CTA - 8502 - Sessão: 11/10/2017 às 17:00

 

RELATÓRIO

Cuida-se de consulta formulada pelo PARTIDO VERDE (PV) nos seguintes termos:

1) Enquanto suplente de vereador ou deputado, o filiado poderá sem justa causa mudar de legenda sem perder sua condição de suplência?

2) Caso o filiado mude de legenda enquanto suplente de vereador ou deputado pelo partido ao qual concorreu (partido A) e, posteriormente, ascenda ao cargo titular filiado a outro partido (partido B), poderá vir a perder o cargo por infidelidade partidária?

3) Caso o suplente a vereador ou deputado troque de partido político, poderá o partido pelo qual concorreu pleitear que ele perca a condição de suplente?

4) Sendo positivas as respostas, quem assumiria o cargo vacante, o segundo suplente de outro partido, mas da coligação? O cargo ficaria à disposição do partido alijado?

Após autuação da Consulta, a Coordenadoria de Gestão da Informação (COGIN) juntou legislação e jurisprudência pertinentes.

A Procuradoria Regional Eleitoral opinou pelo conhecimento da consulta e, no mérito, por respondê-la nos termos do parecer das fls. 80-84.

É o sucinto relatório.

 

VOTO

A lei exige que a consulta, para ser conhecida pelos tribunais, venha revestida de requisitos objetivos e subjetivos. Assim, deve versar sobre matéria eleitoral e ser elaborada em tese por autoridade pública ou por partido político, conforme o art. 30, inc. VIII, do Código Eleitoral:

Art. 30. Compete, ainda, privativamente, aos Tribunais Regionais:

[…]

VIII – responder, sobre matéria eleitoral, às consultas que lhe forem feitas, em tese, por autoridade pública ou partido político.

No caso presente, a consulta é formulada por partido político, por meio de seu órgão regional, que detém legitimidade para atuar perante a Corte Regional Eleitoral, conforme dispõe o art. 11, parágrafo único, da Lei n. 9.096/95:

Art. 11. […].

Parágrafo único. Os delegados credenciados pelo órgão de direção nacional representam o partido perante quaisquer Tribunais ou Juízes Eleitorais; os credenciados pelos órgãos estaduais, somente perante o Tribunal Regional Eleitoral e os Juízes Eleitorais do respectivo Estado, do Distrito Federal ou Território Federal; e os credenciados pelo órgão municipal, perante o Juiz Eleitoral da respectiva jurisdição.

Em relação aos requisitos objetivos, a consulta também preenche a exigência legal, pois formulada em tese e afeta ao Direito Eleitoral, referente à repercussão eleitoral da migração de partido pelo suplente de cargo eletivo às Casas Legislativas.

Assim, conheço da consulta.

Quanto à matéria de fundo, cabe anotar, inicialmente, a lição de José Jairo Gomes, pela qual o princípio da fidelidade partidária encontra assento constitucional no art. 17, § 1º, da Carta Magna e, além disso

[...]

confere novos contornos à representação política, pois impõe que o mandatário popular paute sua atuação pela orientação programática do partido pelo qual foi eleito. É indiscutível o proveito que resulta para a democracia, já que o debate político deve ter em foco a realização de ideias e não de projetos pessoais ou o culto à personalidade. (Direito Eleitoral. 12. ed. São Paulo: Atlas, 2016, p. 121)

No plano infraconstitucional, a perda do cargo eletivo por infidelidade partidária é tratada pela Resolução TSE n. 22.610/07 e pelo art. 22-A da Lei n. 9.096/95 - introduzido pela Lei n. 13.165/15 -, os quais estabelecem que o partido político interessado pode pedir “a decretação da perda de cargo eletivo”, em decorrência de desfiliação partidária sem justa causa, e que “perderá o mandato” o detentor de cargo eletivo que se desfiliar, nessas condições, do partido pelo qual foi eleito. Confira-se:

Resolução TSE n. 22.610/07:

Art. 1º - O partido político interessado pode pedir, perante a Justiça Eleitoral, a decretação da perda de cargo eletivo em decorrência de desfiliação partidária sem justa causa.

§ 1º - Considera-se justa causa:

I) incorporação ou fusão do partido;

II) criação de novo partido;

III) mudança substancial ou desvio reiterado do programa partidário;

IV) grave discriminação pessoal.

[…].

§ 2º - Quando o partido político não formular o pedido dentro de 30 (trinta) dias da desfiliação, pode fazê-lo, em nome próprio, nos 30 (trinta) subseqüentes, quem tenha interesse jurídico ou o Ministério Público eleitoral.

§ 3º - O mandatário que se desfiliou ou pretenda desfiliar-se pode pedir a declaração da existência de justa causa, fazendo citar o partido, na forma desta Resolução. (Grifei.)

Lei n. 9.096/95:

Art. 22-A - Perderá o mandato o detentor de cargo eletivo que se desfiliar, sem justa causa, do partido pelo qual foi eleito. (Incluído pela Lei n. 13.165, de 2015)

Parágrafo único. Consideram-se justa causa para a desfiliação partidária somente as seguintes hipóteses: (Incluído pela Lei nº 13.165, de 2015)

I - mudança substancial ou desvio reiterado do programa partidário; (Incluído pela Lei n. 13.165, de 2015)

II - grave discriminação política pessoal; e (Incluído pela Lei n. 13.165, de 2015)

III - mudança de partido efetuada durante o período de trinta dias que antecede o prazo de filiação exigido em lei para concorrer à eleição, majoritária ou proporcional, ao término do mandato vigente. (Incluído pela Lei nº 13.165, de 2015)

Veja-se que, ao mandatário que se desfiliou, a legislação assegura inclusive o ajuizamento da ação de justificação de desfiliação partidária, na qual o próprio parlamentar pode provocar a Justiça Eleitoral a fim de ver reconhecida a presença das hipóteses de migração partidária sem perda do mandato.

Assim, o diploma normativo de regência prevê que apenas o parlamentar detentor de mandato é legitimado a figurar como sujeito ativo ou passivo nas referidas ações eleitorais que tenham por objeto a titularidade do cargo diante da mudança de partido.

Por sua vez, é cediço na jurisprudência que o suplente de mandato eletivo relativo a cargo proporcional ostenta mera expectativa de assunção à vaga. Enquanto não ocorrer efetivamente a sua posse, o regime de sua disciplina e fidelidade partidária representa matéria partidária interna corporis, cujo enfrentamento refoge à competência da Justiça Eleitoral.

Nessa linha, colaciono os seguintes precedentes deste TRE e do TSE:

REPRESENTAÇÃO. FIDELIDADE PARTIDÁRIA. DEPUTADO FEDERAL. SUPLENTE. DESFILlAÇÃO PARTIDÁRIA. JUSTA CAUSA. SUBSTITUIÇÃO. LICENÇA. INTERESSE. DECADÊNCIA. ART. 1º, § 2º. RESOLUÇÃO-TSE N° 22.610/2007.

1. A disciplina da Resolução-TSE 22.610/2007 não é aplicável aos suplentes que se desligam do partido pelo qual foram eleitos, pois estes não exercem mandato eletivo. Tratar-se-ia, portanto, de questão interna corporis. (Cta 1.679/DF, Rel. Min. Arnaldo Versiani, no mesmo sentido, o RO 2.275/RJ, Rel. Min. Marcelo Ribeiro e a RP 1.399/SP, de minha relatoria). (…)

(TSE, Petição nº 2979, Acórdão de 02/02/2010, Relator(a) Min. FELIX FISCHER, Publicação: DJE - Diário da Justiça Eletrônico, Data 26/02/2010, Página 218 ).

Agravo regimental. Irresignação contra decisão monocrática que extinguiu, sem julgamento do mérito, ação de perda de mandato eletivo. Ilegitimidade passiva do requerido e ausência de interesse processual do requerente. Primeiro e segundo suplentes de vereador. Resolução TSE n. 22.610/07. Eleições 2012.

Conhecimento do recurso diante do caráter terminativo da decisão proferida, em conformidade com o disposto no art. 118, § 1º, do Regimento Interno deste Tribunal.

Somente pode figurar no polo passivo da ação quem é detentor de cargo eletivo. Decisão do Tribunal Superior Eleitoral no sentido de que o exercício do mandato pelo suplente, no caso de licença do titular, deve ser superior a 120 dias para que incida a regra da infidelidade partidária. No caso dos autos, a assunção ao cargo, a título precário, deu-se por dez dias.

A legitimidade ativa restringe-se aos partidos políticos e, subsidiariamente, a quem tenha interesse jurídico ou ao Ministério Público. Somente em caso de inércia da agremiação, no prazo de trinta dias da desfiliação, poderá outro interessado exercer a pretensão.

A eventual mudança de sigla política daquele que não exerce mandato eletivo constitui matéria intrapartidária, estranha ao julgamento da Justiça Eleitoral.

Provimento negado.

(TRE-RS, PET 28-86, Rel. Desa. Federal Maria de Fátima Freitas Labarrère, julg. em 29.4.2014)

Na doutrina, cabe trazer a doutrina de Frederico Franco Alvim:

Com relação ao suplente, visto que enquanto nessa condição não possui cargo a perder, conclui-se que somente quando convocado a assumir funções é que, efetivamente, poderá ver contra si pedido de declaração de vacância. Nesse caso, como propugna Elmana Esmeraldo, o prazo para o ajuizamento da ação começará a contar da data da posse em substituição. (Curso de direito eleitoral. Curitiba: Juruá, p. 581)

Isso posto, retomo a questão de n. 1, qual seja:

1) Enquanto suplente de vereador ou deputado, o filiado poderá sem justa causa mudar de legenda sem perder sua condição de suplência?

A resposta a tal indagação deve ser positiva.

Com efeito, enquanto suplente de vereador ou deputado, o filiado possui mera expectativa de ocupar o cargo em caso de vacância, não sendo possível que essa posição jurídica seja questionada em sede de ação de perda do cargo por desfiliação partidária sem justa causa, por ausência de legitimidade passiva, ainda que o suplente migre de legenda partidária.

Na mesma linha, é a solução do questionamento de n. 2, assim redigido:

2) Caso o filiado mude de legenda enquanto suplente de vereador ou deputado pelo partido ao qual concorreu (partido A) e, posteriormente, ascenda ao cargo titular filiado a outro partido (partido B), poderá vir a perder o cargo por infidelidade partidária?

Quanto ao ponto, a resposta é igualmente afirmativa.

Deveras, é firme o entendimento do TSE no sentido de que, a partir da data da posse do suplente no cargo eletivo, este passa a ter legitimidade para sofrer a ação de perda de cargo eletivo, correndo, desse marco, o prazo de 30 dias para o ajuizamento da medida.

Nesse sentido, elenco os seguintes julgados:

AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL. ELEIÇÕES 2010. DEPUTADO ESTADUAL. INFIDELIDADE PARTIDÁRIA. SUPLENTE. DECADÊNCIA. INOCORRÊNCIA. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO.

1. A jurisprudência do TSE é firme no sentido de que "conta-se da data da posse do suplente no cargo eletivo o prazo de 30 dias para o ajuizamento da ação por infidelidade partidária" (RO nº 2275/RJ, Rel. Min. Marcelo Ribeiro, DJE de 2.8.2010).

2. No caso, tanto o mandato de vereador quanto a suplência de deputado estadual do agravante foram obtidos no período em que este esteve filiado ao partido de origem. Dessa forma, a agremiação pode requerer a perda dos dois mandatos em questão, surgindo o interesse de agir, no tocante à suplência, somente a partir da data em que houve a posse no respectivo cargo eletivo.

3. Tendo o partido ajuizado a ação dentro do prazo de 30 dias, a contar da data em que o ex-filiado deixou a suplência e tomou posse no cargo de deputado estadual, não há falar em decadência do direito de ver reconhecida a infidelidade partidária.

4. Agravo Regimental ao qual se nega provimento.

(TSE, Agravo Regimental em Recurso Especial Eleitoral nº 2882, Acórdão de 06/05/2014, Relatora Min. LUCIANA CHRISTINA GUIMARÃES LÓSSIO, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Tomo 105, Data 6/6/2014, Página 69)

REPRESENTAÇÃO. FIDELIDADE PARTIDÁRIA. DEPUTADO FEDERAL. SUPLENTE. DESFILlAÇÃO PARTIDÁRIA. JUSTA CAUSA. SUBSTITUIÇÃO. LICENÇA. INTERESSE. DECADÊNCIA. ART. 1º, § 2º. RESOLUÇÃO-TSE N° 22.610/2007.

1. A disciplina da Resolução-TSE 22.610/2007 não é aplicável aos suplentes que se desligam do partido pelo qual foram eleitos, pois estes não exercem mandato eletivo. Tratar-se-ia, portanto, de questão interna corporis. (Cta 1.679/DF, Rel. Min. Arnaldo Versiani, no mesmo sentido, o RO 2.275/RJ, Rel. Min. Marcelo Ribeiro e a RP 1.399/SP, de minha relatoria).

2. Nos casos em que o suplente assume o exercício do mandato em razão de licença, há o dever de fidelidade ao partido pelo qual se disputou as eleições. Em tais hipóteses, os suplentes ostentam a condição de mandatários, de modo que eventual infidelidade partidária não mais se restringe a esfera interna corporis. (Cta. 1.714, de minha relatoria, DJe 24.9.2009).

3. A contagem do prazo de 30 (trinta) dias que a agremiação partidária possui para ajuizar o pedido de decretação de perda de mandato por infidelidade partidária (art. 1º, § 2º da Res.-TSE 22.610/2007) inicia-se com posse para substituição do mandatário. No caso, ocorrida a posse em 12.9.2007 e ajuizada a ação apenas em 4.2.2009, reconhece-se a decadência do direito postulado.

4. Extinção do processo, com julgamento do mérito, nos termos art. 269, IV, CPC.

(TSE, Petição nº 2979, Acórdão de 02/02/2010, Relator Min. FELIX FISCHER, Publicação: DJE - Diário da Justiça Eletrônico, Data 26/02/2010, Página 218 )

RECURSO ORDINÁRIO. INFIDELIDADE PARTIDÁRIA. DEPUTADO ESTADUAL. AÇÃO EXTEMPORÂNEA. DESFILIAÇÃO. SUPLENTE. PARTIDO. INTERESSE DE AGIR. AUSÊNCIA.

1. Conta-se da data da posse do suplente no cargo eletivo o prazo de 30 dias para o ajuizamento da ação por infidelidade partidária. Precedente.

2. Falta interesse de agir ao partido na ação de decretação de perda de cargo eletivo por infidelidade partidária em desfavor de suplente que se desligou da agremiação, se tal demanda for ajuizada antes da posse do pretenso infiel.

3. Recurso ordinário provido para extinguir o feito.

(TSE, Recurso Ordinário nº 2275, Acórdão de 25/05/2010, Relator Min. MARCELO HENRIQUES RIBEIRO DE OLIVEIRA, Publicação: DJE - Diário da Justiça Eletrônico, Data 02/08/2010, Página 213)

A partir de tais considerações, está também solvida a questão de n. 3:

3) Caso o suplente a vereador ou deputado troque de partido político, poderá o partido pelo qual concorreu pleitear que ele perca a condição de suplente?

A resposta a tal indagação é negativa.

Conforme alhures exposto, não existindo norma eleitoral que ampare eventual pretensão à perda da expectativa de direito dos eventuais suplentes partidários.  Resulta juridicamente inexequível a decretação da perda dessa posição jurídica com fundamento em eventual infidelidade partidária. O interesse jurídico da agremiação em retomar o espaço parlamentar conquistado nas urnas surge apenas a partir da efetiva posse do trânsfuga no cargo político, nos termos do § 2º do art. 1º da Resolução TSE n. 22.610/07.

Finalmente, enuncia a pergunta n. 4:

4) Sendo positivas as respostas, quem assumiria o cargo vacante, o segundo suplente de outro partido, mas da coligação? O cargo ficaria à disposição do partido alijado?

Sobre a matéria, o Supremo Tribunal Federal, reconhecendo a força normativa do princípio constitucional da fidelidade partidária, assentou que o mandato eletivo pertence ao partido político, conforme ilustra a seguinte ementa:

DIREITO CONSTITUCIONAL E ELEITORAL. AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. RESOLUÇÃO Nº 22.610/2007 DO TSE. INAPLICABILIDADE DA REGRA DE PERDA DO MANDATO POR INFIDELIDADE PARTIDÁRIA AO SISTEMA ELEITORAL MAJORITÁRIO. 1. Cabimento da ação. Nas ADIs 3.999/DF e 4.086/DF, discutiu-se o alcance do poder regulamentar da Justiça Eleitoral e sua competência para dispor acerca da perda de mandatos eletivos. O ponto central discutido na presente ação é totalmente diverso: saber se é legítima a extensão da regra da fidelidade partidária aos candidatos eleitos pelo sistema majoritário. 2. As decisões nos Mandados de Segurança 26.602, 26.603 e 26.604 tiveram como pano de fundo o sistema proporcional, que é adotado para a eleição de deputados federais, estaduais e vereadores. As características do sistema proporcional, com sua ênfase nos votos obtidos pelos partidos, tornam a fidelidade partidária importante para garantir que as opções políticas feitas pelo eleitor no momento da eleição sejam minimamente preservadas. Daí a legitimidade de se decretar a perda do mandato do candidato que abandona a legenda pela qual se elegeu. 3. O sistema majoritário, adotado para a eleição de presidente, governador, prefeito e senador, tem lógica e dinâmica diversas da do sistema proporcional. As características do sistema majoritário, com sua ênfase na figura do candidato, fazem com que a perda do mandato, no caso de mudança de partido, frustre a vontade do eleitor e vulnere a soberania popular (CF, art. 1º, parágrafo único; e art. 14, caput). 4. Procedência do pedido formulado em ação direta de inconstitucionalidade.

(ADI 5081, Relator(a): Min. ROBERTO BARROSO, Tribunal Pleno, julgado em 27/05/2015, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-162 DIVULG 18-08-2015 PUBLIC 19-08-2015) (Grifei.)

Destarte, o objetivo da disciplina da perda de mandato eletivo por infidelidade partidária é assegurar a representatividade política no Poder Legislativo, consoante as opções ideológicas e programáticas selecionadas pelo eleitor no momento do voto. Essas opções são veiculadas pelos partidos isoladamente considerados, os quais, ainda que consorciados por ocasião das eleições, preservam o seu próprio programa e estatuto partidários.

As Coligações, por sua vez, consistem em arranjos temporários, entre agremiações com traços afins, visando obter maior projeção eleitoral pelo somatório de seus esforços de campanha, tempo de propaganda em rádio e TV, etc. Tendo sua existência restrita à eleição, não há atuação política ou parlamentar da Coligação na Casa Legislativa, as quais são realizadas pelo partido isoladamente, no exercício da representatividade democrática.

Nos mesmos passos, assevera a doutrina de José Jairo Gomes:

Sabe-se que a coligação se extingue com o fim das eleições. Isso, porém, não altera os resultados do pleito, que permanecem para todos os efeitos. Cuidando-se de ente de existência transitória, é indefensável a tese segundo a qual o mandato lhe pertence. Por isso mesmo, a Resolução nem sequer se preocupou em lhe conferir legitimidade ad causam para a ação que instituiu. (Op. cit., p. 133)

Nessa senda, a jurisprudência do TSE consolidou o posicionamento de que a vaga aberta em decorrência da decretação de perda do mandato eletivo por infidelidade partidária deve ser preenchida pelo primeiro suplente da agremiação que a conquistou, ainda que tenha composto coligação nas eleições pretéritas.

Pertinente ao ponto, a colação do seguinte acórdão, reconhecendo, inclusive, a possibilidade de que a infidelidade partidária sem justa causa ocorra entre partidos que, outrora, compuseram a mesma coligação:

ELEIÇÕES 2014. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. QUESTÃO DE ORDEM. PETIÇÃO. DEPUTADO FEDERAL. DESFILIAÇÃO. AÇÃO DE PERDA DE CARGO ELETIVO AJUIZADA POR SUPLENTE DA COLIGAÇÃO PELA QUAL SE ELEGEU O TRÂNSFUGA. ILEGITIMIDADE ATIVA. OMISSÃO. INEXISTÊNCIA. REJEIÇÃO.

1. In casu, conforme assentado no acórdão embargado, a vacância pode ser de índole ordinária ou extraordinária. Na ordinária, a sucessão ocorre com a posse do suplente da coligação. Na extraordinária, que versa especificamente sobre as situações de infidelidade partidária - hipótese dos autos -, a vaga deverá ser destinada, necessariamente, a suplente do partido do trânsfuga, haja vista que, em situações tais, a perda do mandato se destina, única e exclusivamente, a recompor o espaço perdido pela agremiação.

2. Logo, forçoso reconhecer a ausência de legitimidade ativa do suplente da coligação para a propositura da ação de perda de cargo eletivo por desfiliação partidária sem justa causa. Reforça esse entendimento a possibilidade de a infidelidade ocorrer dentro da coligação (Cta n. 14-17, Rel. Min. Marcelo Ribeiro, DJ de 13.6.2008).

3. Ainda que se pudesse, em tese, reconhecer a legitimidade ativa do embargante, na condição de suplente da coligação, o que, frise-se, é inviável, ter-se-ia, mesmo assim, outro óbice, igualmente intransponível. É que a atuação do suplente, em casos tais, é sempre subsidiária à da agremiação se, ela própria, não ingressar com a ação no prazo de 30 (trinta) dias, nos termos do artigo 1º, § 2º, da Resolução-TSE nº 22.610/2007, sendo que, na espécie, o partido pelo qual se elegeu o trânsfuga ajuizou a ação dentro do prazo legal.

4. Inexistente qualquer dos vícios do art. 275 do CE, devem ser rejeitados os embargos de declaração, por não se prestarem à mera rediscussão da causa, conforme pretendido.

5. Embargos de declaração rejeitados.

(Petição nº 56703, Acórdão, Relator(a) Min. Luciana Christina Guimarães Lóssio, Publicação: DJE - Diário de justiça eletrônico, Tomo 226, Data 29/11/2016, Página 9) (Grifei.)

Tanto é assim que a jurisprudência consolidou-se no sentido de exigir do partido político, ao pretender reaver mandato eletivo com fundamento na Resolução TSE n. 22.610/07, a existência, dentre seus próprios quadros, de suplente apto a suceder o trânsfuga e garantir a representatividade partidária, não sendo suficiente que essa disponibilidade ocorra entre os integrantes da coligação.

Nessa linha, reproduzo a seguinte ementa do TSE:

ELEIÇÕES 2014. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. QUESTÃO DE ORDEM. PETIÇÃO. DEPUTADO FEDERAL. DESFILIAÇÃO. AÇÃO DE PERDA DE CARGO ELETIVO AJUIZADA PELO PARTIDO. RES.-TSE. Nº 22.610/2007. INEXISTÊNCIA DE SUPLENTE. AUSÊNCIA DE INTERESSE DE AGIR.

EXTINÇÃO DO FEITO. ARTIGO 485, VI, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL/2015. OMISSÃO NO JULGADO. VÍCIO INEXISTENTE. REJEIÇÃO.

1. A técnica hermenêutica do distinguishing não impõe que a aplicação de determinado precedente ao caso concreto somente se viabilize nas situações em que a base fática for idêntica. O esperado é que haja aproximação das

circunstâncias de base as quais permitam ao julgador concluir serem compatíveis as soluções jurídicas adotadas para ambos os casos. A eventual existência de pequenas diferenciações é perfeitamente aceitável e não importa, inexoravelmente, dar à ratio decidendi uma interpretação restritiva (restrictive distinguishing), sendo possível ao magistrado assentar o aproveitamento da tese consagrada (ampliative distinguishing).

2. In casu, tanto nos precedentes citados no acórdão embargado (AgR-AC nº 456-24/RS, Rel. Min. Henrique Neves da Silva, DJe de 21.8.2012; Pet nº 757-34/RN, Rel. Min. João Otávio de Noronha, DJe de 23.9.2014 e Cta n° 937-21/DF, Rel. Min. Marco Aurélio, DJe de 13.11.2015) quanto no caso dos autos, a solução jurídica aplicada por este Tribunal Superior foi no sentido de que o interesse de agir do partido - para a propositura da ação de perda de cargo eletivo por desfiliação partidária sem justa causa - depende da existência de suplente, o que revela a compatibilidade dos raciocínios jurídicos.

3. A demonstração do interesse de agir não pode estar embasada em evento futuro e incerto, condicionado - e aqui a clarividente inversão da lógica jurídica - à eventual procedência da própria ação, ocasião na qual suplente que concorreu por legenda diversa, no ato da diplomação, dada a sua condição de militar da ativa, se filiaria aos quadros do partido requerente.

4. Na vacância excepcional, assim compreendida como aquela decorrente da infidelidade partidária, a perda do mandato eletivo do infiel não tem natureza sancionatória. O que se busca com a medida é apenas garantir ao partido a recomposição do seu espaço no parlamento. Daí porque não tem interesse de agir a legenda que não possui, nos seus quadros, suplente. Esse posicionamento está em consonância com o entendimento do STF nos MS nos 26.602, 26.603 e 26.604.

5. A incidência do art. 56, § 2º, da CF c. c. o art. 113 do CE somente foi suscitada em memoriais e na sustentação oral, motivo pelo qual não pode ser considerada omissão, até porque importaria cercear o direito do embargado à ampla defesa e ao contraditório, pois sobre essa alegação específica não teve oportunidade de se contrapor a tempo e modo.

6. A título de obiter dictum, registro que o art. 56, § 2º, da CF e o art. 113 do CE não guardam qualquer pertinência com a vacância excepcional, objeto específico destes autos. Até porque, como dito, a utilidade no manejo da ação em comento está necessariamente relacionada e dela não se pode afastar) com a recomposição da representatividade da agremiação requerente a partir do seu quadro de suplência.

7. Inexistente qualquer dos vícios do art. 275 do CE, devem ser rejeitados os embargos de declaração, por não se prestarem à mera rediscussão da causa, conforme pretendido.

8. Embargos de declaração rejeitados.

(Petição nº 51859, Acórdão, Relator(a) Min. Luciana Christina Guimarães Lóssio, Publicação: DJE - Diário de justiça eletrônico, Tomo 237, Data 15/12/2016, Página 25/26)

Pelo exposto, VOTO pelo conhecimento da Consulta, a ser respondida nos seguintes termos:

1) O suplente de mandato eletivo relativo a cargo proporcional tem simples expectativa de assunção à vaga; portanto, até que efetivamente ocorra a sua posse, não é possível que essa posição jurídica seja questionada em sede de ação de perda do cargo por desfiliação partidária sem justa causa, por ausência de legitimidade passiva.

2) A partir da data da posse do suplente no cargo eletivo, esse passa a ter legitimidade para sofrer a ação de perda de cargo eletivo, correndo, desse marco, o prazo de 30 dias para o ajuizamento da medida pelo partido, nos termos do § 2º do art. 1º da Resolução TSE n. 22.610/07.

3) O interesse jurídico da agremiação quanto ao manejo da ação fundada no art. 22-A da Lei n. 9.504/97 surge apenas a partir da efetiva posse do trânsfuga no cargo eletivo, não sendo possível questionar a mera condição de suplência nessa sede.

4) A vaga aberta em decorrência da decretação de perda do mandato eletivo por infidelidade partidária deve ser preenchida pelo primeiro suplente apto da agremiação pela qual se elegeu o trânsfuga, ainda que tenha integrado coligação nas eleições pretéritas.

É o voto.