INQ - 7118 - Sessão: 21/09/2017 às 17:00

RELATÓRIO

Cuida-se de inquérito policial instaurado pela Delegacia de Polícia Federal de Porto Alegre, de ofício, em razão de possível uso de uma van em serviço do Tribunal Regional Eleitoral para distribuição de propaganda eleitoral da campanha de NELSON MARCHEZAN JUNIOR, em 28.10.2016.

O veículo VAN FIAT DUCATO, cor amarela, placa DVI 7434, de propriedade de NEIVA DA COSTA, teria sido utilizado pelo motorista EMERSON PAVÃO FONTOURA para transportar material de publicidade eleitoral da campanha de NELSON MARCHEZAN JUNIOR, ao mesmo tempo em que ostentava, em seu capô, uma folha de papel, afixada com fita crepe, com os dizeres “A SERVIÇO DO TRE ZONA – 158/03”.

Houve apreensão do veículo, condução dos investigados e coleta do depoimento da testemunha ELISETE DO CARMO DE OLIVEIRA.

Recebidos os autos pelo juízo da 1ª Zona Eleitoral (fl. 53), em razão de a prática delitiva envolver o Sr. NELSON MARCHEZAN JUNIOR, o feito foi remetido a este Tribunal.

A Procuradoria Eleitoral requereu o declínio de competência ao Juízo da 1ª Zona Eleitoral.

É o relatório.

 

VOTO

Acolho integralmente o requerimento da douta Procuradoria Eleitoral, pedindo vênia para transcrevê-lo na íntegra:

Inicialmente, há de se ressalvar que o presente inquérito policial foi instaurado de ofício pela autoridade policial, modalidade que não se admite na seara eleitoral, como dispõe o art. 8º da Resolução TSE n. 23.396/2013:

Art. 8° O inquérito policial eleitoral somente será instaurado mediante requisição do Ministério Público Eleitoral ou determinação da Justiça Eleitoral, salvo a hipótese de prisão em flagrante. (Grifou-se)

Com efeito, o TSE considera nulo o procedimento policial instaurado sem requisição do Parquet ou do Poder Judiciário:

ELEIÇÕES 2010. HABEAS CORPUS. PENAL. CRIME. CORRUPÇÃO ELEITORAL. ART. 299 DO CE. RÉU. DEPUTADO ESTADUAL. FORO POR PRERROGATIVA DE FUNÇÃO. INQUÉRITO POLICIAL. SUPERVISÃO JUDICIAL, DESDE A INSTAURAÇÃO, ATÉ A DENÚNCIA. NULIDADE ABSOLUTA. TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL. CONCESSÃO DA ORDEM.

1. Em regra, é excepcional o trancamento da ação penal por meio de habeas corpus, o que ocorre quando evidenciadas a atipicidade da conduta, a extinção da punibilidade, a ilegitimidade da parte ou a ausência de condições para o exercício da ação penal, na seara eleitoral, previstas no art. 358 do Código Eleitoral.

2. No presente caso está evidenciada a excepcionalidade apta ao trancamento da ação penal, já que a presença de autoridade com prerrogativa de foro no polo passivo, deputado estadual, demanda o exercício do poder-dever de supervisão judicial das investigações no foro competente para a apreciação e o julgamento da ação penal.

3. A mencionada supervisão judicial do inquérito deve ser observada durante toda a tramitação das investigações, desde sua abertura até o eventual oferecimento da denúncia pelo Ministério Público, não sendo permitida, por essa razão, a abertura de inquérito de ofício pela autoridade policial, tal como realizado no caso concreto.

4. Por não ter havido supervisão judicial sobre a instauração do inquérito, verifica-se a ocorrência de nulidade absoluta, portanto, inconvalidável, a qual retira a validade de todos os atos subsequentes a sua instauração.

5. Ordem de habeas corpus concedida para trancar a ação penal, sem prejuízo do art. 358, parágrafo único, do CE.

(Habeas Corpus n. 57378, Acórdão, Relatora Min. Luciana Christina Guimarães Lóssio, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Tomo 203, Data 28.10.2014, Página 70-71.) (Grifou-se.)

 

Ademais, compulsando os autos, conclui-se pela inexistência de indícios de prática delitiva por pessoa com prerrogativa de função.

Com efeito, é inequívoco que os investigados prestavam serviços de transporte de propaganda eleitoral em favor da campanha de NELSON MARCHEZAN JUNIOR, hoje Prefeito de Porto Alegre/RS.

Todavia, os elementos probatórios coletados no procedimento inquisitório não apresentam indícios de participação ou coautoria por parte de MARCHEZAN. Os depoimentos prestados ante a autoridade policial apontam que o transporte do material publicitário foi feito por empresa contratada pela campanha, não sendo possível afirmar que esta agira a mando do então candidato.

O fato de os investigados estarem levando consigo propaganda eleitoral não induz à responsabilização do candidato, fazendo-se necessários indícios mínimos de autoria, o que não se verifica no caso concreto.

 

Nesse sentido posiciona-se a jurisprudência: RECURSO CRIMINAL. DISTRIBUIÇÃO DE PROPAGANDA ELEITORAL IMPRESSA ("SANTINHOS"). AUTORIA. FALTA DE COMPROVAÇÃO. PROVIMENTO. ABSOLVIÇÃO.

1. A distribuição de material de campanha eleitoral impresso ("santinhos") na via pública configura o crime previsto no artigo 39, § 5º, inc.  III, da Lei n. 9.504/97.

2. A demonstração da autoria, com a atribuição da responsabilidade penal à candidata, demanda prova robusta e contundente, não podendo a condenação basear-se somente na presunção de culpa da candidata em razão da apreensão de alguns santinhos recolhidos no chão, sob pena de responsabilização objetiva.

3. O depoimento de uma única testemunha em juízo, justamente o policial responsável pela apreensão, que não soube apontar o autor da distribuição do material, é insuficiente para embasar uma condenação criminal. 4. Recurso criminal provido para absolver a recorrente, ante a falta de provas suficientes para a condenação. (TRE-GO, RECURSO CRIMINAL n. 2011, ACÓRDÃO n. 25/2016 de 28.1.2016, Relator SEBASTIÃO LUIZ FLEURY, Publicação: DJ - Diário de Justiça, Tomo 020, Data 3. 02.2016, Página 2-3.) (Grifou-se.)

 

AÇÃO PENAL . ART. 39, § 5º, INCISOS I e III DA LEI DAS ELEIÇÕES. AUSÊNCIA DE PROVAS . IN DUBIO PRO REU. IMPROCEDÊNCIA

1 – A prova dos autos não demonstra qualquer ligação do acusado com a prática das condutas narradas na denúncia, não havendo que se falar em responsabilizar o denunciado por condutas de terceiros, por não ter restado comprovado dolo ou culpa do mesmo na conduta delitiva, não lhe sendo possível imputar responsabilidade objetiva por tais fatos, já que não existe no ordenamento jurídico brasileiro a responsabilização penal objetiva.

2 - O decreto condenatório deve estar alicerçado em prova inconteste e conclusiva, de sorte que a íntima convicção do Juiz deva sempre estar amparada em dados objetivos indiscutíveis, o que inocorre no presente caso. 3 - Ação Penal julgada improcedente, absolvendo-se o acusado dos crimes tipificados no artigo 39, §5º, incisos II e III, da Lei n. 9.504/97, com arrimo no art. 386, inciso V, do CPP.

(AÇÃO PENAL n. 271, ACÓRDÃO n. 240 de 03.10.2014, Relatora RACHEL DURÃO CORREIA LIMA, Revisor JÚLIO CÉSAR COSTA DE OLIVEIRA, Publicação: DJE - Diário Eletrônico da Justiça Eleitoral do ES, Data 24.10.2014, Página 07.) (Grifou-se.)

 

RECURSO CRIMINAL. DESCUMPRIMENTO DE ORDEM JUDICIAL. ARTIGO 347 DO CÓDIGO ELEITORAL. AÇÃO PENAL JULGADA PROCEDENTE, COM APLICAÇÃO DAS CORRESPONDENTES PENAS. MATÉRIAS PRELIMINARES: IMPEDIMENTO DO JULGADOR. AFASTADA. CERCEAMENTO DE DEFESA. PREJUDICADA. MÉRITO. .IMPOSSIBILIDADE DE RESPONSABILIDADE PENAL OBJETIVA. NÃO COMPROVAÇÃO DA AUTORIA E PARTICIPAÇÃO DO REPRESENTANTE DA COLIGAÇÃO NA CONDUTA DESCRITA. PROVIDO.

1- AÇÃO PENAL PROPOSTA EM RAZÃO DE SUPOSTO DESCUMPRIMENTO DE ORDEM JUDICIAL, DADA POR MEIO DE PORTARIA, DETERMINANDO AOS CANDIDATOS E PARTIDOS POLÍTICOS QUE SE ABSTIVESSEM DE LANÇAR MATERIAL DE PROPAGANDA EM LOCAIS PÚBLICOS.

2- EM RAZÃO DA APREENSÃO DE MATERIAL IMPRESSO ("SANTINHO") NA VIA PÚBLICA, COM A PROPAGANDA ELEITORAL DO RÉU, O MM. JUIZ A QUO PROFERIU SENTENÇA CONDENATÓRIA RESPONSABILIZANDO-O PELA CONDUTA DESCRITA NA INICIAL.

3- PRELIMINAR DE IMPEDIMENTO DO JULGADOR. ATOS DO MM. JUIZ ELEITORAL REALIZADOS NO EFETIVO EXERCÍCIO DO PODER DE POLÍCIA QUE LHE É ATRIBUÍDO POR LEI, NÃO O TORNA CONHECEDOR DOS FATOS NARRADOS NA PEÇA ACUSATÓRIA. AFASTADA.

4- PRELIMINAR DE CERCEAMENTO DE DEFESA EM RAZÃO DO INDEFERIMENTO DA OITIVA DAS 05 (CINCO) TESTEMUNHAS ARROLADAS, OUVIDAS APENAS 03 (TRÊS). APLICAÇÃO DO ART. 249, § 2º, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL AO PROCESSO PENAL, POR ANALOGIA. PREJUDICADA. 5

5- RECURSO. A CARACTERIZAÇÃO DO DELITO EM COMENTO EXIGE O DESATENDIMENTO A ORDEM JUDICIAL DIRETA E INDIVIDUALIZADA, O QUE NÃO OCORREU NO CASO EM COMENTO. ATIPICIDADE DA CONDUTA.

6- AINDA, NÃO HÁ PROVA DA AUTORIA. INVIABILIDADE DE RESPONSABILIZAÇÃO PENAL OBJETIVA. NÃO COMPROVAÇÃO DA RESPONSABILIDADE DO RÉU.

7- RECURSO PROVIDO PARA ABSOLVER O RECORRENTE, COM FUNDAMENTO NO ART. 386, inc. III, DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. (RECURSO CRIMINAL n. 54843, ACÓRDÃO de 18.3.2014, Relatora CLARISSA CAMPOS BERNARDO, Publicação: DJESP - Diário da Justiça Eletrônico do TRE-SP, Data 25.3.2014.) (Grifou-se.)

Dessarte, inexistindo demonstração do envolvimento de Sr. Nelson Marchezan Junior com as práticas delitivas, é de ser acolhido o pedido de declínio de competência ao primeiro grau da Justiça Eleitoral, como já precedentemente decidido por esta Corte, em acórdão da lavra do Ínclito Desembargador Silvio Ronaldo Santos de Moraes:

PETIÇÃO. NOTÍCIA-CRIME. REQUISIÇÃO PARA INSTAURAÇÃO DE INQUÉRITO. PREFEITO. PRERROGATIVA DE FORO. REQUISITOS. INEXISTÊNCIA. ARQUIVAMENTO. DECLÍNIO DA COMPETÊNCIA.

Suposto esquema de uso de máquinas de propriedade de órgão municipal, com o auxílio de servidores públicos, para distribuição de material para terraplanagem em propriedades particulares em troca de votos. Inexistência de elementos suficientes para o prosseguimento da apuração contra o prefeito. Arquivamento do expediente em relação ao chefe do executivo. Deslocamento da competência para o juízo de origem no que tange aos fatos remanescentes. Competência declinada.

(PET 29-66, julgada em 27.02.2017.) (Grifei.)

 

DIANTE DO EXPOSTO, voto pelo provimento do pedido, declinando da competência ao juízo da 1ª Zona Eleitoral – Porto Alegre, a fim de que, encaminhados os autos ao Promotor Eleitoral oficiante, adote as medidas que entender cabíveis.