RE - 45251 - Sessão: 23/08/2017 às 17:00

Com a vênia da divergência lançada pelo Dr. Jamil Bannura, estou acompanhando o bem-lançado voto do relator, ao qual se somam as bem-lançadas ponderações do voto-vista da lavra do Dr. Silvio Ronaldo.

De fato, atento à normatividade incidente na espécie, penso que não há de se fazer distinção, ao efeito de conclusão diversa, do entendimento que adotamos até aqui quando a operação financeira é realizada por intermédio de depósito eletrônico.

É fato que a norma estabelece, para as doações de valor igual ou superior a R$ 1.064,10 (mil e sessenta e quatro reais e dez centavos), limitacão adicional à forma de captação, sendo admitida apenas a transferência eletrônica direta entre as contas bancárias do doador e do beneficiário da doação, a permitir que a conta bancária registre de forma cabal a fonte (§ 1º do art. 18 da Resolução TSE n. 23.463/15). A medida visa, sem dúvida, ao controle ainda mais rígido do trânsito de recursos financeiros para o financiamento de campanhas eleitorais, assegurando elemento adicional de fiscalização.

Entretanto, na espécie, deve prevalecer a matriz segundo a qual o critério definidor da incidência da hipótese legal passa pela demonstração da identificação da origem do valor objeto de doação. Não só a origem imediata, consubstanciada na operação financeira realizada, mas também – e precipuamente – aquela que explica, minimamente, a fonte mediata dos valores.

Em outras palavras, se a origem da quantia envolvida for lícita, ao menos aparentemente, regular estará a doação realizada; do contrário, não poderá desobrigar-se do alcance do normativo legal.

Nesse sentido, o precedente deste Tribunal no RE 88-68, da relatoria do Dr. Luciano André Losekann, que bem enfrentou a questão:

Recurso. Prestação de contas. Candidato. Doação em espécie. Resolução TSE n. 23.463/15 . Eleições 2016.

Doação em espécie que ultrapassa o limite legal, previsto no art. 18, § 1º, da Resolução TSE n. 23.463/15. Comprovada a origem da quantia depositada, advinda da conta corrente do próprio candidato. Irregularidade meramente formal.

Aprovação das contas com ressalvas. Declarada a prescindibilidade do recolhimento ao Tesouro Nacional do valor considerado irregular na sentença.

Provimento parcial.

(TRE-RS – RE n. 8-68.2016.6.21.0136 – Rel. Dr. LUCIANO ANDRÉ LOSEKANN – J. Sessão de 11.5.2017.)

 

Demonstrada a licitude da receita, por meio de prova convincente, sem comprometimento da transparência e confiabilidade da prestação de contas, é de ser admitida, ao efeito de considerar satisfeita a exigência legal.

Ou, dito de outro modo, a ênfase deve estar na comprovação da origem dos valores compensados, ou depositados, a fim de viabilizar um julgamento seguro a respeito da movimentação de recursos deste jaez.

Nem poderia ser diferente, porquanto ao juiz cabe o crivo de todos os elementos que integram os autos, atento às circunstâncias do caso em concreto, como ocorre diuturnamente nos processos que aportam nos nossos tribunais.

A não ser assim, estaríamos consagrando a “prova tarifada”, sem qualquer admissão de apreciação da causa petendi em face das nuances do caso, e o desprestígio à própria justiça.

Conforme bem descrito pelo Dr. Silvio Ronaldo, “a irregularidade pode ser sanada devido à prova documental, tempestivamente apresentada pelo prestador, demonstrando, com extrema segurança, ter sido realizado um depósito de cheque nominal, oriundo da conta bancária individual da titularidade do próprio candidato beneficiado, na sua conta de campanha”, uma vez que, “de acordo com os extratos juntados aos autos, na data de 23.8.2016, e com o mesmo valor de R$ 4.000,00, foi realizado um depósito de cheque na conta de campanha (fl. 82), com identificação do CPF do candidato (fl. 92), e imediatamente houve compensação na sua conta-corrente pessoal (fl. 109), particularidade que afasta qualquer dúvida sobre a real origem do recurso financeiro”.

Ademais, conclusão outra, sem atenção aos feitos e às suas circunstâncias, poderia propiciar indevido engessamento da dinâmica do processo eleitoral, com prejuízo aos que, comprovadamente, não tenham envidado para o cometimento de irregularidades.

Essa é a exegese que, ao longo de tantos processos, estamos fixando, sob o mesmo viés, o qual, com respeito aos posicionamentos em contrário, penso deva prevalecer.

É como voto.

 

 

Des. Silvio: Neste contexto, em que é farta a documentação a atestar que efetivamente a origem dos recursos é lícita e do próprio candidato, estou acompanhando na íntegra o digno relator e aprovando as contas; porém, com ressalvas, porque, a rigor, a lei estabelece um procedimento que deve ser observado, o que não impede o exame de caso a caso, como o que ora se apresenta.

 

Des. João Batista: Sr. Presidente, no meu voto original, estou aprovando as contas do candidato, sem ressalvas. No entanto, estou agora modificando aquele entendimento, com a permissão do colega Des. Silvio, e adotando as razões por ele expostas em seu voto, para, igualmente, aprovar as contas com ressalvas.

 

Des. Jamil: Gostaria de ressalvar que não há prova de quem fez o depósito. Esse é um elemento que se diferencia completamente de qualquer outra circunstância de transferência bancária. O cheque é dele, evidente. Se o cheque é dele, os R$ 4.000,00 só podem ter saído da conta dele, mas não há prova de quem fez o depósito, se ele próprio, ou se esse cheque foi objeto de negociações e endosso, e acabou parando como doação de terceiro. Essa ressalva que eu gostaria de fazer apenas. Eu voto com a divergência.

 

Des. Dall'Agnol: Sr. Presidente, eminentes colegas e procurador. O tema é interessante e rico, e propiciou um debate bastante proveitoso a respeito de questões que surgiram a partir do fato julgado. Não desconheço a força normativa das resoluções, principalmente aquelas que contêm instruções do TSE, mas não posso me afastar do comando legal, aqui, no caso, de leis anteriores que resguardavam as situações em que poderia ser feita demonstração. Quando houve a inovação, esta veio de forma forte, trazendo consequências ao candidato que não cumprisse com as disposições orientadas no § 1º do art. 18 da Resolução TSE n. 23.463/15 . E como vamos superar essa antinomia? Ao ponderar as circunstâncias do caso concreto, os eminentes Des. Fed. João Batista – relator – e Des. Silvio apreenderam que, aqui, a mens legis é evitar a captação ilícita de recursos, é impedir que alguma ilicitude no depósito possa impedir a fiscalização das contas pela Justiça Eleitoral. Na presente situação, ainda que o depósito não tenha sido feito por transferência eletrônica, podemos concluir que o cheque nominal – como previsto em lei antes da resolução – atende às necessidades legais; mais: ele corresponde à expectativa da Justiça Eleitoral em fiscalizar a lisura da utilização do recurso financeiro. Isso, a meu juízo, foi bem apanhado pelos eminentes colegas e também pelo eminente voto divergente, até porque a questão, mesmo na doutrina e na jurisprudência, tem solução para os dois lados. Embora eu não seja um juiz solipsista, acho que o caso concreto, aqui, permite que possamos formar uma convicção segura de que o depósito foi regular, foi lícito, que procurou não fugir das determinações legais quanto à forma de utilização dos recursos. Por essas razões, e com a mais respeitosa vênia ao eminente voto divergente, estou acompanhando o eminente relator, aprovando as contas, com ressalvas.

 

Des. Losekann: Sr. Presidente, eminentes colegas, no início, eu havia me alinhado ao voto divergente do Des. Jamil; mas fui verificar e, na própria jurisprudência do TSE, há precedentes no sentido da admissibilidade do cheque quando há comprovação da origem lícita dos recursos, precisamente como ressaltou o Des. Dall’Agnoll. Agregue-se ainda o fundamento no sentido de que a boa-fé se presume; a má-fé é que tem que ser provada. Então, não podemos partir da noção de que há má-fé do candidato ao efetuar esse tipo de aporte de recursos à sua conta, sem a devida comprovação. E, nesse sentido, comprovada a origem lícita dos recursos, não há por que não aprovar as contas com ressalvas.

 

Des. Bainy: Sr. Presidente, eminentes colegas, após as considerações feitas pelo Des. Silvio, Des. Dall'Agnol e Des. Luciano, eu também estou revendo meu posicionamento no caso concreto e acompanhando o relator.