RE - 7691 - Sessão: 18/10/2017 às 17:00

RELATÓRIO

Trata-se de recurso interposto pelo PARTIDO DOS TRABALHADORES (PT) de Viamão contra sentença que desaprovou suas contas referentes à movimentação financeira relativa ao exercício de 2014, em razão do recebimento de recursos de origem não identificada, determinando o recolhimento ao Tesouro Nacional de R$ 14.541,00, acrescido de multa de 20% sobre o valor irregular.

Em sua irresignação (fls. 103-106), sustenta que a penalidade pecuniária foi indevidamente fixada, pois não prevista na Resolução TSE n. 21.841/04, a qual rege o exercício financeiro em julgamento. Argumenta que a punição aplicada mostra-se desproporcional em face da reprovabilidade das falhas apontadas. Requer a reforma da decisão, para reconhecer a regularidade das contas.

Nesta instância, os autos foram com vista à Procuradoria Regional Eleitoral, que opinou, preliminarmente, pela nulidade da sentença e, no mérito, pelo parcial provimento do recurso (fls. 110-114).

É o sucinto relatório.

 

VOTO

PRELIMINAR:

Tempestividade:

O recurso é tempestivo. A sentença recorrida foi publicada no DEJERS na data de 05.7.2017 (fl. 102), quarta-feira, e o recurso foi interposto no dia 10 do mesmo mês (fl. 103), segunda-feira, observando, portanto, prazo recursal de três dias previsto pelo art. 258 do Código Eleitoral.

Nulidade da sentença:

Preliminarmente, a sentença desaprovou as contas em razão da existência de doações provenientes de origem não identificada recebidas pelo partido, aplicando a sanção de multa de 20% sobre o valor irregular, nos termos do art. 49 da Resolução TSE n. 23.464/15.

A Procuradoria Regional Eleitoral lançou manifestação no sentido da nulidade da decisão de primeiro grau, ao fundamento de que negou vigência à determinação expressa do art. 37, § 3º, da Lei n. 9.096/95, o qual determina a suspensão do repasse de novas quotas do Fundo Partidário pelo período de 01 a 12 meses.

Apesar dos bem expostos argumentos, entendo que a preliminar deve ser rejeitada.

Não se verifica, na sentença recorrida, a omissão de um dever legal, mas o entendimento do magistrado em sentido contrário ao adotado pelo órgão ministerial.

Embora a sentença não tenha seguido a orientação jurisprudencial a respeito da sanção incidente sobre as prestações de contas do exercício financeiro de 2014, a decisão expressamente fundamentou a aplicação da multa de 20%, “de acordo com o previsto no art. 14 caput e § 3º e art. 49 caput da Resolução TSE n. 23.464/15” (fl. 97v.-98).

Não se trata, portanto, de omissão da sentença a respeito da consequência da desaprovação das contas, mas de uma interpretação do ordenamento, expressamente fundamentada, no sentido de que deveria incidir a multa de 20%, posteriormente prevista na legislação, em vez da penalidade prevista ao tempo do exercício financeiro.

Nesta hipótese, em que a sentença fundamenta a ausência de recolhimento do valor, não se está diante de nulidade, pois o juiz não se omitiu na aplicação de uma norma de ordem pública, mas interpretou o ordenamento, situação que apenas poderia ser alterada mediante recurso – o que foi feito, aliás, pelo órgão partidário.

Do exposto, afasto a preliminar de nulidade da sentença.

 

MÉRITO:

No mérito, a sentença desaprovou as contas em razão do recebimento do total de R$ 14.541,00 por meio de depósito em dinheiro sem identificação do CPF do doador, o que constitui recurso de origem não identificada.

A sentença deve ser mantida.

De fato, o partido recebeu o total de R$ 14.541,00 mediante depósito em dinheiro, sem a identificação da sua origem e em desconformidade ao disposto no art. 4º, § 2º, da Resolução TSE n. 21.841/04:

art. 4º.

§ 2º As doações e as contribuições de recursos financeiros devem ser efetuadas por cheque nominativo cruzado ou por crédito bancário identificado, diretamente na conta do partido político.

A captação de recursos sem o emprego de cheque ou por crédito bancário devidamente identificado, nos termos em que exigido pela norma de regência acima transcrita, inviabiliza a aferição da efetiva origem do valor recebido.

A parte tentou identificar os doadores mediante a descrição do contribuinte e seu CPF, associada ao montante doado (fls. 39-44). Todavia, a lista foi elaborada de forma unilateral pela agremiação, estando desacompanhada de outros documentos capazes de atribuir segurança à declaração partidária.

Ademais, a falha constatada prejudicou a confiabilidade das contas, pois, além do elevado valor nominal, representa 36,1% do total de recursos arrecadados, mostrando-se adequado o juízo de desaprovação das contas.

Por fim, a recorrente insurge-se ainda contra a penalidade da multa imposta, cujo valor consiste em 20% sobre a irregularidade.

Com razão a agremiação. Ao tempo do exercício financeiro de 2014 estava em vigor a norma do art. 37, § 3º, da Lei n. 9.096/95, a qual determinava a sanção de suspensão do repasse de novas quotas do Fundo Partidário pelo período de 01 a 12 meses. Tal previsão foi revogada pela Lei n. 13.165/15, a qual conferiu nova redação ao art. 37, caput, que passou a prever a incidência de multa de 20% sobre a importância considerada irregular.

A respeito das regras de direito intertemporal, a jurisprudência firmou-se no sentido de que a incidência da nova sanção somente ocorreria sobre os exercícios financeiros de 2016, como ilustra a seguinte ementa:

SEGUNDOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. PRESTAÇÃO DE CONTAS DE DIRETÓRIO NACIONAL. EXERCÍCIO FINANCEIRO DE 2009. DESAPROVADA PARCIALMENTE. AUSÊNCIA DE VÍCIOS. REJEIÇÃO DOS EMBARGOS.

1. QUESTÃO DE ORDEM. As alterações promovidas no caput do art. 37 da Lei nº 9096/1995, reproduzidas no art. 49 da Res.-TSE nº 23.464/2015, são regras de direito material e, portanto, aplicam-se às prestações de contas relativas aos exercícios de 2016 e seguintes. Entendimento contrário permitiria que contas das agremiações partidárias relativas a um mesmo exercício financeiro fossem analisadas com base em regras materiais diversas, o que não se pode admitir. É preciso conferir tratamento isonômico a todos os partidos políticos, sem alterar as regras aplicáveis a exercícios financeiros já encerrados, em razão do princípio da segurança jurídica. O Plenário do TSE, analisando a questão relativa à alteração legislativa promovida pela mesma lei ora em análise na Lei das Eleições quanto ao registro do doador originário nas doações, assentou que "a regra constante da parte final do § 12 do art. 28 da Lei nº 9.504/97, com a redação conferida pela Lei nº 13.165/2015, não pode ser aplicada, [...] seja porque a lei, em regra, tem eficácia prospectiva, não alcançando fatos já consumados e praticados sob a égide da lei pretérita" (ED-REspe nº 2481-87/GO, rel. Min. Henrique Neves da Silva, julgado em 1º.12.2015). A modalidade de sanção em decorrência da desaprovação de contas prevista na nova redação do caput do art. 37 da Lei nº 9.096/1995, conferida pela Lei nº 13.165/2015, somente deve ser aplicada às prestações de contas relativas ao exercício de 2016 e seguintes.

[...]

5. Embargos de declaração rejeitados.

(TSE, Prestação de Contas n. 96183, Acórdão, Relator Min. Gilmar Ferreira Mendes, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Volume , Tomo 54, Data 18.3.2016, Página 60-61.)

Dessa forma, incide na espécie a sanção de suspensão do repasse de novas quotas do Fundo Partidário pelo período de 1 a 12 meses, nos termos do art. 37, § 3º, da Lei n. 9.096/95, com redação vigente ao tempo do exercício financeiro em julgamento.

Acolhido o pleito recursal para afastar a multa imposta, em razão do reconhecimento da incidência de disciplina distinta sobre o caso, cumpre estabelecer o período de suspensão do Fundo Partidário, de acordo com critérios de proporcionalidade.

Analisando as circunstâncias do caso concreto, considerando a gravidade da falha – omissão da origem dos recursos arrecadados – e o montante irregular, correspondente à 36% do total arrecadado, entendo proporcional suspender o repasse de quotas do Fundo Partidário por 4 meses.

 

Ante o exposto, VOTO por afastar a preliminar suscitada e por dar parcial provimento ao recurso, para afastar a pena de multa de 20% e fixar a sanção de suspensão do repasse do Fundos Partidário por 4 meses, mantidas as demais conclusões da decisão recorrida.