E.Dcl. - 45292 - Sessão: 10/10/2017 às 17:00

RELATÓRIO

Cuida-se de embargos de declaração opostos por PEDRO SILVESTRE ROCHA COSTA (fls. 247-256).

Em suas razões, sustenta que [sic] “a prova exclusiva dos autos trazidos pela acusação é uma gravação ambiental clandestina”, a qual teria sido produzida de maneira “premeditada e sorrateira”. Questiona a adoção, pelo acórdão embargado, dos termos de julgamento adotados pelo STF no RE n. 583.937, em processo de natureza criminal e dotado de repercussão geral. Entende que houve afronta ao art. 368-A do Código Eleitoral, o qual veda a determinação de perda do mandato com base em prova testemunhal singular e exclusiva. Ao final, indica que o acórdão incorre em contradições e omissões, ao ignorar (1) o fato de que Angélica, interlocutora que gravou a conversa com o embargante, refere que “sabia que ele ia pedir votos lá em casa”, em indicativo de premeditação, e (2) o “claríssimo testemunho da própria acusação”, no sentido de que, em 2016, nada lhe foi prometido. Requer o conhecimento e o provimento dos embargos, para sanar os vícios apontados.

Após manifestação da Procuradoria Regional Eleitoral (fls. 259-263), os autos vieram conclusos.

É o relatório.

 

VOTO

Tempestividade

Cabe afirmar a tempestividade dos embargos de declaração. O acórdão foi publicado no dia 15.9.2017, sexta-feira (fl. 238), e os embargos foram opostos no dia 21.9.2017 (fl. 245). Há de se considerar o feriado ocorrido em 20.9.2017, para entender pela tempestividade.

Mérito

Do não preenchimento dos requisitos para a oposição dos embargos de declaração.

Saliento, desde já, a inocorrência de apontamento de vício no acórdão embargado, pela peça recursal, ao longo dos itens I e II da irresignação. Isso porque o embargante limita-se a rediscutir a legalidade da gravação ambiental realizada pela eleitora Angélica, ponto devidamente fundamentado na decisão deste Tribunal, e que, absolutamente, não se resumiu à referência ao precedente do STF, o RE n. 583.937. Ao contrário: o acórdão aponta, forma expressa, o histórico da jurisprudência do TSE, com a indicação, inclusive, de decisões mais recentes do que aquelas indicadas nos embargos.

Nessa linha, o seguinte trecho:

Como dito, há decisões do TSE que restringem a utilização de tal espécie probatória, ainda que realizada por um dos interlocutores. Mas o assunto merece atenção redobrada, pois o órgão de cúpula foi mais restritivo, especialmente no período entre o ano de 2013 até o início de 2015; antes, sobretudo entre 2008 a 2012, o eg. Superior já construía precedentes pela licitude da gravação ambiental.

Uma jurisprudência um tanto pendular, portanto.

E, recentemente houve um novo movimento, no sentido de admitir como prova a gravação ambiental realizada em locais públicos, o que teve início no REspe 637-61/MG, Rel. Ministro Henrique Neves, DJE de 21.5.2015

RECURSOS ESPECIAIS. AÇÃO CAUTELAR. AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL. ABUSO DO PODER ECONÔMICO. CAPTAÇÃO ILÍCITA DE SUFRÁGIO.

Recurso especial da Coligação Cuidando de Nossa Cidade para Você

1. Na linha do entendimento majoritário, a eventual rejeição de um fundamento suscitado no recurso eleitoral não torna o recorrente parte vencida. O interesse recursal, que pressupõe o binômio necessidade/utilidade, deve ser verificado a partir do dispositivo do julgado. Precedentes: REspe n. 185-26, rel. Min. Dias Toffoli, DJE de 14.8.2013; REspe n. 35.395, rel. Min. Arnaldo Versiani, DJE de 2.6.2009.

2. Se a Corte de origem concluiu que as provas documentais e testemunhais seriam inservíveis e pouco esclarecedoras em relação à segunda conduta imputada na AIJE, a revisão de tal entendimento demandaria o reexame de fatos e provas, providência vedada em sede de recurso especial, a teor das Súmulas 279 do Supremo Tribunal Federal e 7 do Superior Tribunal de Justiça.

Recurso especial não conhecido.

Recurso especial e ação cautelar de Francisco Lourenço de Carvalho

1. "A contradição que autoriza a oposição dos declaratórios é a existência no acórdão embargado de proposições inconciliáveis entre si, jamais com a lei nem com o entendimento da parte" (ED-RHC n. 127-81, rel. Min. Laurita Vaz, DJE de 2.8.2013).

2. Nos termos da atual jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral, a gravação ambiental realizada por um dos interlocutores, sem o conhecimento de um deles e sem prévia autorização judicial, é prova ilícita e não se presta à comprovação do ilícito eleitoral, porquanto é violadora da intimidade. Precedentes: REspe n. 344-26, rel. Min. Marco Aurélio, DJE de 28.11.2012; AgRRO n. 2614-70, rel. Min. Luciana Lóssio, DJE de 7.4.2014; REspe n. 577-90, rel. Min. Henrique Neves, DJE de 5.5.2014; AgRRespe n. 924-40, rel. Min. João Otávio de Noronha, DJE de 21.10.2014.

3. As circunstâncias registradas pela Corte de origem indicam que o discurso objeto da gravação se deu em espaço aberto dependências comuns de hotel, sem o resguardo do sigilo por parte do próprio candidato, organizador da reunião. Ausência de ofensa ao direito de privacidade na espécie, sendo lícita, portanto, a prova colhida.

4. O quadro fático delineado no acórdão regional não revela a mera tentativa de obtenção de apoio político, pois, em diversas passagens, o que se vê são os pedidos expressos de voto e o oferecimento de vantagem aos estudantes. Incidência, na espécie, das Súmulas 279 do Supremo Tribunal Federal e 7 do Superior Tribunal de Justiça.

5. Ação cautelar proposta com o objetivo de conferir efeito suspensivo ao recurso especial julgada improcedente.

Recuso especial conhecido e desprovido. Ação cautelar julgada improcedente.

O Tribunal, por maioria, desproveu o recurso de Francisco Lourenço de Carvalho, nos termos do voto do Relator. Vencida a Ministra Luciana Lóssio.

Ou seja, devidamente abordada a realidade das “contendas judiciais eleitorais”.

O mesmo ocorre com a alegação de “testemunho singular”, cuja aceitação estaria em contrariedade com o disposto no art. 368-A do Código Eleitoral.

O raciocínio do embargante é peculiar, mas não procede. Explico.

Como pretende (mais uma vez) invalidar uma gravação ambiental lícita, o embargante parte da premissa de ilicitude da referida prova para concluir que teria restado, para a condenação, tão somente o testemunho de Angélica.

Equivocado.

Como já dito, o suporte de prova tem também gravação ambiental claríssima, de forma que resta inaplicável à espécie o art. 368-A do CE, pois o arcabouço probatório tem outros meios de prova válidos, além da testemunhal.

Ademais, incorrem em contradição, na realidade, os próprios embargos, pois, primeiramente, afirmam que “consoante se denota do v. acórdão ora embargado, a prova exclusiva dos fatos trazidos pela acusação é uma gravação ambiental clandestina” (fl. 247), para, logo em seguida, sustentar (fl. 255) que “[…] resta evidente que o acórdão não apenas considera como puro e inquestionável o testemunho de quem justamente acusa o embargante como o utiliza para justificar a condenação e perda de mandato deste [...]”.

Ora, a decisão embargada tem suporte tanto no conteúdo da gravação quanto nos elementos colhidos dos testemunhos, conforme demonstrado à fl. 235: “Houve, portanto, a tentativa de compra do voto, a prática do art. 41-A. As teses defensivas sobre os fatos são ilididas pelas próprias declarações de Angélica e pelo conteúdo da gravação”.

Portanto, além de não se prestarem à oposição de embargos, pois intentam apenas rediscutir o mérito de questões já enfrentadas, os itens I e II demonstram apenas contrariedade a uma decisão desfavorável ao embargante.

No que concerne ao item III, melhor sorte não assiste aos embargos.

Note-se que ao argumento central seria a passagem ao largo de duas circunstâncias: a primeira, o fato de que Angélica, interlocutora que gravou a conversa com o embargante, refere que “sabia que ele ia pedir votos lá em casa”, em indicativo de premeditação, e o “claríssimo testemunho da própria acusação”, no sentido de que, em 2016, nada lhe foi prometido.

Não procede.

Transcrevo trecho do acórdão, o qual deixa claro, inclusive, que o próprio embargante, em fala de sua autoria, retira dúvidas relativamente à contemporaneidade da prática de captação ilícita de sufrágio, bem como ao fato de que o diálogo gravado ocorreu enquanto PEDRO realizava campanha eleitoral na rua onde Angélica possui residência:

[...]

Isso porque é necessário ser afastada, desde já, a tese recorrente de que se trataria de diálogo relativo às eleições de 2012.

Não é o caso. A conversa diz respeito às eleições de 2016.

É nítido, no áudio, que a referência ao pleito do ano de 2012 se dá apenas no começo, estritamente no momento em que Angélica refere “[…] lembra que tu prometeu uma coisa para mim e não cumpriu?”.

A partir de então, todo o diálogo se desenvolve tendo como referencial a eleição de 2016, pleito que se avizinhava. Até mesmo para que o diálogo tenha sentido.

Senão, vejamos: PEDRO refere, no áudio, respondendo [sic] que “Te ajudo, me ajuda que eu te ajudo. Agora eu não posso dar, mas me ajuda tu e teu marido que depois da eleição eu te pago. Não posso dar agora porque é ilegal, mas te dou, te dou”.

Ora, o “agora” é o período de véspera das eleições de 2016, data na qual Angélica testemunha ter gravado a conversa porque, na eleição de 2012, “VETI” já havia realizado promessa de benefício em troca de voto. Aliás, este é o motivo pelo qual Angélica preparou-se para gravar o diálogo: porque previa que PEDRO viesse a repetir a proposta em 2016.

Como, de fato, fez.

E as provas são exatamente os termos usados por PEDRO, o qual refere o“domingo agora”, e que “estou precisando do teu voto dessa vez”. Ainda, ao se despedir de “Isabel”, terceira pessoa que interrompe o diálogo com Angélica, PEDRO ouve “boa sorte amanhã”, ao que responde “estamos trabalhando”.

Houve, nessa linha, uma clara renovação da promessa, muito bem analisada pelo juízo monocrático (fl. 119):

Ainda que a eleitora tenha dito em seu depoimento perante o juízo que o candidato teria feito a promessa de fornecimento de sacos de cimento na eleição passada, o conteúdo da gravação não deixa dúvida de que o representado renovou a promessa de entrega do(s) saco(s) de cimento também para esta eleição em troca do voto da eleitora. Nesse sentido, a eleitora Angélica confirmou em seu depoimento em audiência que o candidato ofereceu ajuda caso ela votasse nele. Ademais, a eleitora responsável pela gravação ambiental declarou também que sofreu ameaças por telefone em 31.11.2016 e que inclusive se mudou de Barra do Ribeiro porque estava com medo de sofrer algum mal por ter gravado conversa.

Nesse aspecto, a declaração testemunhal de Angélica corrobora todo o quadro indicado pela gravação, pois ela confirma, ao contrário do que as razões de recurso querem fazer crer, que a gravação ocorreu na véspera do pleito de 2016.

Nesse aspecto, a declaração testemunhal de Angélica corrobora todo o quadro indicado pela gravação, pois ela confirma, ao contrário do que as razões de recurso querem fazer crer, que a gravação ocorreu na véspera do pleito de 2016.

Nessa toada, Angélica testemunha que “sabia que ele ia pedir voto lá em casa nos últimos dias”, bem como que “quatro anos atrás, ele me prometeu os sacos de cimento”, para, em seguida, afirmar que “só que naquele tempo eu não tinha meu celular ainda para gravar” e que eu “deixei ele falar, ele passou a falar mal do pastor, né, que era candidato antes, e falou assim – 'tu tá sempre apoiando o pastor', daí eu já tava gravando, eu sabia que ele ia falar mal para pedir voto”.

Mais ao final do depoimento, Angélica responde a uma pergunta do representante do Ministério Público (“A senhora sabia que o candidato VETI iria lhe procurar?”), relatando que PEDRO já havia realizado a proposta “quatro anos atrás”, e que “eu já sabia que ele ia vir de novo”.

Daí, quem dá – definitivamente – o ar de contemporaneidade à proposta ilícita é o próprio PEDRO, ao afirmar, na gravação realizada por Angélica [sic]: “tô tentando de novo, eu sei que você apoia o pastor, mas dessa vez o pastor não está […] estou precisando do teu voto dessa vez, sei que nunca votaram em mim, sei que apoiam o pastor, mas dessa vez o pastor não está, dessa vez eu estou”, deixando claro que o objeto da conversa é a eleição de 2016.

 

Diante do exposto, VOTO pelo conhecimento e rejeição dos embargos.