pois os representados, ALESSANDRO LEMOS CHAVES, ELISANDRO ALEX DA SILVA PAZ e LEONARDO RODRIGUES VARGAS, na condição de candidatos à vereança do Município de Rosário do Sul, compareceram, na data de 30.9.2016, em solenidade de inauguração da iluminação do Estádio Centenário daquela cidade, contrariando assim, o art. 77 da Lei n. 9.504/97, verbis:

Art. 77. É proibido a qualquer candidato comparecer, nos 3 (três) meses que precedem o pleito, a inaugurações de obras públicas.

Parágrafo único. A inobservância do disposto neste artigo sujeita o infrator à cassação do registro ou do diploma.

O propósito dessa proibição é impedir que um determinado candidato se coloque em posição de destaque em face dos demais concorrentes, rompendo com a igualdade que deve nortear a disputa eleitoral, e que serve como verdadeiro pressuposto da Democracia.

Com vista a analisar a existência da irregularidade apontada na vestibular, cumpre refletir sobre a hipótese fática vertente.

No caso, é incontroverso que a solenidade era uma inauguração de obra pública, custeada pelos cofres públicos, evento noticiado na página oficial da Prefeitura Municipal de Rosário do Sul (fl. 10), amoldando-se ao conceito trazido pela doutrina (In José Jairo Gomes, Direito Eleitoral, 8ª ed., 2012, p. 551):

A obra pública é definida no artigo 6º, I, da Lei de Licitações (Lei n. 8666/93) como sendo “toda construção, reforma, fabricação, recuperação ou ampliação, realizada por execução direta ou indireta”.

A ratio do artigo 77 é impedir o uso da máquina estatal em favor de candidatura, sendo prestigiadas a impessoalidade e a moralidade na Administração Pública. Quer-se impedir que obras patrocinadas com recursos públicos sejam desvirtuadas em prol de candidatos.

Assentada essa premissa, cabe examinar se há demonstração nos autos de que os candidatos compareceram ao evento e se esse comparecimento malferiu o bem jurídico protegido pela norma.

A respeito do comparecimento dos candidatos, colho na sentença exarada a análise da prova:

Alessandro Lemos Chaves aduziu ter comparecido na condição de espectador, prestigiando a Escola de Samba da qual é integrante.

Elisandro Alex da Silva Paz, por sua vez, asseverou não ter comparecido ao evento.

Já Leonardo Rodrigues Vargas afirmou que esteve na frente do estádio, para pegar uma chave com um amigo, não adentrando no local, nem tendo realizado atos de campanha.

A fim de aferir a veracidade das alegações deduzidas pelas partes, passo à análise do conjunto probatório produzido no feito, iniciando pelo teor do depoimento das testemunhas arroladas pelo representante.

Ricardo Cleumar Nunes da Silva, advertido e compromissado, afirmou que esteve na referida inauguração. Aduziu que os candidatos Elizandro, Alessandro e Leonardo lá estavam presentes. Disse que Elizandro e Leonardo estavam na entrada do estádio (do lado de dentro do portão), ao passo que Alessandro estava na arquibancada. Falou que Elizandro e Leonardo estavam abordando pessoas, entregando panfletos e pedindo voto. Afirmou que os candidatos faziam menção a sua ligação com o esporte. Contou não ter visto Alessandro pedindo voto. Indagado, afirmou que os candidatos continuavam na entrada do estádio quando de sua saída do local. Aduziu que quem lhe abordou e pediu voto foi Elizandro. Em momento posterior, disse que não viu Leonardo pedindo voto dentro do estádio, e que não conversou com ele. Aduziu que foi "apresentado" a Leonardo por Elizandro, que referiu-se àquele como "meu parceiro", mas não chegou a ficar frente a frente com Leonardo. Falou que o representante não estava na inauguração. Contou que foi ver uma obra com João Luis (representante) em São Gabriel, oportunidade em que lhe contou o que vira no estádio. Negou que trabalhe com João Luis, aduzindo que a obra referida foi a única que foram ver juntos. Relatou que Elizandro não fez referência à inauguração ao lhe pedir voto. Afirmou que havia cabos eleitorais dentro do estádio, que chegaram a cantar a música do candidato Leonardo. Ao final, reafirmou que viu Elizandro na entrada, do lado de dentro do estádio, que lhe entregou panfleto e pediu voto. Aduziu que Leonardo estava próximo, mas não lhe pediu voto, e não notou que portasse algum distintivo referente a sua candidatura. Disse que viu Alessandro nas arquibancadas, em momento posterior, mas não chegou a ter contato com o mesmo.

Seu depoimento em juízo diverge em teor da declaração acostada à inicial (fl. 08), onde refere que o candidato Leonardo "fazia panfletagem de materiais eleitorais com pedido expresso de votos às pessoas que lá se encontravam", ao passo que Elizandro fazia "panfletagem direta a eleitores com pedido expresso de votos e entrega de santinhos, entretanto era mais discreto que o candidato Nico (...)".

Andréia Fontoura Araújo, advertida e compromissada, afirmou que compareceu à inauguração. Aduziu que Leonardo, Elizandro e Alessandro estavam lá. Disse que Elizandro e Leonardo estavam na entrada do estádio, logo depois do portão. Falou que Alessandro estava na arquibancada, mas não o viu realizando atos de campanha. Contou que recebeu santinhos de Elizandro, e acabou votando nele. Narrou não ter conversado com Leonardo, embora este estivesse entregando panfletos para várias pessoas. Respondeu afirmativamente, quando indagada se Elizandro estava junto com as autoridades por ocasião da inauguração, e atribuíra a si a consecução da iluminação pro estádio. Afirmou que recebeu um ingresso do PTB, para ingressar no estádio, mas não chegou a pagar por ele. Ao final, afirmou que Leonardo falou no microfone por ocasião da solenidade de inauguração. Não soube dizer se Elizandro fez o mesmo.

Aqui também, percebem-se divergências com a declaração que instrui a inicial (fl. 09), onde Andréia afirmou "que os candidatos Leonardo Rodrigues Vargas - Nico e Elizandro Paz Piruca (Candidato do PP) conversaram diretamente comigo pedindo apoio na campanha eleitoral, através de meu voto e entregando-me seus respectivos santinhos, bem como presenciei os mesmo pedindo apoio a inúmeras pessoas".

Chama atenção outrossim, as afirmações de que recebeu ingresso para a solenidade do PTB (o que não é referida por qualquer outra testemunha, e provavelmente não tenha existido, por tratar-se de inauguração de obra pública), e de que testemunhou Leonardo fazendo uso do microfone na solenidade (o que, igualmente, não é referido por qualquer outra testemunha, nem consta do vídeo que instrui o feito - fl. 33).

Por outro lado, as testemunhas arroladas pelos representados Elizandro e Leonardo asseveram não tê-los visto no local, ao passo que aquelas arroladas por Alessandro corroboram a informação de que o mesmo lá esteve, na condição de espectador.

Sem delongas, observo que improcede a representação contra o representado Alessandro, eis que ausente mínima comprovação de que o mesmo tenha utilizado de sua presença no estádio (incontroversa), para fins de promoção eleitoral. Nesse sentido, inclusive, as fotografias de fl. 17/18, denotando participação discreta, na condição de espectador.

Quanto ao representado Elizandro, o conjunto probatório não é seguro suficiente no que diz respeito à sua efetiva presença no evento, nem no que tange à participação ativa no mesmo.

A prova testemunhal produzida pelo representante, como se viu, não é harmônica com o conteúdo das declarações acostadas à inicial, e diverge daquela produzida pelos representados, não sendo possível estabelecer preponderância de uma ou de outra.

Já a fotografia de fl. 20 (furtivamente tirada) não permite afirmar que se refira ao dia da inauguração, nem demonstra entrega ostensiva de panfletos por Elizandro, como referido pelas testemunhas arroladas pelo representante. A situação é diversa, todavia, em relação ao representado Leonardo. Conforme aduzido pelo próprio em contestação, ele esteve na frente do estádio "para pegar uma chave, que se encontrava com um amigo, sendo que sequer adentrou no local".

Não foi declinado, entretanto, o nome do referido amigo, nem arrolado o mesmo como testemunha.

As imagens de fls. 10/11 e 13/14, veiculadas no facebook da Prefeitura Municipal, e compartilhadas pelo representado, permitem concluir que seu comparecimento ao local não restringiu-se a "pegar uma chave, que se encontrava com um amigo", pois permitiu-se fotografar, ao lado de outras pessoas, pela assessoria de imprensa da Prefeitura Municipal.

O fato de as fotografias pertinentes à inauguração terem sido publicadas pela Prefeitura na mesma data e oportunidade daquela em Leonardo aparece com outras duas pessoas à frente do estádio (fl. 11), não deixam dúvidas de que esta última foi tirada por ocasião do evento em questão.

E ao ser fotografado pela imprensa oficial, à frente do local em que se realizava inauguração de obra pública, o candidato passou aos eleitores que lá se encontravam a mensagem de que teve influência na execução da obra, especialmente por seu vínculo com o esporte (evidente nos autos), e com o governo municipal da época (exercido pela Prefeita Zilase Rossignollo, do mesmo partido - PTB), justamente o que o art. 77 da Lei 9.504/97 visa evitar. Impõe-se, por tal razão, o reconhecimento da prática de conduta vedada pelo representado Leonardo.

Quanto ao sancionamento, deve-se t er em conta a gravidade do ato praticado, conforme antes explanado.

Nesse sentido, observo que resumem-se às referidas fotografias a prova da participação do representado no evento, não sendo possível afirmar, com segurança, que o mesmo tenha realizado atos ostensivos de campanha, distribuindo santinhos ou pedindo voto, de modo a impactar significativamente na igualdade de forças entre os concorrentes ao cargo de vereador. Outrossim, o fato de seu jingle de campanha ter sido entoado por apoiadores presentes ao evento (perceptível no vídeo de fl. 33), não tipifica conduta vedada. (Grifei.)

Dessa forma, como concluído pelo magistrado a quo, a prova evidenciou que os candidatos efetivamente compareceram à inauguração, entretanto, não é possível asseverar tenham eles assumido posição ostensiva de campanha, diante das contradições constatadas nos depoimentos.

Entrementes, nessa quadra argumentativa, é preciso verificar se o mero comparecimento é suficiente para atrair a tipificação da conduta vedada.

Para tanto, trago as lições de Rodrigo López Zilio (Direito Eleitoral, 5ª Ed., Verbo Jurídico, p. 586-587) sobre o bem jurídico tutelado pelas condutas vedadas:

O bem jurídico tutelado pelas condutas vedadas é o princípio da igualdade entre os candidatos. Assim, desnecessário qualquer cotejo com eventual violação à normalidade ou legitimidade do pleito. Basta apenas seja afetada a isonomia entre os candidatos; nada mais. Neste sentido, o próprio caput do art. 73 da LE prescreve que são condutas vedadas porque “tendentes” a afetar a igualdade entre os candidatos. O legislador presume que tais condutas, efetivamente, inclinam-se a desigualar os contendores.

Exigir prova da potencialidade da conduta na lisura do pleito equivale a um esvaziamento do comando normativo, porquanto imporia um duplo ônus ao representante: a prova da adequação do ilícito à norma (legalidade estrita ou taxatividade) e a prova da potencialidade da conduta. A adoção dessa tese implica o esvaziamento da representação por conduta vedada, pois, caso necessária a prova da potencialidade, mais viável o ajuizamento da AIJE – na qual, ao menos, não é necessária a prova da tipicidade da conduta. Em suma, o bem jurídico tutelado pelas condutas vedadas é o princípio da isonomia entre os candidatos, não havendo que se exigir prova de potencialidade lesiva de o ato praticado afetar a lisura do pleito. Do exposto, a prática de um ato previsto como conduta vedada, de per si e em regra – salvo fato substancialmente irrelevante – é suficiente para a procedência da representação com base no art. 73 da LE, devendo o juízo de proporcionalidade ser aferido, no caso concreto, para a aplicação das sanções previstas pelo legislador (cassação do registro ou do diploma, multa, suspensão da conduta, supressão dos recursos do fundo partidário).

Contudo, o legislador dispensou tratamento desigual às demais condutas vedadas previstas nos arts. 74, 75 e 77 da LE, nas quais a sanção é apenas de cassação do registro ou do diploma – sem previsão de multa. Neste passo, existe uma dificuldade praticamente incontornável de imprimir uma conceituação uniforme em relação ao bem jurídico para todas as condutas vedadas aos agentes públicos. Com efeito, caso se entenda pela irrestrita aplicação do princípio da isonomia, basta a prática de uma ação que se amolde ao tipo prescrito, para a procedência da representação por conduta vedada. Assim, v.g., um único comparecimento de um candidato, em inauguração de obra pública, no período vedado, importaria a cassação do registro ou do diploma, conforme dispõe o art. 77 da LE. No caso em tela, como não é prevista pena pecuniária, não há espaço para aplicação do princípio da proporcionalidade na fixação da sanção. Por tal motivo, o TSE tem exigido, nas hipóteses dos arts. 74, 75 e 77 da LE, a prova da potencialidade lesiva, já que se trata de infração eleitoral com sanção única e extremamente gravosa. (Grifei.)

As condutas vedadas previstas nos arts. 74, 75 e 77 da Lei das Eleições receberam tratamento diferenciado pelo legislador porque nessas hipóteses, está prevista apenas a cassação do registro ou diploma, diferentemente das demais que cumulam sanção pecuniária.

Diante disso, a jurisprudência do TSE firmou-se no sentido de que naquelas hipóteses (art. 74, 75 e 77), à configuração do ilícito, exige-se prova da potencialidade lesiva. Significa dizer, há de se examinar se a conduta teve o condão de afetar a normalidade e legitimidade do pleito e se é suficientemente gravosa para atrair a única sanção prevista: cassação do registro ou do diploma. Caso contrário, a representação deve ser julgada improcedente, não havendo possibilidade de incidência dos postulados da proporcionalidade e da razoabilidade para aplicar sanção pecuniária não prevista no tipo legal.

A propósito, registro que o precedente colacionado pelo parecer da douta Procuradoria Eleitoral (RP 7572797), no qual esta Corte havia aplicado multa à hipótese do art. 77 da LE, foi alterado pelo TSE porque às normas limitadoras de direitos deve-se dar interpretação estrita (AgR-REspe n. 25.926/SP, DJ de 20.11.2006, Rel. Min. Caputo Bastos).

Transcrevo a decisão do Ministro Dias Tóffoli:

Decisão Monocrática em 21.10.2013 - RESPE N. 572797 Ministro DIAS TOFFOLI, Publicado em 04.11.2013 no Diário de Justiça Eletrônico, página 15-17

[...]

A representação proposta pelo Ministério Público Eleitoral em desfavor do recorrente teve como fundamento a suposta prática de conduta vedada prevista no art. 77 da Lei n. 9.504/97: comparecimento de candidato à inauguração de obra pública nos três meses que antecedem as eleições.

O Tribunal de origem, a despeito de reconhecer a tipicidade da conduta descrita no referido dispositivo legal, julgou desproporcional a aplicação da sanção de cassação do registro de candidatura do representado. Todavia, concluiu pela imposição da pena pecuniária prevista no art. 73, § 4º, da Lei das Eleições, em seu patamar mínimo.

Extraio do acórdão recorrido o seguinte excerto (fl. 83v):

O intérprete apressado poderia objetar a aplicação da sanção pecuniária à conduta prevista no art. 77, caput, da Lei n. 9.504/97, ao argumento de não estar ela expressamente prevista no parágrafo único do mesmo dispositivo legal. Não me parece essa a melhor exegese sistêmica das regras atinentes às condutas vedadas.

O legislador prevê como condutas vedadas aos agentes públicos a infração aos arts. 73, 74, 75 e 77 da Lei n. 9.504/97.

Nessa ordem de considerações, não há como conferir tratamento diferenciado, no que se refere à aplicação de sanções, a fatos que têm idêntico bem jurídico tutelado, qual seja, a isonomia entre os candidatos.

Proíbem-se, nos incisos do art. 73 da Lei n. 9.504/97, condutas com a mesma objetividade jurídica do que as previstas nos arts. 74, 75, 76 e 77. O fato de a multa vir disciplinada topicamente no art. 73 não significa dizer que só às infrações nele dispostas é aplicável. Procedente esse argumento, na hipótese como a vertente, não haveria sanção a ser aplicável, ainda que reconhecida a infração à regra, o que levaria ao esvaziamento absoluto da força imperativa das normas. Seria um convite à transgressão.

Esta Corte já firmou entendimento de que o princípio da proporcionalidade deve ser levado em consideração na imposição da sanção pela prática da infração ao art. 77 da Lei das Eleições, qual seja, a cassação do registro ou do diploma do infrator. Confira-se:

Representação. Conduta vedada. Inauguração de obra pública.

1. Este Tribunal Superior já firmou entendimento no sentido de que, quanto às condutas vedadas do art. 73 da Lei nº 9.504/97, a sanção de cassação somente deve ser imposta em casos mais graves, cabendo ser aplicado o princípio da proporcionalidade da sanção em relação à conduta.

2. Com base nos princípios da simetria e da razoabilidade, também deve ser levado em consideração o princípio da proporcionalidade na imposição da sanção pela prática da infração ao art. 77 da Lei das Eleições.

3. Afigura-se desproporcional a imposição de sanção de cassação a candidato à reeleição ao cargo de deputado estadual que comparece em uma única inauguração, em determinado município, na qual não houve a presença de quantidade significativa de eleitores e onde a participação do candidato também não foi expressiva.

Agravo regimental não provido. (AgR-REspe nº 8902-35/GO, Rel. Min. Arnaldo Versiani, DJe de 21.8.2012)

Do voto condutor do referido julgado, colho o seguinte trecho:

[...] o simples fato de o candidato comparecer ao evento já configura o referido ilícito. Ressaltei, porém, que o art. 77 da Lei das Eleições apenas prevê, como sanção, a cassação do registro ou do diploma do infrator.

Reitero, portanto, que este Tribunal Superior já firmou entendimento no sentido de que, quanto às condutas vedadas do art. 73 da Lei das Eleições, a sanção de cassação somente há de ser imposta em casos mais graves, cabendo ser aplicado o princípio da proporcionalidade, critério que deve ser estendido, com base no princípio da simetria, à sanção pela prática da conduta vedada do art. 77 do mesmo diploma legal.

Como visto, e conforme alegado pelo recorrente, o parágrafo único do art. 77 da Lei das Eleições somente prevê como sanção a cassação do registro ou do diploma do infrator.

Na linha da jurisprudência firmada neste Tribunal Superior, às normas limitadoras de direitos deve-se dar interpretação estrita (AgR-REspe n. 25.926/SP, DJ de 20.11.2006, Rel. Min. Caputo Bastos).

Desse modo, considerando a ausência de previsão legal específica, é inviável a aplicação de pena de multa por violação ao art. 77 da Lei n. 9.504/97.

Adoto ainda, como razão de decidir, os fundamentos esposados no parecer ministerial (fls. 133-134):

Como visto, assiste razão ao recorrente ao afirmar que a cassação do registro ou do diploma consiste na única sanção legal prevista, no caso de descumprimento do preceito. Dessa forma não é cabível a aplicação de multa, diante da ausência de previsão legal que a ampare.

Com efeito, em decisão recente, proferida pelo Exmo. Ministro Marcelo Ribeiro, este ponderou que “não é possível, assim, buscar justificativa para a sanção em dispositivo estranho ao violado, se a lei não cogitou de prevê-la. É necessário que a lei tipifique não só a conduta ilegal como a sanção correspondente, pois dessa forma recomenda o art. 5º, XXXIX, da Constituição Federal”.

Entendeu o eminente julgador, com acerto, em consonância com a manifestação ministerial, que a interpretação sistemática não pode ser utilizada para substituir o legislador, sobretudo em matéria de penalidade, ou seja, “as normas que encerram sanções devem ser interpretadas estritamente, não se admitindo a aplicação de sanção por interpretação sistemática, como pretende o recorrente, sem que a norma de regência expressamente assim determine" .

Ante o exposto, dou provimento ao recurso especial, com base no art. 36, § 7º, do Regimento Interno do Tribunal Superior Eleitoral, para afastar a multa imposta ao recorrente. (Grifei.)

Dessarte, considerando a ausência de previsão legal específica, é inviável a aplicação de pena de multa por violação ao art. 77 da Lei n. 9.504/97, a pretexto de ser dada interpretação sistemática à norma.

Se a cassação do registro ou do diploma consiste na única sanção legal prevista, inviável que o julgador assuma a função de legislador e faça incidir sanção não prevista em lei.

Nesse sentido, a reiterada jurisprudência do TSE:

RECURSO ESPECIAL ELEITORAL. RECEBIMENTO. RECURSO ORDINÁRIO. ELEIÇÕES 2010. INAUGURAÇÃO DE OBRA PÚBLICA. ART. 77 DA LEI 9.504 /97. VIOLAÇÃO. INEXISTÊNCIA. DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL. SIMILITUDE FÁTICA. DEMONSTRAÇÃO. INEXISTÊNCIA. NÃO PROVIMENTO. 1. Cabe recurso ordinário contra decisão que versa sobre expedição de diploma em eleições federais e estaduais (art. 276 , II , a , do Código Eleitoral ). Na espécie, é admissível o recebimento do recurso especial como recurso ordinário por aplicação do princípio da fungibilidade. 2. A disciplina das condutas vedadas aos agentes públicos em campanha eleitoral visa coibir a utilização da máquina administrativa em benefício de determinada candidatura, o que não se verifica na espécie. Na espécie, o candidato compareceu à inauguração de obra promovida pelo seu adversário político, mas não auferiu vantagem político-eleitoral com o evento. Não incide, por isso, a sanção prevista no art. 77 , parágrafo único , da Lei 9.504 /97. 3. Recurso ordinário não provido.

(REspe n. 46984 SP, Data da publicação 07.6.2011, Min. Fátima Nancy Andrighi) (Grifei.)

Dessa forma, não havendo demonstração de que os candidatos tenham assumido qualquer posição de destaque na inauguração, com inequívoca potencialidade de malferir a normalidade e legitimidade do pleito, aliada à circunstância de ter sido apenas um evento ao longo de toda a campanha, nos termos da melhor doutrina e jurisprudência, a ação deve ser julgada totalmente improcedente em relação a todos os candidatos.

Ante o exposto, voto pelo provimento do recurso de LEONARDO RODRIGUES VARGAS, para julgar improcedente a representação, afastando a multa imposta de R$ 5.320,50, e nego provimento ao recurso de JOÃO LUIS RODRIGUES OLIVEIRA.

É o voto.