RE - 2419 - Sessão: 24/05/2018 às 16:00

RELATÓRIO

Trata-se de recurso interposto pelo DIRETÓRIO MUNICIPAL DO PARTIDO DO MOVIMENTO DEMOCRÁTICO BRASILEIRO (PMDB) de Três Coroas (fls. 286-292), contra sentença do Juízo da 149ª Zona que desaprovou a prestação de contas referente ao exercício financeiro de 2015 em virtude do recebimento de recursos de fonte vedada, aplicando a suspensão, com perda, de novas quotas do Fundo Partidário por um ano e determinando o recolhimento de R$46.043,08 ao Tesouro Nacional, acrescidos de multa de dez por cento, a teor do art. 37 da Lei n. 9.096/95 (fls. 276-279).

Em suas razões recursais, arguiu preliminar de nulidade da sentença por suposto cerceamento de defesa em face do indeferimento de prova testemunhal, requerida em sede de defesa. Na questão de fundo, sustentou que as doações realizadas ao partido provieram de pessoas físicas e de servidores municipais a ele filiados, os quais não exerceriam função de comando sobre outras pessoas, fato que demonstraria a ausência de subsunção à norma proibitiva como contribuições oriundas de fonte vedada.

Nesta instância, a Procuradoria Regional Eleitoral opinou pela anulação da sentença e retorno dos autos à origem para saneamento, em virtude do afastamento da responsabilidade dos dirigentes partidários pelo juiz de primeira instância. Alternativamente, pelo afastamento da preliminar e, quanto ao mérito, pelo desprovimento do recurso e pela exclusão, de ofício, da multa cominada (fls. 301-310).

É o relatório.

 

VOTO

Admissibilidade

O recurso é tempestivo (fls. 281-286) e preenche os demais pressupostos de admissibilidade, razão pela qual dele conheço.

Preliminares

De plano, afasto a preliminar de cerceamento de defesa arguida pelo recorrente, suscitada em face do indeferimento, pelo juiz a quo, da prova testemunhal requerida.

Para tanto, adoto o parecer do agente ministerial nesta instância, que bem apreciou a matéria (fls. 301-310):

Ocorre que, no processo de prestação de contas, a prova é estritamente documental, sendo o rito incompatível com a produção de prova testemunhal.

Nesse sentido é o entendimento jurisprudencial:

Recurso. Prestação de contas. Candidato a vereador. Art. 18, inc. I, da Resolução TSE n. 23.376/12 . Eleições 2012. Desaprovação no juízo originário. Rejeitada a preliminar de cerceamento de defesa visto ser incabível a prova testemunhal em processos de prestação de contas. Irregularidade decorrente da aplicação de recursos próprios em campanha em valor superior ao patrimônio declarado por ocasião do registro de candidatura. Inexistência de prova segura quanto à origem dos recursos. Comprometimento da fiscalização das contas pela Justiça Eleitoral. Provimento negado.

(TRE-RS, Recurso Eleitoral n. 15382, Acórdão de 21.11.2013, Relator Dr. Luis Felipe Paim Fernandes, Publicação: DEJERS - Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Tomo 217, Data 25.11.2013, Página 6.) (Grifei.).

 

AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ELEITORAL. PRESTAÇÃO DE CONTAS. ÓRGÃO PARTIDÁRIO. POSICIONAMENTO DE ÓRGÃO TÉCNICO DO TRIBUNAL. CARÁTER OPINATIVO. INOCORRÊNCIA DE OFENSA À LEGISLAÇÃO OU VIOLAÇÃO A CONTRADITÓRIO E À AMPLA DEFESA. DIVERSAS OPORTUNIDADES DE SANEAMENTO. DISCORDÂNCIA ACERCA DE SER EXCESSIVO O VALOR DE ALUGUEL INFORMADO. POSTULADAS PROVA TESTEMUNHAL E PERICIAL. DESNECESSIDADE. CARÁTER DOCUMENTAL DO FEITO. RECURSO DESPROVIDO.

Não há que se falar em ofensa à legislação eleitoral por parte do órgão de auditoria do Tribunal, se as provas carreadas aos autos têm apenas o condão de corroborar as afirmações e conclusões esposadas no relatório técnico final. Igualmente, não há violação do contraditório e da ampla defesa, considerando que o partido foi intimado de todas as diligências destinadas a sanar irregularidades e teve, à sua disposição, todas as dilações de prazo possíveis, nos termos da legislação aplicável.

Na linha de precedentes jurisprudenciais, não se pode conceder ao partido inúmeras oportunidades para suprir falhas na prestação de contas (TSE - Petição n.º 1.454).

Em sede de prestação de contas, inexiste previsão legal para oitiva de testemunhas, em virtude da própria natureza instrumental do procedimento, baseado na análise técnica de documentos, sobretudo quando ausente qualquer fundamento fático que demonstre a imprescindibilidade da colheita da prova testemunhal, considerando a comprovação documental da questão (uso do imóvel locado e consequentes despesas da utilização).

Ainda que discorde do que seria o valor razoável de aluguel sugerido por órgão técnico do Tribunal, ante a presença de orçamentos carreados ao feito e a indiscutível utilização do bem em questão, entende-se que cabe ao magistrado determinar as provas que serão úteis para seu convencimento, sendo que a negativa ora questionada não importa em ofensa aos princípios do devido processo legal, pois o pretendido deferimento redundaria em reiteração das provas já produzidas.

(TRE-MS, PC n. 10581, ACÓRDÃO n. 8411 de 18.8.2014, Relator Nélio Stábile, Publicação: DJE - Diário da Justiça Eleitoral, Tomo 1115, Data 27.8.2014, Página 03/04.) (Grifei.)

 

Esclareço que a prova pretendida consistia na oitiva do presidente da Associação dos Servidores Municipais de Três Coroas para esclarecimentos relativos ao modo como se davam os descontos e os repasses entre servidores, associação e partido.

A prova foi indeferida pelo magistrado de primeiro grau ao fundamento de que seria desnecessária ao deslinde da demanda, vez que o convênio com a mencionada associação – por conta do qual eram feitos os descontos e repasses de recursos – poderia ter vindo aos autos nas diversas manifestações anteriores (fl.259).

Andou bem o juízo.

A questão relativa ao repasse dos valores prescinde de prova testemunhal, pois sendo embasada em convênio, era prova documental que poderia ter sido apresentada pelo partido em momento anterior.

Aliás, dito documento foi apresentado depois, com as alegações finais, e, da sua análise, é fácil concluir que a oitiva pleiteada não teria o condão de influenciar o entendimento monocrático. Acrescento que o convênio tinha como objeto, de forma expressa, “descontar de todos os cargos de confiança e funções gratificadas associadas o valor correspondente à gratificação mensal do partido”.

Do mesmo modo, tenho por afastar a prefacial da Procuradoria Regional Eleitoral de anulação da sentença, em face do afastamento, pelo juízo de origem, da responsabilidade dos dirigentes partidários – os quais, diga-se de passagem, integraram regularmente os autos e atuaram ativamente ao longo do procedimento (v.g., defesas por eles apresentadas às fls. 219-220 e 222-223).

Como fundamento, o agente ministerial aduziu que a Lei n. 13.165/15 é inaplicável a fatos anteriores à sua vigência.

Transcrevo o trecho da sentença combatido (fls. 276-279):

“Preliminarmente, afastada a responsabilidade pessoal dos então presidente e tesoureiro do PMDB de Três Coroas, Sr. Eraldo Araújo e Roque Werner, dos termos da prestação de contas do exercício financeiro de 2015, diante da previsão do art. 49, § 1º, da Resolução TSE nº 23.464/2015 e do art. 37, § 2º, da Lei 9.096/95”.

Mesmo reconhecendo-se o acerto da tese do Parquet, é de se ver que o juízo singular afastou a responsabilidade pessoal dos dirigentes, não obstando, em tese, o redirecionamento aos dirigentes partidários – modo subsidiário – em eventual cumprimento de sentença ou execução.

Ademais, tal circunstância não constou da parte dispositiva da sentença, não operando, em linha de princípio, a coisa julgada.

Logo, por essas circunstâncias, afasto as preliminares e adentro na análise da questão de fundo.

Mérito

O DIRETÓRIO MUNICIPAL DO PARTIDO DO MOVIMENTO DEMOCRÁTICO BRASILEIRO (PMDB) de Três Coroas interpôs recurso contra sentença do Juízo da 149ª Zona Eleitoral, que desaprovou a prestação de contas referente ao exercício financeiro de 2015, apresentada pelo órgão partidário e pelos dirigentes partidários atuantes no período, aplicando a suspensão de novas quotas do Fundo Partidário por um ano e o recolhimento de R$46.043,08 ao Tesouro Nacional, acrescidos de multa de dez por cento, a teor do art. 37 da Lei n. 9.096/95, em razão do recebimento de recursos de fonte vedada nos termos dos arts. 45, inc. IV, al. “a”, e 46, inc. I, da Resolução TSE n. 23.432/14.

Inicialmente, afasto a multa de dez por cento do valor a ser recolhido, fixada na sentença com esteio no caput do art. 37 da Lei n. 9.096/95, com redação dada pela Lei n. 13.165/15 (A desaprovação das contas do partido implicará exclusivamente a sanção de devolução da importância apontada como irregular, acrescida de multa de até 20%).

Com efeito, este Tribunal já definiu que a penalidade de multa de até 20% do valor a ser recolhido ao Erário, prevista no caput e § 3º do art. 37 da Lei n. 9.096/97 com o advento da Lei n. 13.165/15, não pode ser aplicada às prestações de contas de exercícios anteriores, como no caso sob exame, verbis:

AGRAVO REGIMENTAL. DIRETÓRIO ESTADUAL DE PARTIDO. PEDIDO DE PARCELAMENTO DE DÉBITO E PAGAMENTO MEDIANTE DESCONTOS NO REPASSE DO FUNDO PARTIDÁRIO. INVIABILIDADE. EXERCÍCIO FINANCEIRO DE 2013.

1. Agremiação condenada a recolher valores ao Fundo Partidário, além da suspensão de novas quotas por um mês, em razão do recebimento de recursos oriundos de fontes vedadas.

2. Inviabilidade de cumprimento da sanção mediante descontos no repasse do Fundo Partidário, a serem realizados pelo Diretório Nacional, pois as alterações introduzidas pela Lei n. 13.165/15 ao art. 37 da Lei n. 9.096/95 não se aplicam às prestações de contas partidárias de exercícios anteriores.

3. A Resolução TSE n. 23.464/15, expedida nos limites da competência normativa da Justiça Eleitoral, veda a utilização de recursos do Fundo Partidário para cumprimento de pagamentos e recolhimentos a ele destinados.

4. Parcelamento do débito em 30 meses adequado à capacidade financeira da agremiação e ao montante da condenação.

5. Desprovimento.

(TRE-RS – Ag/Rg n. 49-62.2014.6.21.0000 – Relator Des. Carlos Cini Marchionatti – Julgado em Sessão de 27.9.2017.) (Grifei.)

 

Recurso. Prestação de contas anual. Partido político. Art. 4º, caput, da Resolução TSE n. 21.841/04. Exercício financeiro de 2014. Falta de abertura de conta bancária para o registro da movimentação financeira e da apresentação dos extratos bancários correspondentes.

Providências imprescindíveis, seja para demonstrar a origem e a destinação dada aos recursos, seja para comprovar a alegada ausência de movimentação financeira à Justiça Eleitoral.

Inaplicabilidade da norma que desobriga a apresentação das contas por órgãos partidários que não tenham movimentação financeira e que exclui a sanção de suspensão de quotas do Fundo Partidário, haja vista a irretroatividade dos efeitos das alterações decorrentes da Lei n. 13.165/15, conforme entendimento firmado por este Tribunal. Readequação, de ofício, do prazo de suspensão do recebimento de novas quotas do Fundo Partidário para 1 (um) mês.

Provimento negado.

(TRE-RS, RE n. 3350, Relator Des. Federal Luís Alberto D'Azevedo Aurvalle, DEJERS 29.01.2016.) (Grifei.)

O TSE também comunga deste entendimento, de que as mudanças introduzidas pela Lei n. 13.165/15 ao art. 37 da Lei n. 9.096/95 devem observar a máxima tempus regit actum, enfatizando que “as alterações no caput do art. 37 da Lei n. 9.096/95 só se aplicam aos exercícios de 2016 e seguintes”. Veja-se:

RECURSO ESPECIAL. PRESTAÇÃO DE CONTAS. PARTIDO POLÍTICO. EXERCÍCIO 2014. PRINCÍPIO DO TEMPUS REGIT ACTUM. ALTERAÇÕES NO CAPUT DO ART. 37 DA LEI 9.096/95 SÓ SE APLICAM AOS EXERCÍCIOS DE 2016 E SEGUINTES. PROVIMENTO.

1. Autos recebidos no gabinete em 17.5.2017.

2. As mudanças introduzidas pela Lei 13.165/2015 ao art. 37 da Lei 9.096/95 em especial a retirada de suspensão de cotas do Fundo Partidário são regras de direito material e não se aplicam às prestações de contas partidárias de exercícios anteriores, sob pena de afronta aos princípios da isonomia e da segurança jurídica. Precedentes.

3. Recurso especial a que se dá provimento para determinar que o TRE/SC aplique as sanções por rejeição de contas de acordo com o art. 37 da Lei 9.096/95, com texto anterior à Lei 13.165/2015.

(TSE, RESPE n. 4167, Relator Min. Herman Benjamin, DJE 27.6.2017.) (Grifei.)

 

SEGUNDOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL ELEITORAL. CONTRADIÇÃO. INE'XISTÊNCIA. REJEIÇÃO.

I - É descabido o emprego de embargos de declaração para aclarar matéria não suscitada previamente no acórdão embargado.

II - Os embargos declaratórios, mesmo para fins de prequestionamento, somente são cabíveis quando houver no julgado um dos vícios descritos no art. 275 do Código Eleitoral.

III - Inexistência de omissão, contradição ou obscuridade.

IV - O acórdão do TRE/SP que determinou as sanções de recolhimento de recursos ao Fundo Partidário e a suspensão de quotas pelo prazo de 12 (doze) meses observou as normas que regiam a espécie à época, em respeito ao axioma tempus regit actum. Inaplicabilidade do princípio da retroatividade benéfica penal. Precedentes.

V - Embargos rejeitados.

(TSE, RESPE n. 16972, Acórdão, Relator Min. Admar Gonzaga Neto, DJE 30.6.2016.) (Grifei.)

Nesse mesmo sentido é o parecer da Procuradoria Regional Eleitoral, ao frisar, em alusão ao direito material aplicável à espécie, que “impõe-se o afastamento, de ofício, por este TRE-RS da sanção prevista no art. 37 da Lei n. 9.096/95, cuja redação foi dada pela Lei n. 13.165/15, tendo em vista que tal legislação não se aplica às prestações de contas anteriores à sua vigência” (fl. 310).

Prossigo, em apreciação da questão de fundo, à luz da legislação incidente na espécie.

De acordo com a conclusão do examinador técnico à origem, adotada na sentença, a agremiação recebeu doações de autoridades vinculadas à administração pública municipal, especificamente de Prefeito, Vice-prefeito, Chefes de Serviço, Supervisores, Coordenadores e Secretários – no montante final de R$46.043,08, correspondente a 62,27% dos recursos arrecadados pelo partido, que no total somam R$73.937,72.

Pois bem.

Esclareço, desde logo, o modus operandi utilizado pelo partido para arrecadar recursos, qual seja a realização de convênio com a Associação dos Servidores Municipais de Três Coroas (ASMUTC), a qual recebeu os valores descontados em folha dos servidores públicos e repassou para a grei partidária. Coube ao órgão partidário, por sua vez, obrigar todos os contribuintes a se associarem à ASMUTC (fl. 271).

Tal esquema levou a Magistrada de origem a entender como ilícitos os valores recebidos tanto pelo prisma do doador originário – servidores públicos detentores de cargos em comissão e funções gratificadas – quanto sob a ótica do doador imediato, ao fundamento de que a associação seria uma entidade de classe.

Todavia, analisando-se os autos, não vislumbro elementos aptos a atestarem, com certeza, que a associação em questão insere-se no conceito de entidade de classe.

Assim, em razão da escassez documental a legitimar enquadramento outro – que, nada obstante, levaria, em última análise, à mesma conclusão de fundo –, restrinjo a presente apreciação aos doadores originários.

Nesse sentido, à exceção dos cargos de prefeito e vice-prefeito, os quais serão analisados adiante, é inequívoca a irregularidade, vez que os doadores eram exercentes de cargos de direção ou chefia junto à administração pública direta ou indireta, os quais, a toda evidência, encerravam poder decisório e de gerenciamento de pessoas e recursos, inserindo-se, assim, no conceito de “autoridade” para fins de incidência da vedação legal.

De acordo com a jurisprudência consolidada deste Tribunal, as contribuições ou doações efetuadas por detentores de cargo demissível ad nutum da administração pública direta ou indireta, que exerçam função de direção ou chefia, vale dizer, com poder de autoridade, caracterizam recursos de fonte vedada (TRE-RS, PC n. 76-79, Relator Dr. Leonardo Tricot Saldanha, julgado em 31.5.2016 e RE n. 18-62, Relatora Dra. Gisele Anne Vieira de Azambuja, julgado em 02.8.2016).

Após a consolidação do entendimento sobre a interpretação dada pelo TSE ao art. 31, caput, inc. II, da Lei n. 9.096/95, os tribunais eleitorais de todo o país, inclusive este TRE, passaram a julgar as contas partidárias com observância à vedação de contribuições de titulares de cargos demissíveis ad nutum, da administração direta ou indireta, com poder de autoridade:

Recurso. Prestação de contas. Partido político. Doação de fonte vedada. Art. 31, II, da Lei n. 9.096/95. Exercício financeiro de 2013.

Desaprovam-se as contas quando constatado o recebimento de doações de servidores públicos ocupantes de cargos demissíveis ad nutum, da administração direta ou indireta, que detenham condição de autoridade, vale dizer, desempenhem função de direção ou chefia.

Redução, de ofício, do período de suspensão do recebimento de cotas do Fundo Partidário, conforme os parâmetros da razoabilidade. Manutenção da sanção de recolhimento de quantia idêntica ao valor recebido irregularmente ao Fundo Partidário.

Provimento negado.

(TRE-RS, Recurso Eleitoral n. 2346, Acórdão de 12.3.2015, Relator Dr. Ingo Wolfgang Sarlet, Publicação: DEJERS - Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Tomo 45, Data 16.3.2015.)

 

Recurso Eleitoral. Prestação de Contas Anual. Exercício 2012. Partido Democrático Trabalhista (PDT) de Taquara. Contas desaprovadas. Preliminar de impugnação de documentos como prova válida. Exame remetido à análise da questão de fundo. Preliminar de cerceamento de defesa afastada, em face de haver, nos autos, comprovação de que o partido teve oportunidade de se manifestar sobre documentos acostados. Não é permitido aos partidos políticos receberem doações ou contribuições de titulares de cargos demissíveis ad nutum da administração direta ou indireta, desde que tenham a condição de autoridades. Configuradas doações de fonte vedada. Servidores ocupantes de cargos demissíveis ad nutum.

Afastadas do cálculo do valor a ser recolhido ao Fundo Partidário as doações de assessores e procuradores jurídicos, os quais não são considerados autoridades. Deram parcial provimento ao recurso, apenas ao efeito de reduzir o valor recolhido ao Fundo Partidário.

(TRE-RS, Recurso Eleitoral n. 8303, Acórdão de 12.11.2014, Relator Des. Luiz Felipe Brasil Santos, Publicação: DEJERS - Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Tomo 207, Data 14.11.2014, Página 02.)

 

Recurso. Prestação de contas. Partido político. Exercício de 2010.

Desaprovação pelo julgador originário. Aplicação da pena de suspensão das cotas do Fundo Partidário pelo período de doze meses, bem como o recolhimento de valores, ao mesmo fundo, relativos a recursos recebidos de fonte vedada e de fonte não identificada.

A documentação acostada em grau recursal milita em prejuízo do recorrente, uma vez que comprova o recebimento de valores de autoridade pública e de detentores de cargos em comissão junto ao Executivo Municipal. A maior parte da receita do partido provém de doações de pessoas físicas em condição de autoridade, prática vedada nos termos do art. 31, inc. II e III, da Lei n. 9.096/95.

Provimento negado.

(TRE-RS, Recurso Eleitoral n. 4550, Acórdão de 19.11.2013, Relator Dr. Jorge Alberto Zugno, Publicação: DEJERS - Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Data 22.11.2013.)

 

Dessarte, não merece acolhida a argumentação no sentido de que as doações efetuadas por ocupantes de cargo em comissão de direção ou de chefia são regulares, porquanto manifesta a contrariedade a normas que, em rol taxativo, impossibilitam o recebimento de recursos por fonte vedada.

A regra foi criada com intuito moralizador, na expectativa de que os partidos políticos não vislumbrassem contrapartida financeira ou manipulação de órgão da administração pública quando da indicação de ocupantes de cargo em comissão. Tendo influência política representada pelo seu poder de autoridade no âmbito do cargo que exerce, o detentor de cargo em comissão não poderá alcançar valores ao partido ao qual é filiado ou de que é apoiador.

Embora não mais subsista a vedação às doações realizadas por ocupantes de cargos demissíveis ad nutum, desde que sejam filiados a partido político, por força da nova redação conferida ao art. 31 da Lei n. 9.096/95 pela Lei n. 13.488/17, essa inovação não tem aplicação retroativa, conforme firmado por este Tribunal no julgamento do RE n. 14-97, de relatoria do Dr. Luciano André Losekann, cuja ementa transcrevo a seguir:

RECURSO. PRESTAÇÃO DE CONTAS ANUAL. PARTIDO POLÍTICO. EXERCÍCIO DE 2015. PRELIMINAR. MANUTENÇÃO DOS DIRIGENTES PARTIDÁRIOS NO POLO PASSIVO. ILEGITIMIDADE NÃO CONFIGURADA. MÉRITO. RECEBIMENTO DE DOAÇÕES DE FONTES VEDADAS. ALTERAÇÃO LEGISLATIVA. PERMITIDA A CONTRIBUIÇÃO DE FILIADOS. INAPLICABILIDADE AO CASO CONCRETO. APLICAÇÃO DA LEGISLAÇÃO VIGENTE À ÉPOCA DOS FATOS. PRINCÍPIO DA SEGURANÇA JURÍDICA. MANUTENÇÃO DO JUÍZO DE IRREGULARIDADE DA DOAÇÃO. REDUÇÃO DO PRAZO DE SUSPENSÃO DO RECEBIMENTO DAS QUOTAS DO FUNDO PARTIDÁRIO. PARCIAL PROVIMENTO.

1. Preliminar rejeitada. O art. 38 da Resolução TSE n. 23.432/14 prevê que deverá ser determinada a citação do órgão partidário e dos responsáveis para que ofereçam defesa sempre que houver impugnação ou constatação de irregularidade no parecer conclusivo. A integração dos dirigentes na lide é consectário da responsabilização prevista na Lei dos Partidos Políticos. Manutenção dos dirigentes partidários para integrarem o polo passivo. Ilegitimidade passiva afastada.

2. Constituem recursos oriundos de fontes vedadas as doações a partidos políticos realizadas por titulares de cargos demissíveis ad nutum da administração direta ou indireta que detenham condição de autoridades, vale dizer, que desempenhem função de direção ou chefia.

3. A Lei n. 13.488/17, publicada em 06.10.17, alterou a redação do art. 31 da Lei n. 9.096/95 - Lei dos Partidos Políticos -, excluindo a vedação de doação de pessoa física que exerça função ou cargo público demissível ad nutum, desde que filiada ao partido beneficiário.

4. Inaplicabilidade ao caso concreto. Incidência da legislação vigente à época dos fatos. Prevalência do princípio da segurança jurídica e da paridade de armas no processo eleitoral, em detrimento da aplicação pontual da retroatividade in bonam partem. Manutenção do juízo de irregularidade das contribuições advindas de cargos demissíveis ad nutum, ainda que os contribuintes sejam filiados à agremiação.

5. Incontroverso o recebimento de recursos de fontes vedadas, em valor correspondente a 65,79% das receitas do partido, impõe-se a desaprovação das contas. Redução, entretanto, do prazo de suspensão do recebimento de quotas do Fundo Partidário para quatro meses.

6. Provimento parcial.

(TRE-RS, RE n. 14-97, Relator Dr. Luciano André Losekann, julgado em 04.12.2017.) (Grifei.)

Assim, deve prevalecer o entendimento de que os recursos oriundos de contribuições procedentes de autoridades são vedados, ou seja, daqueles ocupantes de cargos demissíveis ad nutum, que exercem atividade de chefia, de direção ou de coordenação.

Nesse contexto, não socorre o recorrente a alegação de que as doações foram feitas de forma espontânea. Aliás, no convênio firmado entre o Partido e a Associação consta expressamente, nas obrigações afetas ao PMDB, o seguinte: “a partir da assinatura do convênio, obrigar todos os contribuintes que sejam cargos de confiança ou possuam funções gratificadas a ser sócio da ASMUTC”.

Do mesmo modo, insubsistente o argumento de que, muito embora os servidores possuíssem em seu cargo a nomenclatura de chefe, supervisor, assessor, coordenador e diretor, não exerciam cargo de comando, inviabilizando a agremiação de ser punida por equívoco de atribuição do nome do cargo.

A uma, porque ao receber as doações, poderia o recorrente ter verificado essa situação.

Nos termos do disposto no item 2.1 do convênio já mencionado, cabia ao PMDB fornecer à ASMUTC, mensalmente, o nome de todos os indivíduos que eram filiados ao partido e que trabalhavam na prefeitura. Assim, era sabedor da condição de cada servidor e poderia ter estornado os recebimentos dos filiados que detinham cargos com tais nomenclaturas.

A duas, porque não apresentou nenhuma prova de que, de forma inusitada, na Prefeitura de Três Coroas os chefes não chefiam, os supervisores não supervisionam, os coordenadores não coordenam e os diretores não dirigem equipes ou pessoas.

Aliás, tal afirmação remete à ideia de que pessoas são nomeadas para cargos que não exercem, com remunerações naturalmente maiores, em franco prejuízo à administração pública, fato que poderia inclusive se caracterizar como ato de improbidade administrativa.

Quanto ao cargo de assessor, citado no recurso, que não é considerado autoridade pela jurisprudência desta casa, não se encontra na lista de doadores (fls. 261-262).

Já em relação aos ocupantes dos cargos de Prefeito e de Vice-Prefeito, os quais efetuaram doações nos valores de R$3.567,57 e R$1.553,66, respectivamente, razão assiste ao recorrente.

É que, a partir do julgamento do RE n. 13-93 e do RE n. 14-78, ambos apreciados na sessão de 06.12.2017, em acórdãos de relatoria do Desembargador Federal João Batista Pinto Silveira, esta Casa passou a reconhecer a licitude de doações feitas por detentores de mandato eletivo, por não se enquadrarem no conceito de autoridade pública, a que alude o art. 12, inc. XII e § 2º, da Resolução TSE n. 23.432/14, independentemente do exercício financeiro a que se refere a prestação de contas.

Transcrevo, a seguir a ementa do acórdão prolatado nos autos do RE n. 13-93:

RECURSO. PRESTAÇÃO DE CONTAS. PARTIDO POLÍTICO. EXERCÍCIO FINANCEIRO DE 2016. RECEBIMENTO DE DOAÇÃO REALIZADA POR DETENTOR DE MANDATO ELETIVO. VEREADOR. INTERPRETAÇÃO RESTRITIVA DA NORMA. NÃO CARACTERIZADA FONTE VEDADA. LICITUDE DA DOAÇÃO. REFORMA DA SENTENÇA. APROVAÇÃO DAS CONTAS. PROVIMENTO.

Configuram recursos de fontes vedadas as doações a partidos políticos advindas de autoridades públicas, vale dizer, aqueles que exercem cargos de chefia ou direção na administração pública, direta ou indireta. Definição expressa no texto do art. 12 da Resolução TSE n. 23.464/15.

No caso, a agremiação partidária recebeu recursos de detentor de mandato eletivo de vereador. O texto normativo não contempla os agentes políticos. Impossibilidade de se dar interpretação ampliativa à norma que traz uma restrição de direitos. O detentor de mandato eletivo não é titular de cargo nomeado em razão de vinculações partidárias, ao contrário, exerce "munus" público, eleito pelo povo. As doações realizadas por essa espécie de agente não possuem a potencialidade de afetar o equilíbrio entre as siglas partidárias. Caracterizada, assim, a licitude da doação efetuada pelo vereador. Fonte vedada não caracterizada. Reforma da sentença para aprovar as contas.

Provimento.

(TRE-RS, RE n. 13-93, Relator Des. Federal João Batista Pinto Silveira, julgado em 06.12.2017.) (Grifei.)

 

Nessa esteira, tenho por bem excluir dos valores considerados irregulares aqueles recebidos do ocupante do cargo de prefeito e de vice-prefeito, de R$3.567,57 e R$1.553,66, respectivamente, os quais totalizam a quantia de R$5.121,23.

O recebimento de recursos de fontes vedadas pela agremiação enseja a desaprovação das contas e o dever de transferência da quantia envolvida ao Tesouro Nacional (art. 14, § 1º, da Resolução TSE n. 23.432/14).

Em relação à penalidade de suspensão do repasse de quotas do Fundo Partidário, este Tribunal tem entendimento consolidado no sentido da aplicação da redação original da Lei n. 9.096/95 aos processos que já tramitavam na Justiça Eleitoral antes da publicação da Lei n. 13.165/15, a qual alterou diversas disposições até então previstas na Lei dos Partidos Políticos.

O inc. II do art. 36 da Lei n. 9.096/95, que dispõe acerca da referida sanção, prevê o prazo de um ano de suspensão de repasse de novas quotas.

Todavia, este Tribunal tem entendido pela aplicação dos parâmetros fixados no § 3º do art. 37 da Lei dos Partidos Políticos, que, em sua redação original, prevê suspensão pelo prazo de 1 a 12 meses, quando o caso concreto revelar situações de menor gravidade, uma vez que há hipóteses em que a suspensão de repasse de quotas do Fundo Partidário pelo prazo de um ano não atende ao princípio da proporcionalidade.

No presente caso, em se tratando de prestação de contas relativas ao exercício financeiro de 2015, não se mostra razoável que a agremiação sofra a grave penalização de suspensão de repasse de quotas por um ano.

O entendimento esposado por este Tribunal é idêntico ao adotado pelo Tribunal Superior Eleitoral, que utiliza os parâmetros da razoabilidade em cada caso concreto, para verificar a adequação da penalidade, merecendo transcrição os seguintes precedentes:

AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL ELEITORAL. PRESTAÇÃO DE CONTAS DE PARTIDO. DOAÇÃO DE FONTE VEDADA. ART. 31, II, DA LEI 9.096/95. SUSPENSÃO DE COTAS DO FUNDO PARTIDÁRIO. ART. 36, II, DA LEI 9.504/97. PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS DA PROPORCIONALIDADE E DA RAZOABILIDADE. INCIDÊNCIA.

1. Na espécie, o TRE-SC, com base nos princípios da razoabilidade e proporcionalidade, concluiu que o recebimento de recursos no valor de R$ 940,00 oriundos de fonte vedada de que trata o art. 31, II, da Lei 9.096/95 – doação realizada por servidor público ocupante de cargo público exonerável ad nutum – comporta a adequação da pena de suspensão de cotas do Fundo Partidário de 1 (um) ano para 6 (seis) meses.

2. De acordo com a jurisprudência do TSE, a irregularidade prevista no art. 36, II, da Lei 9.096/95 – consistente no recebimento de doação, por partido político, proveniente de fonte vedada – admite a incidência dos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade na dosimetria da sanção.

3. Agravo regimental não provido

(TSE, Agravo Regimental em Recurso Especial Eleitoral n. 4879, Acórdão de 29.8.2013, Relator Min. JOSÉ DE CASTRO MEIRA, Publicação: DJE – Diário de Justiça Eletrônico, Data 19.9.2013)

 

Prestação de contas. Campanha eleitoral. Candidato a deputado. Fonte vedada.

1. Este Tribunal, no julgamento do AgR-AI n. 9580-39/MG, rel. Min. Arnaldo Versiani, DJE de 25.9.2012, reafirmou, por maioria, seu entendimento no sentido de que "empresa produtora independente de energia elétrica, mediante contrato de concessão de uso de bem público, não se enquadra na vedação do inc. III do art. 24 da Lei n. 9.504/97". Precedentes: AgR-REspe n. 134-38/MG, relª. Minª. Nancy Andrighi, DJE de 21.10.2011; AgR-REspe n. 10107-88/MG, rel. Min. Arnaldo Versiani, de 9.10.2012. Ressalva do relator.

2. Ainda que se entenda que a doação seja oriunda de fonte vedada, a jurisprudência desta Corte Superior tem assentado que, se o montante do recurso arrecadado não se afigura expressivo diante do total da prestação de contas, deve ser mantida a aprovação das contas, com ressalvas, por aplicação dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade.

Agravo regimental a que se nega provimento.

(TSE, Agravo Regimental em Recurso Especial Eleitoral n. 963587, Acórdão de 30.4.2013, Relator Min. Henrique Neves da Silva, Publicação: DJE – Diário de Justiça Eletrônico, Data 18.6.2013, Página 68-69.)

Da leitura dos julgados transcritos, observa-se que a jurisprudência do TSE tem assentado que é possível a redução do prazo de suspensão do recebimento de novas quotas do Fundo Partidário, fixando-se período entre 1 a 12 meses.

Na hipótese em tela, sem se olvidar da gravidade da irregularidade detectada, o período de suspensão pode ser mitigado conforme os parâmetros da razoabilidade, comportando adequação da pena de suspensão do repasse de novas quotas do Fundo Partidário de 01 (um) ano para 5 (cinco) meses, considerado o percentual final de 55,34% sobre o total arrecadado pela grei partidária e os parâmetros adotados pelo TSE para sancionar as irregularidades cometidas pelas agremiações.

Portanto, dentro de todo esse contexto, a reforma parcial da sentença é medida que se impõe.

Dispositivo

Diante do exposto, afastada a matéria preliminar, VOTO pelo parcial provimento do recurso interposto pelo DIRETÓRIO MUNICIPAL DO PARTIDO DO MOVIMENTO DEMOCRÁTICO BRASILEIRO (PMDB) de Três Coroas, para, mantendo a desaprovação das contas relativas ao exercício financeiro de 2015, reduzir o montante a ser recolhido ao Tesouro Nacional para R$40.921,85 (quarenta mil novecentos e vinte e um reais e oitenta e cinco centavos), bem como, de ofício, reduzir para 05 (cinco) meses o período de suspensão, com perda, do recebimento de novas quotas do Fundo Partidário e excluir a multa de 10% (dez por cento) sobre o valor a ser recolhido, nos termos da fundamentação.