RE - 43617 - Sessão: 13/12/2017 às 18:00

RELATÓRIO

Trata-se de recurso eleitoral interposto por FLORÊNCIA CAVALHEIRO, candidata ao cargo de vereador no Município de Marau, contra a sentença (fls. 19-21) que desaprovou sua prestação de contas relativa às eleições de 2016, em face de a recorrente não ter demonstrado capacidade financeira para efetuar doação para sua campanha eleitoral, no montante de R$ 433,00, valor considerado como recurso de origem não identificada.

Em suas razões (fls. 24-26), a candidata aduziu boa-fé e propugnou pela adoção do princípio da proporcionalidade, alegando, ainda, que os documentos colacionados demonstram a existência de renda compatível com os recursos próprios aportados na campanha. Requereu o provimento do recurso para serem aprovadas as contas.

Nesta instância, a Procuradoria Regional Eleitoral opinou pelo desprovimento do recurso (fls. 44-49).

É o relatório.

 

VOTO

O recurso é tempestivo (fls. 22-24) e preenche os demais pressupostos de admissibilidade, razão por que dele conheço.

Em preliminar, destaco a questão do conhecimento de documentos juntados em grau recursal.

Como já sedimentado em julgamento anterior desta Corte (RE PC n. 282-92.2016.6.21.0128, relator o Dr. Jamil Andraus Hanna Bannura, julgado em 16.5.17), a apresentação de novos documentos com o recurso, nesta classe processual especialmente, não apresenta prejuízo à tramitação do processo, mormente quando se trata de documentos simples, capazes de esclarecer as irregularidades apontadas, sem a necessidade de nova análise técnica ou de diligências complementares. Transcrevo a ementa do referido julgado:

Recurso. Prestação de contas. Candidato. Arrecadação e gastos de recursos em campanha eleitoral. Eleições 2016.

Matéria preliminar. 1. Embora a jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral não admita a juntada de documentação nova ao processo quando já transcorrida oportunidade prévia de saneamento das irregularidades, a previsão do art. 266 do Código Eleitoral autoriza a sua apresentação com a interposição do recurso, quando se tratar de documentos simples, capazes de esclarecer os apontamentos sem a necessidade de nova análise técnica ou diligência complementar. 2. A ausência de manifestação sobre eventual irregularidade nas contas não se confunde com a invalidade da sentença. Observado o regular procedimento na análise das contas ofertadas pelo candidato. Nulidade afastada.

Mérito. Falta de registro de despesa com serviços contábeis e gastos lançados com combustível sem consignar o aluguel ou cessão de veículo. Inconsistências sanadas com a juntada de novos documentos quando da interposição do recurso, que comprovam receita estimável em dinheiro referente ao serviço de contabilidade e juntada de termo de cessão de veículo para uso na campanha.

Desacolhido o pedido ministerial, nesta instância, de arrecadação de valores ao Tesouro Nacional em razão de recebimento de quantia não identificada, a fim de evitar a “reformatio in pejus”.

Aprovação das contas. Provimento.

Nessa linha, visa-se sobretudo salvaguardar o “interesse público na transparência da contabilidade de campanha, aliado à ausência de prejuízo à célere tramitação das contas”, de forma que caracteriza formalismo excessivo a vedação de novos documentos em segundo grau, como salientado no corpo do voto do acórdão paradigma.

Dessa forma, entendo possível a juntada dos novos documentos com o recurso.

Na questão de fundo, o órgão técnico identificou a existência de irregularidades nas contas - relativas a recursos próprios aplicados em campanha - que superam o valor do patrimônio declarado por ocasião do registro de candidatura, o que caracterizaria recebimento de recursos de origem não identificada – art. 3º, inc. I, e art. 14, inc. I, ambos da Resolução TSE n. 23.463/15.

Merece parcial provimento o recurso, para aprovar as contas com ressalvas.

Isso porque a incompatibilidade entre o patrimônio da recorrente – declarado por ocasião do registro de candidatura – e os recursos financeiros próprios empregados na campanha totalizaram a soma de R$ 433,00 (quatrocentos e trinta e três reais).

À míngua de outros elementos probatórios, não se mostra factível sugerir que o referido montante, de expressão reduzida, teria o condão de revelar a utilização de recursos de origem não identificada.

Utilize-se, por exemplo, o valor de R$ 1.064,10 – piso relativo à obrigatoriedade de transferência bancária de valores indicado no art. 18, inc. III, da Resolução TSE n. 23.463/15 – para se entender o valor sob exame de baixa monta.

É certo que o parecer técnico, na origem, tem a obrigação funcional de apontar as dissonâncias contábeis ocorridas, diante do caráter objetivo que permeia a análise a ser realizada.

Todavia, a análise judicial permite, em casos extremos como o que aqui se apresenta, a ponderação da legislação às circunstâncias do caso concreto: FLORÊNCIA CAVALHEIRO labora como confeiteira, atividade que lhe permitiria arcar minimamente com a doação de recursos em tela, consoante os documentos e comprovantes anexados com o recurso (fls. 27-40).

Nesse cenário, penso que a manutenção da sentença, a qual determina o recolhimento de grande parte do valor total de recursos utilizados na campanha ao Tesouro Nacional, refletiria em sanção demasiado grave àquela que colocou seu nome à disposição do eleitorado, exercendo, aliás, direito político fundamental que a Constituição de 1988 assiste.

No caso posto, penso que é caso de afastamento tópico da legislação, pelo fato de que a recorrente é mulher e de classe humilde, e bem sabemos das circunstâncias que, algumas vezes, permeiam as candidaturas aos cargos proporcionais para obediência às quotas de gênero.

Nesse contexto, colho recente aresto deste Tribunal em caso análogo:

RECURSO. PRESTAÇÃO DE CONTAS. CANDIDATO. ELEIÇÃO 2016. DESAPROVAÇÃO. RECURSOS PRÓPRIOS APLICADOS EM CAMPANHA. MONTANTE SUPERIOR AO DECLARADO NO REGISTRO DE CANDIDATURA. INEXISTÊNCIA DE PATRIMÔNIO. ATIVIDADE AUTÔNOMA PARA COMPLEMENTAR A RENDA FAMILIAR. SERVIÇO DE FAXINA. VALOR IRRISÓRIO DESPENDIDO NA CAMPANHA. APROVAÇÃO COM RESSALVAS. PARCIAL PROVIMENTO.

Utilização de recursos próprios na campanha que superam o valor do patrimônio declarado no registro de candidatura. Excesso que decorre da inexistência de patrimônio da prestadora, cuja atividade laboral provém da informalidade, mediante a realização de faxinas para complementar a renda familiar. Contas claras e de valores irrisórios.

Reforma da sentença para aprovar com ressalvas e afastar o comando de recolhimento de quantia ao Tesouro Nacional.

Parcial provimento.

(TRE/RS – RE 452-68 – Rel. DR. EDUARDO AUGUSTO DIAS BAINY – J. Sessão de 8.11.2017.) (Grifei.)

Portanto, por todos esses fatores, a aprovação das contas com ressalvas é medida que se impõe.

Diante do exposto, VOTO pelo parcial provimento do recurso interposto, reformando a sentença para aprovar as contas com ressalvas.