Ag/Rg - 4962 - Sessão: 27/09/2017 às 17:00

RELATÓRIO

Cuida-se de agravo regimental interposto pelo PARTIDO DO MOVIMENTO DEMOCRÁTICO BRASILEIRO – DIRETÓRIO ESTADUAL contra decisão deste Presidente, que deferiu, em parte, pedido de parcelamento formulado pela agremiação às fls. 393-397.

Em suas razões, afirma que o § 3º do art. 37 da Lei n. 9.096/95 permite o cumprimento da sanção por meio do desconto no repasse da parcela do Fundo Partidário, e o disposto em Resoluções do TSE não poderia afrontar dispositivo de lei. Contextualiza o fato de que as sucessivas alterações na legislação eleitoral quanto à forma de devolução dos valores, proibição de receber doações de pessoas jurídicas e de autoridades, cujo conceito foi ampliado nesta Corte, têm inviabilizado o cumprimento de penalidades impostas em prestações de contas. Refere que se encontram em execução os exercícios de 2004 a 2007, assim como o de 2013, objeto deste pedido. Diz que as parcelas adimplidas, quanto ao exercício de 2004, foram satisfeitas com verbas do Fundo Partidário sem que tenha havido apontamento. Sustenta que não haveria o óbice noticiado na decisão de receber/ressarcir idêntica rubrica, pois o agravante pretende a realização de descontos nos futuros repasses. Renova o pedido de cumprimento do que dispõe o art. 37, § 3º, da Lei n. 9.096/95, ofício ao Diretório Nacional e o parcelamento em 60 meses.

É o relatório.

 

VOTOS

Des. Carlos Cini Marchionatti (relator):

O presente agravo regimental é regular, tempestivo e comporta conhecimento.

A decisão ora agravada possui o seguinte teor:

Vistos, etc.

Cuida-se de examinar petição formulada pela agremiação que postula:

a) Cumprimento da sanção por meio de descontos no repasse do Fundo Partidário, a ser levado a efeito pelo Diretório Nacional do PMDB, nos termos do § 3º, do art. 37, da Lei 9.096/95;

b) Seja oficiado o PMDB Nacional para que realize os descontos, suspendendo-se no segundo semestre do próximo ano, nos termos do art. 37, § 9º, da Lei 9.096/95;

c) Parcelamento do débito, permitindo que o desconto seja realizado pelo Diretório Nacional em 60 parcelas.

Decido.

O acórdão que examinou a prestação de contas anual – exercício 2013, transitou em julgado em 25.05.2017 (fl. 384).

A agremiação, em síntese, foi condenada nos seguintes termos (fl. 145):

a) Recolher ao Fundo Partidário a importância de R$ 40.870,40;

b) Suspensão de novas quotas do Fundo Partidário pelo período de 01 (um) mês, contado a partir do trânsito em julgado.

Pois bem.

Passo a analisar os pedidos do PMDB:

a) Cumprimento da sanção por meio de descontos no repasse do Fundo Partidário, a ser levado a efeito pelo Diretório Nacional:

A Resolução TSE n. 23.464/15 regulamentou a execução das decisões que julgam contas do órgão partidário.

O § 3º, do art. 60 desse normativo é expresso:

§ 3º É vedada a utilização de recursos do Fundo Partidário para os pagamentos e recolhimentos previstos neste artigo.

Nessa medida, como a agremiação foi condenada a recolher a importância de R$ 40.870,40, justamente ao Fundo Partidário, frente ao que dispõe expressamente a Resolução e até mesmo pela contradição em utilizar idêntica rubrica para receber/ressarcir, indefiro o pedido.

b) A segunda postulação – ofício ao PMDB Nacional para que realize os descontos - resta prejudicada em face da rejeição da primeira;

Por fim, cumpre examinar o requerimento de parcelamento do débito, permitindo que o desconto seja realizado pelo Diretório Nacional em 60 parcelas.

Nesse tópico, tenho por deferir parcialmente a pretensão.

Considerando que o art. 60 da Res. 23.464/2015 TSE contemplou expressamente a hipótese de parcelamento e, sensível às ponderações do ilustre representante da agremiação e ao valor significativo da quantia a ser adimplida (R$ 40.870,40) reconheço a procedência, em parte, do pleito.

Tendo em vista a capacidade financeira da agremiação e por entender demais extenso o parcelamento em 60 meses, defiro o pedido de parcelamento do débito em 30 (trinta) parcelas, que deverão ser atualizadas nos termos de tal regulamento.

Em que pese a judiciosa peça de agravo regimental (fls. 406-419), não verifico razões para mudar o entendimento que já manifestei, e ratifico-as.

O ponto central de irresignação da agremiação diz com o que dispõe o § 3º do art. 37 da Lei n. 9.096/95:

Art. 37. A desaprovação das contas do partido implicará exclusivamente a sanção de devolução da importância apontada como irregular, acrescida de multa de até 20% (vinte por cento).

Redação dada pela Lei n. 13.165, de 2015.

[...]

§ 3º A sanção a que se refere o caput deverá ser aplicada de forma proporcional e razoável, pelo período de um a doze meses, e o pagamento deverá ser feito por meio de desconto nos futuros repasses de cotas do Fundo Partidário, desde que a prestação de contas seja julgada, pelo juízo ou tribunal competente, em até cinco anos de sua apresentação.

Redação dada pela Lei n. 13.165, de 2015.

O partido agravante pretende o pagamento da importância de R$ 40.870,40, a que foi condenado a recolher ao Fundo Partidário, por recebimento de fonte vedada no exercício de 2013, por meio de descontos nos futuros repasses de quotas do mesmo Fundo Partidário.

Não há como acolher a pretensão.

O próprio dispositivo legal que o agravante refere (§ 3º) faz expressa remissão à sanção prevista no caput do art. 37 da Lei n. 9.096/95, com a nova redação, que estabelece exclusivamente a imposição de multa de até 20% sobre o valor a ser recolhido.

No presente feito, não houve a condenação à multa de até 20% e, sim, recolhimento ao Fundo Partidário de valores recebidos de fontes vedadas e suspensão do aludido fundo por um mês.

Logo, não há identidade entre a natureza jurídica da presente condenação com a prevista no caput do art. 37 da Lei n. 9.096/95.

Soma-se a isso o que estabelece o § 3º do art. 60 da Resolução TSE n. 23.464/15, que regulamentou a execução das decisões que julgam contas do órgão partidário:

§ 3º É vedada a utilização de recursos do Fundo Partidário para os pagamentos e recolhimentos previstos neste artigo.

E não se diga que a disposição regulamentar afronta a lei.

Primeiro, porque cabe ao TSE expedir as instruções para cumprimento da Lei n. 9.096/95, corolário do poder normativo desta Especializada e ao que dispõe o art. 61 da lei dos partidos políticos:

Art. 61. O Tribunal Superior Eleitoral expedirá instruções para a fiel execução desta Lei.

Segundo, porque a Lei n. 9.096/95 é omissa quanto à execução das decisões que julgam contas de órgão partidário, encontrando-se nos limites do poder regulamentar a disciplina dessa matéria.

A propósito, acerca do poder normativo da Justiça Eleitoral, reproduzo trecho das razões que deduzi por ocasião do julgamento da PC 91-38, de relatoria do Desembargador JAMIL ANDRAUS HANNA BANNURA, julgado em 25 de janeiro de 2017, quando em pauta a Resolução TSE n. 23.478/16, que disciplinou a aplicabilidade do novo CPC na Justiça Eleitoral:

Em um contexto “puramente eleitoral”, de viés processual, o centro do presente debate está nos limites do poder regulamentar do TSE, especialmente quando em aparente conflito com leis federais, de cunho infra-constitucional, como a que instituiu o novo Código de Processo Civil (Lei n. 13.105/16).

O prestigiado autor Manoel Carlos de Almeida Neto (em Direito Eleitoral Regulador, Editora Revista dos Tribunais, 1ª edição, 2014) bem introduz o tema, ao explicitar o alcance da competência do TSE para a elaboração de suas resoluções:

Assim, como já examinado em capítulos anteriores, o Código Eleitoral (Lei 4.737/1965) foi recepcionado pela Constituição como lei complementar, em sentido material, e assentou competência privativa ao Tribunal Superior Eleitoral para, em caráter normativo e regulamentar, elaborar o seu regimento interno, fixar as datas para as eleições de Presidente e Vice-Presidente da República, senadores e deputados federais, quando não o tiverem sido por lei; expedir as instruções que julgar convenientes à execução do referido diploma normativo; responder, sobre matéria eleitoral, às consultas que lhe forem feitas em tese por autoridade com jurisdição federal ou órgão nacional de partido político; e tomar quaisquer outras providências que julgar convenientes à execução da legislação eleitoral (art. 23).

Assim é que, ao contrário do sinalizado pelo douto relator, com o máximo respeito, penso que o TSE não violou texto de lei e tampouco preencheu lacuna existente no ordenamento.

Tangente ao aspecto formal, veja-se que a Lei n. 9.096/95, que dispõe sobre os partidos políticos e regulamenta os artigos 17 e 14, § 3º, inciso V, da Constituição Federal, expressamente estabelece, em seu art. 61, que “o Tribunal Superior Eleitoral expedirá instruções para a fiel execução desta Lei”, legitimando a criação da resolução que disciplina todo o procedimento nos processos de prestação de contas partidárias; atualmente, a Resolução TSE sob n. 23.464/15, cuja exposição de motivos dá conta, justamente, de que se está a regulamentar o disposto no Título III da Lei n. 9.096/95 (“Das Finanças e Contabilidade dos Partidos”).

Assim sendo, tendo sido atribuída ao TSE a tarefa de disciplinar todo o procedimento das prestações de contas partidárias, não se mostra arrazoado inibir-lhe a possibilidade de expedir resolução a respeito de aspectos processuais relevantes para o respectivo trâmite, como a respeitante à forma de contagem de prazos.

Reitero: o TSE não está a modificar lei em seu sentido formal, mas resolução por ele criada, a qual foi devidamente autorizada por lei.

A competência normativa da Justiça Eleitoral decorre da legislação ordinária – Código Eleitoral, Lei n. 9.504/97, Lei n. 9.096/95, Lei n. 6.091/74 – e pode ser considerada como implícita na Constituição Federal, diante do que preconiza a Teoria dos Poderes Implícitos.

Veja-se que a disposição regulamentar (art. 60, § 3º, Resolução TSE n. 23.464/15), no sentido de evitar que o partido se utilize de verba do Fundo Partidário para condenações desse jaez, é consentânea com a natureza pública desse recurso destinado aos partidos políticos, que possuem a relevante função constitucional de resguardar a soberania nacional, o regime democrático e os direitos fundamentais da pessoa, consoante o caput do art. 17 da Carta Magna.

Não desconheço as restrições orçamentárias mencionadas pelo agravante, oriundas de diversos vetores, por isso deferi o parcelamento da dívida em 30 vezes, que mantenho nesse patamar, tendo em vista a capacidade financeira da agremiação e o prazo razoável diante do montante a ser adimplido (R$ 40. 870,40).

Com essas considerações, mantendo integralmente a decisão agravada, VOTO pelo desprovimento do regimental interposto.